'Me sentia doente, não podia trabalhar mais': os trabalhadoresaposta da blazeregimeaposta da blazeescravidão moderna na Tailândia:aposta da blaze

Ko Aye

Crédito, BBC Brasil

Legenda da foto, "Estava cansada, me sentia doente, não podia trabalhar mais", conta Ko Aye

Uma potência erguida com base no trabalho escravo,aposta da blazeacordo com Kevin Bales, especialistaaposta da blazeEscravidão Contemporânea na Universidadeaposta da blazeNottingham. Bales considera que o tráfico humano e a escravidão moderna são parte intrínseca da natureza dos grandes conglomerados pesqueirosaposta da blazetodo o mundo.

"É provável que, sem escravidão, a indústria pesqueira tailandesa não pudesse competir com os barcos bengaleses, vietnamitas, chineses e russos que utilizam a escravidão (na indústria pesqueira)", afirma Bales à BBC Brasil, autoraposta da blazeDisposable People: New Slavery in The Global Economy (Pessoas descartáveis: Nova Escravidão na Economia Global,aposta da blazetradução livre).

Pobreza, a diferençaaposta da blazeidiomas eaposta da blazeregras claras para legalização do trabalho imigrante tornam os trabalhadores imigrantes uma presa fácil para a redeaposta da blazetraficantes que operam no sudeste asiático.

Antesaposta da blazeimigrar à Tailândia, Ko Aye eaposta da blazefamília eram empregadosaposta da blazeuma fazenda dedicada à produçãoaposta da blazemilho. "Ganhávamos apenas o suficiente para comer naquele mesmo dia", recorda. A ideiaaposta da blazeque a vida poderia mudar veio quando uma tia disse que um "coiote" poderia lhe conseguir um trabalho na Tailândia.

A família não demorou para decidir. Imigrar à Tailândia é a versão do "sonho americano" para o sudeste asiático, especialmente para os vizinhos empobrecidosaposta da blazeMianmar, Camboja e Laos.

Ko Aye tinha 16 anos quando cruzou a fronteira com a ajuda do coiote e do guarda fronteiriço.

Na fábrica, Ko Aye era proibidaaposta da blazesair e tampouco se arriscava. Nunca teve seus documentosaposta da blazemãos. "Não conhecia ninguém do ladoaposta da blazefora, tinha dívidas a pagar. Comia pouco, mas mesmo assim não dava, gastava tudoaposta da blazecomida", afirma.

Ko Aye e Su Su

Crédito, BBC Brasil

Legenda da foto, Ko Aye tinha 16 anos quando cruzou a fronteira com a ajuda do coiote e do guarda fronteiriço; ela conheceu Su Su,aposta da blazenamorada, na fábrica

"A escravidão por dívida, ilegal sob o direito internacional, é utilizada por traficantes para mantê-los cativos", afirma à BBC Brasil Lisa Rende Taylor, diretora-executiva do Issara Institute, uma das referências no país no combate ao trabalho escravo.

Estima-se que 425,5 mil pessoas estãoaposta da blazesituaçãoaposta da blaze"escravidão moderna" no país,aposta da blazeacordo com a The Global Slavery Index.

Traficantes presos

Na semana passada,aposta da blazeum julgamento inédito, 62 pessoas foram condenadas pela Justiça tailandesa por participaraposta da blazeuma redeaposta da blazetráfico humano. Entre os condenados, está um general do Exército e políticos locais.

O líder da junta militar e primeiro-ministro Prayuth Chan-ocha pediu à população para não rotular os militares como criminosos. "Há muitas pessoas na redeaposta da blazetráfico humano. Não agrupem (a postura de) todos os soldados a partiraposta da blazeum", acrescentou.

Esta redeaposta da blazetraficantes foi desarticuladaaposta da blaze2015, quando centenasaposta da blazeimigrantes foram encontrados enjaulados na selva tailandesa- grande parte deles pertencentes à minoria Rohingya,aposta da blazeMianmar. Dali, os imigrantes seriam vendidos diretamente a barcos pesqueiros. Cercaaposta da blaze500 corpos foram encontradosaposta da blazevalas comuns no mesmo local onde a quadrilha foi desbaratada.

A junta militar que governa o país diz ter ordenado o aumento nos controles sobre os barcos pesqueiros e o registroaposta da blazeimigrantes e afirmam ter fortalecido a vigilância nas fronteiras. Até o fechamento desta reportagem, o governo tailandês não havia respondido ao pedidoaposta da blazeentrevista à BBC Brasil para explicar a dimensão dessas ações.

Na opiniãoaposta da blazeLisa Rende Taylor, as mudanças anunciadas pela junta militar não trouxeram impactos significativos. "Ainda estamos vendo o tráfico dentro do recrutamentoaposta da blazemão-de-obra, a escravidão por dívidas, trabalhadores sem documentos sendo forçados a trabalhar turnos duplos por pouco ou nenhum salário", afirma.

pessoas limpando camarões na Tailândia

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Legenda da foto, Quarto maior exportador mundialaposta da blazefrutos do mar, a Tailândia gera R$ 18,71 bilhões anuaisaposta da blazeexportações

No mês passado, o Departamentoaposta da blazeEstado dos EUA manteve a Tailândia na listaaposta da blazevigilânciaaposta da blazenível 2aposta da blazeseu Relatório Anual sobre Tráficoaposta da blazePessoas (TIP), por considerar que o país "tem demonstrado esforços"aposta da blazecoibir o crime, porém, não demonstrou resultados satisfatórios. A Tailândia é considerada um paísaposta da blazefonte, trânsito e destinoaposta da blazetráfico humano.

O tráfico humano movimenta US$32 bilhões anualmente, atrás apenas do tráficoaposta da blazedrogas na escalaaposta da blazecrimes transnacionais, segundo a Agência para Drogas e Crimes das Nações Unidas (UNDCO).

A Tailândia ainda enfrenta o riscoaposta da blazeter suas exportaçõesaposta da blazefrutos do mar proibidas na Europa. Em 2015, a UE impôs uma advertência que obriga o país a combater a pesca ilegal, não declarada e não regulamentada (IUU nas siglasaposta da blazeinglês). Parte da regulamentação se refere à mão-de-obra.

As exportaçõesaposta da blazefrutos do mar da Tailândia para o Brasil cresceram 44% neste ano, com um acumulado até junhoaposta da blazeUS$ 266,6 mil,aposta da blazeacordo com o Ministérioaposta da blazeIndústria, Comércio Exterior e Serviços. Segundo informações da embaixada tailandesaaposta da blazeBrasília, o camarão ainda é vetado devido às altas taxas para a importação. No entanto, outros peixes provenientes da mesma cadeiaaposta da blazeexploração podem ser encontrados nos supermercados brasileiros.

Para Matthew Smith, diretor executivo da ONG Fortify Rights - que atua contra o trabalho escravo no sudeste asiático - a economia tailandesa colocaráaposta da blazeriscoaposta da blazereputação se não "limpar"o setor. "A Tailândia está vendoaposta da blazereputação ser afetada. Essa é parte da razão por que o regime está pensando no problema. Eles sabem que se não limparem o setor poderão entraraposta da blazecolapso porque começarão a perder contratos e investimentos", afirmou Smith à BBC Brasil. "Os distribuidores começarão a pensar duas vezes antesaposta da blazeimportar produtos da Tailândia", acrescentou.

Resgate

No mesmo anoaposta da blazeque imigrantes foram encontradosaposta da blazejaulas, Ko Aye também foi resgatada. Um imigrante fugiu do galpãoaposta da blazeque ela trabalhava e pediu ajuda à uma ONG local. As autoridades tailandesas foram chamadas e o galpão foi inspecionado. "(As autoridades) disseram que podíamos sair, que não precisávamos continuar ali, trabalhando. Fui chamar Ko Aye mas ela se recusava, ela tinha medo", relata, emocionada, Su Su*, namoradaaposta da blazeKo Yae. Elas se conheceram na fábrica.

Su Su

Crédito, BBC Brasil

Legenda da foto, "(As autoridades) disseram que podíamos sair, que não precisávamos continuar ali trabalhando. Fui chamar a Ko Aye mas ela se recusava, ela tinha medo", conta Su Su, namoradaaposta da blazeKo Yae

O Issara Institute incluiu Ko Yae e Su Su no programaaposta da blazeresgate eaposta da blazetransferênciaaposta da blazedinheiro incondicional para vítimasaposta da blazetráfico para que pudessem sobreviver enquanto conseguiam um novo trabalho. Receberam durante três meses um pouco maisaposta da blazeum salário mínimo e assistência jurídica.

Apesar da ação das autoridades no resgate, as imigrantes não foram reconhecidas pelo governo como vítimasaposta da blazetráfico humano. No entanto, a corte trabalhista aceitou julgar o processo no qual elas reivindicam o pagamentoaposta da blazedois anosaposta da blazesalários atrasados.

"Tenho esperançaaposta da blazeque vamos recuperar nosso salário e poderemos voltar para casa (Mianmar), abrir um negocinho e viveraposta da blazenovo", diz Ko Aye. O futuro das imigrantes será definidoaposta da blazedois meses.

Enquanto espera o julgamento, Ko Yae* continua limpando camarõesaposta da blazeum outro galpãoaposta da blazeSamut Sakhon, como tem feito nos últimos seis anos.

Trabalha entre 10 h e 12 horas diárias, por um salário mínimo mensal equivalente a R$ 700. A renda lhe garante alimentar-se, pagar o aluguel do quartoaposta da blazeque dorme e ter um diaaposta da blazefolga por semana. Apesaraposta da blazeganhar pouco e trabalhar muito, a jovem comemora poder caminhar "livre" fora da fábrica nas horas livresaposta da blazetrabalho. Ela e a namorada - que trabalha no mesmo galpão- ajustam o orçamento para economizarem, juntas, R$180 ao mês. "Quase sempre conseguimos", diz. "Queremos recomeçar nossa vida (em Mianmar) e esquecer tudo isso."

*O nome real das vítimas foram modificados para proteçãoaposta da blazesuas identidades.