Lula toma posse: 4 desafios do novo governo:bet 50

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Legenda da foto, Lula inicia seu terceiro mandato com novos e velhos desafios pela frente

Uma quarta fontebet 50preocupação é a relação com as Forças Armadas, que tiveram papelbet 50destaque no governo Bolsonaro. Para estudiosos do tema, isso enfraqueceu a democracia brasileira e o governo Lula precisa afastar os militares da política.

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Entenda melhor a seguir cada um desses quatro desafios.

1) Equilibrismo fiscal

Um dos maiores desafios do novo governo é cumprir suas promessas eleitorais,bet 50mais gastos sociais e investimentos, ao mesmo tempo que reorganiza as contas públicas.

Esse desafio não é novo. Em 2016, na tentativabet 50segurar as despesas, o Congresso aprovou o chamado Tetobet 50Gastos. O problema é que essa regra tem sido descumprida ano a ano — no governo Bolsonaro, foram gastos R$ 796 bilhões acima do limite constitucional, segundo cálculo do economista Bráulio Borges, pesquisador do Instituto Brasileirobet 50Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV).

Com Lula não será diferente. A pedido do novo presidente, o Congresso aprovoubet 50dezembro uma autorização para o governo gastar R$ 167,9 bilhões acima do tetobet 502023. Com esse dinheiro, haverá mais recursos para obras, o Bolsa Família e outros gastos sociais como o programa Farmácia Popular.

Essa autorização foi aprovada pelo Congresso por meiobet 50uma emenda constitucional, a chamada PEC da Transição. Ela também prevê que até agosto o governo envie ao Congresso uma nova propostabet 50regime fiscal para substituir o Tetobet 50Gastos. A ideia é ter novas regras que regulem o aumento das despesas, já que o teto se mostrou ineficiente na prática.

Para Bráulio Borges, o conjunto da PEC da Transição não foi uma boa sinalização para o rumo das contas públicas. Nabet 50avaliação, o problema não está no aumentobet 50gastos isoladamente, mas no fatobet 50até agora o governo não ter indicado como vai elevar as receitas para cobrir as novas despesas.

Sem isso, os gastos serão pagos com mais endividamento público. E quando a dívida aumenta costuma subir também a taxa básicabet 50juros da economia (Selic), o que dificulta o crescimento e a geraçãobet 50emprego.

Para Borges, uma forma do governo dar uma sinalização rápidabet 50compromisso com o equilíbrio fiscal seria rever cortesbet 50impostos adotados por Bolsonaro, como a redução do IPIbet 50diversos produtos industrializados e os cortesbet 50PIS/Cofins sobre combustíveis.

Ele estima que a reversão dessas duas medidas significaria uma receita anualbet 50cercabet 50R$ 80 bilhões.

O economista da FGV acredita que medidas como essa podem melhorar a confiança do mercado e da sociedade na capacidade do governo pagarbet 50dívida, o que ajudaria a reduzir a cotação do dólar, que está pertobet 50R$ 5,30. E um recuo na taxabet 50câmbio traria alívio para a inflação, baratando itens como combustíveis e alimentos, cujos preços são impactados pela cotação internacional do petróleo ebet 50commodities.

"A incerteza com relação à sustentabilidade fiscal tem impactos econômicos nocivos já hoje. E a gente vê issobet 50maneira muito concreta na taxabet 50câmbio. Não fosse toda essa discussão da PEC da transição, a taxabet 50câmbio já poderia estarbet 50R$ 4,80, R$ 4,90. Haveria um alívio da inflação praticamente imediato", argumenta Borges.

Mas a voltabet 50alguns impostos proposta pelo pesquisador da FGV também traz riscos para o governo. No curtíssimo prazo, tirar o subsídio que Bolsonaro adotou para baratear os combustíveis vai ter como efeito uma subida imediatabet 50preços. Isso costuma desagradar os caminhoneiros que,bet 50várias ocasiões, reagiram com paralisaçõesbet 50todo país. Em 2018, uma mobilização desse tipo gerou retração econômica.

Sem detalhar, o novo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, prometeu adotar medidas para melhorar as contas públicas já no início do governo,bet 50entrevista ao jornal O Globo.

"Arrumar a casa é o item um. Rever desonerações, benesses que foram dadas eleitoralmente, sem base técnica alguma. Isso é uma sinalização que os atores vão responder a ela, o Banco Central, os investidores estrangeiros. Tem que ter uma arrumação inicial", respondeu,bet 50referência aos cortesbet 50impostos adotados por Bolsonaro no ano eleitoral.

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Legenda da foto, Militares durante ensaio na rampa do Palácio do Planalto para a cerimôniabet 50possebet 50Lula e Alckmin

Já a economista Clara Marinho, que integrou a equipebet 50transição do governo eleito e é analistabet 50planejamento e orçamento do Ministério do Planejamento, considera que um desafio importante para o governo é como garantir que as despesas públicasbet 50fato sejam eficientesbet 50atender os grupos mais pobres e historicamente excluídos.

Ela cita como exemplo o esperado reajustebet 50bolsas para pesquisadores. Nabet 50visão, não adianta apenas aumentar essa verba sem pensar tambémbet 50como garantir que pesquisadores negros serão atendidos, já que esse grupo costuma enfrentar mais obstáculos nabet 50qualificação profissional.

"Eu vejo esse como o desafio fundamental:bet 50ao mesmo tempo que fazer a recomposiçãobet 50gastosbet 50políticas públicas que afetam a qualidadebet 50vida das pessoas, que afetam a estruturabet 50oportunidade ebet 50usufrutobet 50direitos, permitir que haja um desenho que garanta que essas pessoas não estarão excluídas depoisbet 50um ciclobet 50quatro anosbet 50governo", destaca.

2) A relação com o Congresso

Construir uma base no Senado e na Câmara dos deputados é fundamental para qualquer presidente governar, pois muitas das políticas propostas pelo governo precisambet 50aprovação do Parlamento. E também é importante para barrar eventuais tentativasbet 50processobet 50impeachment.

Lula já enfrentou esse desafiobet 50seus dois primeiros governos. O escândalo do mensalão, que estouroubet 502005, estava relacionado à distribuição ilegalbet 50recursos entre partidos aliados para garantir apoio no Congresso. Essa foi a conclusão do Supremo Tribunal Federal quando julgou o caso e condenou políticos do PT ebet 50partidos da base aliadabet 50Lula.

Cientistas políticos avaliam que hoje o cenário é ainda mais desafiador. Segundo Beatriz Rey, pesquisadora visitante da Universidade Johns Hopkins,bet 50Washington, o Congresso Nacional se fortaleceu na relação com o Poder Executivo,bet 50especial a partir do governobet 50Dilma Rousseff, presidente que acabou derrubada por um processobet 50impeachment.

Já no governo Bolsonaro, o Parlamento passou a gerenciar dezenasbet 50bilhões do Orçamento federal por meio das emendas do relator-geral, que ficaram conhecidas como Orçamento Secreto. Foi esse arranjo que garantiu uma base forte para Bolsonaro a partirbet 502020, na medidabet 50que o Planalto é que gerenciava o ritmobet 50liberação dessas verbas, negociando assim apoio a suas pautas no Congresso.

Em dezembro, o STF acabou com o Orçamento Secreto, pois considerou inconstitucional a destinação desses recursosbet 50forma pouco transparente por parlamentares.

Com isso, o Congresso redistribuiu os R$ 19,4 bilhões que estavam previstos para essas despesasbet 502023. Metade foi para as emendas individuais, por meio das quais o recurso é distribuídobet 50forma transparente e igualitária entre os congressistas. E a outra metade voltou para gestão dos ministérios. Essa parte deve servir para negociar apoio no Congresso, na medidabet 50que o governo poderá usar a verba dos ministérios para atender pedidos dos parlamentares.

Ou seja, no Orçamento Secreto era o Congresso que decidia sozinho onde os recursos seriam aplicados, enquanto o governo só ditava o ritmobet 50liberação do dinheiro. Nessa outra modalidade, o governo vai ter a palavra final sobre como será gasto o dinheiro.

Para Beatriz Rey, esse mecanismo será importante para Lula formarbet 50base no Congresso. Assim como a nomeaçãobet 50aliados políticos para o comandobet 50ministérios e outros cargos da máquina federal.

O presidente cedeu pastas importantes para siglas da centro-direita, como PSD, União Brasil e MDB.

Alémbet 50o Congresso ter se fortalecido nos últimos anos, outro fator que torna o cenário mais desafiador é a composição do Parlamento. Apesar da derrota para Lula, Bolsonaro conseguiu eleger muitos aliados para o Legislativo. Em especial, o Senado terá uma forte bancadabet 50oposição ao novo governo, com ex-integrantes da gestão Bolsonaro, como Damares Alves (Republicanos/DF), Hamilton Mourão (Republicanos/RS), Sergio Moro (União Brasil/PR) e Marcos Pontes (PL-SP).

"Realmente (a relação com o Congresso) é um dos maiores desafios, se não for o maior desafio que o governo Lula vai ter. Isso porque a gente sai do governo Bolsonaro com o Congresso mais fortalecido, mas também porque a composição ideológica desse Congresso pende para a direita, e este governo pende para a esquerda", observa Rey.

Pedro Abramovay, que nos primeiros governosbet 50Lula atuou na liderança do PT no Senado e no Ministério da Justiça, também acredita que a relação com o Congresso será mais difícil agora.

Hoje diretor executivo para América Latina e Caribe da Open Society Foundations, ele nota que o Parlamento eleitobet 502022 é reflexobet 50uma sociedade mais polarizada, o que significará uma oposição mais dura do que Lula enfrentou há vinte anos, quando PSDB e o então PFL lideravam esse campo.

"O Lula foi minoritário no Congresso várias vezes (em seus dois primeiros mandatos). Tinha um pedaçobet 50uma oposição dura que era o PSDB, o PFL, mas mesmo com esses tinha diálogo. A hora que se discutia um projetobet 50leibet 50reforma do Códigobet 50Processo Penal se sentava, se dava os argumentos. Noventa porcento do que era votado, era votadobet 50acordos. Isso pode ser que não tenha mais", comparou Abramovay.

3) Sociedade partida

Assim como o Congresso mais polarizado, Lula terá que lidar com uma sociedade profundamente divida e com segmentos radicalizados.

A eleiçãobet 502022 viu algo inédito: uma parte dos eleitoresbet 50Bolsonaro que não aceitou a derrota bloqueou rodovias e acampoubet 50frente a quartéis pedindo um golpe militar. Houve até episódios gravesbet 50vandalismobet 50Brasília, alémbet 50ameaçasbet 50bomba dias antes da posse.

O novo ministro da Justiça, Flavio Dino, já deu declarações prometendo ações durasbet 50repressão contra os envolvidos no que ele chamoubet 50"terrorismo político". Além disso, já anunciou como prioridade reverter medidas do governo Bolsonaro que facilitaram o acesso a armas.

Crédito, Reuters

Legenda da foto, Ônibus incendiadobet 50Brasília no dia da diplomaçãobet 50Lula como presidente eleito

Além da repressão a grupos violentos, estudiosos do bolsonarismo dizem que Lula deveria buscar reduzir a resistência dos segmentos mais conservadores da sociedade ao novo governo.

Para o professor da USP Pablo Ortellado, isso precisa ser feito para enfraquecer forças autoritárias na sociedade, ligadas ao bolsonarismo.

"O bolsonarismo é uma força política com traços muito autoritários e antidemocráticos. O desafio desse governo é desarmar essa bomba que foi armada pelo bolsonarismo. Precisa aproveitar esses quatro anosbet 50respiro que o Bolsonaro vai estar sem a máquina pública, sem dinheiro, sem o controle do Estado, para afastar esse perigo, que a gente viveu nesses quatro anos", defende Ortellado.

Para fazer isso, Ortellado diz que o governo deveria evitar algumas "cascasbet 50banana" que mobilizam muito os bolsonaristas, como a relação histórica do PT com alguns governos autoritários.

Nabet 50visão, seria importante o presidente adotar uma postura mais crítica com governosbet 50Cuba e Venezuela, como tem feito outra liderançabet 50esquerda da região, o presidente do Chile, Gabriel Boric.

Além disso, Ortellado defende que o governo Lula desenvolva políticas públicas com uma abordagem mais técnica, sem uma carga simbólica que dispare reações conservadorasbet 50temas sensíveis, como pautas feministas e LGBT.

Para a cientista política Nara Pavão, também é fundamental para reduzir a forte polarização da sociedade que o governo mantenha o espíritobet 50frente ampla que o elegeu e que marcou a composição inicial do ministério, abrigando diferentes forças políticas, para além da esquerda.

"Ou seja, se descolar da ideia que predomina na direita extremistabet 50que o PT é um partidobet 50extrema esquerda, e que Lula vai implantar o comunismo. Então, o que o governo pode fazer é tentar apaziguar os ânimos dos grupos que estão polarizados, sem obviamente alienar o grupo que o elegeu. Lula tembet 50fato o apoio da esquerda, mas ele vai tentar costurar mais ao centro", analisa Pavão.

4) Tirar as Forças Armadas da política

Outro desafio importante é reduzir a influência das Forças Armadas na política. Os militares ganharam um poder enorme no governo Bolsonaro, como não se via desde a Ditadura Militar, que acaboubet 501985.

O agora ex-presidente, que é capitão reformado do Exército, nomeou militares para comandar ministérios-chave como Casa Civil e Saúde, e para ocupar outros milharesbet 50postos civis na máquina federal.

Também envolveubet 50forma inédita os militares na fiscalização das eleições. E, depois da derrota, nem Bolsonaro nem o comando das Forças Armadas deram declarações rechaçando os movimentos golpistas nas portas dos quartéis.

Para estudiosos do assunto, essas ações enfraqueceram a democracia brasileira. Segundo esses especialistas, os militares, por serem o braço armado do Estado, devem ter um papel neutro na política, cuidando apenas da proteção do país frente a ameaças externas.

Lula escolheu para ministro da Defesa José Múcio, primeiro civil a comandar a pastabet 50cinco anos. Ele pode ser considerado um outsider da Defesa, porque não fez carreira na área. Foi escolhido por dialogar bem com civis e militares, conservadores e progressistas. É um político experiente e, inclusive, foi ministro da Secretariabet 50Relações Institucionaisbet 50Lulabet 50seu segundo mandato.

Estudioso das Forças Armadas, o professor da Universidadebet 50Brasília Juliano Cortinhas considera positiva a voltabet 50um Civil ao comando da Defesa. Segundo ele, a função da pasta não é representar os interesses das Forças Armadas no governo, mas justamente o contrário: impor às Forças Armadas a vontade política do governo eleito na áreabet 50Defesa.

O professor, porém, criticou os nomes escolhidos para comandar as três Forças: Exército, Marinha e Aeronáutica. Lula e Múcio optaram por manter a tradiçãobet 50priorizar os oficiais-generais mais antigos, num gesto visto como um aceno aos militares.

"Claramente as Forças Armadas estão usando esses pedidos (por intervenção militar), usando os acampamento, como uma formabet 50se posicionar no jogo político. E se colocando politicamente desse modo, elas estão ganhando espaço. Tanto que conseguiram a nomeação dos comandantesbet 50Força que queriam. O Lula nomeou os mais antigos, quando, na minha opinião, deveria ter nomeado aqueles mais comprometidos com a volta aos quartéis, com a saída da política", argumenta Cortinhas.

Outros especialistas, porém, avaliam que Lula estábet 50terreno delicado e precisa agir com cautela. Nesse sentido, a escolha por antiguidade dos novos comandantes seria um caminho mais seguro para retomar o diálogo com as Forças Armadas.

- Este texto foi publicadobet 50http://vesser.net/brasil-64128434