'Linhasrealsbet luva de pedreirodesejo': os caminhos inventados por pedestres na cidade feita para carros:realsbet luva de pedreiro
"Essa é uma cidaderealsbet luva de pedreiroque, definitivamente, a pessoa que anda foi esquecida. Ela é monumental, é uma cidade bonita vista do carro, com certeza. Mas para quem anda nela, é uma cidade muito dura - você não tem calçadas, precisa criar seu caminho, precisa muitas vezes lutar por espaço com carros", diz Bresani.
Símbolo da arquitetura modernista, a capital - Patrimônio Cultural da Humanidade, segundo a Unesco - é conhecida por características como vias expressas e poucos semáforos.
Nessas condições, o fotógrafo falarealsbet luva de pedreiro"valentia" dos trabalhadores que cruzam os espaços da capital.
"Alguns lugares até têm uma propostarealsbet luva de pedreirocalçada, mas essa proposta provavelmente é muito mais bonitarealsbet luva de pedreiroser vistarealsbet luva de pedreirocima. É visualmente bonita, mas não é prática", diz. "As pessoas passam no meio, pela grama, porque, óbvio, assim você chega mais rápido à paradarealsbet luva de pedreiroônibus. Então tem uma espécierealsbet luva de pedreirosubversão,realsbet luva de pedreirotransgressão dessa lógica (do planejamento inicial)."
A ideia do projeto fotográfico começourealsbet luva de pedreiro2013, depois que Bresani - que nasceu e cresceu no Plano Piloto - vendeu o carro e "virou pedestre".
"Comecei a ver que existiam essas rotas criadas por pessoas na cidaderealsbet luva de pedreiroBrasília, que quem andarealsbet luva de pedreirocarro não vê ou não presta muita atenção. Mas quem precisa se locomover sem carro precisa usar essas rotas ou criar novas."
Brasilienserealsbet luva de pedreiro39 anos, ele diz que, por trásrealsbet luva de pedreiroseus trabalhos, está a inquietaçãorealsbet luva de pedreiroresponder como existirrealsbet luva de pedreirouma cidade inventada.
Ele, que também é diretorrealsbet luva de pedreiroteatro, interpreta esses caminhos como uma "segunda invenção" na cidade inventada.
As fotos,realsbet luva de pedreiropreto e branco, são feitasrealsbet luva de pedreirouma câmera analógicarealsbet luva de pedreirogrande formato, com chapasrealsbet luva de pedreirofilmes fotográficos que são reveladasrealsbet luva de pedreiroSão Paulo.
Durante o processo, Bresani percebeu diferenças no resultadorealsbet luva de pedreirodiferentes épocas do ano. "Uma linharealsbet luva de pedreirodesejo, no filme preto e branco, sairealsbet luva de pedreirodiferentes formas. Na chuva, a terra fica molhada e sai mais escura, preta. Na seca, reflete mais luz, então sai branca."
O fotógrafo também percebeu que esses caminhos são mais vivos do que parecem.
"Durante a pandemia, eu falei: agora será ótimo para fotografar porque não vai ter ninguém na rua - e eu não queria pegar muita gente na rua. Mas cheguei e: cadê os caminhos? Eles foram sumindo. Como não tinha pessoas andando, a grama ia crescendo e eles iam desaparecendo. Quando as pessoas foram voltando para o trabalho, eles foram sendo reconstruídos."
E se algumas são rotas consolidadas, outras têm vida curta.
"É muito comum um caminho ser reconstruído, outros desaparecerem, porque, por exemplo, abriu uma paradarealsbet luva de pedreiroônibusrealsbet luva de pedreirooutro lugar. É bem orgânico", diz. "Tem uns que são bem consolidados, mas outros duram, sei lá, seis meses, que é o tempo que durou uma construção. Aí, depois que acabou a construção, ele some."
Outra característica que ficou clara nesses anosrealsbet luva de pedreiroque o fotógrafo saiu nas primeiras horas da manhã para fotografar os caminhos -realsbet luva de pedreiroum momento ainda sem muitos pedestres - foi o perfil do público que diariamente desenha esses caminhos.
"São as pessoas que trabalhamrealsbet luva de pedreiroBrasília, não são as que moram no Plano Piloto. Então, essa subversão da lógica modernista é feita por pessoas que moram na periferiarealsbet luva de pedreiroBrasília, trabalhadores e trabalhadoras. Não por moradores do Plano Piloto, que, narealsbet luva de pedreirogrande maioria, usam carros."
O próximo passo do projeto é exatamente fotografar as pessoas que passam por esses caminhos. E Bresani já identificou uma clara predominânciarealsbet luva de pedreirogêneros, dependendo do horário.
"Às 6h30 da manhã você encontra basicamente homens, que estão indo para construção civil. Se vai 7h30, 8h, você encontra mulheres que são cozinheiras, babás, empregadas domésticas."
'Caminhos da necessidade'
A arquiteta e urbanista Thaisa Comelli, formada pela Universidaderealsbet luva de pedreiroBrasília (UnB) e doutorarealsbet luva de pedreirourbanismo pela Universidade Federal do Riorealsbet luva de pedreiroJaneiro (UFRJ), diz que "claramente existe uma divisão socioeconômica com recortes raciais erealsbet luva de pedreirogênero" nesse tema.
"Os 'caminhos do desejo', orgânicos, na realidade são 'caminhos da necessidade' para muitos - populações da periferia sem acesso a veículos automotivos - e, se ermos e pouco dotadosrealsbet luva de pedreiroinfraestrutura, podem ser perigosos para mulheres e outros grupos vulneráveis", diz. "Infelizmente há pouca discussão ainda sobre como as pessoas experimentam a cidaderealsbet luva de pedreiroformas diferentes. Esses temas às vezes entram como pautas supérfluas, estéticas ou cotidianas, quando na verdade são janelas para questões mais sérias."
Comelli também destaca a faltarealsbet luva de pedreiroacessibilidade. "Temos muitos avanços na legislação arquitetônica, mas na escala da cidade isso é menos pensado e reforçado. Brasília é um caso especialmente difícil. Imagine o trajetorealsbet luva de pedreirouma pessoa cadeirante que quer se deslocar da W3 para a L2? É uma jornadarealsbet luva de pedreiroobstáculos…", diz,realsbet luva de pedreiroreferência a duas das principais viasrealsbet luva de pedreiroBrasília.
Na prática, o que fazrealsbet luva de pedreiroBrasília uma cidade "por vezes pouco sensível aos pedestres", nas palavras da urbanista?
Comelli cita três características, que refletem paradigmas do urbanismo modernista:
- A escala da cidade, "que cria grandes distâncias entre pontosrealsbet luva de pedreirointeresse"
- O rodoviarismo, "infraestrutura focada nas necessidadesrealsbet luva de pedreiroveículos motorizados, nãorealsbet luva de pedreiropessoas"
- A rigidez no desenho urbano, "que faz com que alguns desses problemas não sejam facilmente solucionados por meiorealsbet luva de pedreirointervenções urbanísticas"
Antesrealsbet luva de pedreirofalarrealsbet luva de pedreirosoluções, Comelli destaca que "dentrorealsbet luva de pedreiroBrasília existem muitas Brasílias" e "cada 'pedaço' da cidade vai requer uma solução diferente".
"A questão do tombamento gera restrições na escala da cidade, justamente porque o caráter rodoviário é protegido. Intervenções simples e baratas, como colocar um semáforo no Eixão, melhorariam muito a vida dos pedestres, mas são impopulares e consideradas 'agressoras' do desenhorealsbet luva de pedreiroBrasília", diz.
Comelli considera, ainda, que "falta vontade política para enfrentar o problema" e menciona que já houve concursosrealsbet luva de pedreiroprojeto para melhorar as passagens subterrâneas, por exemplo, mas diz que não houve avanço na implementação.
"Considerando esses impasses, o que resta para o brasiliense é apostar nas intervenções na escalarealsbet luva de pedreirobairro - ou da quadra -, que podem melhorar um pouco a vida, mas que não solucionam questões estruturais da cidade", diz. "Sombrear melhor as passagens já existentes - orgânicas - ou investirrealsbet luva de pedreiropequenas intervenções comerciais ourealsbet luva de pedreiroiluminação e mobiliário que deixem os caminhos mais vivos, alegres e seguros também ajuda. Mas o problema da mobilidade a longo prazo não se resolverá com esses pequenos gestos."
Professor da Faculdaderealsbet luva de pedreiroArquitetura e Urbanismo da UnB, Frederico Flósculo diz que, na questão da mobilidade associada com acessibilidade, "Brasília é uma das piores cidades do Brasil". "As pessoas são muito mal tratadas", diz.
"Se somos patrimônio cultural da humanidade modernista, é nesta cidade que os melhores experimentosrealsbet luva de pedreiropromoçãorealsbet luva de pedreiroqualidaderealsbet luva de pedreirovida deveriam ser feitos. E, paradoxalmente, é nesta cidade que os melhores experimentosrealsbet luva de pedreiroqualidaderealsbet luva de pedreirovida não são feitos", afirma o professor.
Para Flósculo, o equilíbrio entre automóveis e pedestres esteve presente no projeto do urbanista Lúcio Costa para o Plano Piloto, especialmente no sistemarealsbet luva de pedreirocirculação nas superquadras, que foram concebidas "de modo sinuoso, para dificultar a velocidade do automóvel e facilitar a circulação do pedestre por toda a periferia das quadras".
O professor atribui algumas das dificuldades sentidas até hoje ao momentorealsbet luva de pedreiroexecução do projeto. "Do sonhorealsbet luva de pedreiroLúcio Costa à realidade da construçãorealsbet luva de pedreiroBrasília, houve uma série enormerealsbet luva de pedreiroajustamentos feitos por Israel Pinheiro - engenheiro, responsável pela execução da cidade, presidente da Novacap (empresa do Governo do Distrito Federal)".
"Israel Pinheiro economizou muito no capítulo pedestres", diz ele, acrescentando que os caminhos alternativos criados por pedestres são vistos há décadas.
O grande problema, diz Flósculo, é que problemas antigos não tenham sido resolvidos maisrealsbet luva de pedreiroseis décadas depois. Historicamente, diz ele, "o governo é consistentemente insensível às necessidades da comunidade".
"A gente compreende que Lúcio Costa tinha uma tarefa muito pragmática,realsbet luva de pedreiroexecução muito rápida. Mas isso aconteceu naqueles mil diasrealsbet luva de pedreiroexecuçãorealsbet luva de pedreiroBrasília. Só que Brasília está para completar 63 anosrealsbet luva de pedreiroidade - e essa delicadeza já dava temporealsbet luva de pedreiroter sido encarada e o governo não faz isso. Continuamos num modelorealsbet luva de pedreiroabordagem grosseira, que se revela nos caminhos dos pedestres naquela cidade que deveria ser desenhada para os idosos, crianças, cadeirantes, pessoas com limitações."
"O movimento modernista não considerava as fragilidades do cotidiano e a gente ainda não aprendeu isso", diz.
O que diz o Governo do Distrito Federal
A BBC News Brasil procurou o Governo do Distrito Federal (GDF) para responder às críticas sobre faltarealsbet luva de pedreiroacessibilidaderealsbet luva de pedreiroBrasília erealsbet luva de pedreirouma política voltada para as necessidades dos pedestres.
A assessoriarealsbet luva de pedreiroimprensa da Secretariarealsbet luva de pedreiroDesenvolvimento Urbano e Habitação respondeu que, "em aproximadamente quatro anos, foram feitos cercarealsbet luva de pedreiro530 kmrealsbet luva de pedreiropasseios, atendendo a pedestres das 33 regiões administrativas".
Disse, ainda, que o projeto Rotas Acessíveis "tem mapeadas várias intervenções para melhorias pela capital" e que atualmente dois locais estão sendo atendidos - o Instituto Federalrealsbet luva de pedreiroBrasília (IFB)realsbet luva de pedreiroSão Sebastião e o entorno do Hospital Regional do Guará.
O projeto, segundo a assessoria, seleciona um ponto e, a partir dele, "desenvolve o projeto da rota tomando como base os pontosrealsbet luva de pedreiroônibus mais próximos, estabelecendo trajetos contínuos, sinalizados e livresrealsbet luva de pedreiroobstáculos".
A Secretariarealsbet luva de pedreiroTransporte e Mobilidade do Distrito Federal disse que estárealsbet luva de pedreiroandamento o Planorealsbet luva de pedreiroMobilidade Ativa (PMA), que "tem como foco melhorar as infraestruturasrealsbet luva de pedreiromobilidade para a população, incentivar a migração dos usuários dos modos motorizados para os modos ativosrealsbet luva de pedreirodeslocamento e requalificar o espaço público para torná-los mais acessíveis e com deslocamentos mais seguro para os pedestres, ciclistas, idosos, cadeirantes e pessoas com deficiência".
Segundo o órgão, foram executados projetos na W3, no Setor Hospitalar Sul, Setorrealsbet luva de pedreiroRádio e TV Sul, na Praça do Povo, entre outros.