Amazônia é chave para Lula retomar soft power do Brasil, diz criador do conceito:denise 365

Bolsonaro no G-20denise 3652021

Crédito, Reuters

Legenda da foto, Bolsonaro costumava ter poucas trocas com colegas do G-20 e esse ano sequer foi à reunião
Lula e Alckmin com camisas do Brasil

Crédito, Cláudio Kbene

Legenda da foto, Lula e Alckmin com camisas da seleção do Brasil, um símbolodenise 365soft power usadas ao longo dos últimos anos como uniforme por bolsonaristas

Ex-conselheiro para assuntosdenise 365segurança no governo Bill Clinton e respeitado também por republicanos, Nye compara a deterioração da imagem do Brasil no exterior sob Bolsonaro com o que aconteceu com os EUA durante a gestão do republicano Donald Trump. Para ele, a invasão ao Capitólio, por exemplo, foi um duro golpe no soft power americano.

Nye diz que apesardenise 365Trump e Bolsonaro terem se dado bem pessoalmente, isso não se traduziudenise 365relações proveitosas para os dois países. "Espero que (Joe) Biden e Lula sejam capazesdenise 365reaquecer essa relação", diz.

O atual presidente americano enviou seu conselheirodenise 365segurança, Jake Sullivan, para se reunir com Lula e o senador petista Jaques Wagner nesta segunda, 5/12.

Na reunião, Sullivan deve fazer um convite direto ao presidente eleito para que vá a Washington ainda antes da posse,denise 3651ºdenise 365janeiro, se encontrar com Biden. "Sullivan discutirá como os EUA e o Brasil podem continuar a trabalhar juntos para enfrentar desafios comuns, incluindo mudanças climáticas, segurança alimentar, a promoção da inclusão e da democracia e a gestão da migração regional", afirmoudenise 365nota a Casa Branca.

Lula demonstrou disposiçãodenise 365embarcar para os EUA pouco depoisdenise 365sua diplomação pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), marcada para o próximo dia 12/12.

"Temos muita coisa para conversar, os EUA padecemdenise 365uma necessidade democrática tanto quanto o Brasil. O estrago que o Trump fez na democracia americana é o mesmo estrago que o Bolsonaro fez no Brasil. O pensamento do Trump, o comportamento dele, é o mesmo do nosso presidente aqui. Então penso que vamos conversar política, quero conversar relação Brasil-Estados Unidos, quero conversar o papel do Brasil na nova geopolítica mundial, quero falar com ele da guerra da Ucrânia, que não há necessidadedenise 365ter guerra, além dos assuntos que obviamente ele quiser conversar comigo", disse Lula, na última sexta, 2/12.

Entre as pautas que Lula deve defender está a reforma do Conselhodenise 365Segurança da ONU, que também conta com apoio explícitodenise 365Biden. Para Nye, no entanto, o pleitodenise 365ambos não é "realista" porque membros com poderdenise 365veto devem barrar a iniciativa.

O especialista questiona ainda a intençãodenise 365Luladenise 365fortalecer o BRICS, bloco que reúne Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. "(O BRICS) É uma conveniência diplomática, mas não será um motor da política mundial", opina. Para Nye, o foco do Brasil deveria ser a América Latina. "Um agrupamento na região seria muito mais natural para o Brasil liderar".

Leia a seguir os principais trechos da entrevista com Joseph Nye, concedida à BBC News Brasil por ligação telefônica.

denise 365 BBC News Brasil - Em 2014, após visitar o Brasil, o senhor disse que via o país com "problemas no curto prazo, mas otimismo no longo prazo". De lá pra cá, o Brasil viveu crises graves político e econômicas e mudou drasticamentedenise 365política externa. O então chanceler Ernesto Araújo chegou a dizer que "se isso nos fizer um pária, então que sejamos párias". Como o senhor avalia o que aconteceu com o país no cenário internacional nos últimos anos?

denise 365 Joseph Nye - Economicamente, o Brasil sofreu com a desaceleração (no mercado internacional) das commodities, então havia uma base econômica dos problemas. Mas acho que a eleiçãodenise 365Bolsonaro e a virada para a extrema direita também agravaram os problemas. É uma combinaçãodenise 365causas econômicas e políticas, mas acho que as causas políticas provavelmente foram mais importantes, a longo prazo. E agora parece que (os brasileiros) mudaram um pouco o rumo com as eleições recentes.

denise 365 BBC News Brasil - O senhor concorda com a ideiadenise 365que o Brasil quase se tornou um pária nos últimos anos?

denise 365 Nye - Pária é um termo muito forte, uma palavra que você associaria a um país como a Rússia, que invadiu seus vizinhos, ou como a Venezuela, que prendeu muitosdenise 365seus cidadãos e forçou outros tantos ao exílio. Então, eu não acho o Brasil um pária nesse sentido. O Brasil era visto até um dado momento como uma liderançadenise 365vários assuntos na política mundial. E isso foi perdido.

denise 365 BBC News Brasil - denise 365 O senhor j denise 365 á disse que com Trump os EUA perderam soft power. Vê comparação com o Brasildenise 365Bolsonaro denise 365 ?

denise 365 Nye - Os países podem perder o soft power, mas também podem recuperá-lo. Por exemplo, na décadadenise 3651960, os EUA perderam muitodenise 365seu soft power quando se envolveram na Guerra do Vietnã. As pessoas protestavam contra as políticas americanasdenise 365todo o mundo. Mas depoisdenise 365uma década, os americanos voltaram a ser bastante populares e atrair outros países.

Eu diria que os Estados Unidos perderam muito soft power sob Trump por causadenise 365sua abordagem agressivadenise 365America First ("EUA primeiro", um dos slogans do republicano e nortedenise 365sua gestão). E acho que o Brasil perdeu muitodenise 365seu soft power sob Bolsonaro. Mas os exemplos que mencionei sugerem que não há razão para o Brasil não conseguir recuperar seu soft power.

Lula discursando

Crédito, Reuters

Legenda da foto, Lula era uma das presenças mais aguardadas na COP27, no Egito

denise 365 BBC News Brasil - E como Lula deveria fazer para recuperar o soft power denise 365 brasileiro denise 365 ?

denise 365 Nye - Acho que a mudançadenise 365posição do Brasil sobre a Amazônia, anunciada por Lula (na COP), é uma grande fontedenise 365soft power. A questão das mudanças climáticas tem se tornado cada vez mais importante, não só porque a ciência nos diz isso, mas também porque as gerações mais novas estão mais preocupadas com o assunto.

Uma das razões pelas quais os EUA perderam soft power sob Trump foi a retirada do país do Acordo Climáticodenise 365Paris. E acho que essa mesma agenda é uma das razões pelas quais o Brasil perdeu soft power sob Bolsonaro. Portanto, quando Biden disse que íamos voltar ao Acordo Climáticodenise 365Paris, isso foi muito bom para o soft power americano. Quando Lula diz que o Brasil vai levar a Amazônia a sério, acho que é algo com potencial para restaurar o soft power brasileiro.

denise 365 BBC News Brasil - Os EUA vêm perdendo denise 365 liderança e denise 365 relevância para América Latina denise 365 . denise 365 Trump praticamente abandonou a região. E o governo Biden até agora não conseguiu um aliado forte o suficiente na denise 365 área denise 365 . Ao mesmo tempo, estamos vendo a China avançando profundamente n denise 365 os países latinos denise 365 . Acha que essa é uma tendência cada vez mais irreversível?

denise 365 Nye - Se olharmos as pesquisas internacionais, quando as pessoas são questionadas sobre quais países acham atrativos, o único continentedenise 365que a China e os EUA estão empatados é a África. Na Ásia e na Europa, os EUA saem bem à frente. Na América Latina está um pouco mais perto, mas os EUA ainda estão à frente da China. Portanto, acho que a melhor coisa que os EUA podem fazer é não entrardenise 365pânico com a China, mas se comportar bem.

denise 365 BBC News Brasil - Biden está enviando Jake Sullivan ao Brasil para convidar Lula para uma reuniãodenise 365Washington, D.C., mostrando, novamente, deferência pelo recém-eleito presidente brasileiro. Nadenise 365visão, Lula pode ser uma ponte para os EUA tentarem reconstruir suas relações na região?

denise 365 Nye - O Brasil é o maior país da América Latina. E ter boas relações com o Brasil é muito importante. Trump e o Bolsonaro se deram bem, mas essa relação não foi representativa para seus Estados. Então, se Lula e Biden puderem reaquecer o relacionamento, acho que será bom para os dois países.

Bandeiras dos países dos BRICS

Crédito, MARCELO CAMARGO/AGÊNCIA BRASIL

Legenda da foto, Bandeiras dos países do BRICS, vistos por Nye como uma "conveniência diplomática", mas não um motor da política internacional

denise 365 BBC News Brasil - Quando Lula foi presidente, denise 365 nos anos 2000 denise 365 , ele investiu bastante na formação do bloco BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), até para ser um contraponto global aos EUA. Lula agora faladenise 365fortalecer os BRICS outra vez. O bloco faz sentido e o Brasil tem a ganhar com ele?

denise 365 Nye - Os BRICS são um dispositivo diplomático, mas sejamos realistas: a Índia e a China são os principais membros do BRICSdenise 365termosdenise 365população. E os indianos e chineses tiveram mortes na fronteira que compartilham. Há uma enorme desconfiança sobre a China dentro da Índia. Portanto, chamar issodenise 365uma organização ou aliança internacional bem-sucedida é um erro. É uma conveniência diplomática, mas não será um motor e agitador eficaz da política mundial por causa das profundas divisões entre os membros.

denise 365 BBC News Brasil - Mas pode funcionar como um meiodenise 365o Brasil projetar poder internacionalmente?

denise 365 Nye - Os países do BRICS têm falado sobre a possibilidadedenise 365expansão, com novas adesões ao grupo, o que poderia dar ao Brasil um pouco maisdenise 365espaço para jogar dentro do BRICS. Mas ainda assim não acho que o BRICS seja o instrumento mais importante para o Brasil, especialmente se o Brasil for capazdenise 365trabalhar dentro da América Latina e assumir um papeldenise 365liderança, um agrupamento na região seria muito mais natural para o Brasil liderar.

denise 365 BBC News Brasil - O presidente Biden tem dito que apoia uma reforma do Conselhodenise 365Segurança da ONU, um pleito histórico da diplomacia brasileira que o Lula chegou a citar durante seu discurso na COP esse ano. É factível essa reforma?

denise 365 Nye - Acho que se formos realistas, será impossível mudar o Conselhodenise 365Segurança porque alguns dos membros permanentes vetariam. E se você voltar ao períododenise 365que Kofi Annan era secretário-geral (da ONU), ele tentou negociar um planodenise 365expansão do Conselhodenise 365Segurança e falhou. Acho que nada mudou muitodenise 365termosdenise 365expansão do Conselhodenise 365Segurança.

denise 365 BBC News Brasil - Então porque Biden está dizendo que defende isso?

denise 365 Nye - Os americanos que estão dispostos a aceitar a expansão há 20 anos, e acho que essa tem sido uma posição americana consistente.

denise 365 BBC News Brasil - Muitos analistas veem um declínio do poder internacional americano e dizem que esse tipodenise 365proposta poderia ser um meiodenise 365atrair aliados e reforçardenise 365própria posição. Como vê a posição atual dos EUA, especialmente diante do histórico doméstico tenso, com episódios como a invasão do capitóliodenise 3656denise 365janeiro?

denise 365 Nye - Os EUA sempre dependeramdenise 365alianças paradenise 365liderança. Existe um mitodenise 365que os EUA eram o país que poderia exercer força militar a pontodenise 365controlar o mundo. Isso simplesmente não é nem nunca foi verdade. O fatodenise 365os americanos terem uma aliança estreita com os países da OTAN e na Ásia, com o Japão e a Coréia do Sul e a Austrália foi crucial para o poderio americano. E se você observar no mundodenise 365hoje, a OTAN está mais forte do que nunca. E também a aliança EUA-Japão. As outras alianças com a Ásia igualmente. Portanto, não acho que haja uma mudança no poder dos EUAdenise 365termosdenise 365alianças.

Quanto ao 6denise 365janeiro, ele manchou o soft power americano. Os EUA obtêm muita atração e soft power por serem uma democracia eficaz. E a ideiadenise 365que um grupo radical invadiu o Capitólio, com as bênçãos do presidente derrotado, fez com que as pessoas se perguntassem se a democracia americana era realmente firme. E acho que os americanos ficaram menos poderosos depois disso. Mas acho que o mais importante das eleições americanasdenise 3652022, as eleiçõesdenise 365meiodenise 365mandato, foi que as pessoas que assumiram a defesadenise 365Trump e das posições mais extremas (sobre Biden não ser um presidente legítimo) foram derrotadas. E acho que isso teve um efeito restaurador.

denise 365 BBC News Brasil - Biden chegou ao poder prometendo reafirmar os EUA na arena mundial. Mas então Biden retirou as tropas, as tropas americanas do Afeganistão. E isso teve um grande impacto na imagem pública dos EUA, pela forma como foi conduzido naquele momento. Como você vê essa decisão?

denise 365 Nye - Acho que Biden estava certo ao retirar todas as tropas americanas do Afeganistão. Ele estava errado na maneira como a fez isso. Foi a decisão correta, executadadenise 365maneira incompetente.

denise 365 BBC News Brasil - As condições internacionaisdenise 3652022 têm feito muitas pessoas apelarem para termos como "Segunda Guerra Fria", para descrever a relação entre China e EUA, e "Terceira Guerra Mundial",denise 365referência à Guerra da Rússia contra a Ucrânia, que conta com o apoio da OTAN. Quão bem esses termos se aplicam à realidade atual?

denise 365 Nye - As coisas definitivamente pioraram nos últimos anos, tanto nas relações com a China quanto com a Rússia. Acho que é um erro chamar issodenise 365Segunda Guerra Fria porque se há conflito, ao mesmo tempo há muito mais interdependência. Por exemplo, ainda há muito comércio entre os EUA e a China. E se você olhar para questões ecológicas como o clima, há um grau muito fortedenise 365interdependência. E nada disso existia durante a verdadeira Guerra Fria. Os EUA não tinham comércio com a Rússia e não havia muita preocupação com o clima. Então é um mundo diferente. E acho que chamá-lodenise 365Guerra Fria dois é um erro. Sobre a Ucrânia, a posição americana édenise 365apoiar a Ucrânia contra a agressão russa mas sem que isso leve a uma Terceira Guerra Mundial.

- Este texto foi publicadodenise 365http://vesser.net/brasil-63843940