A luta das mães solo para criar os filhos e construir o próprio bairrodowntown slotSão Paulo:downtown slot

Crédito, Leandro Machado

Legenda da foto, Suzanedowntown slotOliveira cria cinco filhos sozinha

Nos moradias divididas por lotes, vivem cerca 2.500 crianças. Segundo Letícia, a maioria é criada por mães solo, sem ajuda financeira ou participação dos pais. "Os homens desaparecem, fogem, largam os filhos", diz.

"Tem mulher com cinco, seis filhos. A maioria está desempregada. Muita gente não tem o que comer, não tem dinheiro nem para colocar no Bilhete Único. A gente ajuda como pode, mas nem sempre consegue", explica Letícia, sentadadowntown slotfrente à lanchonetedowntown slotuma ruadowntown slotterra na entrada da ocupação.

Na Anchieta, alémdowntown slotcuidar dos filhos edowntown slottodas as outras tarefas diárias, algumas mulheres como a líder comunitária também estão construindo suas próprias casas — trabalham como pedreirasdowntown slotum mutirão que está urbanizando a comunidade.

Na semana retrasada, Letícia percorreu a ocupação ao lado da reportagem. Recebeu carteiros e recenseadores do IBGE, verificou material para construção que acabaradowntown slotchegar, alémdowntown slotorientar os homens e mulheres que estavam trabalhando nas obras.

"Aqui, a gente faz urbanização no braço, abre ruas, constrói casas. Não tem prefeito, não tem ninguém, é a gente mesmo", diz Letícia, mostrando um mapa com o desenho do pequeno bairro que está surgindo no terreno.

Nas ruasdowntown slotterra da Anchieta, a grande maioria dos barracos édowntown slotmadeira, com fossas sépticas e ligações irregularesdowntown slotágua e energia elétrica. Fios e canos atravessam as pequenas vielas. "Aqui é uma uma áreadowntown slotrisco por causa dos incêndios. Tomamos muito cuidado com as ligações, mas sempre existe o risco", diz Letícia.

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Legenda da foto, A comerciante e locutora Letícia Souza é uma das líderes da ocupação Anchieta, na zona suldowntown slotSão Paulo

'Um futuro melhor'

As casasdowntown slotalvenaria estão surgindo nos lotes são resultadodowntown slotdoações edowntown slotuma parceria do movimentodowntown slotmoradores com a Universidadedowntown slotMichigan, nos Estados Unidos, e com a ONG Peabiru, que assessora a comunidadedowntown slotquestõesdowntown sloturbanismo e regularização fundiária.

Priscila Santos, 30, é uma das pedreiras que estão erguendo 42 casas no terreno — as mulheres trabalhamdowntown slotesquemadowntown slotduplas com homens mais experiente no serviço.

A jovem ergueu a própria casa, que ainda estádowntown slotfasedowntown slotacabamento enquanto ela e a filha mais nova vivemdowntown slotum barracodowntown slotmadeira. Ela pena para conseguir dinheiro.

Priscila também é uma mãe solo. A filha tem três anos — e os dois mais velhos moram com os avósdowntown slotoutro bairro

"Deixei com meus pais porque não tinha condiçõesdowntown slotcuidar e ficar com eles. Estava sozinha", diz Priscila.

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Legenda da foto, Priscila Santos está construindo a própria casa na ocupação

O paidowntown slotumdowntown slotseus filhos foi assassinadodowntown slot2013. Outro ex-companheiro, pai da menina, desapareceu quando Priscila estava grávidadowntown slotdois meses.

"Ele disse que precisava sair para resolver um negócio, e nunca mais apareceu. Eu procurei, fui na delegacia, mas ninguém sabia o que aconteceu. Desistidowntown slotprocurar, porque eu tinha um bebê na barriga, tinhadowntown slotme virar", diz.

Desempregada, recebe o Auxílio Brasil, mas os R$ 600 do benefício só ajudam mesmo na alimentação, diz. O restantedowntown slotsua renda vem do trabalho como pedreira na ocupação — ganha R$ 180 por semana.

"Eu faço massa, abro buraco, amarro ferragens, mexo no concreto. Fui aprendendo com os pedreiros e hoje faço tudo", diz Priscila, usando mexendo na terra com uma pá.

Sua futura casa terá quarto, cozinha e banheirodowntown slotpouco maisdowntown slot30 metros quadrados. Além do acabamento, um problema a resolver é o que fazer com o esgoto que corre ao lado. Para terminar a obra, ela dependedowntown slotdoações.

Priscila diz que a experiência nas obras na ocupação fez crescerdowntown slotvontadedowntown slotvoltar aos estudos para tentar cursar uma faculdade.

"Não fiz ensino médio, mas agora quero voltar. Estou gostando muitodowntown slotarquitetura,downtown slotmexerdowntown slotobra, gosto muitodowntown slotmatemática. Mas também pensodowntown slotgastronomia, não sei. Preciso me movimentar, dar uma vida melhor pra minha filha, um futuro pra ela. Sonhar não custa nada", diz.

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Legenda da foto, Priscila Santos é uma das mulheres da ocupação que trabalham como pedreiras na construçãodowntown slotmoradias

'Eu e Deus'

Em outro ponto, mora Suzanedowntown slotOliveira, 33, mãedowntown slotcinco crianças —downtown slotcinco meses a 14 anosdowntown slotidade. A família vivedowntown slotum pequeno barracodowntown slotmadeira com apenas uma cama — quatro crianças dormemdowntown slotcolchões no chão.

Quando chove forte, a água escorredowntown slotum barranco e alaga a moradia. "A força da água já abriu até um buracos no cimento", diz Suzane, apontando para alguns deles espalhados pela casa.

Recifense, Suzane chegoudowntown slotSão Paulodowntown slot2019, depoisdowntown slotse separar do primeiro marido. Trouxe com ela quatro filhos e a esperançadowntown slotuma vida melhor, mas nunca conseguiu emprego e acabou engravidando novamente.

Os dois pais das crianças ajudam muito pouco financeiramente, e não participam do cotidiano dos filhos.

Suzane recebe R$ 600 do Auxílio Brasil, mas o valor não dá contadowntown slotalimentar a família com seis pessoas - falta carne e falta gásdowntown slotcozinha. A família dependedowntown slotdoações.

As crianças comem principalmente na escola, mas o bebê mais novo ainda aguarda uma vagadowntown slotalguma creche pública do Grajaú.

"Aquidowntown slotcasa não tem nada. É arroz e feijão. Só tem carne e ovo quando sobra dinheiro ou alguém doa. Mas não é todo dia", diz, mostrando a geladeira e os armários praticamente vazios.

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Legenda da foto, Suzanedowntown slotOliveira mora com os cinco filhosdowntown slotum pequeno barraco na zona suldowntown slotSão Paulo

Para conseguir dinheiro, Suzane faz pirulitos e tenta vendê-losdowntown slotshoppings centers da zona sul paulistana enquanto os filhos mais velhos estão na escola. "Estou comendo o pão que o diabo amassou. Sou só eu e Deus", diz.

O casodowntown slotSuzane não é incomum na ocupação Anchieta. Todas as mulheres com quem a reportagem conversou recebem o Auxílio Brasil, mas ainda assim elas estavamdowntown slotestadodowntown slotvulnerabilidade social — algumasdowntown slotsituaçãodowntown slotinsegurança alimentar.

O programa do governo federal paga R$ 600 por beneficiário, independente da situação familiar. No antigo Bolsa Família, por exemplo, o númerodowntown slotfilhos determinava qual era o valor que a família receberia.

O presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) prometeu retomar o modelo e renomear o programa novamente como Bolsa Família, que dará R$ 600 fixos e mais R$ 150 por filhodowntown slotaté seis anosdowntown slotidade.

Para o economista Naercio Menezes Filho, professor da cátedra Ruth Cardoso do Insper, embora o Auxílio Brasil tenha o méritodowntown slotter aumentado o valor do benefício, o "programa foi mal desenhado porque não levadowntown slotconsideração a situação das famílias nem o local onde elas estão inseridas."

"O custodowntown slotvidadowntown slotSão Paulo é muito maior do que no interior do Piauí, mas o valor é o mesmo nos dois lugares. No Bolsa Família, havia regras como um benefício maior a depender da situaçãodowntown slotvulnerabilidade", explica.

"Hoje, um homem sozinho,downtown slot25 anos e que esteja na linha da pobreza, recebe a mesma coisa que uma mãe solo com cinco criançasdowntown slotuma ocupação", diz.

Para o pesquisador, programasdowntown slottransferênciadowntown slotrenda não são os únicos responsáveis por quebrar o ciclodowntown slotpobreza. Segundo ele, o acesso a serviçosdowntown slotqualidade, como educação, saúde e moradia, é necessário para enfrentar esse problema que afeta milhõesdowntown slotbrasileiros.

"É muito difícil sair da extrema pobreza sem programasdowntown slotacesso aos serviços públicos. Sem alimentação correta, por exemplo, a criança não desenvolve seu potencialdowntown slothabilidades cognitivas e sociais. Ela acaba repetindodowntown slotano, depois sai da escola e, quando adulta, cai na informalidade. Então esse ciclodowntown slotpobreza se repete", diz.

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Legenda da foto, A geladeira da famíliadowntown slotSuzane estava praticamente vazia quando a reportagem visitou a casa

Do início do ano até 31downtown slotoutubro, 140.032 crianças foram registradas nos cartórios sem o nome do pai - 6,5% dos 2,1 milhõesdowntown slotbebês nascidos no período. Os dados são do Portal da Transparência do Registro Civil, da Associação Nacional dos Registradoresdowntown slotPessoas Naturais (Arpen-Brasil)

A taxa anual tem se mantido no patamardowntown slot160 mil crianças registradas sem o nome do pai.

Hiperperiferias

A ocupação Anchieta, nascida no Grajaúdowntown slot2013, estádowntown slotum terreno particular. Hoje, ela tem 1.200 famílias, mas chegou a ser bem maior, segundo a líder comunitária Letícia Souza.

Uma parte dos moradores foi removida para a construçãodowntown slotuma escola municipal, inauguradadowntown slot2020. Uma das reclamações dos moradores é que o colégio não recebe muitas crianças do assentamento, que precisam estudardowntown slotlocais mais distantes.

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Legenda da foto, A ocupação Anchieta abriga cercadowntown slot1.200 famíliasdowntown slotbarracosdowntown slotmadeira

O assentamento é uma das 516 ocupações irregularesdowntown slotmovimentosdowntown slothabitação monitoradas pela prefeituradowntown slotSão Paulo — entre fevereirodowntown slot2020 e setembro deste ano, o número dessas áreas cresceu 136% na cidade.

A gestão do prefeito Ricardo Nunes (MDB) diz ter realizado dezenasdowntown slotoperações para combater ocupações ilegais, alémdowntown slotcombater o crime organizadodowntown slotloteamentosdowntown slotmananciais junto ao Ministério Público e à Polícia Civil.

Anchieta também pode passar por uma reintegraçãodowntown slotpossedowntown slotbreve, embora uma decisão definitiva sobre o caso esteja parada na Justiça.

Remoções coletivasdowntown slotocupações irregulares foram novamente autorizadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no início deste mês — elas haviam sido proibidas durante a pandemia.

Segundo a campanha Despejo Zero, que reúne organizações e movimentos sociais que atuam contra remoções forçadas, 201 mil famílias estão ameaçadasdowntown slotdespejos coletivos no país — 81 mil delasdowntown slotSão Paulo.

A decisão do STF ocorre no momentodowntown slotque o governo do presidente Jair Bolsonaro (PL) reduziudowntown slot95% as verbas do Casa Verde e Amarela para o próximo ano. Serão apenas R$ 34,1 milhões para o programadowntown slothabitaçãodowntown slot2023.

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Legenda da foto, São Paulo tem maisdowntown slot500 ocupações irregulares, segundo a prefeitura

Nos últimos anos, um dos efeitos do agravamento da crise econômica foi a formaçãodowntown slot"hiperperiferias"downtown slotbairros nos extremosdowntown slotSão Paulo, conforme mostrou reportagem da BBC News Brasildowntown slotoutubro.

Em suma, as hiperperiferias são ocupações recentes, mais distantes e com estrutura mais precária do que os bairros periféricos consolidados.

"Elas retomam esse padrãodowntown slotcasasdowntown slotmadeira, ruadowntown slotterra e sem infraestrutura básica. É como se fosse a periferização da periferia", diz o urbanista Kazuo Nakano, professor do Instituto das Cidades da Universidade Federaldowntown slotSão Paulo.

Em um galpão da ocupação Anchieta, construído por meiodowntown slotdoações e que é usado para reuniões e aulasdowntown slotreforço para as crianças, a comerciante Letícia Souza comentadowntown slotexperiência como mãe e líder comunitária do novo e pequeno bairro no interior do Grajaú:

"Mesmo sendo muito difícil, eu me sinto muito forte."

- Este texto foi publicadodowntown slothttp://vesser.net/brasil-63684766

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