Os crimes que Sara Winter pode ter cometido ao divulgar nomecriança vítimaestupro:

Sara Winter empunhando armas

Crédito, Instagram | Sara Winter

Legenda da foto, Sara Winter já é investigada pela Polícia por suposto envolvimentoesquemadivulgaçãofake news

"É isso o que determinam os Artigos 143 e 247 do ECA, que dizem expressamente que nenhuma pessoa está autorizada a mencionar o nome ou imagemuma criança sem autorização", explica Basso.

O Artigo 143 determina veda a divulgaçãoatos judiciais envolvendo crianças e adolescentes, mesmo que a criança tenha cometido um ato infracional — o que não é o caso, já que a menina é vítimaestupro e o aborto é garantido por leicasos como esse, explica a advogada Ana Paula Freitas, coordenadora adjunta da áreainfância e juventude do IBCCrim (Instituto BrasileiroCiências Criminais).

Criança sentada no chão com as mãos na cabeça

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, O ECA existe para proteger crianças e adolescentesabusos

Isso vale para qualquer pessoa — tanto para funcionáriosórgãos públicos, quanto para cidadãos comuns, jornalistas ou veículosmídia.

Já o Artigo 247 estabelece que quem infringe esse determinação, explica Freitas, pode ser multadoaté 20 salários mínimos.

Maristela Basso, da USP, explica, no entanto, que essa pena pode ser aumentada por um juizcasos concretos, como a divulgação feita por Sara Winter.

Alémtervigor o ECA, o Brasil é signatário da Declaração Universal dos Direitos das Crianças, da ONU, explica Basso, que reitera com mais força que nenhuma criança pode ter seu nome mencionado sem autorização dos pais.

"A declaração determina que o Estado teráaplicarquem é responsável pela divulgação as penas cabíveis. Ou seja, a pena não fica restrita, o juiz tem um poderdiscricionariedade ao examinar o caso concreto", defende a jurista.

'Incitação ao crime'

A promotoraJustiça Celeste Santos, do Ministério PúblicoSP, diz que uma conduta como aSara — que alémdivulgar o nome e o endereço do hospital onde estava a menina, convocou manifestantes para irem até o local tentar impedir a realização do aborto — poderia ainda ser enquadradaoutros crimes, estabelecidos pelo Código Penal.

Sara pode ter cometido, diz Celeste, difamação e calúnia, que são crimes contra a honra e visam a atacar a reputaçãouma pessoa.

Também poderia ser processada criminalmente por incitação ao crime, diz a promotora, porque incita pessoas a interferiratos já autorizados pela Justiça.

"Essa criança vítimaestupro tem o direito ao aborto garantido, porque ela também tem o direito à vida, tanto no aspecto físico quanto psicológico, já que não existe vida sem dignidade", diz a promotora.

"Em que pese que a Constituição assegure a liberdadeexpressão, essa liberdade tem como limitação as questões que envolvem os direitos fundamentais, especialmente as das crianças e adolescentes que tem especial proteção", afirma Celeste Santos.

Foto ilustrativa sobre abuso infantil - menino chora sentado no corredorcasa

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Crianças envolvidasprocessos judiciais têm a identidade protegida pela legislação

"[Sara Giromini] incita as pessoas, com um discursoódio, a irem até o hospital para cometer atos que violam o ECA e negar à menina o tratamento médico", diz Ana Paula Freitas, do IBCCrim, que concorda que o atoSara poderia ser considerado incitação à violência.

Para Celeste Santos, que coordena Avarc, programaatendimento à vítima do MP-SP, atos como oSara,constrangimentoum vítima, têm um fator agravante.

"É um atocensura pública à vítima, que desestimula que outros estupros sejam denunciados — estima-se que só 2% das meninas vítimasestupro denunciem o crime", diz Santos. Ou seja, é algo que,última instância, beneficia criminosos como o que estuprou a menina10 anos.

Já o advogado Guilherme Nostre tem uma visão mais restritarelação à possível cometimentoincitação ao crime — embora concorde que Sara pode ter cometido crimes contra a honra tanto da menina quanto dos médicos que chama"aborteiros".

Para Nostre, a condutaSara não se encaixariaincitação ao crime.

"Por mais abjeta que seja [a atitudeSara], eu não vejo como uma situação claraincitação à violência, porque dar o endereço para convocar as pessoas para um protesto não é crime. Seria se ela tivessefato dito para irem no local e agredirem a menina ou os médicos", defende Nostre.

"Sara constrangeu a criança, submeteu aquela criança a uma situação vexatória, para o que pode caber reparação no no direito civil. Já o Direito Penal tenta coibir condutas graves, reiteradas na sociedade, que causem lesão a bens jurídicos. O caso é uma conduta tão antiética e tão extraordinária, que não existe nem uma previsão específica no Código Penal para isso", defende, dizendo, no entanto, que pode ser configurado crime contra a honra.

Caso o Ministério Público entre com um processo contra Sara por conta a divulgação do nome da menina, é possível que a Justiça reconsidere os benefícios (substituição da prisão cautelar por usotornozeleira eletrônica) que ela já recebeu no contexto da investigação sobre fake news.

"Mesmo que tecnicamente ela não tenha descumprindo nenhuma medida cautelar, é possível que a Justiça leveconsideração o suposto cometimentoum novo crime ao avaliar o benefício", afirma Ana Paula Freitas.

Línea

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