O projeto rodoviário que ameaça uma das áreas mais conservadas da Amazônia:esportebet net tv
"Temos plena compreensão do que essa estrada vai gerar nessa área", comenta. "E os impactos são perturbadores. O carbono emitido por conta do desmatamento e das queimadas [no trajeto e no entorno] tem capacidade para alterar ainda mais o clima global."
Ferrante argumenta que a região é "um dos blocos mais conservadosesportebet net tvfloresta amazônica". E a estrada traria acesso para "desmatadores e madeireiros", "algo muito preocupanteesportebet net tvuma área que hoje é conservada".
Procurados pela reportagem, outros cientistas ligados ao meio ambiente também demonstraram preocupação com a situação.
"Quando você constrói e asfalta, sem planejamento e estudosesportebet net tvimpacto, você permite a proliferaçãoesportebet net tvtodo um ambiente deletério e serviçosesportebet net tvbaixíssimo valor agregado. Construir estrada não é desenvolvimento. Há diversos casos assim no Brasil", diz o pesquisador Tiago Reis, que estuda açõesesportebet net tvcombate ao desmatamento na Universidade Católicaesportebet net tvLouvain, na Bélgica.
"Projetosesportebet net tvinfraestrutura são grandes vetoresesportebet net tvdesmatamento e destruição na Amazônia", completa Reis. "A construçãoesportebet net tvuma rodovia viabiliza que madeireiros ilegais e grileiros cheguem a porções da floresta a que antes eles não chegariam."
O biólogo Filipe França, pesquisador da Universidadeesportebet net tvLancaster, no Reino Unido, e da Rede Amazônia Sustentável, lembra que há diversos estudos anteriores que demonstram os efeitos prejudiciais da construçãoesportebet net tvrodovias para os ecossistemas cortados por elas.
"Se olharmos o histórico da Amazônia, a situação se repete: sempre depois da estrada, chegam os distúrbios", aponta. "A facilitação do acesso aumenta a açãoesportebet net tvmadeireiros, favorece a instalaçãoesportebet net tvpopulação, há a introduçãoesportebet net tvpastagens, mais desmatamento… E tudo isso resultaesportebet net tvperdas para a biodiversidade."
Conforme estudo publicadoesportebet net tv2014 pelo periódico Biological Conservation, 95% do desmatamento da Amazônia ocorre dentroesportebet net tvum raioesportebet net tv5,5 quilômetrosesportebet net tvestradas ouesportebet net tvum raioesportebet net tv1 quilômetroesportebet net tvum rio.
O mesmo artigo também demonstra que no entornoesportebet net tvcada via oficial surge uma malhaesportebet net tvestradinhas não oficiais — o que, evidentemente, aumenta o estrago ambiental.
Estudos ambientais
De acordo com Ferrante, o principal argumento do governo federal para não realizar novos estudosesportebet net tvimpacto é que "como a rodovia já foi pavimentada na décadaesportebet net tv1970", uma nova análise "não seria necessária".
"Só que esses estudos precisam ser refeitos. A via deixouesportebet net tvser trafegável, basicamente ficou fechada e sem manutenção. As dinâmicas populacionais e as perturbações ambientais mudaramesportebet net tvescala nesse período", diz o biólogo. "Hoje a capacidadeesportebet net tvcausar desmatamento na área é muito maior, os processosesportebet net tvdegradação são maiores…"
Havia uma determinação do Ministério Público Federal nesse sentido mas,esportebet net tv24esportebet net tvjunho o Ministério da Infraestrutura e o Departamento Nacionalesportebet net tvInfraestruturaesportebet net tvTransportes (DNIT) publicaram o editalesportebet net tvlicitação para a contratação da empresa a ser encarregada da obra. Na primeira fase, a previsão é asfaltar 52 quilômetros, entre os quilômetros 198 e 250 da rodovia.
Em comunicado divulgado na data pela assessoriaesportebet net tvimprensa, o ministro da Infraestrutura Tarcísio Gomesesportebet net tvFreitas ressaltou que a ação era um compromisso do "governo do presidente Jair Bolsonaro" e que representava "um marco para o desenvolvimento destes dois estados [Amazonas e Rondônia]".
À Agência Brasil, o ministro declarou na ocasião que nutria a expectativaesportebet net tvque as obras começassem o mais rapidamente possível. "Esperamos que a contratação esteja concluída aindaesportebet net tv2020", disse.
No dia 1ºesportebet net tvjulho, o Ministério Público Federal protocolou a impugnação do edital, ressaltando que não havia sido apresentado o estudoesportebet net tvimpacto ambiental e que a interpretação do governo federal era "eivadaesportebet net tvmá-fé" e "não deve ser admitida pelo juízo da execução, sob penaesportebet net tvgrave afronta e desprezo à autoridade das decisões do Tribunal Regional Federal da 1a. Região".
De acordo com outro comunicado à imprensa divulgado no mês passado pelo Ministério da Infraestrutura, as obrasesportebet net tvmanutenção e conservação da pista foram retomadosesportebet net tv3esportebet net tvjulho — indicando uma preparação para a pavimentação.
A nota relatava que houve um pedidoesportebet net tvsuspensãoesportebet net tvtutela provisória feito pela Procuradoria Federal Especializada ao Tribunal Regional Federal, possibilitando o reinício dos trabalhos. "O Ministério Público agiu com baseesportebet net tvrelatório do Ibama, entendendo que o DNIT estava executando obras, e não apenas serviçosesportebet net tvmanutenção/conservação licenciados. O entendimento foi contestado pelo superintendente regional do DNIT", informou o órgão.
A BBC News Brasil pediu esclarecimentos ao Ministério da Infraestrutura. Em nota, o órgão enfatizou que as obras que estão sendo realizados não sãoesportebet net tv"reconstrução", mas simesportebet net tv"manutenção". "Os serviços [em andamento] não contemplam a reconstrução da rodovia, mas apenas da manutenção do revestimento primário da pista, não asfaltado, substituiçãoesportebet net tvbueiros e reformasesportebet net tvpontesesportebet net tvmadeira, garantindo mais segurança aos usuários da BR-319", argumenta a pasta.
"Em relação à reconstrução da BR-319, é importante esclarecer que o que estáesportebet net tvprocesso licitatório pelo DNIT é a contrataçãoesportebet net tvprojeto e obra relativa exclusivamente ao trechoesportebet net tv52 quilômetros denominado Lote C, entre os Km 198 e 250. Tal medida foi tomada após autorização do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), a partiresportebet net tvTermoesportebet net tvAcordo e Compromisso, viabilizando o devido licenciamento ambiental para o segmento", prossegue a nota.
A reportagem solicitou um posicionamento do Ministério do Meio Ambiente, mas não obteve resposta até a publicação da reportagem.
Mudanças na lei
Um fator complicador desse imbróglio está no fatoesportebet net tvque a rodovia original é anterior à legislação ambiental brasileira.
"É importante notar que a rodovia BR-319 se diferenciaesportebet net tvoutros licenciamentos, pois quando ela foi construída, na décadaesportebet net tv70, o governo federal ainda não tinha instituído a Política Nacional do Meio Ambiente,esportebet net tv1981", ressalta,esportebet net tvartigo publicadoesportebet net tvseu informativo do mêsesportebet net tvjulho, o Observatório BR-319, grupo que congrega diversas ONGs ambientais que atuam na região. O mesmo texto lembra que mesma as exigênciasesportebet net tvestudosesportebet net tvimpacto ambiental sãoesportebet net tvresoluçãoesportebet net tv1986.
"É importante lembrar que tais estudos ambientais são obrigatórios por lei", cobra Ferrante. "O governo está passando por cima da legislação brasileira. É arbitrário tentar fazer a estrada dessa forma."
Trechos da BR-319 vêm recebendo obrasesportebet net tvmanutenção desde 2014. A bióloga e ecóloga Adriane Esquivel Muelbert, pesquisadora na Universidadeesportebet net tvBirmingham, no Reino Unido, esteve coletando dados no entorno da BR por seis meses,esportebet net tv2015 e 2016. "Já era possível notar o aumento do tráfegoesportebet net tvcarros e caminhões mesmo com trechos muito ruins", conta ela. "Com a pavimentação, aumentaria o fluxo e, consequentemente, o desmatamento ilegal."
Segundo Ferrante, a região é um reconhecido "poloesportebet net tvexploraçãoesportebet net tvmadeira ilegal" e isso é um dos fatores mais preocupantes. "Está se falandoesportebet net tvlevar acessibilidade para áreas onde a principal atividade econômica é o desmatamento ilegal. Isso vai acelerar a destruição desse bloco [de floresta] e [aumenta] as emissõesesportebet net tvcarbono a partir do desmatamento da Amazônia."
Muelbert relata que, durante seu trabalhoesportebet net tvpesquisa lá há cinco anos, presenciou árvores centenárias sendo extraídasesportebet net tvreserva florestal. "É terra sem lei. Ficamos com medo e decidimos sair porque nos sentimos ameaçados", diz.
O autor da carta publicada pela Science também conta que populações indígenas da região relataram a ele preocupações com a estrada. Eles argumentam que a estrada atrai "invasores" e prejudica suas comunidades. Os locais gostariamesportebet net tvser consultados sobre a viabilidade da obra.
França, que pesquisa besouros na região amazônica, ressalta que rodovias costumam ser problemas para a fauna da região — seja para os grandes animais, seja para os insetos. "O atropelamento é o impacto direto que mais chama a atenção", diz. "Mas existem também os impactos por perdaesportebet net tvhabitat."
Ele explica que a implementaçãoesportebet net tvuma rodovia, alémesportebet net tvretirar a coberturaesportebet net tvvegetação original do trecho, ainda causa a chamada fragmentação, ou seja, um ecossistema único é divididoesportebet net tvvários pedaços.
"Há estudos na Europa que mostram como a presençaesportebet net tvestradas está associada à reduçãoesportebet net tvdiversidade genéticaesportebet net tvbesouros, o que aumenta a chamada endogamia e, consequentemente, o riscoesportebet net tvextinção", conta ele.
O biólogo também lembra que são muitos os efeitos indiretos. "Os produtos químicos que são transportados ou utilizados na construçãoesportebet net tvestradas, levados pela chuva, afetam ecossistemas aquáticos", exemplifica. "Ou seja, a construção da rodovia vai muito além da floresta."
"A nova pavimentação da BR-319 é uma notícia muito triste. Acredito que será uma das principais portasesportebet net tventrada para o desmatamento no que resta da Amazônia brasileira", define Muelbert.
Para a bióloga, a região é "completamente um deserto verde", com potencial para pesquisas científicas e descobertaesportebet net tvmuitas espécies ainda desconhecidas. "Se o desmatamento avançar, vamos perder espécies sem nem mesmo as termos conhecido e estudado", lamenta.
Repercussão
Com a publicação na Science, Ferrante busca chamar a atenção da comunidade internacional para a questão. "Espero que cobrem do Brasil que a legislação seja seguida à risca, já que o país tem demonstrado graves sinaisesportebet net tvnão respeitar as normas ambientais e não estar comprometido com o desmatamento", afirma.
"Que os estudos sejam realizados para evitar um dano ainda maior do que a rodovia pode gerar."
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