Por que Bolsonaro está sendo acusadosite betâniacolocar indígenassite betâniariscosite betâniameio à pandemiasite betâniacovid-19:site betânia

Índia Yanomami

Crédito, Fiona Watson/Survival

Legenda da foto, Ministério da Saúde contabiliza até o momento 9.632 casos confirmadossite betâniacovid-19 entre os indígenas e 198 óbitos, mas números estariam subdimensionados

Segundo o governo, há 750 mil indígenas,site betânia305 etnias, vivendosite betâniamaissite betânia5,8 mil aldeias no Brasil hoje. A preocupação entre lideranças dos povos e organizações que apoiamsite betâniacausa é ainda maior no casosite betâniacomunidades isoladas ousite betâniarecente contato com a sociedade: eles afirmam que uma eventual entrada do coronavírus nesses grupos pode dizimar essas populações, que tem um nívelsite betâniadefesa imunológica mais baixo.

Nas últimas semanas, lideranças indígenas conseguiram vitórias no Supremo Tribunal Federal (STF) e no Congresso Nacional para obrigar o governo a adotar ações emergenciais.

Bolsonaro, porém, vetou na quarta-feira (08/07) trechossite betâniauma nova lei que prevê medidassite betâniaproteção às comunidades indígenas, como a obrigaçãosite betâniagarantir acesso à água potável e a itenssite betâniahigiene, e a oferta emergencialsite betânialeitos hospitalares esite betâniaUnidadesite betâniaTerapia Intensiva (UTI).

O presidente também vetou a elaboraçãosite betâniaplanossite betâniacontingências voltados especificamente para os povos isolados ousite betâniarecente contato com a sociedade.

"O plano do governo é não ter plano algum", crítica Juliana Batista, advogada do Instituto Socioambiental (ISA).

Para exemplificar a importância do planejamento para reagir à pandemia, ela cita a Terra Indígena (TI) Yanomami, a maior do país, uma área que se estende por Roraima e Amazonas, onde vivem 26.780 indígenas.

Xamãs do povo yanomami
Legenda da foto, Avanço do coronavírus pelo interior assusta povos indígenas, que acusam governosite betânianão agir para evitar tragédiassite betâniaaldeias

Além das aldeias, há sete povos isolados dentro desse território, onde a atuaçãosite betâniagarimpeiros tem sido crescente. Hoje estima-se que 20 mil invasores trabalhem na exploração ilegalsite betâniaouro.

"Tem comunidade dentro da TI Yanomani que é preciso andar cinco dias para chegar à aldeia mais perto, onde tem pistasite betâniapouso para tirarsite betâniaavião um infectado dentro da área. São situações extremas, que se não prevenir, não terá como remediar depois", alerta Batista.

O Conselho Distritalsite betâniaSaúde Indígena, órgão do Ministério da Saúde, identificou até quinta-feira (9) 80 casossite betâniacovid-19 dentro da TI Yanomani.

Apenas nas comunidadessite betâniaWaikás, há 37 doentes, o que representa cercasite betâniaum quinto dos 179 indígenas que vivem nessa região da terra indígena.

Segundo o ISA, é uma das áreas mais afetadas pela atividade do garimpo e o contágio começou com um indígena que viajousite betâniaum dos barcos dos garimpeiros.

Na quinta-feira, o vice-presidente Hamilton Mourão contestou que sejam garimpeiros que estejam levando o coronavírus para dentrosite betâniacomunidades: "A questão da chegada da pandemia nas terras indígenas... Não é por que têm elementos estranhos lá dentro que a pandemia chegou. As senhoras e os senhores têm que entender, na realidade amazônica, que o indígena saisite betâniadentro dasite betâniaterra para ir até a cidade, seja para receber algum benefício, da nossa lei orgânicasite betâniaassistência social, seja porque ele tem que comprar alguma coisa", disse, ao ser questionado por jornalistas.

Juliana Batista, do ISA, reconhece que esse também é um problema, mas culpa novamente a faltasite betâniaplanejamento do governo para evitar esse tiposite betâniacontágio.

Vacinaçãosite betâniaindígenas

Crédito, Ministério da Saúde

Legenda da foto, Fila para vacinaçãosite betâniacrianças indígenas no Distrito Sanitário Especial Indígena (DSEI) Tocantins

Ela diz que uma terceira formasite betâniacontaminação também tem ocorrido por meiosite betâniaagentes da saúde que não sabem que estão com covid-19 e vão às comunidades sem serem testados antes.

"Temos casossite betâniaindígenas que desceram (das aldeias para cidades)site betâniamassa para buscar auxílio emergencial. Isso também é faltasite betâniainformação por parte do governo. São todas medidas que exigem planejamento, articulação governamental", diz Batista.

"O governo tomou algumas atitudes. Houve lugares com distribuiçãosite betâniacestas básicas para as comunidades não se deslocarem para as cidades. Mas não se vê uma medida estruturada. Como vai ser isso a curto, médio e longo prazo?", questiona.

Mortes crescentes entre Xavantes

A situação é tensa também entre os Xavantes, etniasite betânia23 mil pessoas que vivesite betâniauma área fragmentadasite betânianove terras indígenas no Mato Grosso. Já são maissite betânia200 casossite betâniainfecção confirmados e 23 óbitossite betâniadecorrência da Covid-19, segundo dados do Distrito Sanitário Especial Indígena (Dsei).

Já a Ana Paula Sabino, que atua há 20 anos com os Xavantes e coordena da campanha SOS Xavante A' uwe Tsari, diz que o coronavírus já matou 38 indígenas.

Ela conta que faltam insumos para tratar os doentes e que, por meiosite betâniadoações, conseguiu mobilizar a comprasite betâniamedicamentos com auxílio da ONG Expedicionários da Saúde. Além dessa carência, ela reclama que os indígenas não estão sendo orientados sobre o enterro das pessoas falecidas por covid-19, o que fez dessas cerimônias focossite betânianovas contaminações.

"Numa pandemia dessas, você não pode mandar um caixão para a comunidade e achar tudo bem eles abrirem, é um absurdo. É verdade que os índios preferem levar os corpos para as aldeias, querem enterrar nos cemitérios deles, mas cade os protocolos, a orientação sobre como isso deve ser feitosite betâniaforma segura?", cobra.

Segundo Sabino, entre os mortos havia indígenas que receberam hidroxicloroquina, substância defendida pelo presidente Bolsonaro como formasite betâniatratar a covid-19, mas que não temsite betâniaeficácia para esse fim comprovada cientificamente.

O uso do medicamento no casosite betâniacontágio por coronavírus é criticado por muitos médicos devido à possibilidadesite betâniacausar efeitos colaterais graves que podem até provocar a morte.

"É um governo que está promovendo genocídio nas comunidades indiretamente, com tratamento ruim", critica ela.

Um documento obtido pelo jornal O Globo nesta semana confirmou que a substância tem sido usadasite betâniacomunidades indígenas. Segundo o jornal, a atasite betâniauma reunião promovida pelo Ministério Público Federal (MPF)site betâniaRoraima no dia 2site betâniajulho mostra que o coordenador do Distrito Sanitário Especial Indígena (DSEI) Leste, Tércio Pimentel, admitiu que a cloroquina enviada pelo governo faz partesite betâniaum kit dado pelo Ministério da Saúde para o tratamento da Covid-19.

Recursos para saúde indígenasite betâniaqueda

Médica cubana deixando o Brasil

Crédito, Organização Pan-Americanasite betâniaSaúde

Legenda da foto, Cubana deixa Brasil com fim da parceria no Mais Médicos; Havana criticou Bolsonaro por questionar 'a dignidade, o profissionalismo e o altruísmo' dos profissionais

O Ministério da Saúde anunciousite betâniajunho que "investiu cercasite betâniaR$ 70 milhõessite betâniaações específicassite betâniaproteção aos indígenas para enfrentamento da covid-19". Os recursos foram usados para a comprasite betâniamaissite betânia600 mil Equipamentossite betâniaProteção Individual (EPIs), insumossite betâniasaúde e medicamentos, que foram enviados aos 34 Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEIs).

Segundo a pasta, isso inclui "372,7 mil máscaras cirúrgicas e N95, 166,7 mil luvas, 13,4 mil aventais, 16,6 mil toucas, 6 mil frascossite betâniaálcoolsite betâniagel e também maissite betânia29 mil testes rápidos que garantem a testagemsite betâniatodos os profissionais que vão entrar nas terras indígenas para atender a população".

No entanto, levantamento do Institutosite betâniaEstudos Socioeconômicos (Inesc) feito a pedido da BBC News Brasil indica que, mesmo com a crise do coronavírus, o total gasto pelo governo na saúde indígena no primeiro semestre deste ano ficou abaixo da despesa registrada na primeira metadesite betânia2019.

Os dados foram extraídos do Siga Brasil, portal do Senado Federal que permite monitorar os gastos do governo, corrigidos pela inflação. Segundo essa fonte, foram efetivamente gastos com promoção e proteção da Saúde Indígena R$ 698,03 milhõessite betâniajaneiro a julho do ano passado. Já no primeiro semestre desse ano, foram R$ 660,69 milhões (5,3% a menos).

Olhando o resultado por mês, os dados mostram quesite betâniaabril e maio, mesessite betâniaque a pandemia já estava com força no Brasil, essas despesas ficaram bem abaixo da registrada no mesmo períodosite betânia2019. Apenassite betâniajunho, houve uma alta relevante.

"Demorou muito tempo para o governo reagir e destinar recursos para a saúde indígena enfrentar a pandemia", crítica Leila Saraiva, assessora política do Inesc.

Ela ressalta que os recursos para área já vinhamsite betâniaqueda no ano passado. O total efetivamente gasto com saúde indígenasite betânia2019 foisite betâniaR$ 1,48 bilhão, 16% a menos da despesasite betânia2018.

Para Leila Saraiva, o argumentosite betâniaque faltam recursos usado pelo presidente ao vetar nesta semana trechos da lei que previa medidas emergenciaissite betâniaproteção aos indígenas é "falacioso".

Ela lembra que o Congresso aprovou um regime fiscal especial para enfrentamento da pandemia que permite aumentar o endividamento e romper o tetosite betâniagastos desse ano.

Além da redução dos gastossite betâniasaúde indígena, outro fator que, nasite betâniaopinião, deixou o atendimento aos povos mais precário nesse momentosite betâniapandemia foi a saída dos profissionais cubanos do programa Mais Médicos.

Logo após a eleiçãosite betâniaBolsonaro no finalsite betânia2018, o governo cubano decidiu deixar o programa brasileiro, se antecipando a uma decisão do futuro presidente. Isso porque Bolsonaro sempre atacou a parceria com o governosite betâniaCuba no Mais Médicos.

Como é difícil atrair médicos brasileiros para atuarsite betâniaterritórios mais isolados, cercasite betânia90% dos profissionais do programa que atendiamsite betâniaterras indígenas eram cubanos. Uma reportagem da BBC News Brasil mostrou que, após a saídasite betâniamédicos cubanos, mortessite betâniabebês indígenas cresceram 12%.

STF estabelece prazo para governo agir

Os vetossite betâniaBolsonaro à lei que prevê as medidas emergenciais para os povos indígenas ainda podem ser derrubados pelo Congresso.

O governo, no entanto, já está obrigado a adotar uma sériesite betâniaprovidências por uma decisão do STF que saiu na quarta-feira (08/07), logo após o presidente vetar parcialmente a nova legislação.

A partirsite betâniauma ação apresentada pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) com apoiosite betâniapartidossite betâniaoposição, o ministro do STF Luís Roberto Barroso determinou que o governo crie uma Salasite betâniaSituação para a gestãosite betâniaaçõessite betâniacombate à pandemia no casosite betâniapovos indígenassite betâniaisolamento ou contato recente, no prazosite betânia72 horas. Deverão participar representantessite betâniacomunidades indígenas, da Procuradoria Geral da República (PGR) e da Defensoria Pública da União (DPU).

Barroso também deu dez dias para o governo apresentar um planosite betâniacriaçãosite betâniabarreiras sanitáriassite betâniaterras indígenas, após ouvir a Salasite betâniaSituação.

Na decisão, o ministro reconheceu que o governo federal vem tomando iniciativas para mitigar a pandemia entre os povos indígenas.

Jair Bolsonaro, presidente do Brasil

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Bolsonaro vetou trechossite betâniauma nova lei que prevê medidassite betâniaproteção às comunidades indígenas

"Entretanto, tais ações precisam ser coordenadas e precisam ser complementadas por medidas que não estãosite betâniacurso. A criação sistemáticasite betâniabarreirassite betâniaproteção aos povossite betâniaisolamento esite betâniacontato recente não estásite betâniacurso", ressaltou na decisão.

"A assistência à saúde dos inúmeros povos indígenas localizados nas muitas terras indígenas ainda pendentesite betâniahomologação não estásite betâniacurso, o que os coloca sob riscosite betâniaperecimento", destacou ainda, ao acolher o pedido da Apib para reverter a decisão do governosite betânianão garantir a todos os povos indígenas atendimentosite betâniasaúde especializado.

Barroso determinou também que o governo criesite betâniaaté 30 dias um Planosite betâniaEnfrentamento da Covid-19 para os Povos Indígenas Brasileiros, com a participação das comunidades e do Conselho Nacionalsite betâniaDireitos Humanos. Esse plano deverá conter medidassite betâniacontenção e isolamentosite betâniainvasoressite betâniarelação a terras indígenas.

Embora o Ministério da Saúde tenha elaboradosite betâniamarço o "Planosite betâniaContingência Nacional para Infecção Humana pelo Novo Coronavírussite betâniaPovos Indígenas", o ministro destacou o argumento da Apibsite betâniaque esse planejamento "expressa meras orientações gerais e não prevê medidas concretas, cronograma ou definiçãosite betâniaresponsabilidades". Além disso, ele frisou a importânciasite betâniaque as comunidades sejam ouvidas na elaboração dessas medidas.

"Esses pontos (medidas não tomadas pelo governo) só estão sendo percebidos porque os indígenas puderam se manifestar. Está claro, portanto, que tais povos, desde seu pontosite betâniavista, são capazessite betâniaidentificar providências e medidas, que, se ausentes, podem constituir um obstáculo para a efetividade das açõessite betâniasaúde já pensadas pela União", acrescentou o ministro.

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