Coronavírus: moradores fogem1xwin appcidades na Amazônia para ter comida e segurança sanitária1xwin appcomunidades ribeirinhas:1xwin app
Vários deles migraram para zonas urbanas nos últimos anos atrás1xwin apptrabalho e estudos, e agora voltam para as casas1xwin appparentes1xwin appbusca1xwin appproteção contra o vírus e a crise econômica causada pela pandemia.
"Temos visto aqui na região um êxodo1xwin apppessoas das cidades rumo ao interior", diz à BBC News Brasil o médico neurocirurgião Erik Jennings Simões, que mora1xwin appSantarém e tem longa experiência no atendimento1xwin appcomunidades indígenas e ribeirinhas da região.
Na comunidade Nova Sociedade, um dos povoados no Arapiuns onde ele esteve nos últimos dias, ouviu1xwin appum morador que as casas nunca estiveram tão cheias — tanto1xwin appmigrantes retornados quanto1xwin appfamiliares nascidos nas cidades1xwin appbusca1xwin apprefúgio.
Ele afirma que a maioria das pessoas se deslocou antes da explosão1xwin appcasos na região, o que tem impedido a entrada do vírus nas comunidades até agora. Conforme a pandemia se agravou nas áreas urbanas, vários povoados passaram a proibir novas chegadas.
Segundo o médico, os cenários radicalmente distintos vividos por cidades amazônicas e parte das comunidades ribeirinhas "mostram a necessidade1xwin apppensarmos a floresta como um fator1xwin appsegurança epidemiológica".
"Quando preservada, a Amazônia pode garantir segurança alimentar e sanitária1xwin appeventos desse tipo", afirma.
Reservas extrativistas
No sudoeste paraense, comunidades ribeirinhas1xwin apptrês Reservas Extrativistas (Resex) na região do Médio Xingu também receberam antigos moradores e parentes que fugiram da pandemia1xwin appcidades.
A região ocupa cerca1xwin app8 milhões1xwin apphectares — o equivalente a dois Estados do Rio1xwin appJaneiro — e é habitada por 450 famílias dispersas pelas margens1xwin apprios e igarapés.
Morador da cidade1xwin appAltamira desde 2017, após ingressar no curso1xwin appEtnodesenvolvimento da Universidade Federal do Pará (UFPA), Higor Cazimiro,1xwin app20 anos, voltou para1xwin appcomunidade natal, na Reserva Extrativista Rio Xingu, assim que foram registrados os primeiros casos1xwin appcovid-19 no Brasil,1xwin appmarço.
Ele diz à BBC News Brasil que1xwin appmaior preocupação era que1xwin appesposa, grávida do segundo filho do casal, adoecesse na gestação. Eles pretendem viajar para Altamira só na véspera do parto, já que não há hospitais na Resex, e retornar para a comunidade1xwin appseguida.
O estudante compara a rotina na reserva à quarentena1xwin appAltamira: "Lá tem que ficar trancado, não pode ir visitar amigo, parente. Aqui é totalmente diferente: pode sair para a roça, pode nadar no rio, pode ir na casa do vizinho, pode brincar1xwin appbola."
"Aqui a gente é livre, só não pode ir para a cidade se contaminar", ressalva.
Substituição1xwin appingredientes
Cazimiro diz que a comunidade é quase autossuficiente1xwin appalimentos, pois nas últimas décadas incorporou alguns itens vindos da cidade, como arroz, feijão e café.
Os produtos são adquiridos coletivamente por uma associação comunitária e levados a um entreposto dentro da Resex, onde as famílias podem comprá-los ou trocá-los por produtos da floresta, como castanhas, borracha e óleo1xwin appcopaíba.
Há 27 entrepostos desse tipo — conhecidos como cantinas — na região da Terra do Meio, que engloba as reservas extrativistas e terras indígenas do Médio Xingu.
Cazimiro afirma que a pandemia limitou a oferta1xwin appprodutos da cidade na reserva, pois houve uma redução das viagens a Altamira para repor o estoque.
Ele diz que alguns moradores têm contornado as restrições resgatando práticas culinárias antigas, substituindo produtos industrializados por ingredientes locais. No lugar1xwin appfarinha1xwin apptrigo e óleo1xwin appsoja, por exemplo, entram a farinha e o óleo do babaçu.
Cazimiro diz que a fartura1xwin appalimentos na floresta os deixa1xwin appsituação bem mais confortável que a1xwin appmoradores pobres nas cidades, dependentes1xwin apptrabalhos cada vez mais escassos e carentes1xwin appredes comunitárias1xwin appapoio.
"Aqui, se precisar, a gente entra na mata e vai atrás1xwin appuma caça, a gente vai no rio e pega um peixe, a gente bate na porta do vizinho e pede uma farinha. Na cidade, você não tem como comprar, ainda mais agora que não estamos num momento bom1xwin appemprego", afirma.
Contato com parentes
Também estudante universitário, Joelmir Silva e Silva deixou Altamira para se proteger da pandemia junto1xwin appfamiliares na comunidade Maribel, no rio Iriri.
"Seria muito depressivo ficar o tempo todo dentro1xwin appum quarto e só conversar com as pessoas que moram com a gente", afirma.
Silva diz que tem se deslocado pela região para alertar moradores sobre a gravidade da covid-19 e ajudá-los a se cadastrar no programa do governo que garante auxílio1xwin appR$ 600 durante a pandemia.
"Graças a Deus, a gente tem nossa comunidade, o nosso povo, que nos recebeu tão bem. Fico preocupado com outras pessoas que não têm acesso a lugares como esse para se resguardar desse vírus."
Outra moradora1xwin appAltamira, a microscopista Dinalva Batista Camilo viajou com o marido e três filhos para1xwin appcomunidade natal, na Reserva Extrativista Riozinho do Anfrísio, até a poeira baixar.
"A gente não tem que usar máscara, luva, álcool gel. Você pode sair e voltar para casa sem aquela correria1xwin appter1xwin apptomar banho e trocar1xwin approupa logo que chega", compara.
Ela diz que a região tem conseguido barrar o vírus graças ao forte controle exercido por líderes comunitários.
"Aqui só estão pessoas que entraram há mais1xwin app30 dias e o povo que mora na comunidade. Só entra e sai quem eles deixarem", afirma.
Fluxo migratório
Assessor técnico das associações que gerem as três Reservas Extrativistas, Naldo Lima endossa o sucesso da estratégia.
Ele afirma que as organizações proibiram a chegada1xwin appnovos visitantes há várias semanas e suspenderam o trânsito1xwin appbarcos1xwin appnão moradores. As restrições valem até o fim do mês, quando serão reavaliadas.
Lima diz que as associações têm rejeitado até pedidos1xwin appantigos moradores que,1xwin appmeio à pandemia, resolveram voltar1xwin appdefinitivo para as reservas.
"Os que estão hoje nas comunidades sabem que não podem nem sair para Altamira, porque a comunidade não vai aprovar que eles voltem", diz.
Ele afirma que muitas pessoas que cogitam retornar às comunidades deixaram o território até 2008, quando ainda não existiam escolas nas reservas e as famílias migravam para Altamira para que os filhos pudessem estudar.
Na cidade, a maioria dos ribeirinhos assumiu trabalhos informais: as mulheres viraram faxineiras e empregadas domésticas, e os homens, estivadores e operários da construção civil.
Com a abertura1xwin appescolas nas reservas, segundo Lima, o movimento migratório esfriou. Hoje ele diz que os ribeirinhos que deixam o território o fazem1xwin appbusca1xwin appmelhores serviços médicos ou1xwin appcursar uma universidade.
Cada reserva tem um só posto1xwin appsaúde com um técnico1xwin appenfermagem, equipado apenas para o atendimento1xwin appcasos simples. Em comunidades mais afastadas, diz ele, pacientes com doenças crônicas têm1xwin appse deslocar por até dois dias1xwin appbarco até hospitais1xwin appAltamira.
Todos os migrantes entrevistados disseram que, se houvesse formas1xwin appcursar o ensino superior e acessar melhores serviços1xwin appsaúde nos territórios, voltariam1xwin appdefinitivo.
"Esse é o ambiente onde a gente nasceu e se criou, nossa raiz está enterrada aqui. Se os serviços públicos fossem um pouco melhores, eu nunca teria saído", diz Higor Cazimiro.
Descentralização da medicina
Para o médico Erik Jennings Simões, a covid-19 tem mostrado que foi um erro concentrar o sistema médico-hospitalar da Amazônia nas grandes zonas urbanas.
Sem UTIs nem condições1xwin apprealizar cirurgias simples, municípios do interior têm1xwin appmandar pacientes para cidades cujos hospitais já viviam sobrecarregados antes da pandemia.
"Nós nos concentramos nas cidades maiores e nos esquecemos1xwin applevar a saúde até as comunidades para evitar que elas viessem até a cidade", afirma.
Simões diz que já há tecnologia para realizar cirurgias1xwin appmédia e até alta complexidade fora1xwin appgrandes hospitais, assim como tratar doenças crônicas e fazer exames1xwin appsangue.
O médico participa1xwin appuma iniciativa1xwin appcurso voltada ao combate à covid-19 que, segundo ele espera, poderá servir1xwin appmodelo para uma reestruturação da atenção médico-hospitalar na região no futuro.
Coordenada pela ONG Expedicionários da Saúde e financiada por doadores, entre os quais o Instituto Socioambiental (ISA), o projeto está instalando enfermarias para atender pacientes e covid-191xwin appaté média gravidade1xwin apppolos1xwin appsaúde já existentes1xwin appterras indígenas na região do Tapajós e do Alto Rio Negro.
As enfermarias são equipadas com concentradores1xwin appoxigênio, aparelhos portáteis normalmente usados no tratamento1xwin appenfisema pulmonar. Não substituem respiradores, mas podem auxiliar pacientes com problemas moderados1xwin appoxigenação causada pela covid-19.
"É uma descentralização que eu defendo há 18 anos e que fomos obrigados a fazer no contexto do coronavírus", diz Simões.
"Primeiro, porque não tem vaga nas cidades; segundo, porque quando você retira as pessoas dos seus territórios, pode causar mais agressão do que a própria doença", afirma.
"É um começo."
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