'Lá, faxineiro tem uma vida': deportados contam por que escolheram viver ilegalmente nos EUA:sport x crb
Depoissport x crbviver por 20 anossport x crbBoston e ser deportadosport x crbvolta ao Brasilsport x crb2008, quando recebeu uma carta do serviçosport x crbimigração americana dando 90 dias para que ele deixasse o país, Edilson diz que só tem coisas boas a dizer sobre os Estados Unidos, que lhe deram, principalmente, oportunidades. Começou trabalhando como serventesport x crbpedreiro, sem falar ou compreender nadasport x crbinglês; depoissport x crbsete anos, abriusport x crbprópria empresasport x crbfaxina e realizou sonhos que pareciam impossíveis no Brasil.
"Eu tinha uma companhia que valia US$ 180 mil [R$ 776 mil] e, quando eu vim embora, eu vendi por US$ 75 mil [R$ 323 mil]. Tive que vender a preçosport x crbbanana", diz. Ele investiu na construçãosport x crbdois prédios residenciais e alguns terrenos na regiãosport x crbValadares, e vive até hoje da renda desses investimentos. Conversou com a BBC News Brasil no prédiosport x crbdois andaressport x crbque mora atualmente com a namorada.
Na realidade americana, quando coordenavasport x crbprópria equipesport x crblimpeza, Edilson diz que ganhava dinheiro no ritmosport x crbsua disposição e capacidade para trabalhar, que eram grandes.
"Eu estava ganhando tanto dinheiro que eu peguei US$ 45 mil [R$ 194 mil] e comprei um carro para sair sábado e domingo, sendo que eu já tinha outro para trabalhar. Olha que cabeça. O vendedor falou: você vai financiarsport x crbquantos meses? Eu disse 'Não, vou pagar à vista'. Tirei um pacotesport x crbnotassport x crbUS$ 100 e jogueisport x crbcima da mesa. Quando no Brasil você faz isso?"
Desde o ano passado, o governo dos EUA endureceu as regras para quem tenta cruzar a fronteira e anunciou um novo processosport x crbdeportação rápida, que dispensa a necessidadesport x crbos casos passarem pelos tribunaissport x crbimigração.
Com as novas regras, qualquer imigrante que não consiga provar que esteve no país por dois anos ininterruptos pode ser deportadosport x crbforma imediata, e mais brasileiros têm sido obrigados a abandonar a vida americana. Desde outubro, três aviões fretados pelo governo do presidente Donald Trump já trouxeram brasileiros deportados para o aeroportosport x crbConfins,sport x crbBelo Horizonte.
Sob as novas regras, os relatossport x crbquem fica detido por meses na imigração sãosport x crbfome, frio e maus-tratos.
'Vestir, morar, ter saúde, carro bom'
O consultorsport x crbvendas Célio, 41 anos, também foi deportadosport x crbvolta a Valadaressport x crb2003, depoissport x crbviver três anos nos Estados Unidos com a esposa e a filha.
Entrou com um passaporte falsificado que comprousport x crbValadares, com a ajudasport x crbamigos que já haviam emigrado e queriam ajudar. "Eu só levei um passaporte e nem era meu, eu entrei nos EUA sem nunca ter tirado um passaporte no Brasil. Fui com o nomesport x crbuma outra pessoa que parecia comigo, e o rapaz só trocou a foto da frente, não trocou a foto do visto, que é aquela escaneada. Lembro o nome dele até hoje, aprendi a assinar a assinatura dele", conta.
A esposa,sport x crbquem Célio atualmente é divorciado, entrou com a filha sete meses depois, cruzando a fronteira pelo México. "Nessa épocasport x crbque ela foi, o rapaz que fez a minha documentação não fazia mais, a Polícia Federal tinha ficadosport x crbcima dele. Daí ela foi pelo México: ficou cinco dias na travessia ali e chegousport x crbBoston, até mim. No Texas tinha uma equipe esperando, que a colocou no trem e eu a peguei na estaçãosport x crbBoston".
Apesarsport x crbter passado pela prisão e deportação, o consultorsport x crbvendas diz que a experiência não reduziusport x crbnada a admiração que tem pelos Estados Unidos, principalmente pelas muitas oportunidades que o país oferece. "Acho aquela terra maravilhosa, organizada, acho que eles estão certossport x crb99% da organização deles", diz.
Pensasport x crbvoltar. Desta vez, porém, sonhasport x crbconseguir o visto legalmente. "Eu tenho um documento que dizia que depoissport x crbcinco anos eu podia tentar o vistosport x crbnovo. Já tem 17 que eu estou aqui."
"E outra coisa: é incrível quando você para para analisar que um faxineiro dentrosport x crbum país daquele tem oportunidadesport x crbvestir, morar, ter saúde, tratarsport x crbuma família, andarsport x crbum carro bom. Lá você não se matasport x crbtrabalhar. Trabalhandosport x crbperíodo integral, você e a esposa conseguem trabalhar para sustentar uma família, ter um carro para andar, e participar das coisas que uma sociedade normal participa. Ir num restaurante, ir numa loja", afirma.
Célio diz que conseguiusport x crbpouco tempo pagar a dívidasport x crbUS$ 10 mil que fez para emigrar, bem como para levar a família. "Acho que as oportunidades teriam fluído bem mais lá, se eu não tivesse sido deportado". Habituado à rotina no Brasil, Célio rebate as críticassport x crbquem afirma que, quando um brasileiro parte para o subempregosport x crboutro país, é tratado como escravo.
"Escravos nós somos aqui. Absurdosport x crbse viver é nesse país. Eu trabalho aqui oito, quinze, desesseis horas por dia. Para eu manter um carro é a coisa mais difícil, no meu próprio país. Com o saláriosport x crbuma pessoa que faxina uma residência nos EUA, as pessoas que trabalham limpando lojas até cinco horas da manhã, elas têm condiçõessport x crbter uma vida. Eles podem morar, beber, vestir, escolher a culinária que querem comer. Aquele país é um espetáculo, eu não consigo ver o lado ruim daquele país. E olha que eles me prenderam e eu fui deportado", afirma.
"Aqui no nosso país quando que um faxineiro consegue comprar uma casa, comprar um carro, e quitar direitinho as dívidas, pagar os impostos no final do ano, levar o filho para comprar roupa?"
Ele afirma que até compreende a postura mais rígida dos EUA para barrar os imigrantes, inclusive os brasileiros. "Aquele país é todo dia minadosport x crbgente que chega pedindo socorro, querendo entrar. Se receber bem todo mundo, que país que aguenta? Nenhum."
Ajudasport x crbquem já foi, medo da prisão e dinheiro escondido
Edilson criou coragem para migrar inspirado pelo exemplo do irmão, que era pintorsport x crbcasas nos Estados Unidos e ia trabalhar todos os dias dirigindo uma BMW.
Foi ele quem mandou os US$ 1.200 (R$ 5.170) que Edilson usou para pagar o coiote e as despesas da viagem. "Meu irmão moravasport x crbaluguel, tinha seu carro próprio, coisa que ele nunca teve no Brasil. Lá você pode ter tudo que você quiser, pode andar num BMW zero se você quiser. Basta você querer trabalhar."
Mas, apesar da prosperidade, muitas das memóriassport x crbEdilson sobre a viagem envolvem perigo e sofrimento.
"Quando você chega lásport x crbTijuana, para fazer a travessia para San Diego, você tem que nadar a largurasport x crbum rio, uns 20 metros, menor que o Rio Doce (que corta a cidadesport x crbValadares). Mas dá medo porque é água corrente, a água corre rápido."
Conta que, quando chegou a vezsport x crbele e o irmão fazerem a travessia, tiveram também que socorrer um companheiro que não sabia nadar. "Ele não falou que não sabia. A ansiedade dele era tão grandesport x crbfazer a travessia, porque ele saiu devendo do Brasil, que ele pulou na água do rio. E na horasport x crbque ele pulou, ele afundou", diz. "Como você deixaria um amigo morrer na água sabendo que você pode ajudar? Não tem como."
Para chegar até a fronteira, viajou por três semanassport x crbum ônibus cheiosport x crbimigrantes levados pelos coiotes. "É uma viagem muito cansativa, é muito sofrido. Você passa fome, você fica preso, você fica estressado. Levei só uma mochilasport x crbroupas, mas na estrada joguei tudo fora. Você não aguenta levar as roupas porque aquilo se torna pesado. Fiquei só com uma peça no corpo."
Na chegada a Tijuana, antessport x crbcomeçar a nadar, o maior desafio era escapar dos olhares da polícia americana. "Dá medosport x crbser preso. Quando você chegasport x crbTijuana, os policiais já ficam te olhando. Eles já veem que você está querendo fazer a travessia."
Edilson chegou a San Diego com o dinheiro — que aprendeu a esconder no cós da calça, seguindo as dicas do irmão que organizou a viagem — molhado.
"Quando eu fui, meu irmão que mora nos EUA já tinha me falado: Edilson, você não coloca o dinheiro todo no seu bolso. Deixa só US$ 100 no bolso porque, se os coiotes chegarem pedindo dinheiro você fala 'Ó, eu só tenho esse dinheiro aqui, se eu te der tudo, vou ficar com fome'", lembra. "Furei um buraco no cós da calça, fiz enroladinhos com o dinheiro e coloquei tudo lá. Chegueisport x crbSan Diego eu ainda tinha US$ 900."
Se hospedousport x crbum hotel, tomou um banhosport x crbquarenta minutos, dormiu por três dias e comprou uma passagemsport x crbavião para Boston, onde iria morar e recomeçar a vida.
Entre a vontade e o medo
Quando a reportagem pergunta a Edilson se ele pretende voltar aos EUA, ele parece indeciso. Diz que não tem nada mais que o prenda no Brasil, desde que a mãe faleceu, há três semanas.
Mas tanto ele quanto Célio são firmessport x crbdizer que, hoje, tentariam entrar pelas vias legais. "A coisa mais importante da minha vida eu perdi. Então o Brasil, para mim, não tem sentido", afirma Edilson.
Ele diz que foi muito difícil se habituar novamente à realidade brasileira, ainda maissport x crbmaneira abrupta.
"Quando eu cheguei, fiquei muito triste, desesperado. Pensava 'Por que eu vim embora?', ficava chateado, pelos cantos chorando, não sabia o que fazer. Minha irmã me falava porque você está desse jeito? A vida que você tem está boa, você não deve nada a ninguém, você tem um patrimônio, onde você quer você vai. Mas a gente fica muito estressado."
Sentia falta da limpeza dos EUA, e do custosport x crbvida, "totalmente diferente". "Com US$ 100 [R$ 431] lá você enche um carrinhosport x crbcompra, aqui com R$ 100 você não faz. Fico pensandosport x crbum paisport x crbfamília com filho, como viver com R$ 1 mil". Hoje, Edilson diz que tem renda aproximadasport x crbR$ 6.500 por mês, mas não vê o dinheiro sobrar. "Gasto tudo, e não ésport x crbluxo."
Por outro lado, vivendo uma vida pacata no Brasil com a renda dos aluguéis que recebe, ele reconhece que a disposição para o perigo não é a mesma dos 19 anos.
Embora a família esteja dividida entre Boston e Valadares — tem irmãos, primos e sobrinhos morando nos EUA —, hoje ele tem mais a perder do que antes. "Lá eu teria que começar do zero. Teria que chegar lá, trabalhar para os outros, meus irmãos teriam que me ajudar, pelo menos por um tempo. Começar tudosport x crbnovo. Aí eu fico desanimado."
Ele diz que hoje compreende quem ainda se arrisca para mudar para lá, desde que não sejasport x crbsituaçõessport x crbrisco à vida. Cita o exemplo do amigo dele que não sabia nadar, e lembra da tristeza que sentiu ao ver a foto dos corpos do imigrante salvadorenho esport x crbsua filhasport x crbquase dois anos que morreram afogados enquanto atravessavam o Rio Grande na cidadesport x crbMatamoros, no estado mexicanosport x crbTamaulipas. Eles tentavam chegar à cidade texana Brownsville (EUA).
Os corpos foram encontrados no lado mexicano da fronteira,sport x crbjunho do ano passado. As fotos que mostram a criança com o bracinho apoiado no pescoço do pai provocaram forte comoção no país.
"Aquilo nossa senhora, só quem não tem coração para falar. Ele foi para procurar uma melhora para família e acabou ele e a filha morrendo. Triste demais. Morrer por isso não vale a pena."
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