'Ser um nutricionista gordo não é atestadoapostar online ao vivoincompetência':apostar online ao vivo
Fiz dietas que me fizeram muito mal. Muitas vezes, parecia que eu iria desmaiar por ficar muito tempo sem comer. Na vida adulta, desisti das dietas. Decidi cursar nutrição, até mesmo para ter respostas sobre essa minha eterna luta contra o meu peso. O que eu não imaginava, na época, era que muitas pessoas que faziam nutrição vendiam a própria imagem como se fosse qualidade do trabalho deles. Por isso, muitos acreditam que é necessário que o profissional seja magro. É um padrão social, que muitos creem ser fundamental para a profissão.
Certa vez, um aluno do curso pediu para a professora comentar sobre o quanto era um absurdo que um nutricionista fosse gordo. Mas ela deixou muito claro que o peso não é algo que interfereapostar online ao vivonossa capacidade e ainda disse que uma das melhores nutricionistas que conhece é gorda e produz estudos indispensáveis para a nutrição.
Fiz o meu Trabalhoapostar online ao vivoConclusãoapostar online ao vivoCurso (TCC) sobre transtornos alimentares, pois sempre considerei um assunto muito importante e pouco debatido na época,apostar online ao vivo2008. Era um tema muito mais voltado para a psicologia do que para a nutrição, mas sempre acreditei que deveria incluir as duas áreas. Não é possível trabalhar a alimentação unicamente, muitas vezes é necessário um trabalho interdisciplinar. Foi justamente enquanto estudava sobre os transtornos que descobri a minha compulsão alimentar.
Quando me formei e fui procurar emprego, descobri outra realidade: a desvalorização e desrespeito ao nutricionista, tantoapostar online ao vivoquestões trabalhistas comoapostar online ao vivooportunidade e mercadoapostar online ao vivotrabalho. Eu ainda tinha outro problema: o meu peso. Na época, eu estava com 140 quilos.
Preconceito contra profissionais gordos
Diferentes pesquisas apontam que profissionaisapostar online ao vivosaúde que estão acima do peso podem ter menos credibilidade para alguns pacientes. O assunto é debatido há anos. Um estudoapostar online ao vivo2013, intitulado O efeito do peso corporal dos médicos nas atitudes dos pacientes: implicações para a seleção do médico, confiança e adesão ao aconselhamento médico, do International Journal of Obesity, do periódico Nature, abordou a temática. A pesquisa concluiu que prestadoresapostar online ao vivoserviço com sobrepeso ou obesos podem ser alvosapostar online ao vivomaiores desconfianças e os pacientes atendidos por eles podem se sentir menos inclinados a seguir os conselhos desses profissionais.
Para Cuzziol, os nutricionistas gordos estão entre os profissionais que enfrentam mais dificuldades para conquistar a confiança dos pacientes.
Em nota à BBC News Brasil, o Conselho Federalapostar online ao vivoNutricionistas (CFN) afirma que a discussão referente ao pesoapostar online ao vivonutricionistas não faz parte das orientações da entidade e o assunto não é debatido pelos membros da instituição. "Não existe posicionamento sobre isso", informa o conselho, que disse não ter um representante para conversar com a reportagem sobre o assunto.
"A missão institucional do conselho é contribuir para a garantia do direito humano à alimentação adequada, fiscalizando, normatizando e disciplinando o exercício profissional do nutricionista e do técnicoapostar online ao vivoNutrição e Dietética (TND) para uma prática pautada na ética e comprometida com a segurança alimentar e nutricional,apostar online ao vivobenefício da sociedade", diz trechoapostar online ao vivonota encaminhada pelo CFN à reportagem.
Após a publicação da reportagem, o CFN enviou à BBC News Brasil uma nova nota sobre o assunto. No texto, a nutricionista Elisabeth Chiari, conselheira-diretora da entidade, afirma que o conselho repudia qualquer tipoapostar online ao vivodiscriminação contra profissionais ou pacientes. "Entendemos que o ser humano não pode ser classificado porapostar online ao vivoaparência ou composição corporal", diz.
Depressão profunda e bariátrica
Depoisapostar online ao vivoformado, tive dificuldades para encontrar emprego. Entreiapostar online ao vivodepressão profunda. A minha família ficou muito preocupada com a minha situação. Engordei cada vez mais e cheguei aos 192 quilos. Cheguei a tentar o suicídio. Decidi fazer a bariátrica.
Sou favorável a essa cirurgia, mas acredito que ela precisa ser feita com mais cautela,apostar online ao vivocasosapostar online ao vivoemergência, quando realmente não existem alternativas. Até porque é um procedimento com o qual a pessoa vai terapostar online ao vivolidar com uma sérieapostar online ao vivosituações, ao longo da vida, que não possuía anteriormente. No meu caso, passei a ter problemas para absorver o cálcio. Por isso, até hoje tomo suplementos específicos.
Emagreci 70 quilos depois da bariátrica, que fizapostar online ao vivo2010. As pessoas enxergam a cirurgia como uma solução para todos os problemas, o que não é verdade. Depois do procedimento, mantive uma boa alimentação e suplementação adequada, mas não me tornei uma pessoa magra, principalmente porque estava desempregado e sem condições para fazer acompanhamento com um profissional para me orientar nas atividades físicas. Hoje, se analisarmos pelo Índiceapostar online ao vivoMassa Corporal (IMC), sou uma pessoa obesa.
Levo um estiloapostar online ao vivovida onde tenho como me movimentar e cuido da minha alimentação. Mas existe uma questãoapostar online ao vivometabolismo, que me prejudica e me impedeapostar online ao vivoemagrecer. Não posso reduzir ainda mais a minha alimentação, principalmente depois da bariátrica, porque posso passar por adoecimento por desnutrição. O meu peso é preocupante? Sim. Mas posso fazer duas coisas: conviver com isso e manter a qualidadeapostar online ao vivovida que tenho ou desregular essa qualidade buscando reduzir cada vez mais o peso. É importante dizer que não tenho colesterol, não tenho diabetes, não tenho nada.
Uma das coisas que mais me incomodam é que a obesidade ainda é pregada como formaapostar online ao vivocomportamento. Parece que as pessoas são gordas porque não têm vergonha na cara, não se esforçam e não se dedicam a emagrecer. Mas para uma pessoa gorda emagrecer, é preciso gastar. A sociedade brasileira ainda não entendeu, mas o mercado do emagrecimento é muito caro.
A obesidade é uma doença, segundo a Organização Mundialapostar online ao vivoSaúde (OMS). Mas defini-la como doença dá uma margem muito grande para quem quer se aproveitar disso para tentar vender algo. O obeso é uma pessoa que estáapostar online ao vivouma condição que precisaapostar online ao vivocuidado grande com alimentação e outros fatores, mas não recebe o mesmo apoio, por exemplo, que uma pessoa com diabetes.
Se partirmos do pontoapostar online ao vivoque a obesidade é uma doença, então qualquer pessoa obesa deveria ter acesso a tratamento gratuito, com uma equipe interdisciplinar, senão corre o riscoapostar online ao vivocairapostar online ao vivoinúmeros tratamentos enganosos.
Mas se a obesidade é uma doença, por que ela ainda é tão desrespeitada na sociedade? Talvez, o melhor seja considerarmos a obesidade como uma condição,apostar online ao vivovezapostar online ao vivotratá-la como doença, até mesmo porque não há tratamento adequado na saúde pública.
Um problema é que, muitas vezes, os médicos associam qualquer problemaapostar online ao vivosaúdeapostar online ao vivouma pessoa obesa ao peso dela. É preciso investigar a origem daquele problema. Se estiver relacionado à obesidade, é fundamental fazer o tratamento necessário e o profissionalapostar online ao vivosaúde precisa entender que o sobrepeso não é algo que depende só daquela pessoa.
A carreira na nutrição
Depois da bariátrica, continuei a busca por um emprego. Em algumas vagas, as pessoas me olhavam estranhamente. Chegaram a me questionar: como você vai convencer as pessoas sendo nutricionista e gordo? Isso me deixava arrasado. Os empregos que consegui foram aqueles que ninguém queria, comoapostar online ao vivoum presídio eapostar online ao vivouma redeapostar online ao vivohipermercados que passava por uma ondaapostar online ao vivodemissões para conter gastos.
Entre os conhecidos, minha profissão foi, muitas vezes, motivoapostar online ao vivogargalhadas: quando eu contava que era nutricionista, algumas pessoas riam, como se fosse uma piada, por eu ser gordo.
Quando a gente pesquisa sobre a obesidade, descobre que há diversos fatores para isso, que nunca paramapostar online ao vivocrescer. As pessoas podem continuar obesas,apostar online ao vivomuitos casos, mesmo quando mudam a alimentação. A gente tem como manter o controle do peso, mas infelizmente não há 100%apostar online ao vivosolução para resolver o sobrepeso ou obesidade.
Entre os fatores para a obesidade há itens como o metabolismo, genética ou outras questões relacionadas a hábitosapostar online ao vivovida dessa pessoa. O crescimento do númeroapostar online ao vivopessoas obesas é uma resposta ao estiloapostar online ao vivovida atual. As pessoas têm buscado alimentos prontos, por conta da correria do dia a dia. Isso não é o correto. Mas as pessoas precisam entender que a melhor saída para a obesidade é muito mais do que dizer que basta apenas a pessoa 'tomar vergonha na cara para emagrecer'.
A obesidade no Brasil
De acordo com a pesquisa Vigilânciaapostar online ao vivoFatoresapostar online ao vivoRisco e Proteção para Doenças crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel)apostar online ao vivo2018, divulgada pelo Ministério da Saúdeapostar online ao vivojulho passado, os númerosapostar online ao vivoobesos no Brasil cresceram 67,8% nos últimos treze anos — saltouapostar online ao vivo11,8%apostar online ao vivo2006 para 19,8%apostar online ao vivo2018, dado mais recente.
Os dados da pesquisa apontam crescimentoapostar online ao vivoum número que estava estabilizado nos últimos anos. Desde 2015, a prevalência da obesidade na população brasileira havia se mantidoapostar online ao vivo18,9%.
O levantamento apontou que o crescimento da obesidade foi maior entre os adultosapostar online ao vivo25 a 34 anos — 84,2% — eapostar online ao vivo35 a 44 anos — 81,1%.
Nutricionista gordo
Eu encaro que uma dieta saudável é uma que possua alimentos simples, como arroz, feijão, pão e verduras, sem que a pessoa deixeapostar online ao vivocomer corretamente. Hojeapostar online ao vivodia, a cada hora surge um modismo diferenteapostar online ao vivodietas. As pessoas cada vez menos procuram aquilo que é natural. Em meu consultório, muitos pacientes relatam que buscam comidasapostar online ao vivoaplicativosapostar online ao vivoalimentação no almoço ou no jantar.
No fimapostar online ao vivo2017, comecei a atenderapostar online ao vivoclínicas, pois antes não atuavaapostar online ao vivoconsultórios. Decidi fazer isso quando começou a vir à tona a discussão sobre gordofobia, porque me senti mais confiante para trabalhar diretamente com os pacientes.
Acho a discussão sobre a gordofobia muito importante. Mas o movimento que discute o tema tem alguns pontos que não acho tão saudáveis. Alguns debates costumam ser agressivos e cheiosapostar online ao vivo'verdades'. Para um assunto que está começando a ser discutido, não é possível ser cheioapostar online ao vivo'verdades'. É preciso haver descobertas e todo mundo se ajudando.
Sou a favor do emagrecimento, desde que aconteçaapostar online ao vivomaneira saudável. Mas o fatoapostar online ao vivoemagrecer tem que ser secundário a outros fatores. A pessoa precisa começar a aprender a escolher os alimentos. O foco é prezar por uma melhor alimentação, que não seja uma dieta restritiva ou que proíba alimentos simples como pães. O emagrecimento pode ser consequência.
Quando um paciente me procura pedindo para emagrecer, eu não prometo isso. Prometo melhora nutricional, que pode culminarapostar online ao vivoum emagrecimento. Mas se a pessoa focar no peso, teremos problemas, porque ela pode não focar na importância do alimento.
Já perdi pacientes por causa do meu peso. O problema é que eles nunca deixam claro que estão desconfortáveis por serem atendidos por um nutricionista gordo. Se disserem, ok, eu devolvo o dinheiro da consulta sem problema algum (Cuzziol atendeapostar online ao vivouma clínica particularapostar online ao vivoSão Caetano do Sul,apostar online ao vivoSão Paulo).
Há pouco maisapostar online ao vivoum ano, depois dos inúmeros comentários sobre o meu peso, decidi usar isso na minha profissão. Nas redes sociais, me tornei o 'Nutricionista gordo'. Estava cansadoapostar online ao vivoexplicar que ser nutricionista e ser gordo não é um crime. Muitos ironizam esse fato e acham que é um atestadoapostar online ao vivoincompetência.
Quando mudei meu nome nas redes, muitos pacientes passaram a me procurar justamente por causa do modo como me defino, por se sentirem mais à vontade. Me impressiona que isso atinge bastante gente, até mesmo alunosapostar online ao vivonutrição e medicina, principalmente aqueles que também são gordos. Uma médica gorda me procurou e me contou que sofre gordofobia no serviço. Ela me perguntou como eu lido com isso, porque é algo que a incomoda muito.
Pode ser muito difícil para algumas pessoas mudarem seus conceitos sobre o fatoapostar online ao vivoum nutricionista ser gordo. Mas é importante entender que isso não é um atestadoapostar online ao vivoincompetência. O importante é compreendermos que uma alimentação saudável não se resume à busca pelo emagrecimento. Além disso, acho fundamental que as pessoas entendam que a obesidade precisa ser vista com mais respeito."
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