Prisão após 2ª instância: pobres prejudicados e ricos beneficiados? A guerrawww betano denúmeros no julgamento:www betano de
A questão sobre o impacto no ritmo do encarceramento é a principal.
Para os defensores da prisão após a segunda instância (chamadawww betano deexecução provisória da pena), a medida ajudou a desacelerar o crescimento no númerowww betano depresos a partir do momentowww betano deque foi autorizada pelo STF,www betano de2016.
O argumento foi apresentado pelo ministro Luís Roberto Barrosowww betano deseu voto, já proferido no dia 23www betano deoutubro.
Quem defende a prisão apenas depoiswww betano deesgotados todos os recursos (o chamado trânsitowww betano dejulgado) argumenta que este efeito não existe, e que a execução provisória contribui para aumentar a superlotação nas cadeias.
A redução no ritmo do encarceramento estaria mais relacionada a outros fatores, como as audiênciaswww betano decustódia — quando um juiz verifica a situaçãowww betano decada pessoa anteswww betano deela ir para o presídio.
Dados atualizados pelo Conselho Nacionalwww betano deJustiça (CNJ) na quarta-feira (29) contradizem a argumentaçãowww betano deBarroso:www betano de2015 até hoje, as audiênciaswww betano decustódia evitaram a prisãowww betano dequase 250 mil pessoas - o que teria refreado o aumento da população carcerária.
Em julho deste ano, o Brasil tinha pelo menos 812 mil presos, segundo os dados mais recentes do CNJ.
Recursos mudam muita coisa?
Outra discussão é sobre a taxawww betano desucesso dos réuswww betano deseus recursos no Superior Tribunalwww betano deJustiça (STJ) e no STF.
Se a taxa é ínfima — como destaca a ala pró-prisão após 2ª instância — não há problemawww betano deprender depois da condenação por um tribunalwww betano desegunda instância. Ou seja, se os recursos são pouco eficazes, poucas pessoas iriam para a cadeia apenas para serem soltas depois por decisãowww betano deum tribunal superior.
Já quem defende a prisão depois do trânsitowww betano dejulgado argumenta que o percentual é pequeno, mas nem tanto. E mais importante: o número totalwww betano depessoas atingidas chega à casa dos milhares por ano. Os efeitoswww betano deuma passagem pela cadeia na vidawww betano dealguém são graves, argumentam os defensores dessa posição.
Antes mesmo do começo do julgamento, existia também uma discussão sobre a quantidadewww betano depessoas que poderiam ser soltas caso o STF mude seu entendimento — desde 2016, permite-se a prisão após a segunda instância (veja abaixo).
O Supremo começou a julgar o assunto no dia 17www betano deoutubro. Até agora, sete ministros já votaram e o placar estáwww betano de4 a 3 para a prisão após segunda instância — já votaram desta forma os ministros Alexandrewww betano deMoraes, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso e Luiz Fux.
Os ministros Marco Aurélio Mello (relator do caso), Rosa Weber e Ricardo Lewandowski votaram no sentido contrário, a favor da prisão apenas depois do trânsitowww betano dejulgado.
As falas e votos anteriores dos ministros que ainda não se pronunciaram indicam que o julgamento caminha para um empate,www betano de5 x 5. Se esse cenário se confirmar, caberia ao presidente do Supremo, o ministro Dias Toffoli, o votowww betano dedesempate.
Na semana passada, Toffoli sinalizou que pode adotar a posiçãowww betano deMarco Aurélio, Rosa Weber e Lewandowski. O atual chefe do Supremo apresentou um projetowww betano delei aos presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), cujo objetivo é evitar que os crimes prescrevam enquanto os acusados esperam decisões para seus recursos.
Se o STF mudarwww betano deentendimento no tema, será a terceira vez que isto acontece nos últimos dez anos. Desde a promulgação da Constituição atual,www betano de1988, a regra erawww betano deque réus iam para a cadeia já depois da segunda condenação. Em 2009, o STF reviuwww betano deposição, para passar a exigir o trânsitowww betano dejulgado.
A exigência durou até 2016. Em fevereiro daquele ano, o STF permitiu a prisãowww betano deuma pessoa do Estadowww betano deSão Paulo que ainda tinha recursos pendentes, mudando a jurisprudência. Dez meses depois,www betano dedezembro, a mudança foi consolidada pelos ministros no julgamentowww betano deum recurso com repercussão geral reconhecida, isto é, capazwww betano decriar regra para todos os tribunais do país.
O númerowww betano depresos vai crescer?
O ministro Barroso trouxe um argumento novo para o debatewww betano deseu voto. Usando dados do CNJ, o ministro mostrou que há uma correlação entre a autorização da prisão após segunda instância e uma desaceleração do aumento no númerowww betano depresos no Brasil.
Não é que a população carcerária tenha diminuído — mas o ritmowww betano deque ela aumentou foi menor a partirwww betano de2016, quando o STF adotou a regra atual, disse Barroso.
A população carcerária estava crescendo num ritmo maior até 2016, período no qual o STF exigia o trânsitowww betano dejulgado. A partir daquele ano, a taxawww betano deaumento diminuiu.
"Note-se bem: entre 2009 e 2016, períodowww betano deque vigorou a proibição da execução após o 2º grau, a médiawww betano deaumento anual do nívelwww betano deencarceramento foiwww betano de6,25%. Após 2016, quando volta a possibilidadewww betano deexecução após o 2º grau, essa média caiu para menoswww betano de1/3 (um terço): 1,46%", escreveu o ministrowww betano deseu voto.
Barroso foi cauteloso ao dizer que não tiraria "consequências apressadas" dos números, mas apresentou duas possíveis explicações para a correlação.
Os tribunais da segunda instância podem ter ficado mais cautelosos na horawww betano demandar prender, sabendo que a decisão seria cumprida imediatamente. Ou talvez, com a certeza da pena provocada pela prisãowww betano desegunda instância, "criminosos potenciais refrearam seus instintos", segundo escreveu ele no voto.
Pessoas que defendem a prisão apenas depois do trânsitowww betano dejulgado discordam das hipóteses apresentadas por Barroso. Segundo esse grupo, não é possível dizer que a mudança do STFwww betano de2016 tenha diminuído o ritmo das prisões.
Para o defensor público do Estado do Rio Pedro Carriello, a queda pode estar relacionada às audiênciaswww betano decustódia.
"Não dá para afirmar isso. É uma ilação. Se por exemplo, há uma queda no númerowww betano dehomicídios, eu posso dizer que isso se deu porque o Congresso vai aprovar um projetowww betano delei para aumentar as penas. São ilações", diz ele, que atuawww betano denome da Defensoria do Estado do Rio nos tribunais superiores (como o STJ e o STF).
"O principal pode ser o que os ministros (Dias) Toffoli e (Ricardo) Lewandowski falaram. Que a diminuição talvez tenha ocorrido com a presença das audiênciaswww betano decustódia. Ou seja, há uma prisãowww betano deflagrante, e,www betano defunção das audiênciaswww betano decustódia, tenham ocorrido solturaswww betano devários processos", disse Carriello à BBC News Brasil.
Causa e efeito
Durante o próprio votowww betano deBarroso, Toffoli pediu um aparte para lembrarwww betano deiniciativas do CNJ que beneficiaram "exatamente aqueles mais pobres e mais carentes". Lewandowski acrescentou que as audiências com juízes antes da prisão "contribuíram para diminuir o númerowww betano deencarcerados substancialmente".
As audiênciaswww betano decustódia passaram a ser realizadaswww betano detodo o paíswww betano de2015, na gestãowww betano deLewandowski como presidente do STF e do CNJ.
Até setembro deste ano, foram realizadas 557 mil reuniões deste tipowww betano detodo o país,www betano deacordo com dados divulgados pelo CNJ na última quarta (30). Ewww betano de222,4 mil casos, os réus foram soltos — porque o juiz constatou que havia algowww betano deilegal na prisão. Em outros 23,1 mil casos, a cadeia foi substituída por penas alternativas.
Professor da FGV Direito Rio, Ivar Hartmann recomenda cautela ao afirmar relaçõeswww betano decausa e efeito entre determinada medida e um fenômeno.
"Na verdade, quem faz pesquisa sabe que chegar a uma afirmação sobre causalidade, do tipo 'A causou B' é algo extremamente complicado. Em determinadas áreas, as pessoas passam décadas fazendo pesquisa para poder se sentir confortáveiswww betano dedizer que 'A causou B'. E tem quem entenda quewww betano deciências humanas (como o Direito), isto é impossível", diz.
"Agora, correlação é outra coisa. Dizer que 'A anda junto com B'. Porque é outra coisa? Por que pode ser que na verdade C tenha causado A e B, que evoluíram juntas", pontua ele. Hartmann foi coordenador do projeto Supremowww betano deNúmeros.
Os recursos realmente importam?
Em seu voto, Barroso também levantou outro ponto que costuma ser defendido pelas pessoas que são a favor da prisãowww betano desegunda instância: owww betano deque é muito pequeno o percentualwww betano derecursos aceitos pelo STJ e pelo STF. Portanto, não vale a pena alterar uma regra geralwww betano derazão um número tão diminutowww betano decasos.
Barroso mencionou dados levantados pelo próprio STF, a seu pedido.
No Supremo, disse ele, 97,2% dos recursos foram recusados nos últimos dez anos. "Estamos falandowww betano demenoswww betano de1%www betano derecursoswww betano defavor da defesa", escreveu o ministrowww betano deseu voto.
"Exigir o trânsitowww betano dejulgado significa prolongar os processos por causawww betano deum percentual mínimo, submetendo a regra geral — que é a manutenção da condenação — à exceção", escreveu ele.
O mesmo padrão se verificaria no STJ:www betano desetembrowww betano de2015 a agostowww betano de2017, apenas 1,02% dos recursos resultouwww betano desubstituição da prisão por penas alternativas (como serviço comunitário), ewww betano deapenas 0,62% dos casos ocorreu a absolvição.
Os defensores do trânsitowww betano dejulgado não contestam que o percentual seja pequeno, do pontowww betano devistawww betano deuma política pública. Mas dizem que, quando considerados os números absolutos, percebe-se que uma quantidade grandewww betano depessoas foi para a cadeiawww betano deforma desnecessária.
O defensor público-geral federal Gabriel Faria Oliveira mostra dados compilados pelo STJ:www betano desetembrowww betano de2015 a agostowww betano de2017, as duas turmas criminais do tribunal fizeram um totalwww betano de68.944 decisões sobre recursos deste tipo.
Dessas, cercawww betano de40% eram relativas a pessoas representadas pela Defensoria Pública, e os percentuais são os seguintes: 1,2%www betano deabsolvições; 1,87%www betano desubstituição da prisão por penas alternativas; e 1,1%www betano decasos nos quais foi reconhecida a prescrição do crime (com anulação do processo).
"(Somando os percentuais) estamos falandowww betano de3,5% ou 4%, aproximadamente, daquele totalwww betano de69 mil decisões, que representaram a soltura da pessoa. Daria cercawww betano de2,7 mil pessoas,www betano dedois anos", disse o chefe da Defensoria Pública da União à BBC News Brasil.
"Em termoswww betano depolítica pública,www betano deproporção, que é o que o ministro (Barroso) analisou, o número é pequeno? É. Mas o que eu defendi no STF é que uma só pessoa encarcerada ilegalmente já faz incidir a perspectiva da garantia constitucional. E nos parece que o que a Constituição determina é a prisão somente depois do trânsitowww betano dejulgado", diz Oliveira.
"A verdade é que, ainda que o percentual seja pequeno, nós encontraremos milhareswww betano decasos por anowww betano depessoas que cometeram pequenos delitos e que foram mandadas para um sistema prisional que, na nossa opinião, (...) tem o potencialwww betano deprofissionalizar estas pessoas ao crime. As organizações criminosas fazem parte hoje do sistema penitenciário, e o Estado reconhece isso", diz ele.
Quantas pessoas podem ser soltas caso o STF mudewww betano deposição?
Segundo Ivar Hartmann, da FGV Direito Rio, o primeiro número contestado neste debate foi owww betano dequantas pessoas poderiam ser soltas com uma mudançawww betano deregra do STF — uma polêmica que está hoje superada.
Antes do começo do julgamento, reportagens chegaram a mencionar o númerowww betano de190 mil presos liberados. Apenas na terça-feira daquela semana (16www betano deoutubro), o CNJ retificou a informação: há até 4.895 pessoas hoje presas que poderiam sair da cadeia — são réus que estão na cadeia exclusivamente por causawww betano demandadoswww betano deprisãowww betano detribunaiswww betano desegunda instância, e não são alvoswww betano deprisão preventiva, por exemplo.
A confusão ocorreu porque o primeiro número,www betano de190 mil, inclui todas as pessoas presas e já sentenciadas sem trânsitowww betano dejulgado, inclusive aquelas que foram condenadas apenaswww betano de1ª instância, e estão presas preventivamente.
Hartmann avalia que as pessoas presas preventivamente, o que pode acontecer antes mesmo do fim do inquérito policial, deveriam ser o verdadeiro focowww betano depreocupaçãowww betano dejuristas da corrente "garantista". Esses casos representam cercawww betano de41,5% dos 812 mil presos do país, disse ele à BBC News Brasil, citando os dados mais recentes do CNJ.
À BBC News Brasil, o CNJ ressaltou que o númerowww betano de4.895 possíveis solturas deve ser lido com cuidado:www betano dedeterminados casos, os juízes podem manter algumas dessas pessoas presas.
"É relevante observar que,www betano deuma eventual decisão do plenário do STF diversa do entendimento atual, nem todo o universo dos 4.895 presos seria beneficiado. Isso porque continuaria sendo possível aos juízos, avaliando as peculiaridadeswww betano decada caso, sob a égide do mesmo artigo 312 do CPP, (Códigowww betano deProcesso Penal) determinar a prisão cautelar", disse o CNJ,www betano denota.
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