Brasileiros nascem mais entre março e maio, mas razão intriga cientistas:codigo boas vindas betano

Barrigascodigo boas vindas betanotrês mulheres grávidas

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Ano a ano, o padrão se repete: nascem mais brasileiroscodigo boas vindas betanomarço a maio e menoscodigo boas vindas betanonovembro a dezembro

Quando a bióloga e matemática americana Micaela Elvira Martinez, professora da Escolacodigo boas vindas betanoSaúde Pública da Universidadecodigo boas vindas betanoColumbia, olhou os dados brasileiros pela primeira vez, ficou perplexa: "Eu fiquei extremamente surpresa: 'uau, eles (brasileiros) têm uma sazonalidadecodigo boas vindas betanonascimentos muito forte".

Gráficocodigo boas vindas betanobarras mostra o número médiocodigo boas vindas betanonascimentos diáriocodigo boas vindas betanocada mês, no acumuladocodigo boas vindas betano1997 a 2017
Legenda da foto, Fonte: Sinasc/Ministério da Saúde

A "sazonalidade" citada por Martinez se refere ao comportamento "sazonal" dos nascimentos por apresentam mesescodigo boas vindas betanopico ecodigo boas vindas betanobaixa que se repetem ano após ano da mesma maneira.

É um fenômeno observado na maioria dos países do mundo. O que muda são os mesescodigo boas vindas betanoque ocorre a alta e a baixa, bem como a diferença entre o númerocodigo boas vindas betanonascimentos nesses dois pontos.

"Se não houvesse sazonalidade, todo mês nasceria uma quantidade equivalentecodigo boas vindas betanopessoas", explica Morvancodigo boas vindas betanoMello Moreira, da Fundação Joaquim Nabuco, um dos únicos pesquisadores brasileiros que se debruçou sobre esse tema.

A particularidade do Brasil - que deixou Martinez surpresa - é que o país é um dos casos com maior sazonalidadecodigo boas vindas betanonascimentos conhecida.

"Na maioria dos Estados americanos, nós vemos uma diferençacodigo boas vindas betano6% a 8% entre o mêscodigo boas vindas betanopico (com maior númerocodigo boas vindas betanonascimentos) e o mêscodigo boas vindas betanovale (com menor número), comparado com os cercacodigo boas vindas betano20% que vocês têm", diz a professoracodigo boas vindas betanoColumbia, que já analisou dadoscodigo boas vindas betanomaiscodigo boas vindas betanouma centenacodigo boas vindas betanopaíses.

Mas a ciência ainda não sabe por que isso acontece - nem no Brasil, nem nos outros países. "Até hoje a gente não tem muita certeza, não podemos afirmar com segurança qual é a causa", diz Moreira.

"Essa é uma grande perguntacodigo boas vindas betanoaberto", acrescenta Martinez, PhDcodigo boas vindas betanoBiologia Evolutiva e Ecologia. "(A sazonalidade dos nascimentos) é um fenômeno conhecido há muito tempo, há relatos com maiscodigo boas vindas betanoum século. Então, é surpreendente que nós ainda não tenhamos a resposta definitiva para uma pergunta tão fundamental para nossa espécie."

Uma das hipóteses é que o ciclocodigo boas vindas betanonascimentos é provocado por mudanças no comportamento sexual ao longo do ano. Entram aí, por exemplo, um possível aumento da frequênciacodigo boas vindas betanorelações sexuais no inverno ou a abstinência por motivos religiosos no período da quaresma.

Outra hipótese é que a fertilidade humana pode aumentar ou diminuircodigo boas vindas betanoacordo com as mudanças nas condições ambientais ao longo do ano - principalmente, a quantidadecodigo boas vindas betanoluz natural e a temperatura.

Porém, ressalta Martinez, é preciso muito mais estudos para testar essas e outras hipóteses. "Essa é realmente uma questãocodigo boas vindas betanoaberto".

Gráficocodigo boas vindas betanolinhas mostra a evolução mês a mês, desde 1997 até 2017, do número totalcodigo boas vindas betanonascimentos
Legenda da foto, Fonte: Sinasc/Ministério da Saúde. Todos os anos, o númerocodigo boas vindas betanonascimentos aumentacodigo boas vindas betanomarço a maio e caicodigo boas vindas betanonovembro a dezembro; queda récordecodigo boas vindas betanonovembrocodigo boas vindas betano2017 é reflexo do adiamento da gravidez após a epidemiacodigo boas vindas betanozika

Região Norte é exceção

A altacodigo boas vindas betanonascimentoscodigo boas vindas betanomarço e quedacodigo boas vindas betanonovembro ocorrecodigo boas vindas betanotodo o Brasil, exceto na região Norte.

Nos Estados da Amazônia, os nascimentos são mais distribuídos ao longo do ano, com dois picos pouco acentuados: o principalcodigo boas vindas betanosetembro e outro mais levecodigo boas vindas betanomarço. Dessa forma, nas últimas duas décadas, a diferença entre o númerocodigo boas vindas betanonascidoscodigo boas vindas betanomarço e dezembro foicodigo boas vindas betanoapenas 5% na região - bem abaixo da média nacional,codigo boas vindas betano17%.

No outro extremo, estão Nordeste e Sudeste, com as maiores sazonalidades do país. Nessas regiões, a diferença entre o númerocodigo boas vindas betanonascimentoscodigo boas vindas betanomarço e dezembro alcançou 20%, no mesmo período.

"Eu nunca tinha ouvido falar disso, mas faz sentido. No começo do ano, tem muita gente grávida. Só no meu trabalho e na igreja tem umas quatro meninas para ganhar neném", diz Karine Fernandacodigo boas vindas betanoAlmeida,codigo boas vindas betanoBrasilândia, zona nortecodigo boas vindas betanoSão Paulo, grávidacodigo boas vindas betanosete mesescodigo boas vindas betanoPedro. O parto está previsto para abril - o meio do períodocodigo boas vindas betanopico.

"Tem lógica (que nasçam mais pessoas nessa época), porque no inverno rola mais clima (de namoro). No verão, com esse calor, ninguém quer ficar junto", brinca Karine.

O Estado onde a sazonalidade é mais forte é a Bahia, com 26% mais nascimentoscodigo boas vindas betanomarço quecodigo boas vindas betanodezembro.

Na principal maternidadecodigo boas vindas betanoSalvador, a Maternidadecodigo boas vindas betanoReferência Professor José Mariacodigo boas vindas betanoMagalhães Netto, a altacodigo boas vindas betanopartos entre março e maio chamou tanto a atenção dos profissionaiscodigo boas vindas betanosaúde da instituição que chegou-se a considerar que esse quadro poderia ser frutocodigo boas vindas betanoum aumento nas concepções durante as festas juninas - associação posteriormente descartada por faltacodigo boas vindas betanoevidências científicas.

Em alguns pontos do Brasil, o fenômeno é ainda mais forte, como na pequena Feira da Mata, cidade baianacodigo boas vindas betano6 mil habitantes, a cercacodigo boas vindas betano800 quilômetroscodigo boas vindas betanoSalvador. Nos últimos anos, Feira da Mata teve mais que o dobrocodigo boas vindas betanonascimentoscodigo boas vindas betanomarçocodigo boas vindas betanorelação a dezembro.

A diferença fica visível no negóciocodigo boas vindas betanoMadson Ravany, sócio da Mundo Encantado Festas, que aluga materiais para festascodigo boas vindas betanoaniversário na cidade. Segundo ele, o movimento entre os mesescodigo boas vindas betanomarço a maio é três vezes maior que o visto no final do ano.

Outro reflexo se dá na única escola estadual da cidade, o Colégio Filomena Pereira Rodrigues. Entre os alunos, há um número muito maiorcodigo boas vindas betanoaniversárioscodigo boas vindas betanomarço a maio do quecodigo boas vindas betanooutubro a dezembro.

"Talvez seja porque aqui é muito calor e o pessoal espera ficar mais fresco para namorar. E no Carnaval o pessoal usa muito preservativo", aposta,codigo boas vindas betanotomcodigo boas vindas betanobrincadeira, Davi Dias Rocha, vice-diretor do colégio. Ele levantou os dados dos aniversários na escola a pedido da BBC. "Eu nunca tinha imaginado que era assim".

Karine Fernanda grávidacodigo boas vindas betanosete mesescodigo boas vindas betanoPedro, na maternidade do Hospital Vila Nova Cachoeirinha, Zona Nortecodigo boas vindas betanoSão Paulo
Legenda da foto, Karine Fernanda, grávidacodigo boas vindas betanosete mesescodigo boas vindas betanoPedro, na maternidade do Hospital Vila Nova Cachoeirinha, Zona Nortecodigo boas vindas betanoSão Paulo

Hipóteses ainda não confirmadas

Mudanças na atividade sexual ao longo do ano são,codigo boas vindas betanofato, uma das hipóteses para explicar a sazonalidade dos nascimentos, diz Martinez, da Universidadecodigo boas vindas betanoColumbia. Outra hipótese importante são mudanças na fertilidade.

"Esses são os dois principais fatores. É possível que, ao longo do ano, a quantidadecodigo boas vindas betanoatos sexuais desprotegidos varie. E também é possível que homens e mulheres apresentem mudanças sazonais na fertilidade, que nós não percebemos", explica.

A combinação desses dois fatores explica por que a sazonalidadecodigo boas vindas betanonascimentos é bastante comum entre espéciescodigo boas vindas betanoanimais, segundo Martinez. "Muitos animais só se reproduzem e são férteis ao longocodigo boas vindas betanouma pequena janelacodigo boas vindas betanotempo no ano."

Dessa forma, os filhotes acabam nascendocodigo boas vindas betanoperíodos específicos - que podem ser estações com mais comida, clima mais favorável à sobrevivência, menor incidênciacodigo boas vindas betanodoenças oucodigo boas vindas betanopredadores.

Assim, é possível que, há milhares ou milhõescodigo boas vindas betanoanos, questões como essas também tenham sido importantes para a espécie humana. O resultado pode ter sido alteração na fertilidade e nos hábitos sexuais nas diferentes estações do ano.

"Então, a ideia é que, talvez, os humanos não sejam tão diferentes dos animais. Apesar das mulheres ovularem todos os meses e serem capazescodigo boas vindas betanoengravidarcodigo boas vindas betanoqualquer momento do ano, e os homens produzirem espermatozoides continuamente, pode haver diferenças na fertilidade ao longo do ano. E isso é algo que nós ainda não sabemos", completa a bióloga e matemática.

Gráficocodigo boas vindas betanolinhas mostra a curvacodigo boas vindas betanonascimentos mês a mêscodigo boas vindas betanocada região do país; região Norte é a única com curva diferente
Legenda da foto, Região Norte é a única do Brasil com uma curvacodigo boas vindas betanonascimentos diferente, com dois picos: umcodigo boas vindas betanomarço a maio, outrocodigo boas vindas betanosetembro e outubro

Relação entre latitude e mês com mais nascimentos

Em um estudo publicadocodigo boas vindas betano2014 no periódico científico Proceedings of the Royal Society, Martinez e outros pesquisadores organizaram uma basecodigo boas vindas betanodados com milhõescodigo boas vindas betanonascimentos ocorridos no hemisfério Norte nas últimas décadas.

Ao analisar essas informações, os cientistas identificaram uma correlação entre latitude e mês do anocodigo boas vindas betanoque nascem mais pessoas. Quanto mais ao norte, mais os picoscodigo boas vindas betanonascimentos tendiam a ocorrer no começo do ano.

A maioria dos países europeus, por exemplo, têm um maior númerocodigo boas vindas betanonascimentoscodigo boas vindas betanomaio. Já nos Estados Unidos, localizadocodigo boas vindas betanouma latitude ao sul da Europa, o picocodigo boas vindas betanonascimentos é um pouco mais tarde, entre julho e setembro - um estudocodigo boas vindas betanoum professorcodigo boas vindas betanoHarvard identificou que 16codigo boas vindas betanosetembro era o diacodigo boas vindas betanoaniversário mais comum entre os americanos.

Mas como a mudançacodigo boas vindas betanolatitude poderia interferir nos nascimentos?

A duração do dia e da noite variacodigo boas vindas betanoacordo com a latitude. Regiõescodigo boas vindas betanolatitudes distantes do Equador têm noites mais longas e dias mais curtos - e vice-versa, dependendo da estação do ano. Jácodigo boas vindas betanolocais próximos do Equador, a duração do dia e da noite muda muito pouco ao longo do ano.

Dessa forma, a latitude interfere na quantidadecodigo boas vindas betanoluz natural disponível. Além disso, a latitude também influencia na temperatura. A hipótese, então, é que mudanças nessas condições poderiam alterar a fertilidade humana - mas, novamente, nada disso foi provado.

O estudo da equipecodigo boas vindas betanoMartinez não analisou dados do hemisfério Sul. Mas, desde o ano passado, a pesquisadora passou a trabalhar com dados brasileiros,codigo boas vindas betanocolaboração com a Universidadecodigo boas vindas betanoSão Paulo. Assim, espera entender se a correlação entre latitude e mêscodigo boas vindas betanopicocodigo boas vindas betanonascimento também se repete por aqui.

"Esse é um dos motivos que me fizeram ficar surpresa com os dados sobre os Estados da Amazônia no Brasil. Nessa região, os dias são muito constantes, cercacodigo boas vindas betano12 horascodigo boas vindas betanodia e 12 horascodigo boas vindas betanonoite, ao longocodigo boas vindas betanotodo ano. E nessa região os nascimentos são menos sazonais", diz a pesquisadora.

Mulher grávida olhando para a barriga

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Mudanças no comportamento sexual e no ambiente (como quantidadecodigo boas vindas betanoluz e temperatura) são algumas das hipóteses para explicar a variação dos nascimentos no ano

Influência da escolaridade da mãe

Mas como explicar que a maior parte do Brasil tenha o mesmo calendáriocodigo boas vindas betanonascimentos, sendo que as regiões são tão diferentes entre si? Para Moreira, da Fundação Joaquim Nabuco, isso é um enigma.

"O Brasil tem dimensões continentais, variabilidadecodigo boas vindas betanoclima, uma população volumosa e muito diferenciada. As sociedades do Sul e do Centro-Oeste são muito diferentes. O clima das duas regiões também. Mesmo assim, elas guardam essa similaridade nos nascimentos. Não conseguimos ter uma explicação para isso", diz.

O pesquisador analisou os dados brasileiroscodigo boas vindas betanodetalhes. Além da região Norte, encontrou apenas uma segunda variável que modifica significativamente o padrão dos nascimentos no Brasil: a escolaridade da mãe.

Entre 1997 e 2017, filhoscodigo boas vindas betanomães sem nenhuma instrução nasceram 30% maiscodigo boas vindas betanomarço do quecodigo boas vindas betanodezembro. Já no casocodigo boas vindas betanomães com nível superior, a diferença no númerocodigo boas vindas betanonascimentos nesses dois meses foicodigo boas vindas betanoapenas 10%.

Para Martinez, da Universidadecodigo boas vindas betanoColumbia, isso pode estar relacionado ao planejamento familiar - mulheres com maior escolaridade usam mais métodos contraceptivos. Uma formacodigo boas vindas betanotestar essa hipótese seria verificar como eram os nascimentos no Brasil antes da existênciacodigo boas vindas betanoanticoncepcionais. Porém, faltam dados antigos - as primeiras informações são da décadacodigo boas vindas betano1990.

Em países que têm estatísticas anteriores, como os Estados Unidos, os pesquisadores verificaram que, no passado, a variação dos nascimentos ao longo do ano era ainda maior. "Nos anos mais recentes, a sazonalidade dos nascimentos está diminuindo e ficando cada vez mais fraca. E isso pode ser uma consequênciacodigo boas vindas betanohaver cada vez mais planejamento familiar", diz a bióloga americana.

Pela faltacodigo boas vindas betanoestatísticas do século passado, não sabemos se isso também está ocorrendo no Brasil. Se estiver, então é possível que, um dia no futuro, os bebês concebidos no inverno brasileiro deixemcodigo boas vindas betanoser a maioria.

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