Guerraroleta bfacções torna Rio Branco, no Acre, a capital onde homicídios mais aumentam no Brasil:roleta b
A principal explicação para esse crescimento é uma guerra entre facções criminosas para controlar rotasroleta btráficoroleta bdroga na Amazônia, que se agravou justamente a partirroleta b2016.
Só no Acre, são maisroleta b1,4 mil quilômetrosroleta bfronteira com Bolívia e Peru, países produtoresroleta bcocaína. A geografia facilita para o tráfico: a maior parte do território é formada por floresta fechada, cortada por um labirintoroleta brios e com pouca fiscalização.
"Antes, quem matava e quem morria no Acre eram conhecidos. Eram brigasroleta bbar, bebedeira, traição, crimesroleta bímpeto. Agora, não mais. São mais casosroleta bexecução, com requinteroleta bcrueldade. É facção criminosa matando facção rival. É lamentável o que está ocorrendo", afirma o promotor Rodrigo Curti, com 14 anosroleta batuação no Tribunal do Júri do Acre.
"São tragédias sociais, semelhantes aos atosroleta bterrorismo praticado pelo (grupo extremista autodenominado) Estado Islâmico", considerou o juiz Leandro Leri Gross, na sentençaroleta bJoalyson da Silva.
A Secretariaroleta bSegurança do Acre foi procurada pela BBC Brasil por uma semana para falar sobre o assunto, mas não respondeu. Já a Secretariaroleta bPolícia Civil afirmou, via nota, que "o Estado do Acre vem experimentando o acirramentoroleta buma guerra entre grupos criminosos que tentam se consolidar e dominar o mercado do comércio varejista e atacadistaroleta barmas, drogas e produtos receptados".
De cidade pacata a capital da violência
Rio Branco é uma das menores capitais do Brasil, com 380 mil habitantes. Com tamanhoroleta bcidaderoleta binterior,roleta brotina já foi aroleta buma cidade pacata. Para enfrentar o calor amazônico, era comum colocar cadeirasroleta bfrenteroleta bcasa, conversar com vizinhos, ver a vida passar.
Mas, ao longo dos anos, as pessoas trocaram o ladoroleta bfora pelo ladoroleta bdentroroleta bcasa, colocaram grades nas janelas, aumentaram os muros. Hoje, moradores e autoridades relatam que há bairros inteiros controlados por facções.
As estatísticas são a prova dessa transformação. Até 2015, a taxaroleta bhomicídioroleta bRio Branco era equivalente à do conjunto das capitais do Brasil - 34 por 100 mil habitantes. No ano seguinte, saltou para 62 por 100 mil, colocando Rio Branco entre as cinco capitais mais violentas do país. Para comparação, a taxaroleta bSão Paulo é inferior a 15 por 100 mil.
O anoroleta b2016 foi só o começo. Em 2017, a taxaroleta bhomicídiosroleta bRio Branco deve ultrapassar 75 por 100 mil habitantes,roleta bacordo com o númeroroleta bassassinatos registrado até novembro pelo Observatórioroleta bAnálise Criminal, do Ministério Público do Acre. Pode ser a maior entre todas as capitais brasileiras no ano passado,roleta bacordo com projeções feitas pela BBC Brasil - os números oficiais devem ser divulgados no final deste ano.
Neste ano, a ondaroleta bviolência continua. A jornalista acreana Lília Camargo, especializadaroleta bcobertura policial, está fazendo a contagem das mortes. Todas as semanas, ela reúne informações primáriasroleta bdiversas fontes - entre elas, nos 30 gruposroleta bWhatsApp que administra - e depois confere os dados com autoridades policiais.
O motivo desse trabalho? "Temos dificuldade para conseguir dados na Secretariaroleta bSegurança Pública. Sem essa lista, a gente perde o controleroleta bquantas pessoas estão morrendo", explica Lília.
Só nas duas primeiras semanas do ano, a lista da jornalista mostra 20 pessoas assassinadasroleta bRio Branco. Pode parecer pouco. Mas, guardadas as proporções, é como se 632 homicídios tivessem ocorridoroleta bSão Pauloroleta b14 dias. De fato, esse foi o númeroroleta bvítimasroleta bassassinato na capital paulista, mas ao longoroleta b11 meses,roleta bjaneiro a novembroroleta b2017.
Disputaroleta bfacções na Amazônia
A chave para entender essa explosãoroleta bviolência não está no Acre, mas no Sudeste. Em 2016, as principais facções do país, o PCC,roleta bSão Paulo, e o Comando Vermelho, do Rioroleta bJaneiro, racharam.
Acredita-se que, a partir daquele ano, o PCC tenha passado a controlar rotasroleta bentradaroleta bdroga do Paraguai para o Brasil. Isso teria acirrado a disputa por rotas alternativas. A Amazônia brasileira entrou então no foco do tráfico.
"A curvaroleta bhomicídios no Acre, a partirroleta b2016, reflete muito bem a cisão das organizações criminosas", afirma o promotor Bernardo Albano, coordenador do Gruporoleta bAtuação Especial no Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do Acre.
De acordo com especialistasroleta bsegurança pública, a disputa pelo tráfico na Amazônia contribuiu para o aumento da violênciaroleta bdiversos Estados da Região Norte. Mas foi no Acre que o númeroroleta bhomicídios cresceu mais. Por quê?
"É a situação inversaroleta bSão Paulo. Em São Paulo, não há esses números porque o PCC dominou tudo, não tem confronto. No Amazonas, também há uma facção dominante. Já no Acre, há um equilíbrioroleta bforças entre as facções beligerantes. Isso gera uma disputa sangrenta entre elas", afirma Albano.
Segundo o Observatórioroleta bAnálise Criminal do Acre, ligado ao Ministério Público, drogas e acertoroleta bcontas teriam sido as motivaçõesroleta b14% dos homicídios ocorridos no Estadoroleta b2013 - 33 casos. O percentual subiu para 49%roleta b2017 - 236 casos. É um crescimentoroleta bseis vezesroleta bquatro anos.
Além das mortes na disputa do tráfico, a Ouvidoria da Secretariaroleta bDireitos Humanos do Acre tem recebido denúncias contra policiais. Segundo o Anuárioroleta bSegurança Pública, o númeroroleta bmortes decorrentesroleta bintervenção policial no Acre subiuroleta b10 para 25 entre 2015 e 2016. Também "há denúnciasroleta bmortes provocadas por membros do poder público e atribuídas a facções", afirma o ouvidor Valdecir Nicácio.
Essa não é a primeira vez que o Acre ganha destaque nacional devido à violência. No final dos anos 1990, o coronel da PM e então deputado federal Hildebrando Pascoal foi acusadoroleta bchefiar a organizaçãoroleta bum esquadrão da morte, e condenado por homicídio, formaçãoroleta bquadrilha e narcotráfico.
Seu crime mais notório foi a morte do mecânico Agílson Firmino, cujo corpo foi esquartejado com uma motosserra. O filhoroleta bFirmino,roleta b13 anos, também foi morto. Além disso, duas testemunhas foram assassinadas.
"Em 1999, o Acre conseguiu desbaratar o crime organizado, na figura do Hildrebrando Pascoal. Achávamos que não precisávamos fazer mais nada. Aí, o crime avançou novamente", afirma um membro do governo do Acre,roleta banonimato.
Buscas, urubus e investigação
A acreana Déborah Freitas,roleta b19 anos, fez parte do Bonde dos 13 por dois anos. Até que decidiu sair: "Meu nome é Déborah, meu vulgo é Barbiie beeck, e eu tô saindo fora do Bonde dos 13 agora", disse,roleta bvídeo gravado com celular no começo deste ano.
Segundo a família, Déborah queria construir uma vida nova para ela e o filhoroleta bdois anos. Mas não deu tempo. Poucos dias depois,roleta b13roleta bjaneiro, seu corpo foi encontradoroleta buma cova rasa, dentroroleta buma mata fechada, na periferiaroleta bRio Branco. É uma das vítimas mais recentes da violência na capital do Acre.
Sua morte também foi gravada. As imagens mostram Déborah feita refém, mantida ajoelhadaroleta buma clareira no matagal. Ainda era dia. "Filma, filma", diziam os criminosos, com o rosto coberto, enquanto começavam a decapitar e esfaquear a jovemroleta bforma bárbara. A seguir, um deles exibe a cabeça da vítima para a câmera. O vídeo dura 60 segundos.
"Déborah se dizia integrante do B13, chegou a gravar um vídeo rasgando blusa com o símbolo desse grupo e, ao que parece, estava se relacionando com um integranteroleta boutro grupo criminoso, o CV. Ao que tudo indica,roleta bmorte está ligada ao seu relacionamento com pessoas desses grupos criminosos", afirmou a Secretariaroleta bPolícia Civil, por nota. No vídeo do homicídio, os assassinos exaltavam o Comando Vermelho, rival do Bonde dos 13.
Quem achou o corporoleta bDéborah foi a própria família: a mãe, a irmã, uma prima e o cunhado. Eles começaram a procurá-la depoisroleta bseu desaparecimento. A polícia também fez buscas, mas "ajudou pouco", segundo Sara Freitas, a irmã. "Ninguém se interessaroleta bajudar, porque ela eraroleta bfacção."
Os familiares decidiram, então, persistir por conta própria. Depoisroleta btrês diasroleta bbuscas, a partirroleta bpistas recebidas por ligações anônimas, chegaram ao matagal no bairro Caladinho. Sara viu quatro urubus voando e suspeitou que ali encontraria o corpo da irmã. Ela estava certa. A polícia foi chamada para retirar os restos mortais da jovem.
Por causa do estado do corpo, não houve velório. A perícia fica prontaroleta bfevereiro. "O que eu quero é que as autoridades tomem providências. Nada vai trazer elaroleta bvolta", diz a irmã.
Dificuldadesroleta binvestigar e controlar as fronteiras
Mas tomar providências não tem sido fácil para as autoridades do Acre. No casoroleta bDéborah, a Secretariaroleta bPolícia Civil diz que identificou, mas não localizou, um adolescente que teria participado do crime. "As dificuldades são enormes, pois ninguém tem informações no local onde foi deixado o corpo - ou teme repassá-las", diz a nota enviada pelo órgão.
"A polícia não está conseguindo investigar. Vivemosroleta bum Estado Amazônico, com uma densidade demográfica muito baixa. As pessoas são mortas nas matas, estradas,roleta blocais onde não há câmeraroleta bsegurança, testemunha. Isso dificulta muito o trabalho da polícia", afirma o promotor Rodrigo Curti.
Tão ou mais difícil que enfrentar os homicídios é combater o tráficoroleta bdrogas na Amazônia. "A cocaína é muito barata nos países vizinhos. O menino sairoleta bmanhã do Acreroleta bmoto e volta à tarde com três quilosroleta bcocaína, sem passar por bloqueio policial, só usando estradas secundárias", afirma Nicácio, da Secretariaroleta bDireitos Humanos do Acre.
As fronteiras são pouco vigiadas, o que faz as autoridades estaduais criticarem o governo federal. "A gente não tem o apoio necessário da União. As fronteiras estão abertas. Os efetivos do Exército, da Polícia Federal, da Polícia Rodoviária Federal são pequenos", afirma Carlos Portela, Secretárioroleta bPolícia Civil do Acre.
Em nota, o Ministério da Justiça e Segurança Pública afirmou que investiu R$ 49,7 milhões no aperfeiçoamento profissional e reequipamento das instituiçõesroleta bsegurança pública do Acreroleta b2017 - tanto para policiamento urbano comoroleta bfronteira. Além disso, disse que repassou mais R$ 16 milhões para construção, reforma e aparelhamento dos presídios, também no ano passado.
Um dos Estados que mais aprisionam no país
Todas as três facções que disputam o território do Acre nasceramroleta bpresídios - masroleta bEstados e anos diferentes. O Comando Vermelho, no Rio,roleta b1979. O PCC,roleta bSão Paulo,roleta b1993. Já o Bonde dos 13 teria surgido no Acreroleta b2013, como uma uniãoroleta bcriminosos locais para fazer frente à chegada das facções do Sudeste. Também é dentro do sistema prisional que ocorrem as principais alianças e cisões entre os grupos criminosos.
O Acre tem a segunda maior taxaroleta baprisionamento do país,roleta b657 para cada 100 mil habitantes, quase o dobro da média nacional - o campeão é Mato Grosso do Sul (697). Também é o Estado com a maior proporçãoroleta bpresos jovens - 45% têm entre 18 e 24 anos. Os dados são do Levantamento Nacionalroleta bInformações Penitenciárias (Infopen 2016).
Em inspeção realizadaroleta b2017, o Conselho Nacionalroleta bJustiça (CNJ) definiu o sistema prisional do Acre como superlotado e disputado por facções criminosas. Das 13 unidades prisionais, dez são "péssimas",roleta bacordo com informações apuradas por juízes criminais e compiladas pelo CNJ. O Institutoroleta bAdministração Penitenciária do Acre não respondeu ao pedidoroleta bentrevista da BBC Brasil.
Como tentativaroleta bconter a força das facções, o Acre instalou bloqueadoresroleta bcelularesroleta bpresídios, introduziu o Regime Disciplinar Diferenciado (RDD) - com maior grauroleta bisolamento eroleta bsegurança - e fez a transferênciaroleta bpresos. Além disso, foi criado o Retina, um sistemaroleta binteligência premiado pelo CNJ - por questõesroleta bsegurança, ninguém fala sobre ele.
"Não é difícilroleta bentender porque estamos vivendo essa ondaroleta bviolência. Vem ordemroleta bfacção eroleta bpresídioroleta bfora do Estado para pessoas praticarem crimes aqui", afirma Portela, secretárioroleta bPolícia Civil.
"O Estado do Acre não é um estudoroleta bcaso a parte. Qualquer lugar do território nacional está enfrentando essa situação. Educação e saúde têm fundos constitucionais previstos. A segurança não tem. Nunca ninguém previu", conclui.
Desde 2014, o Brasil ultrapassou a marcaroleta b60 mil homicídios por ano.