'Trouxeram a cabeça do meu irmãologin estrela betcimalogin estrela betuma bandeja': o drama das famílias das vítimas do massacrelogin estrela betManaus:login estrela bet

Parenteslogin estrela betJ.
Legenda da foto, A uma das irmãslogin estrela betJ. coube a difícil tarefalogin estrela betreconhecer o corpo do parente, liberado dois dias depois do massacre

Todos os parentes temem represálias e pediram anonimato durante as entrevistas.

Legenda do vídeo, 'Tu tem coragemlogin estrela betver a cabeçalogin estrela betteu irmão?'

Bandeja

Um mês depois da tragédia há corpos ainda não reconhecidos no Instituto Médico Legallogin estrela betManaus.

A uma das irmãslogin estrela betJ. coube a difícil tarefalogin estrela betreconhecer o corpo do parente, liberado dois dias depois do massacre. "Trouxeram a cabeça do meu irmãologin estrela betcimalogin estrela betuma bandeja, com um tiro." Outras partes do cadáver foram encontradas dias depois. "Todo furado. A cabeça do lado do ombro. Todo roxo. Como se tivessem batidologin estrela betpau, ferro. Muito feio."

"Vi numa reportagem uma autoridade dizer que lá (no presídio) não tinha nenhum santo", lembra o avô, com os olhos úmidoslogin estrela bettristeza e opacos pela cataratalogin estrela betestágio avançado.

"Ah... se tivesse no mundo um único santo. E se todos nós fôssemos iguais."

O idosologin estrela bet90 anos, delegado aposentado, fazia referência a uma frase dita pelo governador do Amazonas, José Melo (Pros), no dia seguinte à tragédia - e horas antes da neta encarar o rosto dilacerado na bandeja.

Ele repete a frase do político quatro vezes, num ciclo que parece não ter fim, durante a conversa que durou pouco maislogin estrela betuma hora, enquanto escuta a garoa fina do início da noitelogin estrela betuma terça-feira abafada.

"Olha, sou linha dura. Sou do tempo da ditadura. Acho que quem deve tem que pagar, tem que ser preso e viver como preso", diz o senhor, com voz firme.

Presoslogin estrela betManaus

Crédito, EPA

Legenda da foto, Chacinalogin estrela betManaus chocou o país logo na primeira segunda-feira do ano

"Mas não como um porco", faz questãologin estrela betcompletar.

Pão

Na pequena sala colorida, cercadalogin estrela betfotos antigaslogin estrela betfamília, a reportagem pergunta o que teria levado J. ao crime.

"Eu era novinha, éramos muitos irmãos e passávamos muita necessidade. Talvez tenha sido isso que o motivou a fazer o que fazia...", diz a jovem ao lado do avô.

"Roubava comida", ela lembra. "Pão."

J. estava preso no Compaj acusadologin estrela betagressão como reincidente. Nunca completou o ensino fundamental, nem tinha ligação, segundo a família, com facções criminosas. Dentro do presídio, entretanto, a aproximação foi inevitável.

"Há uns seis meses, ele denunciou que um motim iria acontecer para os policiais", conta a irmã. "Sabia que ia morrer e denunciou. Foi considerado 'cagüeta'. O motim acabou não acontecendo e os agentes mandaram ele para o 'seguro'."

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Seguro é como se chamam as alas isoladas dos presídioslogin estrela bettodo o país. Para lá vão os juradoslogin estrela betmorte ou membroslogin estrela betfacções rivaislogin estrela betdesvantagem numérica.

No seguro, onde J. morreu, estavam membros do PCC (Primeiro Comando da Capital), que disputa a rota amazônica do tráfico com a FDN.

A carnificina, segundo o governo do Estado e o Ministério Público, foi a maneira bárbara que a FDN encontrou para demarcar seu território e intimidar os rivais.

Enterro dos corpos

Crédito, SNS

Legenda da foto, 64 pessoas morreram na chacina

Medo

Na terça-feira, 30 dias apos o massacre, o Exército promoveu uma varredura na cadeia pública Raimundo Vidal Pessoa, que abriga sobreviventes da matança no Compaj.

Sem camisa, sentados sob chuva forte, os presos aguardavam no pátio enquanto soldados, munidoslogin estrela betdetectoreslogin estrela betminas terrestres, encontraram 23 celulares e 42 armas brancas escondidos no reboco das paredes das celas.

"A operação foi um sucesso. Usamos o que hálogin estrela betmais moderno. Agora cabe ao governo do Estado continuar este trabalho", comemorou o ministro da Defesa, Raul Jungmann, que acompanhou parte da varredura.

À imprensa, no imponente Comando Militar da Amazônia, Jungmann anunciou uma parceria com o governo colombiano para identificar rotaslogin estrela bettráfico na região da fronteira. Nenhuma autoridade citou a FDN, responsável pelo massacre na prisão.

Nos diaslogin estrela betvisita, quando encontrava a família, J. falava sempre do medo que sentia da Família do Norte.

"Ele falava que estavam ameaçando o pessoal do seguro. Que passavam lá na frente e diziam que iam matar. Eles faziam o gestologin estrela betcortar a cabeça", diz a irmã. "E ele não podia fazer nada."

A família conta que avisou os agentes penitenciários. Não houve reação, e, semanas depois, a ameaça se concretizou.

Jornais e revistas reproduziram imagens da matança, que já circulavam por aplicativoslogin estrela betmensagens e chegaram a ser vendidaslogin estrela betDVDs por camelôs. Foi assim que, pelo celular,login estrela betchoque, familiares reconheceram uma das pernaslogin estrela betJ, marcada por uma velha tatuagem, descolada do troncologin estrela betum corredor úmido.

No mesmo telefone celular, a irmã mostra uma das últimas fotoslogin estrela betJ.login estrela betliberdade, sorrindo sentadologin estrela betuma moto.

O avô se emociona. Diz que a tragédia poderia ter sido evitada se os agentes carcerários tivessem controle sobre os presídios e conseguissem conter a violência dos presos.

Compaj

Crédito, Felipe Souza

Legenda da foto, Preso mostra perna machucada durante chacina no Compaj

O idoso, entretanto, mostra resignação.

"Deus hálogin estrela betperdoar aqueles algozes dele. E para eles dar o descanso. E para as autoridades, vai o meu lembrete: que procurem tratar com mais atenção aqueles menos favorecidos pela sorte."

Retaliação

Duas semanas depois da tragédia no Amazonas, 26 pessoas foram mortaslogin estrela betum novo motim no presídiologin estrela betAlcaçuz, no Rio Grande do Norte.

A polícia investiga uma possível retaliaçãologin estrela betmembros do PCC às mortes registradas nas cadeiaslogin estrela betManaus.

Em resposta à matança, o governo federal anunciou um Plano Nacionallogin estrela betSegurança, com a construçãologin estrela betnovos presídios e a criaçãologin estrela betmaislogin estrela bet30 mil vagas.

A iniciativa gera controvérsia: meses antes do anúncio, o ministro da Justiça, Alexandrelogin estrela betMoraes, afirmou que o Brasil "prende muito e prende mal", sugerindo que penas alternativas poderiam ajudar a resolver o problema das prisões superlotadas.

Em retaliação ao plano do governo, sete membros do Conselho Nacionallogin estrela betPolítica Criminal e Penitenciária (CNPCP) pediram demissão coletiva. Em carta, eles acusaram o governologin estrela betautoritarismo e faltalogin estrela betdiálogo com a sociedade.

A ameaçalogin estrela betnovos motins continua. Enquanto isso, a famílialogin estrela betJ. tenta se reconstruir. "Dei a ele um enterro digno", diz o avô. "Paguei uma funerária e reuni todos os irmãos. O J. foi embora. É uma pena porque não vai ser o último."