Brasil lidera índice internacionalnúmeropartidos - o que isso significa para a crise?:

Painel eletrônico da Câmara,fotoarquivo

Crédito, Ag Câmara

Legenda da foto, Painel eletrônico da Câmara,foto2015; país tem Congresso hiperfragmentado por conta do alto númeropartidos

Para efeitoscomparação, considerando números arredondados, Índia tinha 8; Argentina, 7; Alemanha, 6; México, 4; e Estados Unidos, 2, os conhecidos partidos Democrata e Republicano.

Esse índice é o mais usado para fazer comparações internacionais. A partiruma fórmula que levaconta o número totalcadeiras na Câmara dos Deputados e a quantidadeparlamentares por legenda, calcula-se o númeropartidos que têm votos suficientes para influenciar o resultado das votações.

Há consensoque esse número subiu ainda mais nos últimos anos no país. Segundo cálculo do cientista político Michael Gallagher, especialista no tema da Universidade Trinity, na Irlanda, a quantidadepartidos políticos efetivos no Brasil deu um salto na última eleição, tendo passado112010 para 142014.

Segundo o cientista político Sérgio Abranches, o índice costuma ser um bom parâmetro do que se observa na prática sobre quantos partidos têm,fato, poderinfluenciar e bloquear discussões no Congresso.

Um número muito baixopartidos pode indicar um problemarepresentaçãopaíses como grupos sociais diversificados. Já um índice alto indica maior dificuldade para o presidente formar uma base parlamentar que lhe dê governabilidade.

Propagandaspartidos nanicos

Crédito, Reprodução

Legenda da foto, Todos os partidos, mesmo os nanicos, têm direito a inserções gratuitas na TV

Coalizão cara

Abranches foi quem cunhou, no fim dos anos 1980, o termo "presidencialismocoalizão" para classificar o sistema político brasileiro que nascia com a redemocratização. Ele previa que as grandes desigualdades sociais e regionais do país levariam ao crescimento do númeropartidos, o que obrigaria à legenda vencedora das eleições presidenciais a se aliar com outras para poder governar.

O problema, nota ele, é que as regras eleitorais do país acabaram criando incentivos para a multiplicação dos partidos, levando a uma hiperfragmentação que torna "mais cara" a gestão da coalizão.

"Digo mais cara no sentido técnico da palavra, sem levarconsideração qualquer aspectocorrupção. Exigem-se mais concessões do presidente, tanto no sentidocompartilhar o governo (com cargos), como no sentidoabrir mãoposições programáticas para encontrar uma mediana entre os partidos e implementar um conjuntopolíticas públicas", explica ele.

A necessidadeconciliar muitos interesses e pensamentos diferentes acaba trazendo instabilidade para a coalizão. No caso da presidente afastada Dilma Rousseff, eram constantes os embates entre a base social do PT,geral mais progressista, e partidos aliadosviés mais conservador.

"Isso cria tensões e disputas por espaço. E no caso do governo Dilma tem um outro elemento que é a própria incapacidade, dificuldade da presidentegerenciar essa coalizão. Os ex-presidentes Lula e FHC tiveram uma capacidade maiorfazer isso", afirma a cientista política Denise Paiva, professor da Universidade FederalGoiás.

O presidente interino Michel Temer tem colocado a boa relação com o Congresso como meta primordialseu governo. Ao nomear seus ministros, privilegiou indicações das bancadas parlamentares e usou isso para justificar a ausênciamulheres no primeiro escalão.

Em entrevista à BBC Brasil no iníciomaio, pouco anteso Senado aprovar seu afastamento, Dilma apontou justamente o grande númeropartidos como um elemento que dificultava a governabilidade durante a crise econômica.

"Se você comparar o meu governo com os dois anteriores, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso governava com três, no máximo quatro partidos. Quando começa a expansão do ciclo econômico, não havia partido que desafiasse a popularidade do presidente Lula. Eu já vivo num momentoque o mundo entroucrise. Ora, eu passo a precisar13 partidos, às vezes 14", reclamou.

"E no Brasil você não tem partidos políticos, com exceçãouns três, quatro, que são ideológicos. Os outros partidos formam-se atravésagregação dos interesses os mais diversos. Então eles tendem a se dividir diantefatos concretos", afirmou também.

Mais partidos

Há 35 partidos registrados no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e, portanto, com acesso aos recursos do Fundo Partidário e a tempotelevisão para propaganda - ambos bancados com dinheiro público.

E a listanovas siglas a serem criadas é vasta. No momento, há trêsprocesso mais avançado no TSE: o Partido Liberal, o Partido dos Servidores Públicos e Privados e o Muda Brasil. Além disso, há outras 24 "em formação", também segundo o tribunal.

A maior parte do fundo partidário e do tempoTV é distribuída para partidos com parlamentares eleitos, na proporçãosuas bancadas. No entanto, mesmo siglas nanicas, sem representatividade no Congresso, recebem recursos e espaço gratuitopropaganda.

Para especialistas, isso incentiva a criação"legendasaluguel" - partidos sem relevância social mas que ganham poder ao negociar coligações com siglas maiores que buscam ampliar seu tempotelevisão.

"É importante que a pluralidade da sociedade seja representada no sistema partidário. Agora, nesse universo tão grande35 partidos, eles representam muito mais disputa entre elites, partido pequenos que existem para participardeterminadas coligações e dar nacospoder a certos grupos", critica Paiva.

"Isso cria para o eleitor um problemainteligibilidade. Como ele vai entender quais são as clivagens, as diferenças entre 35 partidos? Na verdade, muitas vezes nem existe (diferença)", ressalta a professora.

Reforma política?

A reforma política - uma grande revisão das regras do sistema político brasileiro - é frequentemente apontada por especialistas como caminho essencial para melhorarmos a democracia brasileira. No entanto, os cientistas políticos entrevistados pela BBC Brasil são céticos quanto a essa proposta e acreditam ser mais viável adotar mudanças pontuais e graduais.

Como as alteraçõeslei necessariamente passam pelo Congresso, é muito difícil que parlamentares eleitos pelas atuais regras aprovem mudanças radicais, com impactos muitas vezes imprevisíveis sobre o resultado das eleições seguintes, ressalta Abranches.

Naavaliação, um medida importante para reduzir a fragmentação partidária seria o fim das coligações nos pleitos proporcionais (eleição para vereadores e deputados). Nesse caso, os partidos se unem para aumentar suas chanceseleger ao menos um deputado federal, garantindo acesso ao Fundo Partidário e ao tempoTV.

"Isso tiraria imediatamente incentivo às legendasaluguel que se coligam a um partido grande para poder dar a ele alguns segundostelevisãotrocaum poucofinanciamento e a possibilidadeeleger eventualmente um ou poucos parlamentares", observa.

Outra proposta seria a adoçãouma "cláusulabarreira" - criaçãoum patamar mínimovotos para permitir que o partido eleja parlamentares e tenha acesso ao Fundo Partidário e tempotelevisão.

O Congresso já chegou a aprovar duas vezes na última década um mecanismo do tipo, mas o Supremo Tribunal Federal considerou o limite inconstitucional, já que a Constituição brasileira prevê o princípio do pluripartidarismo.

Abranches nota que essas restrições tendem a acabar com partidos que, embora menores, têm consistência ideológica, como PSOL e Rede. Nesse caso, diz, a tendência seria que se abrigassem como correntes dissidentes dentrolegendas maiores.