Dolorosa e duradoura, 'chikungunya vai ser surpresa maior que zika’, diz pesquisador:bet dos brasileiros
"O grande desafio para o governo serão essas grandes epidemias. Ainda não sabemos a dimensão do que vai acontecer com a epidemiabet dos brasileiroszikabet dos brasileirosoutras regiões do país", disse à BBC Brasil.
"Mas a chikungunya vai trazer mais surpresas do que a própria zika e a dengue. Como pesquisador, tenho ficado impressionado com seus efeitos."
Enquanto a dengue é capazbet dos brasileirosatingir cercabet dos brasileiros5 a 10%bet dos brasileirosuma população, a chamada "taxabet dos brasileirosataque" da chikungunya pode chegar a 50%, avalia Brito. A zika, cujo percentualbet dos brasileirosatingidos ainda é desconhecido, deve ficar entre as duas, ele estima.
Números subestimados
De acordo com os dados mais recentes divulgados pelo Ministério da Saúde, já são maisbet dos brasileiros64 mil notificaçõesbet dos brasileiroscasosbet dos brasileiroschikungunya até 23bet dos brasileirosabrilbet dos brasileiros2016, contra 38 milbet dos brasileiros2015. Maisbet dos brasileiros11 mil casos foram confirmadosbet dos brasileirostodo o país.
Brito, no entanto, diz acreditar que os números são muito maiores.
"Pernambuco, por exemplo, está dizendo que o maior númerobet dos brasileiroscasos este ano ébet dos brasileirosdengue, mas nós vemos pouquíssima dengue na prática. O maior número ébet dos brasileiroschikungunya, e há uma subnotificação impressionante por uma sériebet dos brasileirosrazões, incluindo despreparo dos profissionais para fazer as notificaçõesbet dos brasileirosforma correta", afirma.
"Com três vírus circulando no país, o modelo da vigilância epidemiológica não consegue ser mais fiel à verdadeira situação da epidemia."
Até o dia 24bet dos brasileirosmaio, Pernambuco registrou maisbet dos brasileiros30 mil casos notificadosbet dos brasileiroschikungunya e cercabet dos brasileiros75 milbet dos brasileirosdengue, segundo a Secretariabet dos brasileirosSaúde do Estado.
"Quando começaram a aparecer os casosbet dos brasileirosmicrocefaliabet dos brasileirosPernambuco, o Estado tinha 4 casos notificadosbet dos brasileiroszika e 120 milbet dos brasileirosdengue. Destes, provavelmente cercabet dos brasileiros90 mil eram zika. O mesmo deve estar acontecendo agora com a chikungunya."
Em fevereiro, a reportagem da BBC Brasil visitou Vitóriabet dos brasileirosSanto Antão, a 60 kmbet dos brasileirosRecife, e encontrou emergências hospitais e postosbet dos brasileirossaúde superlotados com pacientesbet dos brasileirosarboviroses (grupo que inclui as doenças transmitidas por mosquitos) - o Estado estava no meiobet dos brasileirosseu primeiro surtobet dos brasileiroschikungunya.
Em bairros da cidade, moradores relatavam a rapidez com que a doença se espalhou por famílias e ruas.
"Já passamos do surto, mas os próprios pacientes do interior brincam dizendo que saem nas ruas e parece que estãobet dos brasileirosuma cidadebet dos brasileirosmúmias, porque as pessoas andam com dificuldade", afirma Brito.
Impacto
Ao contrário do que ocorre com a zika, ainda não há evidênciasbet dos brasileirosque o vírus da chikungunya seja transmitido da mãe para os bebês durante a gravidez, segundo o Ministério da Saúde. No entanto, a doença tem suas próprias peculiaridades.
Em seus primeiros dez dias, os sintomas costumam ser febres, fortes dores e inchaço nas articulações dos pés e das mãos. Em alguns casos, ocorrem também manchas vermelhas no corpo.
Mas mesmo com o fim da viremia - períodobet dos brasileirosque o vírus circula no sangue - a dor e o inchaço causados pela doença podem retornar ou permanecer durante cercabet dos brasileirostrês meses. Em cercabet dos brasileiros40% dos casos, eles tornam-se crônicos e podem permanecer por anos.
"A intensidade do sofrimento dos pacientes para mim foi uma surpresa, mesmo que a literatura já falasse disso", diz Brito.
"São pessoas que podem ficar meses sem conseguir trabalhar, com dores muito intensas que não melhoram com analgésicos habituais como dipirona e paracetamol", continua.
"Elas têm dificuldadebet dos brasileirosandar,bet dos brasileirospentear o cabelo,bet dos brasileirostomar banho sozinhas. E isso acontece na parte produtiva da vida, porque a maioria dos acometidos são adultos e idosos. Então além do impacto na qualidadebet dos brasileirosvida, há também um impacto econômicobet dos brasileirosdimensão ainda não calculada."
Depoimento: 'Não sou mais a mesma pessoa'
Peguei chikungunyabet dos brasileirossetembrobet dos brasileiros2014, quando a epidemia começoubet dos brasileirosFeirabet dos brasileirosSantana. Tive febre, dores no corpo e fiquei uma semana afastada com o mal estar. Na época, não fiz o exame sorológico. Me recuperei, mas continuei tendo inchaço no corpo, principalmente as pernas, com frequência. Fiz diversos exames com especialistas, porque não imaginei que fosse da chikungunya.
Em setembrobet dos brasileiros2015, eu passei a sentir dores muito fortes. Já não conseguia escrever, não conseguia sentar, nem andar, nem ir ao banheiro. Parecia que meu corpo estava paralisado pela dor. Fiquei internada por dois dias e a sorologia identificou o vírus.
Desde então, eu não tenho mais vida social. Às vezes sento e não consigo me levantar. Tem diasbet dos brasileirosque não consigo ir ao trabalho. Não calço mais salto alto, não abaixo mais para pegar nada no chão. Acordo à noite sentindo dores, dormência nas mãos, cãimbra nas pernas, não durmo bem.
Eu perdi todas as roupas porque ganhei cercabet dos brasileiros18 quilos. Não consigo fazer atividades físicas. Já tentei pilates, hidroginástica, caminhada, mas não aguento, porque os nervos estão inflamados. A medicação que tomo é forte e eu não vejo muito resultado. A médica me disse que tenho que tomar por tempo indeterminado, porque não sabemos quando ficarei bem.
Não consigo mais ir a festas porque não aguento ficarbet dos brasileirospé nem sentada por muito tempo. Só a gente não poder se arrumar como quer já mexe com a autoestima. Não uso mais anéis, porque os dedos começam a inchar.
Antes eu morava sozinha e era independente, mas hoje moro com minha sobrinha porque não consigo fazer muita coisa. Não consigo pegar uma garrafa térmica para colocar o café na xícara. Minhas mãos não a sustentam.
Pedi auxílio-doença no INSSbet dos brasileirosoutubro, com os relatórios das médicas. Mas foi no períodobet dos brasileirosque os peritos estavambet dos brasileirosgreve. Então eu fiquei sem receber meu salário nem o auxílio durante 3 meses. Passei dificuldade financeira, foi minha família que me deu suporte. Em janeiro eu tive que voltar ao trabalho, mesmo sem condições.
A sensação que a gente tem ébet dos brasileirosser um robô, uma múmia, o corcundabet dos brasileirosNotre Dame. Por pouco não fiquei deprimida. Tomei antidepressivos por quatro meses porque as médicas perceberam alterações no meu humor.
Tem diasbet dos brasileirosque você acorda mais animada, mas aí vem aquela sensaçãobet dos brasileirosdesgaste físico como se você tivesse corrido uma maratona. Não sou mais a mesma pessoa. Ando pelas ruas me segurando nas paredes.
Conceição Carneiro,bet dos brasileiros40 anos, é assistente social e morabet dos brasileirosFeirabet dos brasileirosSantana, na Bahia.
'Competição'
Pesquisadores afirmam que o vírus da febre chikungunya entrou no Brasilbet dos brasileirosjulhobet dos brasileiros2014, trazido por um funcionário da construção civil brasileiro que trabalhabet dos brasileirosAngola e veio visitar a famíliabet dos brasileirosFeirabet dos brasileirosSantana, na Bahia.
"O vírus entrou no inverno, quando não tinha muita circulação no mosquito. Mas eu fui para lá e saí alertando que havia um risco muito altobet dos brasileirosa epidemia ser grande", relembra Brito.
"Só que nesse meio tempo começaram a aparecer outros casosbet dos brasileirosuma doença que parecia dengue, mas não sabíamos o que era. Era a zika. Esses vírus competem e uma epidemia sempre predomina", explica.
"O que provavelmente aconteceu foi que esperávamos que a chikungunya fossebet dos brasileirosFeirabet dos brasileirosSantana para o resto do Nordeste, mas a zika entrou na frente. Aí todo mundo ficou voltado para a zika, especialmente após os casosbet dos brasileirosmicrocefalia, e a gente esqueceu da chikungunya."
Na regiãobet dos brasileirosFeirabet dos brasileirosSantana, no entanto, a primeira epidemia da febre ocorreu a partirbet dos brasileirossetembrobet dos brasileiros2014, e os efeitos são sentidos até hoje.
"Na época do surto, aumentou maisbet dos brasileiros100% a demanda nas emergências, tanto públicas quanto privadas", disse à BBC Brasil Melissa Falcão, infectologista da Vigilância Epidemiológicabet dos brasileirosFeirabet dos brasileirosSantana.
"Agora tenho pacientes que estão doentes há quase dois anos. E maisbet dos brasileirosmetade deles têm um graubet dos brasileirosdepressão ou alteraçãobet dos brasileiroshumor. Imagine conviver com uma dor intensa e prolongada que você não sabe quando vai acabar."
Em casos crônicos, os pacientes podem sofrerbet dos brasileirosinsônia, dormência nos membros, cãimbras e dificuldadesbet dos brasileiroscaminhar. A doença pode causar inflamação nos nervos ou iniciar doenças reumatóides, como a artrite.
Além disso, também pode desestabilizar doenças cardíacas, problemas renais e diabetes. Nos casos mais graves, pode causar a síndromebet dos brasileirosGuillain-Barré e outros problemas neurológicos graves, do mesmo modo que a zika.
Ela atinge adultos e idosos com mais força. Em crianças, as manifestações costumam ser mais leves,bet dos brasileirosacordo com Falcão.
Mortes
Carlos Brito também suspeita que a doença seja responsável por um aumento no númerobet dos brasileirosmortesbet dos brasileirosidososbet dos brasileirosPernambuco registrado desde o início do surto.
O Estado registra atualmente 22 óbitos relacionados à chikungunya, e outros estão sendo investigados.
Ele ressalta, no entanto, que o fatobet dos brasileiroso vírus agravar doenças crônicas comunsbet dos brasileirosidosos pode ter feito com que muitas mortes não tenham sido inicialmente relacionadas a ele.
No invernobet dos brasileiros2015, um ano depois da chegada do vírus à Bahia, a chikungunya chegou com mais forçabet dos brasileirosPernambuco, no Rio Grande do Norte e na Paraíba. Juntos, todos esses Estados registram a maior parte dos casos,bet dos brasileirosacordo com o Ministério da Saúde.
"Não tenha dúvidasbet dos brasileirosque zika e chikungunya vão atingir São Paulo. Elas não ficarão só no Nordeste. A dengue também começoubet dos brasileirospartes específicas do país. Só que a velocidadebet dos brasileiroszika e chikungunya atingirem o país como um todo vai ser muito maior do que a da dengue", diz Brito.
Em nota enviada à BBC Brasil, o Ministério da Saúde afirmou que o SUS disponibiliza acesso integral aos tratamentos para os pacientes com chikungunya e "oferece medicamentos, como paracetamol e dipirona, entre outros, e tratamento dos sintomas da doença".
Brito afirma, no entanto, que os medicamentos comuns não são suficientes para o tratamento da dor, e que muitos profissionaisbet dos brasileirossaúde estão tratando doentesbet dos brasileirosforma incorreta.
Junto a outros pesquisadores, ele elaborou um novo protocolo para o tratamento, que deve ser anunciado pelo ministério nos próximos dias e tende a demandar mais custos, por exigir mais doses dos remédios.
O Ministério da Saúde afirmou que, entre janeiro e marçobet dos brasileiros2016, repassou aproximadamente R$ 60 mil aos gestores dos serviçosbet dos brasileirossaúde para internações por chikungunya.
O ministro Ricardo Barros assumiu a pasta no dia 24bet dos brasileirosmaio, mas, até o momento, não foram anunciados os nomes que assumirão cargos importantes no combate a essas epidemias, como o secretáriobet dos brasileirosVigilânciabet dos brasileirosSaúde e o diretorbet dos brasileirosVigilância das Doenças Transmissíveis.
Ainda não há previsãobet dos brasileirosdesenvolvimentobet dos brasileirosuma vacina contra o vírus.