'Facções nunca dormem': a guerra silenciosa por trásbetano aviator ao vivoataques no Rio Grande do Norte:betano aviator ao vivo

A recente ondabetano aviator ao vivoviolência fez com que a governadora Fátima Bezerra (PT) pedisse auxílio da Força Nacional, que enviou 180 profissionais ao Estado. Segundo a Polícia Militar, 68 pessoas foram presas e um adolescente foi apreendido até a noite dessa quinta-feira, todos sob suspeitabetano aviator ao vivoterem participado dos atentados.

Segundo a imprensa local, os ataques teriam sido ordenados por membros do Sindicato do Crime, quadrilha local presentebetano aviator ao vivobairros periféricos dos principais municípios do RN.

Os crimes teriam sido motivados pelas más condições dos presídios do Estado. Em vistorias a cinco prisões do Estado, o Mecanismo Nacionalbetano aviator ao vivoPrevenção e Combate à Tortura (MNPCT), órgão ligado ao Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania, encontrou evidênciasbetano aviator ao vivotorturas físicas e psicológicas, faltabetano aviator ao vivoalimentação, desassistênciabetano aviator ao vivosaúde e superlotação, entre outras violações dos direitos, conforme noticiado pelo portal g1.

Especula-se que as duas quadrilhas rivais, Sindicato e PCC, teriam dado uma trégua no conflito para reivindicar melhorias no sistema carcerário por meiobetano aviator ao vivoataques violentos à sociedade civil e serviços públicos.

Porbetano aviator ao vivovez, a Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (Sesed) negou que a motivação seja essa. A pasta afirma que os ataques são uma retaliação a ações policiaisbetano aviator ao vivocombate ao tráfico e ao crime organizado.

“Acreditamos que ações policiais anteriores, onde houve o enfrentamento da segurança pública a infratores e apreensãobetano aviator ao vivogrande quantidadebetano aviator ao vivodrogas e armas, inquietaram a delinquência a enfrentar o sistemabetano aviator ao vivosegurança pública”, disse o secretário da pasta, Francisco Araújo, na terça-feira.

Por outro lado, quem estuda e trabalhabetano aviator ao vivoáreas relacionadas à segurança pública no RN acredita que a onda recente escancara para a sociedade civil um conflito violento e cotidiano travado dentro dos presídios ebetano aviator ao vivoruasbetano aviator ao vivobairrosbetano aviator ao vivodiversas cidades.

“As facções criminosas do Rio Grande do Norte nunca dormem, nunca estiveram sob controle. O que vimos nesses últimos dias é reflexobetano aviator ao vivouma guerra que acontece há anos,betano aviator ao vivomaneira silenciosa. São jovens que estão matando e morrendo por causabetano aviator ao vivobrigabetano aviator ao vivofacção”, diz Ítalo Moreira, promotor criminal que desde 2003 atuabetano aviator ao vivocasosbetano aviator ao vivohomicídiosbetano aviator ao vivoMossoró , a segunda maior cidade do RN.

Mossoró dividida pelo crime

Nos últimos anos, o conflito entre os grupos está fomentando o aumento da violência no Rio Grande do Norte.

Em 2000, a taxabetano aviator ao vivohomicídios no Estado erabetano aviator ao vivo9,57 assassinatos por 100 mil habitantes, segundo o Atlas da Violência, publicação do Institutobetano aviator ao vivoPesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e do Fórum Brasileirobetano aviator ao vivoSegurança Pública.

Em 2010, esse índice subiu para 25,5 e,betano aviator ao vivo2019, chegou a 38,3 homicídios - o pico ocorreu dois anos antes, com 62,8 mortes violentas por 100 mil moradores.

Esse aumento coincide com a chegada do PCC ao Estado e a outros pontos do Nordeste, no início da última década, segundo especialistas. E ocorreu durante gestõesbetano aviator ao vivogovernadoresbetano aviator ao vivolinhas ideológicas e partidos distintos: Wilma Faria (PSB), Rosalba Ciarlini (à época no DEM), Robinson Farias (PSD) e Fátima Bezerra (PT).

Para expandir seus negócios, a facção paulista se aliou a grupos locais, estimulando o comérciobetano aviator ao vivoarmas e drogas, e motivando rivalidades e conflitos bélicos.

Essa história foi narrada pelos pesquisadores Bruno Paes Manso e Camila Nunes Dias no livro A Guerra: a ascensão do PCC e o mundo do crime no Brasil (Ed. Todavia).

O Sindicato do Crime surgiu como uma dissidência do PCC por voltabetano aviator ao vivo2013, porque alguns criminosos se recusaram a seguir ordensbetano aviator ao vivolideranças paulistas da facção.

Desde então, os dois grupos entrarambetano aviator ao vivoconflito pelo controlebetano aviator ao vivoterritórios e tráficobetano aviator ao vivodrogasbetano aviator ao vivotodo o Rio Grande do Norte, embora a quadrilha local seja apontada por especialistas e jornalistas especializadosbetano aviator ao vivosegurança pública como mais numerosa.

“Eu diria que a imensa maioria dos homicídios está relacionada a esse conflito. Em Mossoró, às vezes uma pessoa é morta porque se mudoubetano aviator ao vivoum bairro comandado pelo PCC para outro local dominado pelo Sindicato do Crime. Isso não é aceito e a pessoa acaba sendo assassinada”, diz o promotor Ítalo Moreira.

Em Mossoró, cidade com cercabetano aviator ao vivo300 mil habitantes, o PCC comanda bairros da região sul, enquanto o Sindicato do Crime controla a zona norte.

No ano passado, o município registrou 167 homicídios - 9 a mais do quebetano aviator ao vivo2021 -, segundo levantamento do jornalista Cezar Alves, especializado na coberturabetano aviator ao vivosegurança pública na região do semi-árido do RN.

Essa divisão geográfica entre as facções tinha um terceiro elemento quatro anos atrás, quando a BBC News Brasil visitou a cidade para realizar uma reportagem sobre a violência da guerrabetano aviator ao vivofacções: os Guardiões do Norte, conhecidos como GDE, quadrilha cearense que nos últimos anos perdeu força na região.

Crimes sem solução

Segundo o Monitor da Violência, índice compilado pelo g1, Núcleobetano aviator ao vivoEstudos da Violência da Universidadebetano aviator ao vivoSão Paulo (NEV-USP) e Fórum Brasileirobetano aviator ao vivoSegurança Pública, o RN registrou 1,1 mil assassinatos no ano passado - ligeira quedabetano aviator ao vivo5%betano aviator ao vivocomparação com 2021.

A maior parte dessas mortes, no entanto, não é solucionada pela polícia potiguar. Ou seja, as investigações não conseguem apontar quem foram os autores dos crimes.

Segundo o “Painelbetano aviator ao vivoProdutividade do Departamentobetano aviator ao vivoHomicídios”, dos 810 inquéritos policiaisbetano aviator ao vivoassassinatos sob investigação desse setor da Polícia Civil, apenas 22,8% foram solucionados no ano passado - ou seja, apenas umbetano aviator ao vivocada cinco homicídios foi esclarecido pela polícia do RN.

Em 2010, o índice era maior: 62% dos casos foram solucionados naquele ano, mas esse número foi diminuindo desde então.

“Eu não diria que a culpa é dos delegados e policiais, e sim da piora da estrutura para realizar as investigações. Faltam pessoal e ferramentas. Muitos casos são arquivados. Em outros, peço absolvição do réu por faltabetano aviator ao vivoprovas, mesmo tendo certezabetano aviator ao vivoque ele é culpado. Um júri não pode condenar uma pessoa se a investigação não provou que ela é culpada”, diz o promotor Ítalo Moreira.

“Então, a impunidade acaba fomentando a violência, porque a pessoa mata e não é punida”, diz.

Mas quem são as vítimas?

Um estudobetano aviator ao vivo2018 do Observatório da Violência do Rio Grande do Norte (Obvio) tentou responder essa pergunta.

Entre 2011 e 2018, cercabetano aviator ao vivo93% delas eram homens, 85% eram pretas ou pardas, 49% tinham entre 18 e 29 anos. Além disso, 31% não tinham sequer completado o ensino fundamental, 54% não exerciam atividade remunerada e 39% ganhavam até dois salários mínimos.

Massacrebetano aviator ao vivoAlcaçuz

Em 2017, o conflito entre Sindicato do Crime e PCC causou um massacre no presídiobetano aviator ao vivoAlcaçuz, na cidadebetano aviator ao vivoNísia Floresta, região metropolitanabetano aviator ao vivoNatal. Em 14betano aviator ao vivojaneiro daquele ano, uma briga entre os dois grupos acaboubetano aviator ao vivo27 presos assassinados - todas as vítimas estavam na ala do Sindicato.

Dias depois do massacre, o governador da época, Robinson Faria, hoje deputado federal pelo PL, prometeu fechar a unidade prisional. Mas isso nunca aconteceu.

No ano passado, a detenção foi alvobetano aviator ao vivouma vistoriabetano aviator ao vivomembros do Mecanismo Nacionalbetano aviator ao vivoPrevenção e Combate à Tortura (MNPCT). O cenário erabetano aviator ao vivoprecariedade ebetano aviator ao vivoviolaçõesbetano aviator ao vivodireitos humanos, como torturas e isolamento forçado, segundo um relatório do órgão a ser publicado nos próximos dias.

"No Rio Grande do Norte, o sistema prisional funciona a partir da prática sistemáticabetano aviator ao vivotorturas físicas e psicológicas", afirmou Bárbara Coloniese, perita do MNPCT,betano aviator ao vivoentrevista ao g1. "Trata-sebetano aviator ao vivouma engrenagembetano aviator ao vivofaltabetano aviator ao vivoalimentação, desassistênciabetano aviator ao vivosaúde e superlotação".

Em entrevista nesta quinta-feira, a governadora Fátima Bezerra afirmou que as denúncias serão apuradas “por meiobetano aviator ao vivouma investigação profunda”.

“Nosso governo jamais compactuará com nenhuma medidabetano aviator ao vivoarbítrio. Temos feito um esforço grande no sentidobetano aviator ao vivoavançar com projetosbetano aviator ao vivoressocialização, na áreabetano aviator ao vivoeducação, na áreabetano aviator ao vivopreparação para o trabalho, que inclusive é referência a nível nacional”, disse.

Para o advogado criminalista Gabriel Bulhões, professorbetano aviator ao vivoDireito Penal e ex-presidente da Comissãobetano aviator ao vivoAdvocacia Criminal da OAB-RN, a situação precária dos presídios do Estado pouco mudou desde o massacrebetano aviator ao vivoAlcaçuz.

“O governo do Estado tomou medidas para melhorar a ressocialização, a disciplina e o atendimento, mas foram medidas paliativas que não resolveram o problema crônicobetano aviator ao vivoviolaçõesbetano aviator ao vivodireitos humanos. Sebetano aviator ao vivouma cela cabem quatro pessoas mas abriga 10, não adianta você criar programasbetano aviator ao vivoleitura para diminuir a pena dos detentos”, diz.

Segundo Bulhões, a superlotação e a precariedade dos presídios “fornecem mãobetano aviator ao vivoobra barata para as facções”.

“Digamos que João foi preso por um crime não violento. Ele já entra na prisão devendo papel higiênico e escovabetano aviator ao vivodentes para a facção do pavilhão onde foi parar. As dívidas só crescem. Quando ele sai, está preso à facção, e tembetano aviator ao vivocometer outros crimes para pagar o que deve”, afirma o advogado criminalista.

Para o advogado Diego Tobias, presidente da Comissãobetano aviator ao vivoDireitos Humanos da OAB-Mossoró, os crimes nas ruas “explodem” quando a situação dos presídios fica insustentável.

“Nós repudiamos veementemente esses ataques, porque não é a melhor formabetano aviator ao vivoreivindicar melhorias. Para isso, há corregedoria, ouvidoria e comissõesbetano aviator ao vivodireitos humanos. Mas é inegável que o sistema carcerário é um problema crônico do Rio Grande do Norte, e que precisabetano aviator ao vivouma resposta enérgica do governo”, diz.