Lava Jato segue viva no Peru e na Colômbia - e mantém Odebrecht e políticos sob pressão :

Crédito, ERNESTO BENAVIDES/AFP via Getty Images

Legenda da foto, ApoiadoresAlejandro Toledoabril, protestando a favor do ex-presidente peruano enquanto ele era extraditado dos EUA

Já na Colômbia a construtora é alvocobrança do presidente Gustavo Petro, que afirma que a Odebrecht não pagou a compensação devida ao país por envolvimentocorrupção - questionada pela BBC News Brasil, a empresa disse que não reconhece essa dívida.

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Entenda abaixo os fundamentos da decisãoToffoli, o posicionamento da construtora e como a a Lava Jato, combalida no Brasil, segueevidência no Peru e na Colômbia.

O que Toffoli decidiu

Emdecisão, Toffoli reforça sentença anterior da corte que já afirmava que informações repassadas pelos executivos da construtora ou pela própria empresa não podem ser usadasprocessos criminais contra acusadosirregularidades.

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Os principais argumentos acatados pelo ministro do Supremo são dois: ele afirma que da Lava Jato pois houve quebra da cadeiacustódia. Ou seja, a produção dessas provas não respeitou a lei.

O acordo da Odebrecht previa que a empresa iria devolver R$ 2,7 bilhões aos cofres públicos etroca o MPF (Ministério Público Federal) não entraria com ações contra ela na Justiça. A partirinformações obtidas da empresa com esse acordo, o MPF reuniu um material que apresentou como prova contra réus da Lava Jatovários processos - incluindo um envolvendo o ex-presidente Lula.

O problema, segundo o Supremo, é que esse acordo com Odebrecht foi irregular já que teve participaçãoautoridades brasileiras, americanas e suíças, mas sem passar pelos canais oficiais necessários.

O problema, segundo o Supremo, é que esse acordo com Odebrecht foi irregular já que teve participaçãoautoridades brasileiras, americanas e suíças, mas sem passar pelos canais oficiais necessários.

No final2017,meio ao abalo provocado pela operação Lava Jato e após o acordoleniência firmado com as autoridades brasileiras, a companhia decidiu mudar suas marcas e retirar o nome "Odebrecht" das diversas unidadesnegócio.

Atualmente, a empresa tem como nome Novonor. Já o ramo da construtora passou a se chamar OEC, com o descritivo "Odebrecht Engenharia e Construção". Desde então,identidade visual também passou por alterações.

O momento da 'Lava Jato peruana'

Alguns especialistas avaliam que a decisãoToffoli possa repercutir nas esferas judiciais destas outras nações.

Na última semana, o depoimento do antigo responsável pela Odebrecht no Peru, Jorge Barata, dominou o noticiário deste país.

Na ocasião, o executivo reafirmou que a empresa pagou propina a uma sérieimportantes nomes da política local, incluindo uma sérieex-presidentes.

Crédito, Nelson Jr./SCO/STF

Legenda da foto, Alguns especialistas avaliam que decisão recenteToffoli pode repercutir nas esferas judiciais destas outras nações

A audiência foi realizadamaneira remota, mas Barata foi convocado a deporsolo peruano no caso que envolve o ex-presidente Ollanta Humala.

O executivo Marcelo Odebrecht também havia sido convocado, masdefesa alegou que decisões recentes do STF fazem com que seu cliente não tenhaprestar depoimento neste caso.

Uma decisão anteriorToffoli invalidou evidências obtidas pelos sistemas Drousys e MyWebDay B, que eram supostamente utilizados pela empresa para ocultar o pagamentosubornos.

A promotoria peruana pede 20 anosprisão para Humala, além26 anos e seis meses paraesposa Nadine Heredia, ambos julgados pelo crimelavagemdinheiro pelo recebimentosupostas verbas ilícitas, incluindo da Odebrecht.

O caso envolveria um financiamentoUS$ 3 milhões para a campanha presidencialHumala2011.

Em 2018, a Odebrecht chegou a um acordo no Peru no qual se declarou culpada pelas acusaçõesque ofereceu propina a políticos locais.

Além disso, os executivos da empresa prometeram delatar os envolvidos nos esquemascorrupção, o que incluía oferecer provas substanciais.

Em troca, os executivos puderam deixar o país, alémpoderem sacar fundos que possuíam no Peru. Por parte da companhia, houve a permissão para a vendaativos locais.

Dentre as negociações, a Odebrecht vendeu a usina hidrelétricaChaglla, no centro do país, por US$ 1,4 bilhões a um consórcio chinês. O empreendimento é responsável por cerca5% da energia produzida no Peru.

Por outro lado, a empresa tevepagar uma compensação610 milhõessoles (R$ 818 milhões) ao governo peruano, valor acrescido150 milhõessoles (R$ 201 milhões)juros.

O combinado é que os pagamentos sejam feitosforma gradativa, e, até o momento, 220 milhõessoles (R$ 295 milhões) foram abatidos da dívida.

Procurada pela BBC News Brasil, a Odebrecht afirmou que "a condição da companhia no Peru écolaboradora do Ministério Público, entidade com a qual firmou um acordo que continua sendo cumprido integralmente pela empresa e que,contrapartida, lhe confere garantias legais típicas desse tipoconvênio. Em tal contexto não é prevista, portanto, uma estratégia'defesa'".

'Brasil está permitindo impunidade no Peru'

A advogada Delia Muñoz ocupou o cargoministra da Justiça e Direitos Humanos durante o governo do ex-presidente Manuel Merino – um mandato que durou 5 dias, entre 10 e 15novembro2020.

À BBC News Brasil, ela afirma que o acordo foi benéfico para os executivos da Odebrecht, e diz que as compensações pagas pela empresa são "cômodas", e que demorarão anos para serem quitadas.

Além disso, ela vê a justiça peruana com pouca capacidade para agir apenas com os depoimentos dos executivos, uma vez que as provas mais relevantes seguem no Brasil.

"Quando foi descoberto o pagamentopropina para a conquistaobras, não houve acesso no Peru às grandes evidências que sustentassem as afirmações das acusações feitas pelos executivos da Odebrecht", afirma.

No caso peruano, entre os grandes empreendimentos envolvidos nos processos estão o metroLima e a chamada rodovia Interoceânica, que conecta o país ao Brasil.

Emvisão, o movimento desta semana no STF dificulta que provas cheguem à justiça local.

“É claro no Peru que esta recente decisão é um claro prejuízo para o país, uma vez que nega o acesso à justiça”, avalia.

“Desta forma, o Brasil permite a impunidade absoluta no Peru. Os réus admitem que pagaram propina e agora vão dizer que as autoridades brasileiras não permitem que utilizem as provas que estão no país”, afirma a ex-ministra.

Emvisão, os executivos irão continuar fazendo afirmações sobre os envolvidoscorrupção, mas sem apresentar as provas. Para ela, o cenário atual faz com que o fim do caso localmente seja uma possibilidade real. “Vamos viver a situação absurda do caso arquivado apesardeclarações aceitando corrupção. Acho que o caso vai morrerbreve, é muito difícil fazer uma acusação sem provas fortes”, avalia.

“Ficou claro que o Ministério Público peruano confiou na palavra dos executivosque iriam entregar as provas, mas não foi isso que aconteceu. O caminho agora seria redesenhar a estratégia”, avalia.

Crédito, NELSON ALMEIDA/AFP via Getty Images

Legenda da foto, Em 2018, a Odebrecht chegou a um acordo no Peru no qual se declarou culpada pelas acusaçõesque ofereceu propina a políticos locais

Segundo criminalistas consultados pela BBC News Brasil, no entanto, a decisão do STF levaconta uma sérietratados internacionais determina que, qualquer cooperação jurídica criminal entre o Brasil e outros países precisa seguir uma sérieregras.

No caso do acordo feito pela Odebrecht, a cooperação entre o MPF e autoridades estrangeiras deveria ter sido acordada com o DRCI (DepartamentoRecuperaçãoAtivos e Cooperação Internacional), órgão do Ministério da Justiça.

A defesaLula já havia pedido,2017, para ter acesso a esse acordo que foi celebrado entre Brasil, EUA e Suíça, e a acusação já havia dito que não havia correspondência oficial sobre isso. Agora, a partirum pedidoToffoli, o Ministério da Justiça confirmou que não encontrou qualquer registroque o acordo tenha passado pelo DRCI, o que o torna irregular, segundo Toffoli.

“O MPF não pode sair fornecendo informações nacionais para outros países sem passar pelas vias oficiais”, diz Bruno Salles, membro da diretoria do Instituto BrasileiroCiências Criminais (IBCCrim).

“Em síntese, a decisão reforça que as comunicações realizadas entre autoridades devem ser realizadas sempre pelos meios e formas que garantam uma cadeiacustódia da prova”, acrescenta Rogério Cury, professordireito penal do Mackenzie.

“Havendo violação, tais provas devem ser consideradas ilícitas e desentranhadas dos autos, ou seja, retiradas do processo”, explica o professor.

Forte impacto na política local

Em seu depoimento nesta semana, Barata afirmou que a empresa contribuiu para “diversas campanhas políticas, principalmentepresidentes, deputados e prefeitos”.

Dentre os nomes que o executivo citou, estão os ex-presidentes Alan García, Ollanta Humala e Pedro Pablo Kucsynki, além da influente congressista Keiko Fujimori.

Os escândalos da empresa no país envolvem ainda o ex-presidente Alejandro Toledo, que neste ano foi extraditado dos Estados Unidos para ser julgadosolo peruano. Em novembro2016, Barata afirmou que a construtora pagou US$ 20 milhões a Toledotroca da permissão para a construção dos trechos 2 e 3 da Rodovia Interoceânica Sul.

Na visão da socióloga do Instituto NacionalEstudos Peruano (IEP) Patricia Zárate, o impacto na vida nacional destes sucessivos escândalos segue forte. “A corrupção continua a ser identificada como um dos principais problemas que o país tem”, aponta. “Após o escândalo da Odebrecht, os cidadãos consideraram a corrupção como o principal problema do Peru”, afirma a socióloga.

Além disso, há uma percepçãoimpunidade, emvisão.

“Parece que não houve, ou não se sentiu como se houvesse, uma verdadeira luta contra o problema da corrupção porque novos escândalos continuam a surgir, talvez menores, mas são como uma constante, e não há ação tangível”, avalia.

No entanto, segundo ela, há uma diferenciação da empresa com o Brasil, o que não refleteuma imagem negativa sobre o país vizinho.

“Há coisas mais positivas, como o futebol, que estão sempre na cabeça dos peruanos”, afirma.

Desfecho trágico

Crédito, ERNESTO BENAVIDES/AFP via Getty Images

Legenda da foto, VelórioAlan García, que se suicidou2019 quando a polícia estava prestes a prendê-lomeio a investigações sobre supostos subornos da Odebrecht

Em 2019, García suicidou-se com um tiro na cabeça, logo antesser preso. Em uma cartadespedida, ele reafirmouinocência no caso. Em 2018, ele chegou a pedir asilo político na embaixada do Uruguai, afirmando que sofria perseguição.

Em seu depoimento nesta semana, Barata afirmou que, dentre os políticos mencionados, aquele com quem tinha uma relação mais próxima era García. O executivo afirmou ainda que a Odebrecht entregou dinheiro para campanhas do ex-presidenteduas oportunidades.

À BBC News Brasil, Ricardo Pinedo, que foi secretárioGarcia, afirmou que “lamentavelmente”, as investigações foram “manipuladasforma política”. Segundo ele, o processo ficou centrado nas relações do ex-presidente com os executivos. Sobre fotos que mostram Garcíaaviões junto dos comandantes da Odebrecht, ele alega que era algo natural já que o mandatário tinha como hábito acompanhar inauguraçõesobras.

Para Pinedo, há uma sensaçãoque a Odebrecht “fez o que queria” no Peru, e que “na realidade zombou da justiça peruana porque os promotores, tendo um interesse tendenciosoinvestigar aproveitaram-se para que os depoentes dissessem o que lhes convinha”.

Em resposta à consulta da BBC News Brasil, a Odebrecht reafirmoucolaboração com as autoridades e destacou que está habilitada a realizar novos contratos no país.

“No Peru, a empresa está habilitada para contratar com o Estado, o que foi recentemente confirmado pela Corte Suprema do país, e atualmente executa alguns projetosinfraestrutura nos setorestransporte e irrigação. No que se refere ao AcordoLeniência, o objetivo da empresa é que seja integralmente cumprido pelas partes, conforme os seus termos e condições, o que compreende, entre outros pontos, o pagamento da multa até o final do prazo e a operação sem restrições no país”, afirmou.

Desdobramentos na Colômbia

Crédito, Ricardo Maldonado Rozo/EPA-EFE/REX/Shutterstock

Legenda da foto, O procurador-geral da Colômbia Francisco Barbosa anunciouagosto a acusação contra dezenas pessoas envolvidascontratos com a Odebrecht

Na Colômbia, a Odebrecht voltou a ser foco das atençõesagosto, depois que o presidente Gustavo Petro afirmou que o caso envolvendo a empresa poderia ser reaberto no país. Em Bogotá, o governo colombiano sediou o Congresso Internacional sobre a Luta contra a Corrupção e a RecuperaçãoAtivos, ocasião na qual Petro acusou a procuradoria localpermitir que os responsáveis pela corrupção saíssem da Colômbia sem prestar contas à justiça.

O presidente argumentou também que os proprietários da multinacional brasileira não compensaram financeiramente a Colômbia, apesar das sanções impostas pelos tribunais locais, como os US$ 250 milhões anunciados2018 pelo Tribunal AdministrativoCundinamarca como compensação. “Não pagaram um só peso”, exclamou Petro.

À BBC News Brasil, a Odebrecht afirmou: “A companhia tem um processocolaboração iniciado2016 com o Ministério Público colombiano, permanecendo à disposição das autoridadescasocontinuação ou reaberturaqualquer procedimento com o qual a empresa possa contribuir”.

“Na Colômbia, o foco tem sido a conclusão da colaboração com as autoridades e a preservação dos direitos da companhia com relação a uma sérieprocedimentos que considera indevidos”, acrescentou,nota.

Segundo o Ministério Público colombiano, houve uma redecorrupção na qual executivos da Odebrecht teriam criado um empreendimento criminoso para entregar mais80 bilhõespesos (R$ 99 milhões)propinas na Colômbia. Mais 22 pessoas foram intimadas para serem processadas por suposto envolvimento nos atoscorrupção.

Neste cenário, o promotor Daniel Hernández, foi acusadodeixar escapar vários executivos da Odebrecht eintimidar testemunhas no caso da empresa brasileira. Ele foi indiciado pelos crimesprevaricação por omissão e ameaças a testemunhas perante a Suprema CorteJustiça da Colômbia.

Em audiência no dia 7setembro, a defesaHernández afirmou que ele atuou como promotorapoio no caso Odebrecht e não há clareza na norma que determina que tal função deve processar o registromandadosprisão na entidade judiciária.