O brasileiro que participou da gravação'We Are The World', sucesso que uniu estrelas pela fome na África:

Paulinho da Costa,camisa azul epé,estúdiogravação com microfones e instrumentos musicais

Crédito, Arquivo pessoal

O USA for Africa existe até hoje e afirma ter gerado US$ 75 milhões para programascombate à fome erecuperação e desenvolvimento na África e ter apoiado mais500 organizações21 países do continente.

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O projeto também se associou ao WhyHunger, uma entidadecombate à fome nos Estados Unidos que foi criada por um músico e um DJrádio1975. Juntas, afirmam ter arrecadado também US$ 25 milhões para ações contra fome e por moradiaterritório estadunidense.

A propostaBelafonte foi inspirada na Band Aid, um grupo organizado pelo cantor irlandês Bob Geldof e pelo guitarrista inglês Midge Ure para arrecadar dinheiro para ajudar quem passava fome da Etiópia.

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O projeto original produziu o single Do They Know It's Christmas? (Eles sabem que é Natal?,tradução literal)novembro do ano anterior e teve a participaçãoartistas como Bono Vox, do U2, Sting, David Bowie, Paul McCartney, Phil Collins, Boy George e George Michael.

O projeto britânico e irlandês lançoucanção no Natal e gerou um festival1985, o Live Aid, com shows na Inglaterra e nos Estados Unidos na sequência, com a participação do Queen, Eric Clapton e Led Zepellin. O Band Aid teve três novas gravações,1989, 2004 e 2014. Na versão Band Aid 30, a mais recente delas, o objetivo foi colaborar na luta contra a epidemia do vírus Ebola na África Ocidental.

A ideiacriar a versão estadunidense foi encampada pelos cantores Lionel Richie e Michael Jackson e,seguida, pelo produtor e maestro Quincy Jones - três dos principais artistas da indústria fonográfica naquela época. Apesarincluir depois artistasoutras etnias, o movimento se diferenciava por ser liderado por afrodescendentes.

Cantores e estrelas do cinema cantando We Are The World1986

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Cantores e estrelas do cinema cantando We Are The World em 1986

O documentário da Netflix mostra como eles conseguiram, com alguma sorte, reuniruma noite 42 grandes nomes da música para gravar as vozes do hit. Entre os solistas estavam, além dos próprios Lionel e Michael, nomes como Stevie Wonder, Bob Dylan, Ray Charles, Tina Turner, Bruce Springsteen, Cyndi Lauper, Al Jarreau, Kenny Rogers e Paul Simon.

Participaram como coristas artistas como os atores Bette Midler, Dan Aykroyd, os irmãosJackson que fizeram parte do Jackson 5 e o próprio Belafonte.

O brasileiro diz ter ficado muito feliz com o documentário sobre a gravação. “É um trabalho muito bem feito, com um material bem completo”, comenta. Ele fala que ficou emocionado e feliz por ter participado daquele momento especial, resgatado pelo filme.

Mas, apesarrepetirem os elogios, alguns músicos que participaram da gravação se mostraram insatisfeitos com o resultadoum ponto: a faltacrédito para as outras etapascriação da música, antes da gravaçãovoz.

Quem tornou a insatisfação pública foi o baterista John Robinson. Ele divulgou um vídeo nas suas redes sociaisque criticava diretamente o diretor do documentário, Bao Nguyen, por não citar a participação dos músicos.

Nele, ele conta o trabalhoprodução dos arranjosQuincy com um triomúsicos: ele próprio, o baixista Louis Johnson e o tecladista Greg Phillinganes. “Nós construímos a base da música junto com o Michael e o Lionel”, afirmou.

Na primeira sessão foi o momentoque foi feita o arranjo, que passou para os demais músicos fecharem a parte instrumental antes da gravaçãovoz. Paulinho participa da segunda fase. “Eu entrei com um tempero na música."

"Coloquei um pouco da nossa pimenta”, explica,referência à musicalidade latinoamericana. Outra expressão que ele gostausar para definir seu trabalho é “dar corpo” para as músicas, fazer improvisações percussivas que tornam o som mais preenchido.

Depois deste trabalho, a música foi enviada para todos os cantores no dia 24 janeiro.

A gravação, que é tema central do documentário, foi feita quatro dias depois, com todos os cantores juntosum mesmo estúdio. Assim como havia feito com os músicos, Quincy comandou os solos e corosvozes.

Depois desta etapa, a música foi finalizada e ficou pronta para ser transferida para as mídias físicas (era um tempo anterior às plataformas eletrônicas).

O lançamento foi simultâneo e global, no dia 7março daquele ano, menosum mês e meio após a conclusão da gravação. O disco vendeu mais20 milhõescópias.

Para Robinson, os músicos que participaram das duas etapas antes da gravação das vozes deveriam ter sido creditados. Por isso, ele cita nominalmente Johnson, Phillinganes, Michael Ormatian, David Paich, Michael Boddicker e Paulinho.

Assim como os cantores, diz Paulinho, os músicos e outras pessoas que participaram da equipeprodução colocaram os objetivos humanitários acimaqualquer remuneração.

“A gente queria que servisse para ajudar a salvar as pessoas que estavam passando fome na África. Foi o maior objetivoquem trabalhou sem receber por isso”, comenta.

Um hit produzido na Califórnia

Quando Paulinho foi convidado para participar do projeto, os músicos se reuniam com discrição, para evitar o vazamentoinformações, o que poderia comprometer o término do trabalho. Muitos deles já haviam trabalhado juntosoutras gravações e são amigos até hoje.

O local escolhido para a produção dos arranjos foi o estúdio Lion Shares,Beverly Hills,propriedadeKenny Rogers. As vozes foram gravadas dias depois no A&M, tambémLos Angeles.

O tempo era escasso porque era necessário deixar tudo pronto para o dia da gravação com os vocalistas. Tudo foi preparadoduas semanas.

Como o documentário mostra, a data da gravação das vozes foi marcada com base na entrega do Prêmio American Music Awards, no dia 28janeiro daquele ano.

A ideia era aproveitar a presença dos artistas para fazer o registro nas horas seguintes à premiação. A maioria dos artistas saiu direto da premiação para o estúdio.

Gravar com aqueles artistas reconhecidos internacionalmente não era novidade para Paulinho. Nascido há 75 anos na zona norte do RioJaneiro, o percussionista foi convidado por Richie, com quem havia gravado nos dois primeiros discos solo,1982 e 1983.

Mas esse não era seu único contato entre os astros da gravação. MorandoLos Angeles desde meados da década anterior, Paulinho já havia participadotrabalhos anterioresRogers, Jarreau, Janet e Michael com e sem os irmãos, alémoutros projetosQuincy.

O músico chegou aos Estados Unidos1972, para tocar com o brasileiro Sergio Mendes, e a partir daí se tornou um dos percussionistas mais requisitados da indústria fonográfica americana.

Estes participantes do hit são apenas uma pequena amostra das estrelas com quem Paulinho já havia tocado na época.

Naquele momento, seus trabalhos já incluíam a participaçãodiscosartistas estrangeiros como Aretha Franklin, BB King, Barbra Streisand, Cher, Dizzy Gillespie, Ella Fitzgerald, Elton John, Gabor Szabo, Gato Barbieri, Herbie Hancock, Joe Cocker, Julio Iglesias, Lalo Schifrin, Liza Minelli, Rod Stewart, Sadao Watanabe e Stan Getz, alémtrilhas sonorasfilmes.

Naquele mesmo ano, ele participaria como ator, no papelum músico africano, no filme A Cor Púrpura – dirigido por Steven Spielberg e que teve Quincy como umseus produtores. No ano seguinte, ele tocou na gravação da música La Isla Bonita, da cantora Madonna, e faz uma participação no videoclipe do mesmo sucesso.

Paulinho sorrindo enquanto posa para fotoum ambiente com plantas

Crédito, Arquivo pessoal

A participaçãoWe Are The World deu a ele a oportunidadeparticiparum trabalho organizado por um dos grandes ativistas da luta pelos direitos civis nos Estados Unidos. “Eu era um grande admirador do Belafonte, mas infelizmente não tinha participadonada com ele antes”, comenta.

Bob Dylan, Bruce Springsteen, Ray Charles e Stevie Wonder são alguns dos participantes do single com quem ele trabalhou depois. Atualmente, a listaartistas brasileiros e estrangeiros com quem ele colaborou ultrapassa 900 nomes e 6 mil músicas.

Mas a influência do hit no Brasil não se resumiu à participação do músico brasileiro ou à repercussão da gravaçãoterritório nacional. A ação incentivou movimentos semelhantes por aqui.

O primeiro deles foi o ChegaMágoa, projeto capitaneado por Gilberto Gil e pelo Sindicato dos Músicos do Município do RioJaneiro,maio1985, na campanha Nordeste Já,apoio à população carente da região. A música foi creditada como criação coletiva a partir do poema Seca D’Água,Patativa do Assaré, e teve arranjoDori Caymmi.

Alceu Valença, Belchior, Beth Carvalho, Caetano Veloso, Chico Buarque, Djavan, Ednardo, Edu Lobo, Elza Soares, Erasmo Carlos, Gal Costa, Gonzaguinha, Guilherme Arantes, Luiz Melodia, Maria Bethania, Marina Lima, Martinho da Vila, Milton Nascimento, Moraes Moreira, Pepeu Gomes, Rita Lee, Roberto Carlos, Sergio Ricardo, Tim Maia e Tom Jobim foram alguns dos participantes da gravação.

Dois anos depois, um grupocantores brasileiros voltou a se reunir numa gravação coletiva. Foi Viver Outra Vez,solidariedade aos pacientesAIDS, num momentoque não havia tratamentos eficazes para quem era HIV positivo e o preconceito era muito forte.

A música estreou com um videoclipe exibido no Fantástico, da Rede Globo, antes do lançamento do disco.

Guilherme Arantes, Emilio Santiago, Erasmo Carlos, Elza Soares, Jane Duboc, Neguinho da Beija-Flor e Tim Maia foram alguns dos participantes. Paulo Autran, Fernanda Montenegro, Tônia Carreiro, Lima Duarte e Maitê Proença também participaram do álbum, com as leiturastextosescritores como Adélia Prado, Carlos DrummondAndrade, Catulo da Paixão Cearense, Mario Quintana e Paulo Mendes Campos.