Milei: 3 boas notícias da economia que podem beneficiar próximo presidente da Argentina:
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Este ano foi difícil para o bolso dos argentinos, com a inflação ultrapassando os 140% ao ano, uma queda real5,5% nos salários nos primeiros nove meses do ano, uma moeda local que perdeu entre metade e 60% do seu valor frente ao dólar americano, dependendo da taxacâmbio praticada.
Vale lembrar que 2022 também já não tinha sido favorável.
O governo atual atribui isso à faltadólares no país, tanto para fazer frente aos pagamentos como para acumular reservas que lhe permitam defender o valorsua moeda.
Mas tudo indica que o próximo presidente da Argentina terá melhores rendimentos nos cofres do Estado2024.
"No próximo ano, a balança comercial da Argentina poderá aumentarcercaUS$ 25 bilhões (R$ 120 bilhões)" a favor do país sul-americano devido ao aumento das exportações, diz o economista argentino Miguel Kiguel à BBC News Mundo, o serviçonotíciasespanhol da BBC.
Antes que essas receitasexportação comecem a fluir, a economia argentina deverá cair ainda mais, com uma possível aceleração da inflação, preveem os especialistas.
Apesar disso, as receitas geradas por grãos, combustíveis e lítio oferecem três boas notícias a médio prazo para o próximo presidente.
1. Produção agrícola
Considerado um dos maiores celeiros do mundo, a Argentina possui vastas extensõesterra onde se cultivam principalmente soja, milho e trigo, cujo principal destino é a exportação.
Dois a cada três dólares que entraram no país2022 foram provenientesexportações relacionadas com o setor agroalimentar.
Como a venda desses cereais no exterior é fortemente tributada, a agricultura alimenta os cofres do país com cifras consideráveis todos os anos.
Mas durante a safra2022/2023 (que começajunho), a Argentina registrou uma das piores secas dahistória, o que reduziu substancialmenteprodução agrícola e, como resultado, a entradadinheiro na economia do país sul-americano.
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A situação começou a se reverter no segundo semestre2023, quando o fenômeno meteorológico La Niña — que causou a seca — terminou e deu lugar ao El Niño, períodoque predominam as chuvas na região.
A BolsaRosário, localizada no interior argentino e especializadaprodutos agrícolas, estima que na safra 2023/2024 serão colhidas 136 milhõestoneladasgrãos na Argentina, muito acima dos 80 milhõestoneladas do ano agrícola anterior.
"Considerandodólares, isso nos dá uma estimativaque as exportações atinjam US$ 34,3 bilhões (R$ 165 bilhões)", diz Franco Ramseyer, analistamercado da BolsaValoresRosário, à BBC News Mundo.
Esse valor é superiorquase US$ 10 bilhões (R$ 48 bilhões) às exportações do ano anterior.
A BolsaCereaisBuenos Aires tem projeções semelhantes e afirma que o setor renderá US$ 14 bilhões (R$ 68 bilhões) aos cofres do Estado, 50% a mais que um ano antes.
"Estamos dianteuma colheita razoável, que não vai ser das melhores porque temos todo um ambiente macroeconômico que tem feito com que muitos não desenvolvam o seu potencial, mas a colheita não vai ser ruim", assinala o presidente da BolsaValoresCereaisBuenos Aires, José Martins, ao apresentar as projeçõessetembro.
Ramseyer destacou que, "se a melhora se concretizar — porque ainda não se materializou — seria uma contribuição importante para a reconstrução das reservas internacionais".
O Banco Central tem reservascercaUS$ 20,9 bilhões (R$ 101 bilhões), segundo dados oficiais. O saldo líquido, ao descontar seus passivos (dívidas), é negativoUS$ 10,6 bilhões (R$ 51 bilhões), segundo estimativas da consultoria Ecolatina.
2. Mudança na equação dos hidrocarbonetos
Até o ano passado, a Argentina era importadorahidrocarbonetos — gás e petróleo — porque, embora possuísse uma boa quantidade desses recursos naturais, eles não eram suficientes para suprir a demanda interna.
A conclusão neste ano das obras no campo petrolíferoVaca Muerta, no oeste do país, permitiu aumentar a produçãogás e petróleo, e a equação passou a serequilíbrio2023 e superávit comercialenergia2024, ou seja, mais exportações do que importações desses combustíveis.
Segundo a secretáriaEnergia, Flavia Royón,2024 haverá um superávit na balança comercialenergiaUS$ 3,7 bilhões, enquanto2022 o saldo foi negativoUS$ 4,4 bilhões.
O diretor da consultoria Economía y Energía, Nicolás Arceo, diz à BBC News Mundo que as estimativas dele são um pouco mais conservadoras.
Em suas estimativas, o superávit da balança comercialenergia seráUS$ 2,5 bilhões (R$ 12,1 bilhões) no próximo ano — mas concordaapontar que a transformação do setor terá um impacto positivo na necessidademoeda estrangeira do país.
"Sejam US$ 2,5 bilhões ou US$ 3,7 bilhões, o que marca é uma mudança estrutural no setor, que esteve cronicamente deficitário desde meados da primeira década do século 21 e que vai se tornar um setor com excedentestermos comerciais ao longo da próxima década”, explica.
"Há uma longa discussão sobre se o problema da economia argentina é fiscal ou externo. Estou mais inclinado para o externo e, nesse sentido, o aumento das exportações do setor dos hidrocarbonetos vai ser decisivo para moderar (reduzir) a restrição externa na próxima década", observa.
Arceo diz que o impacto da expansão da redegasodutos na Argentina será visto "com toda aintensidade" no próximo inverno austral e que isso não significará apenas a substituição das importaçõesgás natural liquefeito, mas também uma menor importaçãocombustíveis líquidos, particularmente o diesel, para o sistemageraçãoenergia elétrica.
3. Extraçãolítio
A Argentina possui uma das maiores reservas mundiaislítio, mineral utilizado na fabricaçãobaterias e que hoje é muito demandado pela indústriacarros elétricos. O país é o quarto maior produtor do mundo, atrás apenas da Austrália, Chile e China.
"A indústria do lítio na Argentina atrai atualmente investimentos muito importantes", explica Patricia Vásquez, pesquisadora do centroestudos Wilson Center, nos Estados Unidos.
Além dos dois projetosexploração que já existiam, um terceiro iniciou operaçõesmeados deste ano e prevê produzir 40 mil toneladas2024, o que representará exportações adicionais para o paíscercaUS$ 820 milhões (R$ 4 bilhões), se o preço no mercado internacional permanecer o mesmo.
Outros dois projetos anunciaram o início da produção2024 e, no total, a indústria planeja aumentar seu volumeexportação37,5 mil toneladas para 141,5 mil. Isso significa receitas adicionaismaisUS$ 2,1 bilhões (R$ 10,2 bilhões) por ano.
"O lítio é importante para uma economia como a Argentina, que precisadinheiro, mas também não é o que vai salvar o país", ressalva Vásquez.
Faltadólares ou gastos públicos elevados?
No centro do debate sobre os desafios econômicos persiste a discussão sobre onde realmente está a chave para enfrentar a crise: uma maior entradadólares no país, como enfatizava o candidato derrotado Sergio Massa, ou um corte profundo nos gastos fiscais, como destaca o vitorioso Milei.
"A economia argentina é disfuncional e tem muitos problemas, mas para mim a questão central é que não tem reservas e por isso o mercado espera uma desvalorização e há uma inflação muito alta", diz Kiguel.
O economista prevê que a maior receita cambial2024 será usada para pagar as dívidasimportação que o país tem.
O Banco Central da Argentina projetou um superávit comercialUS$ 22,4 bilhões (R$ 107 bilhões) até 2024, valor que aumentaria para quase US$ 42 bilhões (R$ 204 bilhões)2030.
Se essa previsão se concretizar, o mercado argentino terá mais dólares, e o país estarámelhor posição para enfrentar seus desafios econômicos.
No entanto, nem todos acreditam que a chave é um fluxo maiormoeda estrangeira.
O economista-chefe da Fundação Latino-AmericanaPesquisas Econômicas (Fiel), Juan Luis Bour, diz acreditar que o problema não está na balança comercial, como o governo peronista tem dito, mas nos gastos públicos, e que a próxima gestão terá que fazer um ajuste fiscal.
"Essa é uma visão típicaquem dirige uma economiaações (restrições cambiais) na qual todo o problema da economia argentina se resolve conseguindo alguns dólares para distribuí-los com certa discrição, para manter a taxacâmbio sob controle... Todas são medidas contrárias a uma política econômica saudável", diz Bour à BBC News Mundo.
"Embora alguns setores devam se recuperar2024 e outros possam registrar crescimentocomparação com anos anteriores, não acredito vão retornar ao níveloutrora, porque a maior parte da economia éserviços e indústria. Além disso, a maior parte desses setores deve apresentar queda durante o próximo ano como parteum processoajuste para evitar um processo hiperinflacionário", prevê.
Alguns analistas dizem acreditar que uma combinaçãoreceitas fiscais mais altas provenientes das exportações e uma diminuição da despesa pública ajudará o próximo presidente a estabilizar as finanças.
Não será fácil para Milei, agora à frente da Casa Rosada. Mas pelo menos nem tudo são más notícias a médio prazo.