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'Grande vitória, mas não fim da ameaça': o que acontece após STF decidir contra marco temporal para terras indígenas:
"Mas a bancada ruralista está com uma cobiça nas terras indígenas e quer a todo custo aprovar [no Congresso] uma tesemarco temporal."
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Fim do Matérias recomendadas
Com um placar9 votos a 2, a Corte entendeu que o direito dos povos originários a territórios tradicionalmente ocupados não depende da presença dos indígenas no local antes1988.
Diversos territórios indígenas que foram tradicionalmente ocupados e com os quais os povos possuem vínculos não estavam sob o controle dos indígenas oudisputa na data da aprovação do texto constitucional, mas foram reocupados pelos povos origináriosanos seguintes.
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Para o ministro Luís Roberto Barroso, não existe um "marco temporal fixo e inexorável" para a ocupação dos territórios indígenas.
"A ocupação tradicional também pode ser demonstrada pela persistência na reivindicaçãopermanência na área, por mecanismos diversos", afirmou Barroso.
Votaram pela rejeição da limitação temporal para oficializar territórios indígenas os ministros Edson Fachin, Luis Roberto Barroso, AlexandreMoraes, Cristiano Zanin, Dias Toffoli, Luiz Fux, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes e Rosa Mendes.
Votaram a favor do marco temporal os ministros Kassio Nunes Marques e André Mendonça.
O ministro Nunes Marques, que teve voto vencido a favor do marco temporal, disse que o limitedata cria segurança jurídica para as demarcações.
Já o ministro André Mendonça afirmou que a inexistênciamarco cria a possibilidadeexigênciademarcaçãoáreas ocupadastempos imemoriáveis.
A rejeição do marco temporal aconteceu na decisão sobre uma disputa entre o povo Xokleng e o EstadoSanta Catarina, mas tem repercussão geral, ou seja, afeta todos os casos similares.
Atualmente, estãocurso cerca300 processosdemarcação cujos resultados serão afetados pela decisão desta quarta.
"O alcance da decisão vai muito além do caso concreto", afirmou o ministro Dias Toffoliseu voto. Além disso, a decisão vale para inúmeros casos futurosdisputas sobre processosdemarcação.
Há hoje 1,69 milhãopessoas indígenas no Brasil, o equivalente a 0,83% da população brasileira, segundo os dados já divulgados do Censo 2022 E a maior parte dos indígenas — cerca63% — vive hoje fora dos territórios indígenas oficialmente limitados.
Juristas indígenas: 'Não é o fim da ameaça'
Apesar da decisão do Supremo, já foi aprovada na Câmara e tramita no Senado um projetolei para estabelecer o marco temporal via legislação - algo visto com preocupação pelos povos indígenas, apesar da vitóriahoje para eles.
"Eu não duvido que o Congresso Nacional queira continuar tirando uma quedabraço com o Supremo Tribunal Federal", diz Maurício Terena, coordenador jurídico da Apib.
Os deputados que defenderam o projeto na Câmara vêem com antagonismo o fato do STF estar julgando o temo. O relator do projetolei, deputado Arthur Oliveira Maia (União-BA), defendeu que um marco temporal traria "mais segurança jurídica para proprietários rurais". Arthur Lira (PP-Al) reconheceu que o tema avançou rapidamente na casa por causa do julgamento no STF.
“Tentamos um acordo para que a gente não chegasse a este momento", disse Lira. “Nós não temos nada contra povos originários, nem o Congresso tem e não pode ser acusado disso. Agora, nós estamos falando0,2% da população brasileiracima14% da área do país", completou, segundo informações da Agência CâmaraNotícias.
Caso o Congresso aprove uma lei estabelecendo um marco temporal, o mais provável é que o assunto volte ao Supremo.
A decisãohoje fortalece a ideiaque uma lei comum não poderia tratar do tema, que é um direito garantido na Constituição.
Para mudar temas constitucionais, é necessária uma PEC (PropostaEmenda à Constituição), que precisa3/5 dos votos dos parlamentares para ser aprovada.
"Ainda existe uma possibilidade fortea bancada ruralista se movimentar eresposta ao Supremo tentar trazer algo novo via PEC", afirma Kleber Karipuna.
"Vamos continuar alertasrelação a isso para que não tenhamos nenhuma regressão aos direitos dos povos indígenas."
Mesmo uma PEC poderia ser questionada na Justiça.
Se o Supremo entender que o direito aos territórios independentementelimitedata para a ocupação é uma cláusula pétrea, o tema não poderia ser alterado nem mesmo por uma PEC.
Uma lei sobre marco temporal também poderia ser vetada pelo presidente, mas juristas indígenas acreditam que isso é improvável.
A questão da indenização
Mesmo com a decisão contra o marco temporal, ainda há uma questão a ser decidida no julgamento desta quarta.
Estãodisputa duas visões sobre a possibilidadeindenizaçãonão-indígenas que ocupam terras indígenas que venham a ser demarcadas.
A questão da indenização para os posseirosterras não estava no caso concreto sendo julgado, explica o advogado Rafael Modesto, que defendeu os Xokleng no caso específico julgado pelo Supremo.
Ela foi trazida no voto do ministro AlexandreMoraes, que defende que seja estabelecida uma compensação como condição prévia para as demarcações.
Segundo lideranças indígenas, a indenização nesses moldes tornaria inviáveis as demarcações, já que a União não teria orçamento para fazer as compensaçõestodos os casosdisputa.
Após o votoMoraes, as organizações indígenas entraram com uma interpelação argumentando contra esse entendimento.
"Na época do fim da escravatura os senhoresescravos queriam ser indenizados por perderem as suas mãosobra escrava. Talvez a gente esteja dianteum julgamento tão simbólico e civilizacional para o país que novamente se decide se os escravocratas invasoresterras públicas terão direito aindenização", diz Maurício Terena.
A outra visão foi trazida pelo ministro Cristiano Zanin, que afirma que a oficialização das terras indígenas não pode dependerindenização préviaposseiros.
O ministro defende que posseirosboa-fé que ocuparam terras da União sem saber que se tratavamáreas indígenas podem até ter direito a indenização, mas ela não estará vinculada à demarcação.
Ou seja, eles precisarão entrar com um processo judicial à parte para serem compensados pela União e a demarcação não depende da existência nem do resultado desse processo.
Para grupos do movimento indígena, esse seria um meio-termo aceitável.
Isso porque, nesse entendimento, os posseiros não teriam direitopropriedade sobre as terras indígenas e os eventuais títulospropriedade que tenham recebidos foram atos ilegais.
A compensação seria pela atuação irregular da União ao conceder uma área que não poderia ser transferida. E também por eventuais benfeitorias (melhorias) no território feitas pelos invasores.
"Essa decisão traria um equilíbrio se viesse a beneficiar principalmente pequenos agricultores que ocupem área indígenaboa-fé", explica o advogado Rafael Modesto, que defendeu os Xokleng.
"Então ele teria além do direito à indenização das benfeitorias feitas na áreauma indenização por ato ilícito do Estado ou da União. Mas essa compensação não seria dentro do processodemarcação, mas seria necessário um processo administrativo próprio", diz Modesto.
O que disseram os ministros
O relator do caso, ministro Edson Fachin, disseseu voto que os "direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam” não depende da existênciaum marco temporal nemum conflito ou controvérsia judicial na data da promulgação da Constituição.
Segundo ele, o processo demarcatório deve ser definido por tradicionalidade da ocupação, verificada por laudo antropológico, não por marco temporal.
Fachin afirma ainda que a ocupação tradicional indígena é diferente da propriedade civil, pois precisa abranger não só a terra habitada, mas a usada para atividades produtivas, a terra imprescindível à preservação dos recursos ambientais necessários para seu bem estar, além das necessárias àreprodução física e cultural.
"A função econômica da terra (indígena) se liga, visceralmente, à conservação das condiçõessobrevivência e do modovida indígena, mas não funciona como mercadoria para essas comunidades”, afirmou o relator.
O ministro Dias Toffoli também entende que a Constituição não estabelece marco temporal para oficializar territórios indígenas e afirma que a Corte faz, com a votação, a "pacificaçãouma situação histórica".
O ministro Luis Roberto Barroso, que também votou contra o marco temporal, afirmou que,casosque a comunidade indígena foi forçada a se afastar da áreaocupação tradicional, ela pode comprovar o vínculo cultural com laudos antropológicos.
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