A complexa relação humana com o canibalismo ao longo da História:campeonato brasileiro de futebol

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Legenda da foto, Ilustração do séculio 19 sobre sacrifícios humanos entre povos andinos

O canibalismo é uma prática documentada na África Ocidental e Central, na Melanésia, na Nova Guiné,campeonato brasileiro de futebolalgumas ilhas da Polinésia ecampeonato brasileiro de futeboltribos da Sumatra. Também era comum nas sociedades pré-estatais.

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Na história contemporânea, alguns casos individuais foram atribuídos a indivíduos instáveis ou criminosos e a situações difíceis, como a crise alimentar na Ucrânia, na décadacampeonato brasileiro de futebol1930, e na Segunda Guerra Mundial, durante o cercocampeonato brasileiro de futebolLeningrado ecampeonato brasileiro de futebolBergen-Belsen,campeonato brasileiro de futebolacordo com os oficiais britânicos que libertaram o campocampeonato brasileiro de futebolconcentração.

Mas acampeonato brasileiro de futebolatualidade é controversa. O que é geralmente aceito é que as acusaçõescampeonato brasileiro de futebolcanibalismo têm sido historicamente mais comuns do que a própria prática, como refere Alberto Cardín no livro Dialéctica y Canibalismo. O canibal foi quase sempre "o outro" no imaginário colonial.

O termo canibal é um legadocampeonato brasileiro de futebolCristóvão Colombo. É a deformaçãocampeonato brasileiro de futebol"Carib", um povo originário das Índias Ocidentais e que Colombo acreditava ser súdito do Grande Khan da China (kannibals).

Colombo, preparado para se encontrar com o Grande Khan, tinha consigo intérpretescampeonato brasileiro de futebolárabe e hebraico e, ao ouvir dos nativos a palavra "caniba" (ou "canima"), pensou que estes poderiam ser os homens com cabeçacampeonato brasileiro de futebolcão (cane-bal) descritos pelo explorador John Mandeville.

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Legenda da foto, 'Canibais saboreando restos humanos',campeonato brasileiro de futebolFrancisco Goya

Povos canibais

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No transcorrer da história, os judeus já foram acusadoscampeonato brasileiro de futebolcomer crianças cristãs, assim como os ciganos. Na Antiguidade, os gregos relataram casoscampeonato brasileiro de futebolantropofagia entre povos não-helênicos, os "bárbaros". E os espanhóis e portugueses fizeram o mesmocampeonato brasileiro de futebolrelação à práticas antropofágicas registradas no Império Asteca, no México, durante as chamadas guerras floridas, e entre os índios Tupinambás do Brasil, nas primeiras décadas do período colonial.

Neste sentido, William Arens salientou que, para além dos casoscampeonato brasileiro de futebolcanibalismo praticado por necessidade, a prática é um mito e que a descriçãocampeonato brasileiro de futebolum grupo humano como canibal é apenas uma reivindicação retórica e ideológica para estabelecer uma superioridade moral sobre esse grupo.

Na mesma linha, Michelcampeonato brasileiro de futebolMontaigne assinalava que na Europa, no século 16, qualquer pessoa ou coisa com hábitos diferentes aos tradicionais era chamadacampeonato brasileiro de futebolbárbaro (ou canibal).

Ele considerava as guerras religiosas no seu país natal, a França, e a práticacampeonato brasileiro de futeboltortura praticada pela própria Igreja mais bárbaros do que, por exemplo, a prática dos Tupinambáscampeonato brasileiro de futebolingerir o corpocampeonato brasileiro de futebolum defunto.

No entanto, a amplitude dos casos registados mostra que o canibalismo não é uma invenção. A definição mais recentecampeonato brasileiro de futebolcanibalismocampeonato brasileiro de futebolF. B. Nyamnjoh refere-se ao consumocampeonato brasileiro de futebolseres humanoscampeonato brasileiro de futebolforma material, metafórica, simbólica ou fantasiosa.

Com efeito, a difusão da Internet contribuiu para multiplicar as fantasias canibais e sexualizadascampeonato brasileiro de futebolmilharescampeonato brasileiro de futebolpessoas que sonham, nos fóruns,campeonato brasileiro de futeboldevorar ou ser devoradas por membros do seu gênero sexual preferido.

Assassinos e canções dos Rolling Stones

Há casos extremos, como o do assassinocampeonato brasileiro de futebolsérie Fritz Haarmann ("O Carniceirocampeonato brasileiro de futebolHanôver") ou Armin Meiwes, um técnicocampeonato brasileiro de futebolinformáticacampeonato brasileiro de futebolRotenburg (Alemanha) que,campeonato brasileiro de futebol2001, procurou por meio da Internet "um jovem rapaz, entre os 18 e os 25 anos" para comê-lo (o pedido foi bem sucedido, pois Jürgen B. concordou com a ideia e foicampeonato brasileiro de futebolfato morto e comido por Meiwes).

Um dos casos mais chocantes foi o do estudante japonêscampeonato brasileiro de futebolliteratura inglesa Issei Sagawa, que comeu um estudante alemão da Sorbonnecampeonato brasileiro de futebolParis,campeonato brasileiro de futebol1981, descrevendo o atocampeonato brasileiro de futebolpormenores.

A forma como revelou este fato tornou-o um herói nacional no Japão e gerou vários best-sellers. Até os Rolling Stones lhe dedicaram uma cançãocampeonato brasileiro de futebol1986: Too much blood.

O canibalismo não nos é estranho. O ato católico da Eucaristia e a comemoração da Última Ceia remetem à ideiacampeonato brasileiro de futebolingerir um totem, um símbolo sagradocampeonato brasileiro de futebolum grupo, clã ou linhagem, para absorver o seu poder distintivo. Por detrás do dogma da transubstanciação católica está expressa a ideiacampeonato brasileiro de futeboladquirir a divindade (imortalidade, perdão dos pecados…) por absorção através da ingestão do corpocampeonato brasileiro de futebolCristo. Este "canibalismo ritual" partilha muitas das características do conceito.

Noutras culturas da Ásia e da Austrália, por exemplo, acredita-se que comer o pêniscampeonato brasileiro de futebolum tigre proporciona maior virilidade. Os indígenas baruya,campeonato brasileiro de futebolPapua Nova Guiné, acreditam que comer o inimigo (exocanibalismo) perpetuará a alma do comensal. Assim como os fore, também da Nova Guiné, buscam a eternidade ingerindo uma partecampeonato brasileiro de futeboluma pessoa falecida (endocanibalismo). Em suma: o corpo do outro é um alimento para o corpo, a mente e a alma.

A questão que se coloca é, por um lado, quem tem o direitocampeonato brasileiro de futeboljulgar e avaliar os aspectos contraditórios dos povos do passado. E, por outro lado, porque é que se tornou habitual pensar que o canibalismo é um costume extraordinário.

Um exemplo deste último caso está na obra do antropólogo francês Pierre Clastres, que fala da normalidadecampeonato brasileiro de futebolfenômenos como a guerra e o canibalismo entre os indígenas guayaki como se fossem típicoscampeonato brasileiro de futebolpovos exóticos, quandocampeonato brasileiro de futebolmuitos casos estes povos foram as vítimas.

Já os Andamaneses da Baíacampeonato brasileiro de futebolBengala ganharam no Ocidente a reputaçãocampeonato brasileiro de futebolcanibais belicosos, como descreve Radcliffe-Browncampeonato brasileiro de futebolThe Andaman Islanders (Os Ilhéuscampeonato brasileiro de futebolAndaman,campeonato brasileiro de futeboltradução literal para o português,campeonato brasileiro de futebol1922), pois faziamcampeonato brasileiro de futebolpedaços as suas vítimascampeonato brasileiro de futebolguerra e costumavam pendurar os ossos dos seus antepassados.

De fato, foram escritos vários romancescampeonato brasileiro de futebolque, invariavelmente, o enredo envolvia um naufrágio causado pelos recifescampeonato brasileiro de futebolcoral ao largo da costacampeonato brasileiro de futebolAndaman,campeonato brasileiro de futebolque ocorriam episódioscampeonato brasileiro de futebolcanibalismo, contada a partir da históriacampeonato brasileiro de futebolum único sobrevivente.

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Legenda da foto, Dirigido por Juan Antonio Bayona, 'A Sociedade da Neve' contacampeonato brasileiro de futebollíngua espanhola a história do desastre aéreo nos Andes

Perversões individuais

O canibalismo seria um fenômeno mais típico, nãocampeonato brasileiro de futebolpovos exóticos, mas uma consequênciacampeonato brasileiro de futebolperversões individuais, situações catastróficas e peculiares.

Nos anos 1990, jornalistas ocidentais escreveram sobre o canibalismo no contexto da guerra civil da Libéria (1989-1997). O historiador Stephen Ellis sugeriu que as causas não eram apenas políticas, mas podiam ser explicadascampeonato brasileiro de futeboltermos religiosos ou espirituais característicos dos rituais das sociedades secretas.

Em suma, as descrições contemporâneas do canibalismo, que parecem ecoar os estudos arqueológicos, mostram que,campeonato brasileiro de futeboluma forma oucampeonato brasileiro de futeboloutra, como assinalou Claude Lévi-Strauss, "somos todos canibais".

*David Lagunas é professorcampeonato brasileiro de futebolAntropologia da Universidadecampeonato brasileiro de futebolSevilla, na Espanha.

**Este artigo foi publicado originalmente no sitecampeonato brasileiro de futebolnotícias acadêmicas The Conversation e republicado sob licença Creative Commons. Leia aqui a versão originalcampeonato brasileiro de futebolespanhol.