‘Risco é constante’, diz embaixador brasileiro no Iraque:bwinone 8

O embaixador Ánuar Nahes (Foto: Arquivo Pessoal)
Legenda da foto, Ánuar Nahes vive e trabalhabwinone 8prédio fortificado, com vigias armados e proteção contra explosões

bwinone 8 Há cercabwinone 8um ano no Iraque, o embaixador brasileiro Ánuar Nahes diz que ainda enfrenta um cotidianobwinone 8risco constantebwinone 8Bagdá, dez anos após a invasão militar do país liderada pelos Estados Unidos.

Por maisbwinone 820 anos, desde a primeira Guerra do Golfo, o Brasil ficou sem representação diplomática no Iraque. Por motivosbwinone 8segurança, a embaixada brasileirabwinone 8Bagdá foi fechadabwinone 81991 e,bwinone 82006, os assuntos diplomáticos entre os dois países passaram a ser conduzidos por um escritório na Jordânia.

A situação só mudou no início do ano passado, pouco depoisbwinone 8as últimas tropas americanas deixarem o Iraque após os anosbwinone 8guerra que se seguiram à invasão do país,bwinone 8marçobwinone 82003.

O escolhido para assumir o comando da nova missão diplomática foi o embaixador Ánuar Nahes,bwinone 860 anos, que já serviu como embaixadorbwinone 8Doha ebwinone 81995 chefiou a Divisão do Oriente Próximo do Ministério das Relações Exteriores.

Paulistabwinone 8Santa Adélia, Nahes assumiu a Embaixadabwinone 8janeirobwinone 82012, mas só se mudou para o Iraquebwinone 8março do mesmo ano.

Em Bagdá, entre gestões para reaproximar os dois países que foram grandes parceiros comerciais nas décadasbwinone 81970 e 1980, Nahes vive e trabalhabwinone 8um prédio fortificado, com vigias armados e proteção especial contra explosões. Assim como os outros diplomatas, ele também é obrigado a restringir suas saídas para eventos sociais por motivosbwinone 8segurança.

"Há risco constante", disse Nahesbwinone 8entrevista concedida por telefone à BBC Brasil durante uma passagem do diplomata por São Paulo, no último sábado. Confira abaixo os principais trechos da conversa com o embaixador.

bwinone 8 BBC Brasil - O senhor tem uma grande experiência com Oriente Médio, foi chefe da Divisão do Oriente Próximo do Itamaraty e serviu no Líbano, Tunísia e Doha. Como o senhor avalia a situação do Iraque agora, dez anos depois da invasão americana?

bwinone 8 Ánuar Nahes – O Iraque ficou ocupado até o finalbwinone 82011. A invasão do Iraque teve por objetivo derrubar a ditadurabwinone 8Saddam Hussein. Isto é, o objetivo explícito (era esse), os que estavam por trás da ideia são discutidos até hoje. Mas o objetivo explícito era derrubar Saddam e restaurar a democracia no Iraque.

Nesses primeiros anos houve uma espéciebwinone 8democracia imposta e somente agora, a partir da retirada dos americanos, é que o Iraque está exercendo esta democracia sozinho, sem tutela.

Então você pode imaginar, (como)bwinone 8qualquer processo político, há agora a ocupação dos espaços vazios deixados pelos americanos e, sobretudo,bwinone 8um momentobwinone 8que as eleições provinciais, marcadas para 20bwinone 8abril, estão chegando.

Há sim uma briga política ferrenha no Iraque e, por causa da história recente do país,bwinone 8violência, muitas pessoas recorrem à violência para tentar desarticular e descarrilar o processo democrático, muita gente não quer o processo democrático.

O Iraque tem hoje então esse problemabwinone 8violência interna, por fatores internos e motivado também por fatores regionais. Mas está indo, democracia é uma coisa difícilbwinone 8consolidar, é preciso paciência,bwinone 8concessões. Nós no Brasil sabemos muito bem como é que é isso.

O Iraque na verdade está caminhando com suas próprias pernas faz um ano apenas. Os americanos saírambwinone 8lábwinone 8dezembrobwinone 82011. Um ano e três meses, foi há pouco tempo.

bwinone 8 BBC Brasil - Pelo que o senhor pode sentir, qual é a avaliação da populaçãobwinone 8geral sobre a guerra e a invasão, dez anos depois?

bwinone 8 Nahes – É uma misturabwinone 8amor e ódio. Por um lado, a maioria da população é grata pelo final da ditadurabwinone 8Saddam. Mas, por outro lado, acredito que essa não fosse a intenção, (mas) direta ou indiretamente, os Estados Unidos acabaram fazendo muito mal ao Iraque.

Primeiro na guerra para tirar o regimebwinone 8Saddam do Kuwait, (antes) na Guerra Irã-Iraque – quando os ocidentais armaram ambos os lados –, e (depois) na invasãobwinone 82003, quando os americanosbwinone 8um primeiro momento foram bem recebidos, mas quando se tornaram os administradores do Iraque, tomaram certas medidas das quais os iraquianos se ressentem hoje.

Eles se ressentem da desestruturação do Estado iraquiano feita durante o tempo do Paul Bremer (ex-diplomata americano que chefiou a Autoridade Central da Coalizão no Iraque entre 2003 e 2004), ele acabou com as instituições.

Agora, passados tantos anos, a gente pode dizer que no calor do momento, quem sabe qual seria a melhor atitude a se tomar?

Há essa ambivalência por parte dos iraquianos. Se por um lado os americanos os livrarambwinone 8Saddam, por outro, o país que eles deixaram ao se retirar é um país dividido, é um país violento. Então há um mistobwinone 8amor e ódio.

bwinone 8 BBC Brasil – Este mês fez um ano que o senhor se mudou para Bagdá. Como é a vida no Iraque? Vocês têm um esquemabwinone 8segurança especial?

bwinone 8 Nahes – Fez um ano dia 1ºbwinone 8março. Nós temos duas casas, é um compound no qual há a residênciabwinone 8representação, há o escritório – que é a chancelaria –, e há a residência do resto do pessoal.

Como toda residênciabwinone 8certa importância no Iraque, é toda cercada por uma camada duplabwinone 8blocosbwinone 8concreto para amenizar o impactobwinone 8uma explosão. Não que a explosão venha a ser feita contra a embaixada do Brasil, não há razão. Mas,bwinone 8repente, ali perto.

Nós temos uma empresa britânica que cuida da guarda, são quatro profissionais supervisores e todos os demais são iraquianos. Temos também três carros blindados. Então há uma segurança,bwinone 8proteção, segurança armada.

Olha, a gente só sai mesmo para uns poucos eventos sociaisbwinone 8embaixadas, são poucos eventos, saímos para ir a reuniões do governo, mas até o governo tem risco. Por exemplo, você viu aí (o atentado) no Ministério da Justiça (sériebwinone 8atentados a bombas e armasbwinone 8fogo que deixaram maisbwinone 820 mortos no último dia 14)? Se nós tivéssemos fazendo uma visita, teríamos sido colhidos pela explosão, pelo tiroteio.

Então há um sempre um risco, há risco constante.

bwinone 8 BBC Brasil – Quantas pessoas trabalham na embaixada?

bwinone 8 Nahes – Temos três diplomatas, contando comigo, e mais dois funcionários do quadro não diplomático e dois funcionários locais.

bwinone 8 BBC Brasil – O senhor já se sentiu pessoalmentebwinone 8risco nesse período?

bwinone 8 Nahes – Toda vez que você sai, quando você parabwinone 8um checkpoint (bloqueio), você olha para o lado e está cercadobwinone 8carros, é um trânsito intenso, e um deles pode estar carregado com uma bomba e explodir.

Então, toda vez que você sai, você está com medo. Bom, não é medo, eu não tenho medo, você sai com a possibilidade ao seu lado. Por exemplo, como eu te falei, onde aconteceu o atentado, ali no Ministério da Justiça, ébwinone 8frente ao Ministério das Relações Exteriores. Ora, uma vez por semana eu vou ao Ministério das Relações Exteriores.

Nós já passamos por lugares onde no dia anterior houve uma explosão. Eu até comento com os meninos que trabalham comigo, eles são diplomatas jovens e dizem "embaixador, já pensou se a gente estivesse passando aqui àquela hora?". Eu digo, "pois é meu filho, você teria visitado Deus mais cedo". Então é isso, é um risco.

bwinone 8 BBC Brasil – Há outros brasileiros morando no Iraque?

bwinone 8 Nahes – Olha, há 35 brasileiros no Iraque, nós conseguimos descobrir isso, a maior parte deles no Curdistão, no norte. Há alguns jogadoresbwinone 8futebol, há alguns pastores religiosos, porque há uma comunidade cristã no Curdistão. E há também cidadãosbwinone 8dupla nacionalidade, uma brasileira casada com iraquiano...

bwinone 8 BBC Brasil – O Iraque foi um grande parceiro do Brasil nos anos 1970 e 1980. Há espaço para o Brasil no futuro do Iraque?

bwinone 8 Nahes – Só pelo movimento natural,bwinone 8redemocratização e abertura econômica, presençabwinone 8embaixadores, o comércio hoje girabwinone 8tornobwinone 8US$ 1 bilhão por ano. Mas o que entrava um pouco esse comércio? É a instabilidade política e a situação securitária no Iraque por um lado.

Por outro, há empresas brasileiras já interessadasbwinone 8participar dos trabalhosbwinone 8reconstrução no Iraque, que ainda vão demorar 20 ou 30 anos, já que o país todo precisa ser refeito e reestruturado. Se você andabwinone 8Bagdá hoje você vê uma cidade com a infraestrutura dos anos 1970.

Mas hojebwinone 8dia o comércio não é mais feito por intermédiobwinone 8agentes estatais, então muita coisa que o Brasil poderia exportar para o Iraque, a Turquia exporta, porque está ali. Você tem o fator China.

Por exemplo, o Brasil exportou muito (o automóvel) Passat. Quando o Brasil quis retomar a exportaçãobwinone 8Volkswagen para lá, o tal do novo Passat, a Alemanha falou, "muito bem, só que quem vai exportar o Passat seremos nós", porque a Alemanha também precisa exportar, a matriz também precisa exportar.

Então os dois países mudaram, mas é crescente o númerobwinone 8empresas e empresários iraquianos indo para o Brasil. Eles gostam do Brasil, o Brasil não tem passado colonial, há um bom nome deixado pela nossa presença lá nos anos 1970 e 1980.

bwinone 8 BBC Brasil – Quais são os caminhos para que o Brasil aumente esse comércio com o Iraque? E quais são os gargalos?

bwinone 8 Nahes – Os gargalos principais são a violência interna no Iraque, a instabilidade política, consequentemente a instabilidade econômica e a fragilidade institucional.

No Iraque, quando chega uma carga até a agênciabwinone 8inspeções, nem sempre uma se coordena com a outra. Ou seja, o Iraque também tem que reconstruir suas instituições, suas agências, seus órgãosbwinone 8controle.

Sobre o Brasil, neste momento o nosso mercado interno está aquecido, assim como regionalmente, ou na África Ocidental, na Europa, quer dizer, o Iraque é um parceiro novo.

Então a gente têm – a nossa embaixada no Iraque e a embaixada do Iraque no Brasil – pouco a pouco sensibilizado pessoas a visitarem, a virem.

Já houve duas reuniões da Comissão Mista (Brasil-Iraque), já houve uma missão empresarial para o Iraque. Duas empreiteiras brasileiras já foram lá, uma está lá e outra querendo entrar no Iraque. A Câmarabwinone 8Comércio Iraque-Brasil está querendo realizar uma missão empresarial iraquiana no Brasil.

Há (também) missões técnicas. O Iraque quer aderir à OMC (Organização Mundial do Comércio), então nós vamos organizar um cursobwinone 8informação para os iraquianos, o Iraque ficou interessadobwinone 8nosso sistemabwinone 8votação eletrônica, mandou uma delegação ao Brasil, quer aproveitar esse sistema para as eleições do ano que vembwinone 8uma zona eleitoral piloto.

A gente está tentando diversificar, mas há o fator distância também, o Brasil é longe, a passagem é cara. A embaixada faz seu trabalho paciente, não apenas comercial, não é só isso e toma tempo.

O importante agora é que o Iraque mantenha o calendário eleitoral, faça a eleição (provincial)bwinone 8abril, faça a eleição (parlamentar)bwinone 82014, a população vai votar. A população está muito cansada, quer ter uma vida normal.