O que é o cercoTúpac Katari, anunciado por seguidoresEvo e temidoLa Paz:
Quatro semanas após as eleiçõesque a oposição denunciou ter ocorrido uma fraude e que, segundo a Organização dos Estados Americanos (OEA), teve "irregularidades", estes movimentos sociais apelam para uma estratégia que já funcionou antes e que se origina no século 18.
A lenda do cerco
Em 2003, uma mobilização que aparentemente não representava um perigo real para o governoGonzalo SánchezLozada transformou-seum protesto maciço que terminou com a renúncia do então presidente.
As primeiras mortes ocorridas na crise agravaram a situação e levaram as Províncias indígenas no entornoLa Paz a tomar uma decisão: reeditar o cercoTúpac Katari.
A violenta resposta do governoEl Alto acabou sendo conhecida como o MassacreOutubro e deixou mais70 mortos. Gonzalo SánchezLozada renunciou algumas semanas depois,17outubro2003.
Em 2005, com Carlos Mesa como presidente, houve uma nova crise política que levou a um novo bloqueio totalLa Paz. A medida funcionou mais uma vez, e o mandatoMesa terminou prematuramentemeados daquele ano.
Essa estratégia remete a 1781, um dos anos mais icônicos das lutas dos povos indígenas contra o colonialismo espanhol. Julian Apaza, conhecido como Túpac Katari, liderou dezenasmilharesindígenas no cerco à cidadeNossa Senhora da Paz por vários meses, desencadeando cenashorror e desespero entre os espanhóis e descendentesespanhóis que viviam ali.
Embora o cerco tenha sido derrotado e Katari punido com a morte, esse episódio ficou conhecido como um feito indígena que forçou os representantes da colônia a ficaremjoelhos por alguns meses.
Em meadosnovembro (2019), Evo Morales fez uma menção ao líder indígena emconta no Twitter. "O imperialismo espanhol pensou que, ao desmantelar Túpac Katari há 238 anos, acabaria com a força do povo para romper as correntes do colonialismo. Hoje, mais do que nunca, a luta continua. Diante da repressão do golpismo racista, repetimos a frase: 'Voltarei e serei milhões!'."
A reedição do cerco
Após a renúnciaEvo, uma grande marchamoradores das Províncias indígenas percorreu La Paz. "Agora sim, guerra civil", eles gritavam enquanto avançavam pelo centro da cidade e caminhavam ao redor do Palácio do Governo e da Assembleia Legislativa Plurinacional.
"Cerco até as últimas consequências, companheiros", disse um dos manifestantes que vestia um poncho vermelho e carregava uma wiphala, bandeira indígena elevada a símbolo nacional por Morales.
Ele explicou que o objetivo dos manifestantes é deixar La Paz "sem um grãoarroz", conforme uma decisão tomada no fimsemana,uma assembleia dos representantes das Províncias eorganizações sociais ligadas a Morales, na cidadeEl Alto, quando decidiu-se sufocar a capital boliviana até que Áñez deixe a Presidência.
Caso ela não renuncie, o cerco começará entre as próximas terça e quarta-feiras (26 e 27/11) , com uma greve por tempo indeterminado e o "bloqueiomil ruas".
No entanto, as organizaçõesEl Alto ligadas a Morales não são as únicas que se juntarão à mobilização. As federaçõesprodutoresfolhacocaEl Chapare, no centro da Bolívia, também deram um ultimato a Áñez e dizem que nunca abandonarão o homem que começou como "um deles" e "chegou ao poderdefesa da coca".
O medo do cerco
Lizzy Moraibe é uma estudante universitária20 anos e foi a La Paz para estudar. Nos cercos2003 e 2005, ele moravaSanta Cruz e tinha menos6 anosidade. Ela diz que não sabe muito bem o que comprar para estocar antes do cerco.
"Há cada vez menos comida, e não sabemos quando isso vai acabar", diz Moraibe, que mora sozinha e vai ao mesmo restaurante todos os dias para almoçar. "A cozinheira toda vez me diz que há menos comida. Que não há frango, agora não há carne. Tudo está acabando."
Por outro lado, Joeris Vera sabe muito bem como foram os cercos recentes e decidiu aproveitar uma tarde livre para ir aos mercados. Por 2 kgcarne bovina, pagou o equivalente a R$ 126, algo que não deveria custado mais do que R$ 84 antes da atual crise.
"Felizmente, consegui isso, mas acho que a fila para o frango eratrês horas", diz ele, resignado.
Vera tem 45 anos e lembra das últimas vezes que o "cercoTúpac Katari" obrigou La Paz a estocar mantimentos e produtos básicos — e a deixou muito parecida com uma cidade fantasma.
"Eu não quero voltar a viver aquilo. Espero que solucionem a situaçãouma vez", diz ele.
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