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Como é viver na Islândia, o país 'mais amigável do mundo' para imigrantes:1neon54
"Isso aqui é um pequeno povoado", repetem os habitantes da capital Reykjavík.
Quase dois terços da população nacional se concentram nesse centro urbano, onde há edifícios coloridos com só dois ou três andares e onde a neve reina durante seis meses do ano. Durante o verão, o sol não se põe.
São cerca1neon54350 mil habitantes, não mais que isso.
Desses 350 mil, 10,6% são estrangeiros: se se juntassem, não chegam a lotar o estádio Spartak, na Rússia, onde Islândia e Argentina disputaram1neon54primeira partida.
Mas há duas décadas, eram apenas 2% da população total – o que revela um crescimento1neon54430%.
Sociedade homogênea
No mês passado, ao divulgar as estatísticas1neon542017, a revista Icelandic Review disse ter sido "o ano1neon54que recebemos mais imigrantes que1neon54nenhum outro1neon54toda nossa história".
O radiologista Fernando Bazán é um recém-chegado. Foi à Islândia com uma oferta1neon54trabalho tentadora, para um cargo1neon54especialista muito procurado no hospital da capital.
"Me atraiu o caráter igualitário do país – queria ver como era e experimentar a vida nessa sociedade que,1neon54fora, parece um pouco idílica", diz esse peruano1neon5436 anos.
Em uma ilha remota, a chegada incessante1neon54imigrantes como ele – e outros quase 15 mil1neon542017, segundo dados oficiais, 50% a mais que1neon542016 – traz consigo uma série1neon54desafios.
Em primeiro lugar, ela coloca1neon54xeque as crenças e pressupostos1neon54uma sociedade praticamente –1neon54parte, pelo isolamento – homogênea.
Para se ter uma ideia:1neon541996, 95% da população era 100% islandesa, segundo Statistics Iceland, o instituto oficial1neon54registros.
A homogeneidade e a capacidade1neon54gestão – muito mais simples1neon54um país pequeno – são com frequência assinaladas como fatores por trás do "êxito" da Islândia.
Da eficácia1neon54suas políticas1neon54segurança social, seus méritos1neon54relação ao meio ambiente (100% da energia vem1neon54fontes renováveis), seus avanços1neon54igualdade1neon54gênero (em janeiro, o país virou o primeiro do mundo a obrigar empresas a demonstrarem que pagam1neon54modo igualitário homens e mulheres), suas melhorias1neon54matéria1neon54saúde pública (um programa antitabaco conseguiu reduzir o consumo entre jovens com resultados extraordinários). E a lista continua.
Esses resultados são, paradoxalmente, os que atraem milhares1neon54estrangeiros a tentar a sorte nessa sociedade que, historicamente, quis preservar1neon54uniformidade.
Uma economia forte também teve papel fundamental.
"Na última metade do século, a Islândia experimentou um crescimento econômico substancial. Passou1neon54um dos países mais pobres da Europa a um dos mais ricos mediante uma série1neon54reformas1neon54livre mercado combinadas com um alto nível1neon54intervencionismo governamental", segundo o Instituto1neon54Políticas Migratórias.
Como consequência, o mercado1neon54trabalho islandês precisa1neon54mais mão1neon54obra.
Segundo a confederação empresarial do país, se o PIB mantiver o ritmo atual1neon54crescimento anual –1neon54entre 2,5 e 3%, pelas projeções mais conservadoras – a Islândia precisa preencher cerca1neon543 mil novas vagas.
Podem ser até mais. E com um índice1neon54desemprego1neon54apenas 2%, essa força1neon54trabalho só pode vir1neon54fora.
"A maior parte do fluxo (das pessoas1neon54fora que foram trabalhar no país) é uma migração econômica. A estabilidade que a Islândia oferece é um critério que pesa muito. A maioria1neon54nós diz que viemos para cá para trabalhar e poder guardar dinheiro", diz Èric Lluent, que emigrou1neon54Barcelona por causa da crise econômica espanhola e é autor1neon54dois livros sobre a história da Islândia.
A maior comunidade1neon54imigrantes na Islândia é a dos poloneses – 38,3% do total1neon54imigrantes –, seguidos pelos lituanos (5,2%) e filipinos (4,5%).
"Quando chegamos, encontramos trabalho1neon54questão1neon54dias", diz Tomasz Chaprek,1neon5436 anos, polonês responsável por um projeto1neon54integração para seus compatriotas na ilha. "Era 2007, pré-crise."
A crise a que ele se refere aconteceu1neon542008, quando três dos principais bancos comerciais islandeses faliram e a economia nacional entrou1neon54colapso, levando à queda1neon54emprego e, como consequência, a uma queda do fluxo migratório.
Mas essa má fase não durou muito. Em três anos, o PIB voltou a crescer e, com isso, a chegada1neon54novos residentes estrangeiros1neon54busca1neon54emprego.
Assim como cresceu a onda1neon54turistas, que triplicaram entre 2010 e 2017 – curiosamente depois1neon54a espetacular erupção do vulcão Eyjafjallajökull colocar a Islândia no mapa1neon54destinos a serem descobertos.
"Há um 'boom'. Hotéis estão sendo construídos e a chegada1neon54visitantes ajuda indiretamente os estrangeiros que moram aqui", opina Sussette Terrazas,1neon5428 anos, que viveu na Bolívia e no Peru antes1neon54parar na Islândia1neon542006.
"Embora isso também esteja mudando a cara da cidade. Os aluguéis disparam e isso satura a capacidade da ilha1neon54muitos sentidos. E nem todos veem isso com bons olhos", observa ela, que trabalha como guia1neon54turismo e tradutora.
País para criar filhos
Para muitos imigrantes, mudar-se para a Islândia não tem a ver só com emprego. Eles dizem também que é "o melhor lugar para se ter filhos".
"Para nós, a escolha1neon54mudar para cá teve a ver com o fato1neon54que aqui é o lugar ideal para formar uma família", diz Azahara Bejarano, catalã que mora na Islândia há quase três anos.
"Como mãe, me sinto cuidada", afirma Izabela Sobczak, polonesa1neon5435 anos, mãe1neon54uma menina1neon54três.
A educação primária, que é pública, mostra resultados.
"Há muitos lugares para levar as crianças e ajuda para mães solteiras. As escolinhas são1neon54alto nível e na escola se preocupam1neon54me perguntar o que preciso sendo mãe estrangeira", diz Sobczak.
Quanto à segurança, esse país que não tem Exército há décadas tem uma das taxas1neon54homicídio mais baixas do mundo,1neon54apenas 1,8 por ano. Em 2017, registrou o menor índice1neon54roubos desde 1999. Mantém-se consistentemente1neon54primeiro lugar no Índice Global1neon54Paz, da organização1neon54pesquisa global Instituto para Economia e Paz, que categoriza os países por seus níveis1neon54criminalidade, entre outros indicadores.
"Não dá para precificar a possibilidade1neon54que as crianças estejam na rua até as 22h sem que fiquemos preocupados, além das vantagens1neon54ter a natureza próxima", aponta Tomasz, seu marido, que tem licença paternidade1neon54três meses (e, segundo as estatísticas, 90% dos homens fazem uso do benefício).
E o idioma?
Mas o bem-estar familiar se choca com umas das realidades mais duras para quem emigra para a Islândia: a necessidade e dificuldade1neon54aprender islandês.
O idioma – com quatro declinações, infinitas irregularidades, dez letras adicionais1neon54seu alfabeto e uma pronúncia complicada para o ouvido pouco treinado – é central para a cultura e tradições do país.
Em outras palavras, é indispensável para quem quiser se sentir parte da sociedade, embora a maioria dos locais fale inglês na escola e seja perfeitamente bilíngue.
"A sociedade tem um medo visceral1neon54perder1neon54cultura, precisamente porque está estruturada1neon54torno do idioma e o islandês é uma língua minoritária que é falada só aqui. Dá para ver a cara1neon54pânico deles quando escutam outro idioma sendo falado na rua ou no bar", diz Chaprek.
Neste ano, o número1neon54estudantes1neon54islandês bateu recordes, segundo dados do Ministério da Educação, com mais1neon54200 mil registrados no mundo todo1neon54programas gratuitos via internet elaborados pelo governo. E o número1neon54inscritos1neon54cursos1neon54idioma na universidade local é o dobro que há dez anos, segundo o periódico Reykjavík Grapevine.
E mesmo assim...
"Eu estudei, mas é quase impossível", diz Herianty Novita Seiler, que emigrou da Indonésia há 18 anos e casou-se com um islandês. Às vezes ela não consegue ajudar os filhos com1neon54lição1neon54casa. "Isso me frustra bastante."
Takk!, Gjörðu svo vel, Mér þykir það leitt: obrigada,1neon54nada, desculpe. Até aí, pode até é fácil.
"Mas é extremamente difícil progredir depois dos primeiros níveis", agrega Wiola Ujazdowska, artista visual polonesa. "E se você não fala, você não pode nem sonhar com alguns trabalhos."
Os imigrantes recém-chegados se queixam1neon54que, embora haja muito emprego, os oferecidos a estrangeiros sem islandês avançado são pouco qualificados – na indústria1neon54pesca, por exemplo, que é chave para a economia, e mal-remunerados.
"Os recursos para facilitar o processo1neon54adaptação a estrangeiros são escassos e ruins. Em um país que tem um boom imigratório, isso irremediavelmente cria guetos", opina o peruano Bazán.
"Mesmo se eu conseguir decodificar todas essas sutilezas culturais, nunca vou estar no Livro dos Islandeses", ri Macieg Chmielewsky, um polonês-americano que deixou os Estados Unidos após a eleição1neon54Donald Trump.
O livro que ele menciona, Íslendigabók, é uma base1neon54dados que contém a genealogia1neon5495% dos islandeses, com uma árvore genealógica que começa 1.200 anos atrás. E "estar no livro" é1neon54algum modo uma validação social na ilha, explicam várias pessoas.
"Se é o país mais amigável? Bom, na superfície são legais. Mas levantam paredes invisíveis com tudo aquilo que for diferente deles", diz Novita Seiler.
Mudanças
Os estrangeiros viraram um fator1neon54pressão para que o governo islandês modifique suas políticas migratórias e as leis1neon54naturalização, que são as mesmas desde 1950.
No passado, por exemplo, os estrangeiros que adquiriam a cidadania deviam "islandizar" seu nome – modificando o sobrenome com o sufixo son para homens e dóttir para mulheres –, mas esse requisito já foi abolido pelo Parlamento.
"Não só os imigrantes têm que se adaptar, a sociedade também tem. Temos que nos encontrar na metade do caminho", diz Amal Tamimi, com o punho cerrado, mas olhar sereno.
Tamimi é palestina, chegou1neon54Jerusalém1neon541995 – "durante um dos piores invernos na Islândia, que já é dizer muito nesse país1neon54frio"– escapando da violência doméstica e com cinco filhos no colo.
Foi a primeira mulher1neon54origem estrangeira a conseguir um assento no Parlamento,1neon542011. "O islandês médio é amável e muito correto, mas há um grupo pequeno e eloquente com um sentimento anti-imigrante e contra uma política1neon54portas abertas."
Talvez a principal reclamação contra o governo atualmente, por parte dos setores mais progressistas, seja1neon54posição frente à crise1neon54refugiados.
O país aceitou neste ano 55 estrangeiros refugiados – a maioria da Síria, segundo Tamimi –, e planeja expandir o número para 100, segundo o Icelandic Monitor.
Para muitos, a próspera Islândia poderia acolher muitos mais.
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