A dura vida do único policial (e bombeiro)vilarejo do México:
Tepetongo é um pacato conjuntovilarejos no México, um dos países mais violentos do mundo. Não enfrenta tantos problemas nem registra ocorrências similares às das cidades nos arredores.
Ainda assim, Rodríguez gostariater companhia.
Ele passa a maior parte do tempo circulando numa caminhonete ou numa viatura que está com o farol traseiro quebrado. Com um cordãomadeira pendurado no pescoço, coturno e uniforme azul, diz acreditar que a presença da polícia é importante para fazer os moradores se sentirem mais seguros.
Mas às vezes demora 30 minutos para iruma comunidade a outra - a mais longe delas, El Laurel, fica a duas horas da delegacia. O policial fica alternando entre estradasasfalto eterratrês turnos24 horas.
Rodríguez reclama do cansaço, mas não perde nunca o sorriso. Diz gostar do que faz, senão teria desistido como o colega que abandonou o posto.
Como outros oito policiais inicialmente escalados para patrulhar a área não passaram no teste, a equipe nunca foi recomposta.
Ronda
Acompanhar a ronda do policial é se deparar com cenários tão pitorescos quanto cinematográficos. É também encarar muitos quilômetrosestrada.
O vilarejo Salitrillo é assustador, quase abandonado. Perto da igreja, homens assam carne ao ar livre e cavalos amarrados na portauma casa pastam entediados. Uma garotinha recebe o visitante entusiasmada.
Depoismarcar presença, Rodríguez segue para a próxima parada. Em Juanchorrey, o policial fala com dois homens sentados numa paredepedra bebendo tequila e usando chapéuabas largas. E continua a ronda passando rapidamente pelas outras comunidades.
São vilarejos que insistemnão desaparecer, mesmo com a migraçãomassa para os Estados Unidos. Na década1970, Tepetongo chegou a ter mais30 mil habitantes - a maioria atravessou a fronteira.
Para a polícia, cuidar das comunidadesTepetongo não é um trabalho tão difícil - as pessoas que ali moram são pacíficas.
Há brigasfamília, e às vezes os moradores bebem demais. O banco da cidade está fechado há quase duas décadas, restando aos ladrões roubarem apenas algumas vacas, pouco além disso.
"As pessoas não vivem com medo", diz o morador José Cupertino González Muro, enquanto prepara uma tortilla com abacate e queijo. Ele conhece o policial,quem é um parente distante, desde criança.
A situação na região ficou mais calma há uns três anos. Antes, conta Muro, traficantes costumavam passar armadosseus carros, e havia roubos e sequestros.
Mas hoje, não mais. Ele não explica o que mudou, só diz que o policial solitário ganha reforço da polícia estadual ou do Exército quando ocorre algo mais sério.
Muro já foi prefeitoTepetongo e lembra que, quando administrou a cidade pela primeira vez, no final dos anos 1980, também havia apenas um policial para 18 mil habitantes.
Mas há quem diga que vive com medo, como Manuel,78 anos, um fazendeiro que passa boa parte do tempo sentado na praça do vilarejoBuenavista.
"A coisa não é fácil, há insegurança. Tenho medoassalto,sequestro,deixar minha esposa sozinha. Existe roubogado. Os oficiaissegurança são muito poucos. Se houvesse mais, poderiam patrulhar com mais frequência, mas não é o suficiente", afirma.
Uma vizinha, que não se identifica, atravessa a mesma praça onde Manuel descansa para reclamar.
"Os auxiliares são inúteis, sem preparação, estão lá porque eles têm mais nada para fazer, não servem muito. Não sabem como lidar com bêbados e esse tipocoisa"
Segundo ela, o policial, um sobrinho distanteseu marido, "é querido".
Delegacia
Enquanto Rodríguez faz a ronda, os auxiliares dele ficam na delegaciaparedes verdes, que tem uma recepçãotrês metros quadrados, uma cela, dois quartos com camas e um banheiro.
Na parede do fundo, há uma bandeira do México, um calendário, um posterJoão Batista batizando Jesus e o equipamentotrabalho - um cassetete, algemas e dois bonés. Ao lado, a TV exibia o humorístico mexicano Chaves.
Há também um rádio, quatro walkie-talkies, um monitor que mostra a imagemquatro câmeras localizadas nos lados direito e esquerdo da rua, da cela e da sala principal.
No balcão, fica o controle remoto da televisão e relatórios listando todos os deslocamentos.
No dia 8julho, alguém registrou saída para fazer entregas, transportar o juiz, atender a dois acidentes - um no postogasolina e outro no meio-fio -, uma ronda numa comunidade próxima e retornos à delegacia.
De repente o telefone toca. "Segurança pública, boa tarde", responde o atendente. Alguém procura pelo policial solitário, que não está - só volta mais tarde.
A função do auxiliar é atender ao telefone, fazer relatórios e às vezes acompanhar o chefe.
Ele admite que precisou aprender a conviver com o tédio. A única "arma" que pode transportar é um mata-moscas - Tepetongo é famosa pela quantidademosquitos.
Uma placa lembra a morte do prefeito Carlos Robles Filimon dentro da própria delegacia,2013. "Sabemos que Deus agetodas as coisas para o bem daqueles que o amam, isto é, dos quais são chamados segundo o seu propósito", diz a mensagem.
Duas semanas depoisassumir o cargo, contam os assistentes, Filimon perguntou a um dos policiais se havia trazido o revólver.
Ao ouvir que sim, pediu a arma emprestada. Avisou que iria se matar e disparou duas ou três vezes. Ninguém naquela pacata região entendeu o porquê.