Por que preçosimóveis atingiram maior alta18 anos no mundo:
O tema foi, inclusive, objetoum estudo divulgado pelo Federal Reserve (Fed, o banco central americano)Dallas, que alertou para os riscos nesse sentido.
Portugal também vê com temor a alta dos preços. O valor dos imóveis no país vinha crescendo pelo menos desde 2014, especialmente depois da entradavigor da política"golden visa", que abriu a possibilidade para que estrangeiros que compram uma propriedade no país possam pedir nacionalidade portuguesa.
A dinâmica da pandemia aprofundou a escaladapreços e tem dificultado o acesso à casa própria para muitas famílias portuguesas.
Maior alta18 anos
O último trimestre2021 marcou o maior aumento18 anos nos preçosimóveis acompanhados150 cidades pela consultoria Knight Frank, especializada no ramo imobiliário e com mais500 escritórios pelo mundo.
De acordo com o último relatório do índice Global Residential Cities, com periodicidade trimestral, o valor médio dos imóveis vendidos nos locais pesquisados cresceu 11%relação ao mesmo período do ano anterior, o maior percentual desde o quarto trimestre2004.
Entre as 150 cidades que compõem a amostra, 140 registraram alta nos preços, contra 122 no ano2020.
Istambul, na Turquia, está no topo da lista, com aumento expressivo63% no valor dos imóveis. As três primeiras posições, aliás, são ocupadas por cidades turcas - Izmir vemsegundo (58,5%) e Ancara,terceiro (55,9%).
O país, contudo, é um caso à parte. A Turquia está mergulhadauma crise econômica marcada pela maior alta da inflaçãoduas décadas. Em 2021, o índice oficialpreços subiu 36,1%, e segue acelerando. Em abril deste ano, a alta acumulada12 meses chegou perto70%.
Nos Estados Unidos, a cidade com maior salto nos preços foi Phoenix (32,5%), que ocupa o 5º lugar do ranking, seguida por Miami (27,4%, 8ª posição), Dallas (26%, 9ª posição) e San Diego (25,4%, 10ª posição).
São Paulo e RioJaneiro, as cidades brasileiras que compõem o índice, estão na parte final da lista, na 121ª e 129ª posições, respectivamente, com altas4,4% e 2,2% nos preços.
'Efeito bumerangue' da pandemia
Parte do aumento dos preços observado no fim do ano passado também se deve a uma espécierenascimento das cidades observado após quase dois anospandemia, acrescenta a chefepesquisa residencial internacional da Knight Frank, Kate Everett-Allen,entrevista à BBC News Brasil.
Após os primeiros lockdowns, nos países mais ricos muitas pessoas chegaram a deixar os grandes centros urbanos e, com a mobilidade proporcionada pelo home office, se mudaram para cidades menores ou mesmo para áreas rurais.
Chegou-se a questionar na época qual seria o futuro das cidades - se elas veriam, por exemplo, um êxodo significativoseus habitantes.
"Mas, desde a primavera2021, cercaum ano atrás, começamos a ver muita gente voltando para as cidadesbusca da conectividade, da ofertacultura, dos teatros, dos restaurantes", comenta Everett-Allen, referindo-se especialmente às nações ricas fora da Ásia. No continente asiático,locais como China, Hong Kong e Cingapura, a maioria das pessoas se manteve nas grandes cidades.
"AquiLondres, há pessoas que compraram um segundo imóvel no interior, por exemplo, e hoje, com o trabalho híbrido, passaram a usá-lo no home office uma parte da semana, enquanto passam os demais dias por aqui", ela ilustra.
A retomada do turismo - e dos intercâmbiosestudantes - também contribuiu para empurrar os preços para cimaalgumas regiões, entre elas Austrália e Nova Zelândia.
Sonho da casa própria mais distante
A onda generalizadaaumentopreços tem reduzido as chancesfamíliasclasse média e mais pobres adquirirem seu primeiro imóveldiversos países. Esse problema já despertou a atençãogovernos como o do Canadá, que resolveu barrar a compraimóveis por estrangeiros (ainda que muitos analistas avaliem que a medida não deve surtir o efeito esperado).
A Coreia do Sul, que vem lidando com um mercado imobiliário superaquecido há alguns anos, lançou uma sériemedidas para tentar estabilizar os preços, entre elas novas restrições para tomadaempréstimos.
"Fora alguns casos pontuais, houve poucos anúnciosmedidasintervenção no ano passado", pondera Everett-Allen. "Devemos ver mais neste ano."
O que esperar2022
Os aumentosjuros que vêm sendo observadosboa parte dos países para tentar controlar a inflação elevada que tem marcado 2022 deve ajudar a desacelerar os aumentospreços.
Por dependerfinanciamentosmédio e longo prazo, o mercado imobiliário é,forma geral, bastante sensível às oscilações das taxasjuros. À medida que os financiamentos ficam mais caros, a demanda tende a cair - e,alguns casos, esse movimento pode levar os preços a estabilizarem ou mesmo reduzirem.
A questão, neste caso, é que mesmo que os preços subam menos, o problema do acesso a moradia pelas famílias mais pobres persiste ou pode se intensificar, já que os empréstimos se tornam mais caros.
Em um longo relatório sobre o mercado imobiliário divulgado no último mêsabril, a consultoria britânica Capital Economics destacou que o indicador da OCDE que relaciona o preço dos imóveisproporção da renda domiciliar - o que, na prática, revela o quão acessíveis ou não os preços são às famílias - atingiu o maior patamar pelo menos desde o ano 2000, acima inclusive do último pico,2007, às vésperas da crise financeira global.
No texto, os economistas Vicky Redwood e Andrew Burrell destacam, contudo, que é bastante improvável que a nova ondaaumentojuros desencadeie uma crise financeira global nos moldes daquela2008.
O aumento dos preços observado na última década e mais recentemente, eles argumentam, não foi acompanhado por um relaxamento da concessãocrédito - um dos fatores que catalisou a crise no mercado imobiliário americano naquela época.
No Brasil, classe média e mais pobres serão mais prejudicados
No Brasil, o mercado imobiliário viveu um boom nos anos 2020 e 2021, alimentado,parte, pela mesma dinâmica da pandemia que favoreceu o mercado imobiliárioum contexto global.
A taxa básicajuros, hoje12,75%, chegou à mínima histórica2%março do ano passado.
"A Selicpatamar mínimo teve um efeito duplo sobre o mercado imobiliário", pontua Ana Maria Castelo, coordenadoraprojetos da construção do Instituto BrasileiroEconomia da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV).
"De um lado, os juros baixos fizeram com que os investidores passassem a buscar uma rentabilidade maior para suas reservas financeiras [o que favoreceu o investimentoimóveis]. De outro, o crédito continuou se expandindo, só que agora com taxas historicamente reduzidas."
"Houve um deslocamento importanterecursos para o mercado imobiliário tanto das famílias quantoinvestidores", completa.
Os preçosimóveis no Brasil registraram2021 a maior alta desde 2014.
Segundo a pesquisadora, não há, contudo, dados públicos disponíveis que possam sinalizar quanto do aumento foi gerado por uma demanda das famílias e quanto pelo movimento dos investidores que resolveram comprar imóveisbuscamaior rentabilidade.
Conforme o Índice Geral do Mercado Imobiliário Residencial (IGMI-R/Abecip), no ano passado os preçosimóveis no país tiveram salto16,25%relação ao ano anterior, percentual superior inclusive à inflação do período,10,06%. A cidade com maior elevaçãopreços foi São Paulo, com expressivos 21,09%.
Feitoparceria com o Ibre-FGV, o índice cobre dez capitais e levaconsideração não os preçosanúncios, que por vezes não se concretizam, mas os valores finais negociados dos imóveis.
O cenário para 2022 é outro. Com o aumento da inflação no Brasil e no mundo, as construtoras estão enfrentando um aumento significativo nos custosinsumos. De um lado, o custo para construir cresceu, enquanto,outro, o espaço para repassar a alta para os preços diminuiu, com a perdapodercompra dos consumidores e o contextodesemprego alto.
O impacto dessa combinação sobre os preços ainda é difícilprever, mas deve reduzir o apetite das famílias por novos lançamentos.
"O crédito mais caro vai tirar do mercado um percentual grandefamílias", avalia a economista do Ibre-FGV.
Segundo Castelo, o impacto negativo deve recair especialmente sobre os mais pobres - que antes eram contemplados pela faixa 1 do programa Minha Casa Minha Vida e acabaram ficando fora do Casa Verde Amarela, o programa habitacional do governo Bolsonaro - e da classe média.
As famílias contempladas pela faixa 1 do MCMV não pagavam juros do financiamento dos imóveis e podiam pleitear subsídios que cobriam um percentual relevante do preço da casa. No Casa Verde Amarela, a primeira faixa prevê taxasjuros que começam4,25%.
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