Avi Loeb: 'Procuro vida inteligente no espaço porque é difícil encontrar na Terra':

Legenda do áudio, Em áudio: 'Procuro vida inteligente no espaço porque é difícil encontrar na Terra'

Não foi possível obter imagens ou dados sobreformação, mas os cálculos existentes permitem estimar que o objeto eraforma plana, com dimensões400 m por 40 m². Tinha uma superfície avermelhada, com um brilho que mudava abruptamente, alémnavegartrajetória caótica pelo cosmos.

Alguns astrônomos disseram que poderia se tratarum asteroide ou um cometa. Um ano depois do achado, porém, o astrônomo e professorFísica Teórica da UniversidadeHarvard Avi Loeb publicou um estudo defendendo uma ideia muito mais audaciosa.

Nele, Loeb ressalta que o objeto não tinha a caudaum cometa e que os dados sugerem que ele era incomumente brilhante — ao menos dez vezes mais do que os asteroides do Sistema Solar.

O estudo gerou grande controvérsia e críticasvários cientistas conhecidos.

IlustraçãoOumuamua

Crédito, SPL

Legenda da foto, IlustraçãoOumuamua, apontado como o primeiro corpo celeste identificado que parece ter vindofora do Sistema Solar

Longeceder, Loeb se manteve firmedefesasua tese e agora,2021, publicou um livroque a explica ao públicogeral, com o título Extraterrestre: O primeiro sinalvida inteligente fora da Terra.

Em entrevista à BBC News Mundo, serviçoespanhol da BBC, Loeb comenta seu interesse pela possibilidadevida extraterrestre, conta por que acredita ser importante buscar inteligênciaoutros lugares do cosmos e como defende suas ideias sobre o misterioso Oumuamua.

Línea

BBC - O senhor afirma que buscar vida extraterrestre é a questão mais fundamental da ciência. Por quê?

Avi Loeb - Porque encontrar vida extraterrestre teria uma grande implicação para a humanidade. Mudaria nossa perspectiva sobre nosso lugar no universo, nossas aspirações sobre o espaço, as relações entre nós, as relações internacionais, porque nos daríamos contaque somos parte da espécie humana eque há mais alguém lá fora.

A melhor analogia que posso fazer é com minhas filhas. Em seu primeiro dia no jardiminfância, elas tiveram um choque psicológico, porque antes, achavam que eram as mais inteligentes do mundo e que o mundo girava ao redor delas.

Quando conheceram outras crianças e se deram conta que não era bem o caso, foi uma grande revelação.

Para que nossa civilização amadureça, precisamos encontrar outras.

Além disso, busco inteligência no espaço porque muitas vezes não a encontro aqui na Terra. Ao longa da história da humanidade, vejo pessoas brigando entre si, tentando se sentir superiores, e isso tem tão pouco sentido no grande esquema do universo, porque todos somos tão insignificantes que não há por que tentarmos ser superiores entre nós.

Poderíamos nos comportarmaneira muito mais inteligente antessermos admitidos no clube da inteligência, então espero que a possibilidadevida extraterrestre nos convença a agir juntos e ter um futuro melhor que nosso passado.

Telescópio

Crédito, Getty

Legenda da foto, Loeb defende a busca por vida fora da Terra como formaensinar e unir os humanos a respeitoseu (insignificante) papel no universo

BBC - Para o senhor, o que é inteligência?

Loeb - Para mim, uma civilização inteligente é aquela que segue os princípios da ciência, ou seja, a cooperação e o intercâmbioconhecimentos baseados na evidência.

BBC - O senhor diz que os humanos não são especiais, que somos insignificantes, mas o certo é que somos bastante complexos, não?

Loeb - Sim, mas me refiro à forma como nos sentimos acercanós mesmos.

De fato, embora na Terra sejamos muito especiais e únicos, se você olhar ao seu redor, verá que aproximadamente a metade das estrelas parecidas ao Sol têm um planeta do tamanho da Terra, aproximadamente à mesma distância.

Isso significa que não só não estamos no centro do universo, como argumentou o filósofo Aristóteles e as pessoas acreditaram durante mil anos porque isso inflava seu ego, como que, além disso, sabemos que o sistema Terra-Sol não é especial; não somos privilegiados, é um sistema muito comum.

Para mim, isso significa que o universo está nos dizendo que devemos ser modestos, que não somos particularmente privilegiados. Temos circunstâncias parecidasdezenasbilhõesTerras na Via Láctea, e 10 à potência21todo o universo. Isso é mais do que o númerogrãosareiatodas as praias da Terra.

O número é tão grande que me pergunto como nos atrevemos a nos considerarmos únicos e especiais.

Além disso, a maioria das estrelas se formou bilhõesanos antes que o Sol. Então é muito provável que tenha havido coisas similares a nós que existiram antesnós e, se víssemos o que fizeram, poderíamos vislumbrar nosso futuro.

BBC - Por isso o senhor afirma que é mais provável que haja inteligências mais avançadas do que nós,vezmenos avançadas?

Loeb - Sim, uma das razões é que nós somos tecnológicos há apenas cercaum século, e é muito provável que muitos deles tenham sido (tecnológicos) há muito mais tempo.

Mas, além disso, é porque tenho um sensomodéstia. Quando abro livrosculinária, vejo que com os mesmos ingredientes podemos fazer bolos muito diferentes.

Então qual é a probabilidadeque, a partir da mesclaquímicos que existiu na Terra primitiva, obtivemos o melhor bolotodos? É pequena.

BBC - Qual é aideia a respeito da existênciaum deus e como ela se relaciona à possibilidadevida extraterrestre?

Loeb - Nós vemos que nossas tecnologias estão avançando exponencialmente, então as tecnologias que desenvolveríamos dentromil ou um milhãoanos não seriam reconhecíveis hoje — pareceriam magia ou milagre. Acho que a ciência e a tecnologia suficientemente avançadas podem nos parecer a algo como um deus.

Já há laboratórios que estão se aproximando do desenvolvimento da vida sintética, ou seja, se começa com uma sopaquímicos e a partir daí se obtém uma célula viva e funcional — e acho que dentropoucas décadas seremos capazesconseguir isso.

No passado, acreditávamos que um deus cria a vida, mas parece que os cientistas poderão fazer isso ainda neste século. E depois,um futuro distante, se conseguirmos uma teoria da relatividade quântica, que unifique a teoria da mecânica quântica e a da gravidadeEinstein, talvez possamos projetar um experimento que crie um universo bebêlaboratório.

Natureza

Crédito, Getty

Legenda da foto, "Para mim, a natureza parece incrivelmente linda e com frequência, quando estudo o universo, vejo que ela está controlada pelas mesmas leisfísicatodas as partes. As leis que descobrimoslaboratório se aplicam a todo o universo", diz Loeb

Mas se você pergunta sobre o Deus religiosoque as pessoas acreditam e que não tem nada a ver com tecnologia, nesse sentido me alinho à noção do filósofo Spinoza, que basicamente o identifica com a natureza.

Para mim, a natureza parece incrivelmente linda e com frequência, quando estudo o universo, vejo que ela está controlada pelas mesmas leisfísicatodas as partes. As leis que descobrimoslaboratório se aplicam a todo o universo. É extraordinário que seja tão bem organizado e tão lindo.

Para mim, como cientista, essa ideia funciona muito bem.

Mas quanto a esse Deus religioso que monitora suas ações, por simples modéstia acho difícil acreditar nele. Simplesmente não acho que sejamos suficientemente importantes para que um Deus esteja nos monitorando.

Além disso, se há criaturas inteligentesoutros planetas, é muito trabalho monitorar dezenasbilhõesplanetas e garantir que tudo ocorra segundo avontade.

Me parece exaustivo, e e acho que Deus estaria acima disso.

Se alguma civilização alienígena nos monitora, aí é outra coisa. Aí diria que sim, talvez possam se interessar por nós ao ver que estamos desenvolvendo tecnologia.

BBC - O que o senhor acha dos métodos usados atualmente para buscar vida extraterrestre?

Loeb - Acho que não estamos procurandoforma correta.

Nos últimos 70 anos, essa busca tem sido principalmente por sinaisrádio. O problema com isso é que é similar a uma conversa telefônica — você precisa que o interlocutor esteja vivo, e a maioria das civilizações que existiram no passado podem já estar mortas.

Isso não significa que não possamos procurar os rastros que elas deixaram, como fazemos aqui na Terra com a arqueologia.

Pan STARSS

Crédito, Rob Ratkowski/PS1SC

Legenda da foto, Oumuamua foi detectado ela primeira vez pelo observatório Pan STARSS

Pode haver uma arqueologia espacial,busca por relíquias ou equipamentosoutras civilizações, como se fossem garrafas lançadas ao mar.

BBC - Segundo seu estudo, um desses objetos alienígenas poderia ser Oumuamua...

Loeb - Oumuamua foi o primeiro objeto detectado provenientefora do Sistema Solar, efato parecia muito estranho. Tinha várias anomalias que me convenceram que poderia ser um artefatouma civilização tecnológica.

Em 2020, o mesmo telescópio que o detectou observou outro objeto, conhecido como 2020 SO, que se comportavamodo similar, e era o propulsorum foguete construído1996.

Sabemos então que nós humanos construímos aquele objeto artificial. A pergunta é quem produziu Oumuamua. E a maneiraresponder essa pergunta é que, se outro objeto se aproximarnós, poderíamos detectá-lo cedo, seja com o telescópio Pan STARSS, o Observatório Vera C Rubin (que será concluído daqui a dois anos no Chile), por exemplo, e podemos lançar uma nave equipada com uma câmera fotográfica que nos diga se é um objeto artificial ou uma rocha.

Se se assemelha a um artefato, talvez possamos aterrissar sobre ele, assim como fez a missão Osiris-Rex sobre o asteroide Bennu. E poderíamos verqual planeta foi feito ou mesmo tentar trazê-lo à Terra, embora isso custe muito dinheiro.

BBC - Oumuamua é um objeto construído por extraterrestres?

Não sabemos com certeza, porque não reunimos provas suficientes.

A razão pela qual eu digo que talvez seja artificial é por suas anomalias. Uma delas é que, quando ele girava, a quantidadeluz solar que ele refletia mudava por um fator10, o que significa que ele tem uma forma muito extrema, provavelmente como auma panqueca.

Também tinha um ímpeto excessivo distanciando-se do Sol, não tinha cauda como um cometa, nem evaporaçãogás ou pó que lhe pudessem dar esse ímpeto — então a única explicação que me ocorreu é que isso se devesse ao reflexo da luz solar.

Para que isso ocorra, o objeto teria que ser muito fino, como a velaum barco, mas não necessariamente projetada para ser uma vela. Talvez Oumuamua fosse só um receptor que se comunicava com sondas que já estão na Terra.

BBC - O senhor descarta a possibilidadeque Oumuamua seja o resultadoum processo natural que nós humanos ainda desconhecemos?

Loeb - Depois que eu publiquei meu estudo, outros cientistas propuseram outras possíveis explicações para argumentar que Oumuamua tinha uma origem natural, mas todas elas estavam associadas a um objeto que nunca havíamos visto antes.

Um argumentava que era uma nuvempartículaspó cem vezes mais densa que o ar. O problema com isso é que, à medida que ela se aproximasse do Sol, esquentaria e não manteriaintegridade.

Também se sugeriu que era um iceberghidrogênio do tamanhoum campofutebol, que, ao evaporar, não deixa uma caudacometa porque o hidrogênio é transparente. Mas o hidrogênio evapora muito rapidamente, então não resistiria à viagem espacial.

Ou se disse que seria o fragmentoum objeto maior que se destruiu. A dificuldade aqui é que, nesse caso, geralmente o resultado seriam peças alargadas, e não planas. (Loeb sustenta que Oumuamua teria a formauma panqueca, e nãoum charuto).

Meu ponto é que, se é algo que nunca havíamos visto, também deveríamos contemplar a possibilidadeque tenha uma origem artificial.

BBC - Estamos sozinhos no universo?

Loeb - Por pura modéstia, acho que não. Além disso, não procuramos o suficiente para chegar a uma conclusão.

Acho que não apenas não estamos sós, como talvez não sejamos a turma mais inteligente do quarteirão.

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