Maioria dos casais não aguenta intimidade constante sem a esfera pública, diz socióloga Eva Illouz:galeta.bet

Legenda do áudio, Em áudio: 'Maioria dos casais não aguenta intimidade constante sem esfera pública'

"Muitas dessas relações se baseiam no fatogaleta.betque os homens e as mulheres tomam caminhos diferentes durante o dia", diz.

Na maioria dos casos, cada membro do casal vai para o seu lado, quer cada um tenha um emprego ou um fique encarregado da casa ou dos filhos, o que implica, por exemplo,galeta.betsairgaleta.betcasa para levá-los à escola.

"E, depois, à noite eles se encontram."

Mas os lockdowns impostos para evitar a propagação do novo coronavírus acabaram com as condições que permitem que isso aconteça.

A intimidade

Illouz é autoragaleta.betvários livros, incluindo O amor nos tempos do capitalismo e Why Love Hurts: A Sociological Explanation ("Por que o amor dói: uma explicação sociológica",galeta.bettradução literal).

Crédito, EMMANUEL DUNAND/AFP via Getty Images

Legenda da foto, Eva Illouz é professora universitária e autoragaleta.betvários livros, premiada por suas pesquisas sobre sociologia cultural, emoções e capitalismo

Em 2019, ela publicou The End of Love: A Sociology of Negative Relations ("O fim do amor: uma sociologia das relações negativas",galeta.bettradução literal) , que é "a conclusãogaleta.betum estudogaleta.betduas décadas sobre as maneiras pelas quais o capitalismo e o mundo moderno transformaram nossas vidas emocionais e românticas", observa a editora do livro, Oxford University Press.

Na obra, a acadêmica mostra como grandes forças coletivas moldam nossas experiências privadas.

A crise desencadeada pela pandemiagaleta.betcovid-19 é mais um exemplo do impacto das forças macrossociaisgaleta.betnossa intimidade.

"O que mais observei é que o que chamamosgaleta.betcasa, a esfera privada e doméstica, precisa desesperadamente da esfera pública dos amigos, do trabalho, das ruas para poder cumprirgaleta.betfunção", afirma.

"De repente, os pais se deram contagaleta.beto quanto as escolas apoiam,galeta.betfora, as famílias. Mas também percebemos que a intimidade constante e contínua não é suportável para a maioria dos casais."

'Suportável'

Segundo a autora, "a crise do coronavírus nos fez entrargaleta.betcolapsogaleta.betnossas próprias casas".

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Várias famíliasgaleta.betdiferentes partes do mundo sofreram violência domésticagaleta.betmeio aos lockdowns

"Transformou a casagaleta.betuma frentegaleta.betguerra (da pandemia), mas a maioria das casas no mundo não está equipada para isso", explica.

"De certa forma, o que descobri é que precisamos da sociabilidade com amigos, estranhos, conhecidos, mais ou tanto quanto a intimidade com outra pessoa."

Em entrevista à jornalista austríaca Tessa Szyszkowitz, transmitida no YouTubegaleta.betjunhogaleta.bet2020, a socióloga refletiu sobre os confinamentos e sobre como "o lar só é suportável para muitos casais se eles tiverem a possibilidadegaleta.betpercorrer caminhos diferentes durante o dia".

Ela destacou que,galeta.betmuitos casos, a violência doméstica aumentou "tremendamente" e que homens e mulheres regressaram aos seus "papéis tradicionais", mostrando que as mulheres são majoritariamente responsáveis ​​pelas tarefas domésticas.

Entre forças

Illouz disse à BBC News Mundo que não acredita quegaleta.betalgum momento tenhamos nos isentado das forças públicas, apesar do fatogaleta.betque "desenvolvemos uma mitologia muito poderosa do lar e da privacidade como se estivéssemos protegidosgaleta.betforças externas".

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Legenda da foto, A incerteza da pandemia causou ansiedadegaleta.betmilhõesgaleta.betpessoasgaleta.bettodo o mundo

A verdade é que "essas forças nos fazem o que somos": tanto dentro quanto foragaleta.betnossas casas, somos quem somos porque participamosgaleta.betuma cultura pública.

Em termos imediatos, ela exemplifica, as pessoas que ficaram desempregadas ou foram despejadas por não ter como pagar o aluguel "são objeto, dentrogaleta.betsuas casas, da açãogaleta.betforças externas que não controlam"? "Claro que são", diz.

"Esta crisegaleta.betsaúde nos mostrou quão profundamente dependentes somos da sociedadegaleta.betque vivemos."

E também quão sociáveis somos.

A importância das aparências

"Ser sociável é vivergaleta.betum mundogaleta.betaparências", diz a especialista.

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Legenda da foto, Passar maquiagem para sair faz parte dos hábitosgaleta.betmuitas mulheres

Sendo a aparência entendida como "o trabalho que faço no meu corpo para aparecergaleta.betcerta forma na frentegaleta.betoutras pessoas".

Ela reconhece que a aparência tem uma "fama ruim" porque a associamos à superficialidade quando, na verdade, é,galeta.betmuitos aspectos, "a essência da sociabilidade".

"O que nos foi roubado durante esta pandemia, por termos que ficargaleta.betcasa, é justamente a possibilidadegaleta.bettermos essas relações superficiais, que se baseiam na forma como nos apresentamos."

Para a especialista, se maquiar ou se vestirgaleta.betforma elegante é um sinalgaleta.betque fazemos isso por algo mais.

"Há um ano, na Austrália, viralizaram algumas fotosgaleta.betpessoas vestidas com roupasgaleta.betgala, usando maquiagem e lindas joias para levar o lixo para fora, porque era a única coisa que podiam fazer."

"As imagens se tornaram virais porque expressaram essa necessidade fundamental que temosgaleta.betaparecer na frente dos outros."

"Estar na frente do computadorgaleta.betcasa e trabalhargaleta.betpijama pode ser confortável, mas acho que não é uma sensação que dura porque rapidamente se transformagaleta.betalgo sem estrutura, carentegaleta.betum mundogaleta.betaparências."

O elemento arquitetônico

Os apartamentos modernos, diz Illouz, não são projetados para que as pessoas fiquem "o tempo todo" dentrogaleta.betcasa.

"E como os preços dos imóveis aumentaram dramaticamentegaleta.betquase todas as cidades do mundo, a maioria das pessoas vive no que chamaríamosgaleta.betcasasgaleta.betpequeno ou médio porte."

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Legenda da foto, Com os lockdowns, as famílias transformaram suas casasgaleta.betlocalgaleta.bettrabalho, escola, espaçogaleta.betlazer, descanso, entre outras coisas

"A arquitetura urbana dos subúrbios é tal que poucos apartamentos têm terraço, varanda ou contato com a rua."

Muitos vivemgaleta.betespaços muito menores do que os habitados por seus ancestrais.

A acadêmica esclarece que isso não significa que esses lugares sejam piores, pois, se levarmosgaleta.betconsideração outros critérios, provavelmente as casas dos nossos antepassados eramgaleta.betqualidade inferior.

Mas o que parece ser uma constante nas cidades é que as casas tendem a ser menores.

"Essas casas foram concebidas mais ou menos como lugares para os quais se volta para dormir" após a jornadagaleta.bettrabalho fora.

"Acho que grande parte do que chamamosgaleta.betlar moderno se baseia, na verdade, na existênciagaleta.betuma vasta esfera pública formada pelo trabalho e pela escola, o que torna possível a interação na mesma."

A especialista reflete, por exemplo, sobre os relatosgaleta.betmães que tiveram dificuldadegaleta.betlidar com os períodosgaleta.betque seus filhos ficaramgaleta.betcasa, após o fechamento das escolas.

Algumas chegaram até a sentir que não eram boas mães.

"Essas são as razões pelas quais eu acho que a casa pode ser vivenciada como algo extremamente opressivo, porque na verdade ela não é concebidagaleta.betforma alguma como um lugargaleta.betque realmente vivemos. É concebida como um lugar para o qual retornamos."

Outra formagaleta.betexpressar afeto

Em marçogaleta.bet2020, Illouz escreveu na revista Nueva Sociedad o artigo intitulado "O coronavírus e a insuportável leveza do capitalismo".

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Legenda da foto, Durante meses, filhos e netos tiveram que se abstergaleta.betvisitar seus pais e avós como formagaleta.betprotegê-los contra o vírus

Entre vários temas, ela refletia sobre como, diante da pandemia, é necessária uma "nova formagaleta.betsolidariedade por meio do distanciamento social", o qual aumenta a sensaçãogaleta.betcrise.

Uma solidariedade, frisou ela, entre as gerações mais novas e as mais velhas, "entre quem não sabe se pode ter a doença e alguém que pode morrer por causa daquilo que o primeiro desconhece, entre quem pode ter perdido o emprego e alguém que pode perder a vida."

Ela acrescentougaleta.betprópria experiência: "Já faz muito tempo que estougaleta.betconfinamento, e o amor que meus filhos me manifestaram consistiugaleta.betme deixar sozinha".

"Essa solidariedade exige isolamento e, assim, fragmenta o corpo social nas menores unidades possíveis, o que dificulta a organização, o encontro e a comunicação, muito além das intermináveis ​​piadas e vídeos trocados nas redes sociais".

A sociabilidade, segundo ela, se tornou indireta.

A inversão do cuidado

Da noite para o dia, escreveu a autora, o mundo "se esvaziou dagaleta.betfamiliaridade", se tornou algo que nos é estranho.

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Legenda da foto, Estamos aprendendo a conviver com as novas normasgaleta.betdistanciamento social para proteger nossos entes queridos

"Seus gestos mais reconfortantes — os apertosgaleta.betmãos, beijos, abraços, a comida compartilhada — se tornaram fontesgaleta.betperigo e angústia."

Tivemosgaleta.betnos familiarizar "com as estranhas regras e rituais" do distanciamento social.

Em entrevista à organização J! Jewish Culture in Sweden, transmitida pelo YouTubegaleta.bet18galeta.betjunho, Illouz argumentou que está acontecendo uma espéciegaleta.betinversão das categoriasgaleta.betcuidado.

É que até agora relacionávamos o cuidado à proximidade física, mas a pandemia nos disse que o segredo para nos proteger é nos afastarmos.

A formagaleta.betamar

Questionada se acredita que a crise do coronavírus está mudando nossa maneiragaleta.betamar, a professora afirma à BBC News Mundo que é muito cedo para dizer.

O que reforçou, ele acredita, é uma divisão entre solteiros e casados.

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Legenda da foto, A pandemia está criando novas dinâmicas quando se tratagaleta.betsocialização

"Essa diferenciação existia, mas a (crise) deixou isso muito claro porque os solteiros, eu acho, podem ser muito mais privados do sexo, da sexualidade e dos encontros."

As regrasgaleta.betcomo nos envolvemosgaleta.betum relacionamento estão mudando e surge a necessidadegaleta.betfazer perguntas sobre a outra pessoa e seu corpo.

São perguntas como "quanto risco eu corro?", que já foram feitas por membros da comunidade homossexual nas décadasgaleta.bet1980 e 1990, quando apareceu o HIV, vírus causador da Aids.

"(A crise) foi conduzida muito bem e com bastante rapidez, porque percebemos que se usássemos preservativos estaríamos mais ou menos seguros. Mas não é o caso (agora), porque não é tão fácil se protegergaleta.betum vírus respiratório", explica.

E a essas perguntas agora são adicionadas questõesgaleta.betoutra dimensão que não haviam sido levantadas antes, como: "Até que ponto posso pedir ao outro para gerenciar o risco da mesma forma que eu?"

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Legenda da foto, 'Não sei se diria que a maneira como nós amamos mudou fundamentalmente, embora a tecnologia esteja desempenhando um papel muito mais significativo do que no período anterior ao coronavírus', diz Eva Illouz

Isso fará possivelmente com que os encontros casuais não sejam tão livres e que novas tensões sejam geradas porque as pessoas nem sempre concordam com os níveisgaleta.betprecaução, refletiu a autoragaleta.betentrevista à Jewish Culture in Sweden.

E essa tensão também estará presente nos lares: "Duas pessoas que moram juntas se comprometem a que exatamente? Pensegaleta.betuma casa onde uma pessoa é vulnerável,galeta.betalto risco. Que implicações isso tem exatamente para os outros membros? Pensegaleta.betuma médica casada com um diabético."

Surge um novo conjuntogaleta.betperguntas relacionadas com a nossa maneiragaleta.betviver,galeta.betnos comportar e interagir.

O paradoxo do mundo hiperconectado

Em setembrogaleta.bet2019, Illouz escreveu no blog da Oxford University Press o artigo Why love ends ("Por que o amor acaba",galeta.bettradução literal).

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Legenda da foto, Existe a preocupaçãogaleta.betque a pandemia esteja desencadeando uma epidemiagaleta.betsolidão devido aos lockdowns

Lá ela ecoou o que Julianne Holt-Lunstad, professoragaleta.betpsicologia da Universidade Brigham Young, nos Estados Unidos, havia apontadogaleta.bet2017: "Muitas nações ao redor do mundo agora sugerem que estamos enfrentando uma 'epidemiagaleta.betsolidão'".

Illouz havia identificado uma "mudança cultural" nas decisões que muitas pessoas estavam tomando, que se manifestava no estabelecimentogaleta.betrelações efêmeras.

É que na modernidade hiperconectadagaleta.betque vivemos, "a não formaçãogaleta.betvínculos se torna um fenômeno sociológicogaleta.betsi", escreveu.

"Se a modernidade e a alta modernidade foram marcadas pela luta para permitir certas formasgaleta.betsociabilidade, nas quais o amor, a amizade, a sexualidade fossem livresgaleta.betconstrangimentos morais e sociais, na modernidade interconectada a experiência emocional parece escapar aos nomesgaleta.betemoções e relações herdadasgaleta.bettemposgaleta.betque eram mais estáveis. "

Assim, "as relações contemporâneas terminam, se rompem, desvanecem, evaporam e seguem uma dinâmicagaleta.betescolha positiva e negativa, que entrelaça vínculos e não vínculos."

A autora fez essas observações muito antesgaleta.betestourar a pandemia que teve efeitos devastadoresgaleta.betmilhõesgaleta.betpessoas.

Psicólogos e especialistasgaleta.betsaúde mental manifestaram a preocupaçãogaleta.betque a mesma pandemia esteja desencadeando uma epidemiagaleta.betsolidão, não só entre aqueles que tiveram que se isolar com mais rigor, como os idosos, mas também entre adolescentes e jovens.

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