É triste terbetway 30gastar tanta energia reconstruindo a cultura tão potente do Brasil, diz atriz Maria Fernanda Cândido:betway 30

Maria Fernanda Cândido, uma mulher brancabetway 30cabelos castanhos cacheados, usa um vestido estampado e posabetway 30uma sacada com o Pãobetway 30Açucar ao fundo

Crédito, Fabio Lovino/IlTraditore

Legenda da foto, Em 'O Traidor', Maria Fernanda Cândido interpreta uma brasileira que se apaixonou por um mafioso italiano

A atriz também diz que a onda ultraconservadora que o mundo vive é resultado do medo e da não aceitação das diferenças. "Talvez a gente precise expandir um pouco a nossa capacidadebetway 30aceitar as diferenças, e entender que isso não é algo que apenas exige um esforço, mas que é algo bonito, que é algo que traz muita riqueza", diz ela.

Leia os principais trechos da entrevista:

A atriz Maria Fernanda Cândido, uma mulher brancabetway 30cabelos castanhos cacheados, posa com um véu flutuante

Crédito, Lucas Seixas/Divulgação

Legenda da foto, A atriz tem feito diversos trabalhos no exterior

betway 30 BBC News Brasil - O tema da máfia é muito recorrente no cinema. Por que ele faz tanto sucesso entre o público?

betway 30 Maria Fernanda Cândido - Existe uma questão da máfia como uma sociedade paralela, um tipobetway 30poder paralelo, com muitos códigos, existe todo um códigobetway 30honra, uma fidelidade... Mas, ao mesmo tempo, é algo paralelo ao poder, ao status quo, ebetway 30certa maneira é muito intrigante. Existe uma grande atração por parte das pessoas. Porém o filme do (diretor Marco) Bellochio não romantiza a máfia, é um retrato muito cru dessa situação e da vida dessas personagens que vivem dentro desse sistema paralelo.

A grande questão que o filme traz é o dilema dessa personagem principal, que é o Don Masino, o Tomaso Buschetta, entre ser parte deste grupo que o acolheu durante a vida toda — desde a adolescência ele fez parte da máfia — ou não. Ele diz que a máfia não é mais a máfia, porque a máfia antigamente tinha um códigobetway 30honra.

betway 30 BBC News Brasil - Sua personagem é uma brasileira, uma mulher normal que se apaixona por um criminoso. O que ela viu nele para fazer ela se apaixonar e viver com ele?

betway 30 Maria Fernanda Cândido - A gente não consegue compreender como uma mulher como Maria Cristina, tão inteligente, tão culta, pertencente a uma famíliabetway 30advogados — uma família que trabalhava com a lei — como uma mulher que vem deste lugar se apaixona por um criminoso, um homem do mundo do crime. É uma perguntabetway 30fato que não tem resposta e eu acho que essas perguntas são as mais atraentes para os atores, para as atrizes, porque é com esse material absolutamente controverso, incongruente, que a gente gostabetway 30trabalhar.

E ela foi muito apaixonada por esse homem e ficou com ele até o último dia da vida dele. Ela ainda está vida. E ela não só cuidou dos filhos deles, que tiveram juntos, como ela cuidou dos enteados, os filhos da primeira esposa, da segunda esposa.

betway 30 BBC News Brasil - Como que foi interpretar uma personagem baseadabetway 30uma pessoa real?

betway 30 Maria Fernanda Cândido - Foi bem difícil, tínhamos pouquíssimas informações, algumas fotografias... Meu sonho na época era encontrar a Maria Cristina ou pelo menos conversar com ela por telefone, ter algum contato. O que foi absolutamente impossível, porque ela vive sob proteção judicial, então ninguém sabe o paradeiro dela.

A atriz Maria Fernanda Cândidobetway 30meio a atores italianosbetway 30cena do filme O Traidor

Crédito, Fabio Lovino/IlTraditore

Legenda da foto, A personagembetway 30Maria Fernanda Cândio no filme é baseadabetway 30brasileira que hoje vive sob proteção judicial

betway 30 BBC News Brasil - O filme tem algumas cenas mais fortes, cenasbetway 30tortura da Maria Cristinabetway 30um avião. Como você lida com esses momentos mais brutos?

betway 30 Maria Fernanda Cândido - Eu nunca tinha feito uma cena assim, foi a primeira vez que eu participeibetway 30uma cena com esse tipobetway 30ação. Era muito complexo porque eu fiquei presa por cabosbetway 30aço, cintosbetway 30segurança, era seguro. Mas (depois)betway 30ter passado o dia todo presa e pendurada, no dia seguinte eu não conseguia andar, fiquei toda com marcas, fiquei toda roxa. É muito físico. E não foi fácil, porque eu tinha que estar pendurada pelos cabelos. Depois eu não conseguia tossir, não conseguia dar risada porque as costelas ficaram superdoloridas. Enfim, ossos do ofício.

betway 30 BBC News Brasil - O setor cultural foi um setor que sofreu muito com a pandemia no Brasil, ele foi especialmente afetado. Mas mesmo antes da pandemia já tinha artistas reclamando do fatobetway 30o governo usar canais oficiais para criticar trabalhos e da diminuição do financiamento para o cinema brasileiro. Como você vê essa crise na cultura e o que você acha que precisa ser feito?

betway 30 Maria Fernanda Cândido - A gente não pode esquecer que antes da pandemia a gente já estava enfrentando grandes dificuldades porque hoje nós temos um governo que não prioriza a cultura. A cultura para esse governo, claramente — isso é dito abertamente — não é uma prioridade. E alémbetway 30não ser uma prioridade ela ébetway 30uma certa forma desvalorizada. É um problema enorme porque também vai provocando um certo desmantelamento do setor. A gente está há dois anos vivendo isso, e agora alémbetway 30tudo isso tem a pandemia. Ebetway 30certa maneira, se a gente pensar num próximo governo, que tenha uma relação diferente com a cultura, vai precisarbetway 30um tempo para uma reorganização, para uma reconstrução.

Não é a primeira vez que o país atravessa esse tipobetway 30problema, a cultura já sofreu antes e ela se reergueu, ela se refez. Estamos aqui e não desistiremos, sobreviveremos. Mas é muito triste ter que passar por tudo isso e depois gastar tempo e energia reconstruindo algo que no Brasil é tão potente, é uma marca tão forte do nosso povo. Somos um povo com muita potência criativa, a nossa cultura é muito exuberante.

A atriz Maria Fernanda Cândidobetway 30teleconferência pela internet com a BBC News Brasil
Legenda da foto, A atriz está Londres trabalhando sob rígidos protocolosbetway 30segurança contra covid-19

betway 30 BBC News Brasil - Você citou as ações do governo na cultura, mas açõesbetway 30outras áreas repercutiram muito, a questão das queimadas na Amazônia, o próprio combate à pandemia tem sido polêmico. Isso mudou a imagem do Brasil? Como você tem sentido a repercussão dessas notícias?

betway 30 Maria Fernanda Cândido - As pessoas sabem aquilo que estamos atravessando, elas sabem as características desse governo, isso é um fato. Mas eu percebo que o Brasil tem uma imagem bastante positiva na Europa, nos países onde eu tenho andado. Muito mais positiva do que a imagem que nós mesmos fazemosbetway 30nós. O Brasil ainda precisa caminhar muito no sentidobetway 30se reconhecer, reconhecer as suas qualidades, abetway 30própria força, aquilo que nós temosbetway 30muito bom. E também reconhecer os pontosbetway 30que nós precisamos trabalhar, desenvolver e melhorar. É uma questãobetway 30autoconhecimento.

betway 30 BBC News Brasil - Agora a Globo está reprisando a novela betway 30 A Força do Querer, betway 30 da qual você faz parte. Ela trouxe o tema da transexualidade como discussão. Entre 2017 e agora, como você sentiu o impacto dabetway 30personagem, da novela e da discussão que ela trouxe?

betway 30 Maria Fernanda Cândido - Não mudou nada ainda. É uma discussão ainda para a sociedade, não é um tema resolvido. Eu acho que ainda tem um impacto, ainda é relevante. Essa discussão estábetway 30pauta dentro da sociedade... Homofobia, misoginia, racismo, enfim, todas essas questões são muito atuais e já vêm sendo tratados ao longobetway 30muitas décadas. Se a gente está aqui hoje conversando sobre tudo isso, (é) graças a todos que já começaram essa luta lá atrás.

É uma corridabetway 30bastão, que vem sendo passadobetway 30mãobetway 30mão há muito tempo. Talvez a gente precise expandir um pouco a nossa capacidadebetway 30aceitar as diferenças, e entender que isso não é algo que apenas exige um esforço, mas que é algo bonito, que é algo que traz muita riqueza, que enriquece as nossas vidas. Estamos aqui, hoje, nessa onda ultraconservadora que a gente está vivendo. A gente demora para conseguirbetway 30fato as grandes transformações.

A atriz Maria Fernanda Cândido, uma mulher brancabetway 30cabelos castanhos cacheados, sorri para a foto

Crédito, Lucas Seixas/Divulgação

Legenda da foto, Cultura sofre demantelamento no Brasil, diz Maria Fernanda Cândido

betway 30 BBC News Brasil - Você faloubetway 30onda ultraconservadora betway 30 . C betway 30 omo você tem sentido o impacto disso?

betway 30 Maria Fernanda Cândido - As pessoas quando votam escolhem as diretrizes que elas querem, que elas imaginam que seria adequadas para o seu país. Então se hoje você analisar esse painel dos dirigentesbetway 30muitos países a gente tem um grande númerobetway 30governantes que tem esses princípios muito mais conservadores,betway 30não aceitaçãobetway 30diferenças. Eu me sinto triste, porque eu acho que é um reflexobetway 30muito medo.

Eu vejo que essa maneira muito conservadorabetway 30viver traduz para mim um grande medo. As pessoas têm muito medo, e esse medo faz elas reagirembetway 30forma conservadora como uma ilusória formabetway 30proteção. Como se elas entendessem que isso é uma formabetway 30proteção. E na verdade não é. E se a gente parar para analisar, o nosso sistema capitalista é muito baseado numa lógica fálica, "eu tenho, você não tem", "eu tenho, portanto eu sou melhor que você", sempre numa atitude comparativa que vai sempre valorizar quem tem. Colocando quem tem como sendo melhor, sendo bom. Esse critério não propicia uma compreensão das diferenças entre as pessoas. Porque as diferenças não deveriam servir como critériobetway 30valoração, elas são apenas diferenças.

betway 30 BBC News Brasil - Qual o impacto real nessa mentalidade que você acha que o cinema, e as novelas, a televisão, têm?

betway 30 Maria Fernanda Cândido - Eu gostariabetway 30pensar que a gente pudesse ter um grande impacto, mas eu não tenho certeza disso. Eu acho que a arte é um grande mecanismo, é uma grande maneirabetway 30discutirmos ebetway 30pensarmos nós mesmos, ebetway 30fazer esse espelho com a realidade. O artista deve ser um reflexo do seu tempo, do povo, do lugar que ele habita, desse espírito do tempo. Mas a arte não se produz somente dessa maneira, a arte também está inserida dentrobetway 30um mercado.

betway 30 BBC News Brasil - Falandobetway 30paralelos entre a vida real e da arte, e voltando ao filme betway 30 O Traidor, betway 30 um dos personagens relacionados ao Don Masino é Giovanni Falcone, o juiz que trabalhou contra a máfia na Itália antes da operação Mãos Limpas (que visava desmantelar o crime organizado). No auge da Lava Jato betway 30 , surgiram betway 30 comparações entre Falcone e S betway 30 e betway 30 rgio Moro. Na época betway 30 , betway 30 você até chegou a apoiar as dez medidas contra a corrupção (principal bandeirabetway 30Moro). Hojebetway 30dia como você enxerga essa comparação entre esses dois personagens?

betway 30 Maria Fernanda Cândido - Olha, eu sei que o juiz Sergio Moro usou a operação Mãos Limpas da Itália um pouco como base, como referência. Então isso é um fato. Eu na época apoiei as dez medidas, antes do golpe, do impeachment da Dilma — era 2014, 2015. Tinha uns 70% daquelas medidas que eram muito boas e todos estavam muitobetway 30acordo que era bom. E tinha 20% que eram questionáveis, que deveriam ser discutidas pelo Congresso.

Mas era uma forma assim ingênuabetway 30achar que também alguma coisa seria feita. E no fundo nada aconteceu, o Congresso desvirtuou todas as medidas, foi uma coisa horrível, muito decepcionante. E na sequência os fatos foram acontecendo, houve o impeachment da Dilma, esse envolvimento do próprio Sérgio Moro, o fatobetway 30ter entrado para esse governo atual. Foi uma experiência um pouco decepcionante, que me desiludiu, até mesmo como cidadã.

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