Reinfecção mais grave por variante do coronavírus traz novo alerta sobre as mutações, diz cientista:a3 bet

Crédito, Science Photo Library

Legenda da foto, Quanto maior liberdade o vírus tem para circular, maior probabilidadea3 betdesenvolver mutações

Tanto Brasil quanto África do Sul identificaram recentemente novas linhagens do coronavírus que podem ser mais transmissíveis e até driblar os anticorpos daqueles que já tiveram a doença uma primeira vez, provocando reinfecções. Ao ladoa3 betuma outra cepa identificada no Reino Unido, elas preocupam autoridadesa3 betsaúdea3 bettodo o planeta.

Em entrevista à BBC News Brasil, a pesquisadora explica os riscos representados por essas variantes, conta um poucoa3 betsua trajetória e chama atenção para o estudo que detalhou o primeiro casoa3 betreinfecção por uma linhagem do coronavírus que pode "driblar" o sistema imunológico,a3 betque a paciente teve sintomas mais severos da covid-19.

Crédito, Divulgação

Legenda da foto, A virologista operando sequenciadora3 betgenoma portátil: técnica usadaa3 betepidemiaa3 betzika tem sido aplicada na pandemia

As mutações N501Y e E484K

Hoje, causam preocupação pelo menos três variantes do Sars-CoV-2, conforme a OMS: a B.1.1.7, identificadaa3 betdezembro no Reino Unido, a 501Y.V2, encontrada na África do Sul, e a P.1, que emergiu no Amazonas.

A atenção dos cientistas está voltada a duas mutaçõesa3 betparticular: a N501Y, presente nas três variantes, e a E484K, encontrada na da África do Sul e na que circula no Brasil.

Ambas estão localizadasa3 betgenes que codificam a espícula, a proteína responsável por interagir com a célula do hospedeiro, e que, na prática, facilita a entrada do coronavírus nas células humanas.

No caso da N501Y, há indicativoa3 betque ela possa tornar o Sars-CoV-2 mais transmissível - mais contagioso, o vírus poderia levar mais pessoas ao hospital e elevar o númeroa3 betmortes. Não há indicativo, contudo,a3 betque a mutação resultea3 betuma versão mais grave da covid-19.

No caso da E484K, compartilhada pelas variantesa3 betManaus e da África do Sul - e ainda por uma outra identificadaa3 betdezembro no Rioa3 betJaneiro, chamadaa3 betP.2 -, estudos têm demonstrado que ela pode dificultar a açãoa3 betanticorpos.

Ela modifica uma região da espícula conhecida como RBD (domínioa3 betligação ao receptor), que se liga ao receptor das células humanas - e justamente onde atuam os anticorpos neutralizantes produzidos pelo sistema imunológico.

Com a mudança, os anticorpos perdem a especificidade com o RBD e o vírus tem um mecanismoa3 betescape do nosso sistema imunológico, o qual passa a ter maior dificuldade para atuar.

Descobertas desse tipo têm gerado preocupação sobre um possível efeito sobre as vacinas. Por enquanto, acredita-se que elas não percam a eficácia, mas podem ter essa eficácia reduzida.

"Mas muito mais estudos serão necessários para entendermosa3 betfato se essas variantes podem ou não ter impacto grande nas vacinas. A gente não pode 'fazer terrorismo' neste momento", acrescenta Giovanetti.

De qualquer maneira, o alerta que essas descobertas emitem já é bem claro: é preciso,a3 betum lado, manter as medidasa3 betcontrole à pandemia, como o distanciamento social, e acelerar o processoa3 betvacinação para reduzir a possibilidadea3 betcirculação destas ea3 betpossíveis futuras linhagens, diz a cientista.

Quanto mais o vírus tiver liberdade para circular, maior a probabilidadea3 betele sofrer mutações.

Crédito, Divulgação

Legenda da foto, Mutações na região da espícula do vírus têm preocupado autoridadesa3 betsaúde

Driblando o sistema imunológico

A E484K também chamou atenção da cientistaa3 betum estudo do qual ela participou recentemente, que identificou o primeiro casoa3 betreinfecçãoa3 betcovid-19 por uma variante com essa mutação.

"Nosso estudo abriu várias outras perguntas, porque o segundo caso foi um pouco mais severo do que o primeiro", ela conta, ressaltando que a maioria dos casosa3 betreinfecção pelo Sars-CoV-2 descritos até o momento mostravam um segundo episódio mais leve que o primeiro.

Tratou-sea3 betuma profissional da saúdea3 bet45 anos sem comorbidades residentea3 betSalvador, que teve a doençaa3 betmaio e, depois,a3 betoutubro - cada episódio causado por uma variante diferente do coronavírus.

No primeiro, ela apresentou diarreia, dora3 betcabeça, fraqueza e dor ao engolir por aproximadamente 7 dias.

Meses depois, infectada pela linhagem do coronavírus identificadaa3 betdezembro no Rioa3 betJaneiro, hoje chamadaa3 betP.2, os sintomas evoluíram para tosse, dora3 betgarganta, perdaa3 betpaladar, insônia e faltaa3 betar. Não precisou ser internada, entretanto, e se recuperou.

O trabalho, liderado pelo pesquisador Bruno Solano, do Instituto D'Ora3 betEnsino e Pesquisa e do Hospital São Rafael, foi publicadoa3 betjaneiroa3 betversão não revisada por pares e submetida à publicação científica Lancet.

"O estudo leva a perguntas sobre a questão da reinfecção e da gravidade clínica associada a essa mutação. É uma questão ainda aberto, e mais pesquisas serão necessárias."

A variante P.2 apresenta apenas uma mutação na espícula, a E484K, enquanto a P.1 - encontrada inicialmente no Amazonas mas já detectadaa3 betoutros Estados, como São Paulo - possui um número maiora3 betmutações na proteína que se liga às células humanas e, por isso, tem gerado ainda mais preocupação.

Crédito, PA Media

Legenda da foto, Mutação E484K sinaliza que algumas variantes podem 'driblar' anticorpos

Centenasa3 betlinhagens diferentes

Marta explica ainda que, apesar da preocupação com as novas variantes, as mutações são abundantes nos vírus.

Essas alterações no código genético dos patógenos aparecem quando eles se multiplicam, fazem uma cópiaa3 betsi mesmos. São "erros" na transcrição do código genético - no caso do Sars-CoV-2, do RNA.

E podem acabar sendo importantes para o vírus justamente porque podem fazer com que ele se torne resistente à resposta imune do hospedeiro.

"A gente precisa pensar que eles são parasitas intracelulares obrigatórios - não conseguem sobreviver foraa3 betuma célula, foraa3 betum hospedeiro. Se não mudam, o hospedeiro se torna resistente, e eles não conseguem sobreviver. Então essas mutações são necessárias para que ele possa garantir a própria sobrevivência", ilustra.

A maioria das mutações, contudo, é irrelevante - algumas inclusive prejudiciais à sobrevivência do vírus.

Para se ter uma ideia, apesara3 beto planeta estar discutindo quatro ou cinco variantes do coronavírus mais preocupantes, já há quase mil cadastradas por cientistasa3 bettodo o mundo na plataforma Pangolin - acrônimoa3 bet"phylogenetic assignment of named global outbreaks lineages", e também o nomea3 betum dos animais que, conforme investiga a ciência, pode ter servidoa3 bethospedeiro intermediário para o novo coronavírus.

Crédito, Arquivo Pessoal

Legenda da foto, Cientista já estudou vírus da chikungunya, zika, dengue e fere amarela no Brasil

Seis anosa3 betsurtos e epidemias no Brasil

Formadaa3 betbiologia, com mestrado e doutorado na área, Marta diz que sempre teve interesse nos vírus.

"Para mim era incrível pensar que essas partículas tão pequenas eram capazesa3 betse replicar como se tivessem sido programadas por algum algoritmo misterioso."

E foi aindaa3 betRoma que teve contato com os pesquisadores Luiz Alcântara, então da Fiocruz da Bahia, e com Tulioa3 betOliveira, que atua desde 1997 na África do Sul,a3 betum projetoa3 betcooperação internacional para fazer a caracterização molecular dos vírus HIV e HTLV tanto no Brasil quanto na África do Sul.

Depois veio a oportunidadea3 betvir para o Brasil,a3 bet2015. Desde então, o trabalho da pesquisadora, que vive no Rioa3 betJaneiro, tem se adaptado a cada novo surto ou epidemia que acontece por aqui.

Ela estudava a dispersão do vírus da chikungunya quando eclodiu a epidemiaa3 betzika.

Naquele momentoa3 betcrise, Alcântara, hoje à frente do Laboratórioa3 betFlavivírus da Fundação Oswaldo Cruz, se uniu a parceiros nacionais, como a imunologista Ester Sabino, e internacionais, como Oliveira, na África do Sul, e as universidades britânicasa3 betOxford e Birmingham, no projeto Zibra, que objetivava fazer a caracterização moleculara3 bettempo real do vírus que vinha causando microcefaliaa3 betbebês recém-nascidos.

Com a equipe, Marta viajou o Nordestea3 betum laboratório móvel para estudar o genoma do patógeno.

A tecnologia usada nesse projeto, um sequenciadora3 betgenoma portátil batizadoa3 betMinION, seria fundamental anos depois na pandemiaa3 betcovid-19. Foi com ele que a equipea3 betSabino, pesquisadora do Institutoa3 betMedicina Tropical da Faculdadea3 betMedicina da USP, sequenciaria o primeiro genomaa3 betSars-CoV-2 no Brasil no fima3 betfevereiro.

"A implementação dessa tecnologia foi fundamental, porque se tornou uma técnica para permitir o monitoramento ativoa3 bettempo reala3 betpatógenos virais", diz Marta.

Depois do zika, ela relembra, houve ainda a reemergência da febre amarela no Sudeste e,a3 betparalelo, grandes surtosa3 betdengue.

Em 2020, acrescenta, chegou o coronavírus e tudo mudoua3 betescala. Há maisa3 betum ano os pesquisadores estão trabalhandoa3 betforma quase ininterrupta e a produção e o compartilhamentoa3 betconhecimento não tem parâmetro.

Em 12 meses, destaca, foram gerados maisa3 bet400 mil genomas completos do Sars-CoV-2, "talvez um décimo da quantidadea3 betgenomas completos que nós temos do vírus da dengue, que é endêmico há décadas no Brasil" - um trabalho fundamental para o desenvolvimentoa3 betvacinasa3 bettempo recorde.

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