'Placar da vida' do governo estimula negacionismo por omitir realidade trágica da covid-19, dizem cientistas:fast casino

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, 'Placar da Vida' com dados atualizados dos 'brasileiros salvos' tem sido compartilhado diariamente nas redes sociais do Ministério da Saúde, mas postagens muitas vezes não incluem informações sobre óbitos

"No jornal da manhã é caixão, corpo; na hora do almoço, é caixão novamente. No jornal da noite é caixão, corpo e númerofast casinomortos. Eu pergunto a todos: como é que você acha que uma senhorafast casinoidade, uma pessoa humilde ou que sofrefast casinooutra enfermidade se sente com essa maciça divulgação desses fatos negativos. Não está ajudando", disse.

Entretanto, para especialistas ouvidos pela BBC News Brasil, a exaltaçãofast casinodados sobre brasileiros recuperados neste momento é uma formafast casinoreforçar o negacionismofast casinorelação ao Sars-Cov-2, nome oficial do novo coronavírus. Isso porque afirmam que destacar somente aspectos positivosfast casinomeio ao crescimento exponencialfast casinocasos e mortes no Brasil é uma formafast casinotransmitir a falsa ideiafast casinoque as coisas estão melhorando.

Professor da faculdadefast casinoMedicina da Universidadefast casinoSão Paulo, Marcos Boulos critica duramente a exaltação dos númerosfast casinorecuperados neste momento.

"É um vírus que mata, normalmente, menosfast casino5% das pessoas que foram infectadas e tiveram sintomas. Então é óbvio que maisfast casino95% vão se recuperar. Enfatizar os númerosfast casinorecuperados não muda nada neste momento. É preciso ser realista. Não é correto tentar minimizar a gravidade da doença", diz à BBC News Brasil.

Crédito, Reprodução/Facebook

Legenda da foto, Dados divulgados nas redes sociais do Ministério da Saúde na última quinta-feira (21), quando Brasil registrou maisfast casinomil mortes por covid-19fast casinoapenas 24h

Nas redes sociais, as publicações do "Placar da Vida" causaram repercussão. Enquanto algumas pessoas comemoraram o númerofast casinorecuperados, outras criticaram o fatofast casinoas tabelas não citarem o aumento das mortes por covid-19 no país.

Nas publicações que mostram as imagens com os númerosfast casinorecuperados nas redes do Ministério da Saúde, há discretos links para todos os dados sobre a covid-19 no Brasil, inclusive sobre os númerosfast casinomortos. No entanto, estudiosos apontam que as tabelas podem ser compartilhadas massivamente por outros perfis efast casinoaplicativosfast casinomensagens sem a devida contextualizaçãofast casinoóbitos, que não são mencionados no "Placar da Vida".

Reforço ao negacionismo

Os dados sobre recuperados costumam ser utilizados como argumentos por pessoas que negam os riscos do novo coronavírus para justificar que medidasfast casinoprevenção, como o isolamento social, são desnecessárias.

Professor da Universidade Estadualfast casinoCampinas (Unicamp) e pesquisador no ramo da divulgação científica, Leandro Tessler classifica o destaque aos dadosfast casinorecuperados como uma estratégiafast casinomarketing desrespeitosa.

"Tentar dar um ar otimista efast casinoque estamos nos saindo bem no enfrentamento ao coronavírus é perigoso, porque os dados sobre infectados e mortos não paramfast casinoaumentar. Pegam um ângulo que favorece o governo, mas sem nenhum rigor", declara.

"É muito bom comemorar os recuperados. Mas é errado citar isso como se fosse um dado positivo e que mostra a realidade do país. É falacioso passar a ideiafast casinoque estamos tendo controle da doença, enquanto as mortes aumentam cada vez mais", acrescenta Tessler.

O filósofo Pablo Ortellado, professor da USP, explica que o atofast casinomencionar apenas os dadosfast casinopacientes recuperados faz parte do discurso negacionista, pois tenta minimizar a gravidade do Sars-Cov-2. "Eles tentam mudar a leitura do cenário do coronavírus no Brasil. É uma estratégia do governo Bolsonaro dizer que o coronavírus é um problema superdimensionado", diz o estudioso.

"É uma estratégia que faz partefast casinouma campanhafast casinodesinformações. Essa campanha dos bolsonaristas também costuma argumentar que os governadores estão aumentando númerosfast casinomortos, que os hospitais estão vazios e que a cloroquina é eficaz (mesmo sem comprovação científica)", completa Ortellado.

Um dos objetivos da estratégia negacionista sobre o novo coronavírus é a reaberturafast casinoestabelecimentos no Brasil,fast casinomeio à pandemia — medida que não é recomendada por cientistas e pela Organização Mundialfast casinoSaúde (OMS)fast casinopaíses que enfrentam explosãofast casinocasosfast casinocovid-19.

Para o infectologista Marcos Boulos, nenhum tipofast casinodivulgação sobre números do novo coronavírus deve citar somente os dadosfast casinocurados. "Como a mortalidade do vírus é consideravelmente baixa, é lógico que a maioria estará recuperada. O que pesa mesmo é o númerofast casinomortes, porque está aumentando cada vez mais no Brasil."

"Somente poderemos avaliar questões positivas quando o númerofast casinomorte efast casinoinfectados começar a cair no país. Na fasefast casinoagravamento, como a que estamos atualmente, não tem cabimento ressaltar casos recuperados. Estão tentando dizer que as coisas estão melhores, quando não estão", assevera Boulos.

Em breve resposta à BBC News Brasil, o Ministério da Saúde afirma que todas as informações referentes ao novo coronavírus estão sendo divulgadasfast casinoseus diversos canaisfast casinocomunicação. A pasta não respondeu se considera que a exaltaçãofast casinopessoas recuperadas neste momento, como no caso do "Placar da Vida", pode passar a falsa impressãofast casinoque a situação do vírus está controlada no país.

Consequências do negacionismo

Médicos e pesquisadores apontam que o negacionismofast casinorelação ao novo coronavírus é um dos grandes problemas do enfrentamento à covid-19. A ideiafast casinoque o vírus não é tão perigoso e que o isolamento social é desnecessário costuma ser reforçada por fake news, como afast casinoque há caixões enterrados vazios para inflar os dadosfast casinomortos.

De acordo com os especialistas ouvidos pela BBC News Brasil, o "Placar da Vida" vai ao encontrofast casinodeclarações do presidente Jair Bolsonaro, que adota um discurso que tenta reduzir a gravidade do novo coronavírus, enquanto o Brasil sobe na listafast casinopaíses mais atingidos pelo Sars-Cov-2.

O pesquisador Leandro Tessler pontua que um dos maiores erros do presidente no combate ao Sars-Cov-2 é ignorar a ciência.

Crédito, EPA/Joedson Alves

Legenda da foto, Levantamento apontou que seguidores do presidente Jair Bolsonaro têm maior tendência a não permanecerfast casinoisolamento social

"Hoje, a ciência diz que ainda não temos nada para oferecer contra o novo coronavírus, a não ser os cuidados paliativos. Por isso, a melhor alternativa é o isolamento social. O mais prudente é fazer como muitos governos no mundo e ouvir os cientistas. Já no Brasil, após a saídafast casinodois ministros da Saúde, o recado é claro: quando a ciência não diz o que eu quero, demito."

Um levantamento do Monitor do Debate Político no Meio Digital apontou que os eleitoresfast casinoBolsonaro são os que menos seguem o isolamento social. O distanciamento social passou a ser menorfast casinoáreas com mais seguidoresfast casinoBolsonaro desde 24fast casinomarço, quando ele fez um discurso defendendo o relaxamento da medida, sem qualquer respaldo científico.

O negacionismo pode trazer consequências graves no enfrentamento ao Sars-Cov-2. "Embora seja difícil quantificar, dá para dizer com segurança que essa campanhafast casinonegação da gravidade do vírus tira vidas. É complicado quantificar, mas há gente morrendo por essas campanhas negacionistas", declara o filósofo Pablo Ortellado.

Marcos Boulos afirma que um dos motivos que fizeram do Brasil um dos países com mais casosfast casinoSars-Cov-2 no mundo é o fatofast casinoque muitas pessoas optaram por não seguir o isolamento social, por não acreditar nos riscos trazidos pelo vírus.

"Essas pessoas arriscam suas próprias vidas e as dos outros. Quando alguém leva uma vida normal nesse período, pode ajudar a aumentar a transmissão e fazer com que ainda mais pessoas morram", declara Boulos.

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