Coronavírus: 'Somos treinados a nos acostumar com a morte, mas não nos acostumamos', diz enfermeira brasileira na Itália:lampião bet app

Enfermeira brasileira Claudialampião bet appMorais

Crédito, Reproducao

Legenda da foto, Enfermeira na Itália, brasileira Cláudialampião bet appMorais trabalhalampião bet apphospital que agora só atende pacienteslampião bet appcovid-19

'Sentimentolampião bet appdever'

Desde o fimlampião bet appfevereiro, o hospital onde trabalha, Policlínico San Donato, na periferia da cidade, passou a atender exclusivamente pacienteslampião bet appcovid-19.

"Normalmente, o pronto-socorro é cada dia um lugar diferente. Agora, vemos sempre as mesmas coisas", diz ela, por Skype,lampião bet appuma sala do hospital, à BBC News Brasil. "Nós enfermeiros somos treinados a nos acostumar com a morte, mas não nos acostumamos. Quando você perde um paciente a cada três, quatro dias, é uma coisa. Quando você perde todos os dias… É muito difícil."

"Estamos vivendo uma guerra", repete algumas vezes, contando sobre seu trabalho árduo no hospital e a tristezalampião bet appver pacientes morrendo sozinhos, sem contato com a família. Mas deixa claro: não se vê como especial pelo trabalho que vem fazendo.

"Não somos heróis. Estamos fazendo o nosso trabalho do dia a dia, com medo, como todas as outras pessoas, mas com o sentimentolampião bet appdever para a sociedade", diz.

No fimlampião bet appsemana, o apresentador Luciano Huck publicou emlampião bet appcontalampião bet appInstagram um vídeolampião bet appMorais. Paramentada com seu uniformelampião bet appenfermeira, ela fazia um alerta: "Quem vai para a terapia intensiva tem muitas chanceslampião bet appnão morrer, só que não tem lugar para todo mundo (...) Podem acreditar que é pior do que vocês estão imaginando".

Enfermeira brasileira Claudialampião bet appMorais

Crédito, Arquivo pessoal

Legenda da foto, Profissionaislampião bet appsaúde destacam importância do materiallampião bet appproteção individual para não serem contagiados pelo novo coronavírus; na imagem, Cláudia com a roupalampião bet appproteção

O vídeo viralizou, e só na contalampião bet appHuck teve maislampião bet app4 milhõeslampião bet appvisualizações. Mas não era para ter sido divulgado — ela havia mandado só para uma pessoa mandar no grupolampião bet appWhatsApp da família.

"Quando acordei, tinha milhõeslampião bet appvisualizações, eu não entendi nada", diz. "Nunca aconteceu uma coisa dessas comigo, me assustou muito. Agora estou tentando pensar que minha família é todo o Brasil", brinca, dizendo-se orgulhosalampião bet appser uma brasileira ali, na linhalampião bet appfrentelampião bet appcombate.

"Venholampião bet appuma realidade muito humilde. Sou resiliente desde criança, acostumada com o sofrimento. Ter crescido no Brasil me fez mais forte", afirma.

Seu objetivo com o vídeo era convencer os idosos dalampião bet appfamília a se protegerem e não saíremlampião bet appcasa, mas ela teme que tenha causado pânico na população. Então, agora, a primeira coisa que diz é: "Não entremlampião bet apppânico. Mas tomem cuidados".

Cuidados para evitar a disseminação do vírus incluem o distanciamento social (mantendo dois metroslampião bet appdistância entre as pessoas) e a higiene (lavando as mãos com frequência).

Morais deletou seu perfil das redes, mas diante da grande quantidadelampião bet appmensagens que recebeulampião bet appprofissionaislampião bet appsaúde do Brasil pedindo conselhos, decidiu criar uma nova conta para falar sobre o assunto (@claudia.demorais.off, no Instagram).

De Goianópolis à Itália

Há 20 anos, Morais trancou a faculdadelampião bet appmatemática e deixou Goianópolis, pequena cidadelampião bet app11 mil habitantes, para viajar pela Europa com uma amiga. O plano era ficar viajando por dois anos, mas gostou da Itália, conheceu o homem (também brasileiro) que se tornaria seu marido e acabou ficando por lá.

Alguns anos depois, realizou o sonholampião bet appestudar enfermagem na Universidadelampião bet appPavia, na Lombardia. "Sempre gosteilampião bet apptomar conta das pessoas,lampião bet appter contato com elas. É algo meu,lampião bet appdentro,lampião bet appsempre."

Enfermeira brasileira Claudialampião bet appMorais

Crédito, Arquivo pessoal

Legenda da foto, Cláudialampião bet appMorais gravou vídeo para a família que acabou viralizando

E nunca imaginou que passaria pela situação pela qual passa agora, é claro, embora tenha recebido treinamento para lidar com o ebola há alguns anos.

Suas filhas,lampião bet app14 e 16 anos, também foram envolvidas na batalha. A mais velha mudou-se para a casalampião bet appuma vizinha para liberar um quarto. Ali, Morais fica isolada da família, dormindo no cômodo separado e fazendo refeições sozinha. Além disso, todos os dias ela passa para ver a filha mais velhalampião bet appuma "distância necessária". "Ela fica no jardim e eu fico na rua."

Na cidade onde mora, a 30kmlampião bet appMilão, Morais diz conhecer várias pessoas que perderam a vida por causa do novo coronavírus. "Todos os dias eu vejo um nome novolampião bet appuma pessoa que eu conheço. Eu perdi as contas. Vou contar depois que tudo isso passar."

'Gripezinha?'

Quando publicou o vídeolampião bet appMorais emlampião bet appconta, Luciano Huck, considerado um dos possíveis candidatos à Presidêncialampião bet app2022, mandou um recado: "Para quem acha que é só mais uma gripezinha… Para quem acha que é exagero… Obrigado por compartilhar, Cláudia".

O presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, já disse que, por seu "históricolampião bet appatleta", caso fosse contaminado pelo coronavírus, nada sentiria ou "seria acometidolampião bet appuma 'gripezinha' ou 'resfriadinho'".

A enfermeira diz não querer entrarlampião bet appquestões políticas. "Não sou eu a pessoa indicada para dizer o que é certo ou errado. Cada país tem suas prioridades e profissionais competentes para avaliar as decisões", afirma. Mas defende o distanciamento social como formalampião bet appcombater a disseminação do vírus.

Não é uma gripe como outras, diz ela, "pelo númerolampião bet appcontágios, alta virulência, por contagiar pessoas que estão com a saúde boa e pela pneumonia mais grave que provoca". "Há pacientes que chegam no pronto-socorro com uma saturaçãolampião bet appoxigêniolampião bet app70% s 80% tendo tido oxigênio na ambulância. É uma insuficiência respiratória grave."

O enfermeiro Filippo Bigioni, coordenador do pronto-socorro do Hospital Policlínico San Donato, onde Cláudia trabalha, concorda. A covid-19 não é apenas uma gripe. "Nunca vimos algo assim, nem com a Sarslampião bet app2003", diz ele à BBC New Brasil. "Vemos pneumonias devastadoras. São coisas novas que nem os pneumólogos tinham visto", afirma.

O hospital foi completamente transformado por causa da doença. Oferece ao menos 200 leitos para pacienteslampião bet appcovid-19. Na UTI, são 28 leitos, com previsãolampião bet appaberturalampião bet appmais 12.

Bigioni conta que salaslampião bet appcirurgia foram transformadaslampião bet appUTI e que equipes médicas foram unificadas — cirurgiões e médicos com outras especialidades, por exemplo, agora atendem pacienteslampião bet appcovid-19.

Ele trabalhou na transformação do hospital, elaborando novas formaslampião bet appfluxolampião bet apptrabalho e instruindo as equipes. "Abrimos um departamento por dia, e cada dia instruímos os médicos e enfermeiroslampião bet appum andar", diz Bigioni, que também está vivendo isolado da família,lampião bet appuma outra casa. Desde o começolampião bet appmarço, conta ele, o hospital atinge lotação máxima todos os dias.

Enfermeira brasileira Claudialampião bet appMorais

Crédito, Arquivo pessoal

Legenda da foto, 'Sou resiliente desde criança, acostumada com o sofrimento. Ter crescido no Brasil me fez mais forte', diz enfermeira

Morrem sozinhos

Os relatoslampião bet appmédicos na Itália que mais têm impressionado quem não vive na pele o que acontece no país são os que falam sobre a "escolhalampião bet appSofia"lampião bet appmédicos ali, que teriam que escolher entre um ou outro paciente para salvar por não ter leitos ou equipamentos suficientes. Além disso, assustam também os relatos sobre como pacientes têm morrido sozinhos, sem poder se despedirlampião bet appfamiliares.

Morais comenta as duas situações.

Primeiro, esclarece que o critério para admitir alguém na UTI não é apenas a idade, e que isso é um procedimento normallampião bet apphospitais. Médicos criam um algoritmo para fazer essa escolhalampião bet appque cruzam as patologias crônicas dos pacientes,lampião bet appcapacidade respiratória, idade, graulampião bet appcriticidade daquele momento, entre outros.

Quando há mais disponibilidadelampião bet appleitos na UTI, esse algoritmo "se alarga", ou seja, há mais margem para pacientes irem para a terapia intensiva. Agora, no entanto, "estamos estreitos" — mais critérios são utilizados, e a idade é um deles. No entanto, assegura que todos os pacientes estão recebendo assistência, do início ao fim.

Depois, conta que,lampião bet appfato, muitos pacientes morrem sozinhos. É política do hospital não admitir qualquer outra pessoa que não o paciente para não disseminar o vírus. Acompanhantes estão proibidos.

Pacientes que estãolampião bet appcondiçõeslampião bet appusar o celular ficamlampião bet appcontato com seus familiares, mas os que não estão dependem dos profissionaislampião bet appsaúde para fazê-lo, e nem sempre é possível fazer isso para todos ou o tempo todo.

"Sentimos compaixão pelos pacientes que estão isolados. Muitas vezes não podemos estar com eles, e eles ficam sozinhos dentrolampião bet appum quarto sem os familiares", lamenta Morais.

"Muitos deles não conseguem se despedir ao telefone, e mandam recados por nós. Mensagens como: 'Avisa minha mulher que eu amo ela' e expressãolampião bet appgratidão pela vidalampião bet appgeral." Ela conta ainda não ter conseguido dar o recado para esses familiares.

"Eu tenho um carinho especial pelos idosos. Na fase terminal, gostolampião bet appdar uma atenção especial, lavar, perfumar, acolher a família, no limite do possível consigo fazer isso. E agora, nesse período, não podemos."

Em corredorlampião bet apphospital, um membro da equipe consola outro, ajoelhado com as mãos na cabeça

Crédito, PAOLO MIRANDA

Legenda da foto, Em outro hospital, enfermeiro italiano fotografou força e fragilidadelampião bet appcolegas lidando com a pandemia do coronavírus

Impotência e fé

Esse "inimigo invisível" faz com que ela se sinta impotente.

"A empatia às vezes é um negócio difícil. Se você se colocar no lugar do paciente, você pode entrarlampião bet appcrise", diz ela, que atribui partelampião bet appsua resiliência até agora à fé.

"Se não fosse a minha fé, eu já teria caído. Já teria ido para além da ajuda psicológica."

De acordo com ela, há colegas que estãolampião bet appcrise, choram durante os plantões e pedem para ficar afastados do pronto-socorro durante meia hora para respirar um pouco. O hospital abriu um ambulatório psicológico aos profissionaislampião bet appsaúde.

Mas não é exatamente o momentolampião bet appagora que preocupa a enfermeira, mas o "pós-guerra". "Agora a adrenalina está alta, depois vamos ver as consequênciaslampião bet apptodos nós."

Para seguir com seu trabalho todos os dias, Morais conta que sailampião bet appcasa e deixa "a Cláudia da família". Entra no trabalho e veste a "Cláudia do combate". E, quando tira o materiallampião bet appproteção todos os dias, deixa o que passou no hospital ali.

"Demorou um tempo para desenvolver essa técnica. Mas tem dias que a gente não consegue, voltamos para casa tristes. Somos humanos", diz, desejando que no Brasil a situação não seja tão grave como na Itália.

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