'Se beber, não nade': a perigosa ligação entre álcool e mortes por afogamento:aposta pix

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Legenda da foto, Um diaaposta pixverão, um drink, um mergulho... Pode não parecer, mas há uma combinação que não cai bem aí, alertam organizações da área da saúde

Em números absolutos, o Brasil aparece neste relatório da OMS como o terceiro país com mais mortes por afogamentos (6.487, com ano baseaposta pix2011), atrásaposta pixRússia (11.981,aposta pix2010) e Japão (8.999,aposta pix2011).

Quando considerado o valor proporcional ao tamanho da população, que no Brasil foiaposta pix3,3 mortes por 100 mil habitantes, o país se afasta das primeiras colocações e da média mundial (5,2). Mas, ainda assim, fica acima do panoramaaposta pixpaíses ricos (2,3 por 100 mil habitantes) e da região das Américas (3 por 100 mil habitantes).

Quem trabalha com o tema diz que estes números provavelmente são subestimados, pois há muitas mortes por afogamentos que não são registradas como tal - tanto no Brasil quanto no mundo. E há outro desafio para os pesquisadores: quantificar o papel do álcool nestes incidentes.

Enquanto as pesquisas sobre o papel do álcool nos afogamentos se aprimoram, quem trabalha na linhaaposta pixfrente - com os pés na areia, por exemplo - vê nesta associação uma velha conhecida.

"A gente sabe que o álcool tem relação direta com afogamento. Estudos têm mostrado que ele pode variar como fator determinanteaposta pix15 a 60% dos óbitos", diz David Szpilman, diretor médico da Sobrasa e que trabalhou por décadas como tenente-coronel do Corpoaposta pixBombeiros no Rioaposta pixJaneiro, período no qual prestou diversos atendimentos a pessoas afogadasaposta pixpraias.

"O consumoaposta pixálcool na areia é um sinal que já deixa os guarda-vidasaposta pixalerta. Tem um comportamento clássico, da pessoa que vai à praia não para entrar na água, e sim para beber. Em algum momento ela vai querer entrar na água e não consegue ver que está sob risco, mesmo aquelas que sabem nadar", diz Szpilman.

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Legenda da foto, Álcool influencia nas capacidades física e mentalaposta pixlidar com riscos como correntezas

A campanha, inclusive, recomenda que quem for nadar não beba nada: "Se beber, não nade".

"Já temos hoje uma culturaaposta pixnão misturar álcool e direção, mas a associação álcool e lazer ainda existe. É algo que ainda se vê muito nos barcos, por exemplo. E vemos também diferençasaposta pixlugar para lugar. Onde tem mais turismo pode haver maior consumoaposta pixálcool, que faz parte da propostaaposta pixse divertir. Tende a ser diferenteaposta pixcidadesaposta pixque ir à praia já faz mais parte da rotina", exemplifica Szpilman.

Maisaposta pix15 afogamentos fatais por dia no Brasil

A partiraposta pixdados do Ministério da Saúde, a Sobrasa estima que,aposta pix2017, 5.692 pessoas morreram afogadas no Brasil, uma taxaaposta pix2,7 por 100 mil habitantes (ao longo das décadas, os números absolutos e relativosaposta pixafogamentos fatais no Brasil têm diminuído). São cercaaposta pix15 mortes por dia no país.

Os mesesaposta pixnovembro a fevereiro, portanto incluindo o verão, concentram 44% dos casos. Maisaposta pix65% dos óbitos acontecem nos finaisaposta pixsemana e feriados, o que vai ao encontro da associação entre lazer, álcool e afogamentos.

As praias, no entanto, concentraram apenas 15% óbitosaposta pix2017. A maior parte, 75% dos incidentes fatais, aconteceuaposta pixlugaresaposta pixágua doce. E é o Norte a região brasileira com o maior número relativoaposta pixcasos (5,1 por 100 mil habitantes), seguido pelo Nordeste (3,1); Centro-Oeste (2,8); Sul (2,7); Sudeste (1,98).

Essa distribuição geográfica indica também que as mortes podem ocorrer não sóaposta pixmomentosaposta pixlazer, mas tambémaposta pixatividades rotineiras, comoaposta pixtrabalho e transporte.

"Possivelmente, o litoral tem uma segurança maior, por ter mais agentes capacitados supervisionando as pessoas", explica Szpilman.

"Cada ambiente aquático exige uma competência aquática diferente: não é só saber nadar, mas conhecer o ambiente que se está entrando. E o álcool afeta essa capacidadeaposta pixavaliação, inclusive para quem sabe nadar", diz o diretor da Sobrasa. "Os rios, por exemplo, podem aparentar serem lugares tranquilos para mergulhar, mas além da correnteza, têm obstáculos como lodo, galhos, pedras e desníveis rápidos."

O psiquiatra Arthur Guerra, presidente executivo do Centroaposta pixInformações sobre Saúde e Álcool (CISA), aponta que uma dose já é capazaposta pixlevar a alterações psicológicas e fisiológicas na pessoa alcoolizada, por isso reforça a recomendação "se beber, não nade".

O site do CISA traz uma tabela relcionando níveisaposta pixconcentraçãoaposta pixálcool a certas alterações - com 0,01 a 0,05gaposta pixálcool por 100 mlaposta pixsangue, por exemplo, várias funções do sistema nervoso já passam por alterações, alémaposta pixaumento do ritmo cardíaco e respiratório.

"Claro que há fatores que influenciam neste impacto do álcool, como se a pessoa se alimentou antes, seu peso, altura e etc", explicou à BBC News Brasil por telefone.

"O álcool inibe a censura, fazendo a pessoa se sentir mais confiante e eufórica; mas também deixa a pessoa mais lentificada, com menos reflexos. Imagine a cena onde uma pessoa está alcoolizada e enfrenta uma correnteza, ondas fortes. É como uma 'tempestade perfeita'."

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Legenda da foto, Em 2017, maior parte dos afogamentos no Brasil aconteceuaposta pixlocaisaposta pixágua doce

Há ainda a preocupação com o efeito negativo do álcool na supervisãoaposta pixcrianças, um grupoaposta pixrisco importantíssimo nos afogamentos.

No Brasil, a Sobrasa destaca que afogamentos são a principal causaaposta pixmorte acidentalaposta pixcrianças com idades entre um e quatro anos, conforme mostrou a BBC News Brasil no ano passado.

"Fisiologicamente, o problema do afogamento é a aspiraçãoaposta pixlíquido que vai para o pulmão e atrapalha as trocas gasosas. Há uma baixa do oxigênio que pode levar a uma parada respiratória e depois cardíaca. Isso pode aconteceraposta pixum minuto e meioaposta pixafogamento, é um processo muito rápido", explica David Szpilman.

A OMS também destaca, no relatório Evitando Uma Das Maiores Causasaposta pixMorte, que quando uma pessoa começa a se afogar o "desfecho é quase sempre fatal". "Diferenteaposta pixoutros ferimentos, a sobrevivência (a um afogamento) é quase exclusivamente determinada na cena do incidente, e dependeaposta pixdois fatores cruciais: quão rápido a pessoa é tirada da água e quão rapidamente o procedimentoaposta pixressuscitação adequado é feito."

Álcool como indicador fundamental

Normalmente, pesquisas que buscaram detalhar o papel do álcool nos afogamentos recorreram a atestadosaposta pixóbitos, autópsias e, por vezes, inquéritos policiais. Costumam ficaraposta pixfora dados sobre afogamentos que não levaram à morte; aqueles intencionais, como suicídios e homicídios; e os que são resultadoaposta pixenchentes ou transportes aquáticos.

Austrália, Canadá e Nova Zelândia têm as melhores basesaposta pixdados no mundo sobre afogamentos, e foi a partir destes países que foram publicados,aposta pixjunho, resultadosaposta pixuma das pesquisas mais recentes sobre o assunto.

A partiraposta pixdadosaposta pixjaneiroaposta pix2005 a dezembroaposta pix2014, os autores do artigo publicado no periódico BMC Public Health relacionaram o álcool a 36% dos afogamentos fatais no Canadá; 25,8% na Austrália; e 16,4% na Nova Zelândia. Drogasaposta pixgeral também foram dectectadasaposta pix24% das mortes no Canadá; 27% na Austrália; e 2,2% na Nova Zelândia.

Afirmando que os afogamentos são "causasaposta pixmortes evitáveis eaposta pixgrandes dimensões" no mundo, mas um tema ao qual se dedica pouca atenção, os autores desse estudo sugerem que os países recolham um conjuntoaposta pixdados básicos sobre: idade, sexo, localização, atividade, data, causa primária da morte e envolvimentoaposta pixálcool e drogas.

Também na Austrália, a reduçãoaposta pixafogamentos fatais relacionados ao álcool e outras drogas foi considerada um dos pontos prioritários na Australian Water Safety Strategy, um plano nacional para aprimorar a segurança aquática no país.

O governo australiano também lançou a campanha Don't Let Your Mates Drink and Drown, algo que poderia ser traduzido como "Não deixe seus amigos beberem e se afogarem", direcionada a homens para que estes exerçam uma vigilância mútua.

Tanto na Austrália quanto no Brasil e no mundo, os homens têm mais propensão a se afogar do que as mulheres.

No Brasil, um estudo antigo,aposta pix2000, chegou a verificar o presençaaposta pixálcoolaposta pixcorposaposta pixvítimas fatais por diversas causas na região metropolitanaaposta pixSão Paulo. Foi detectado álcoolaposta pix64% das vítimasaposta pixafogamento; 52%aposta pixhomicídios; 32%aposta pixsuicídios; e 50%aposta pixacidentesaposta pixtrânsito.

Quais são as responsabilidades?

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Legenda da foto, Alguns lugares na África do Sul e Nova Zelândia proíbem consumoaposta pixálcoolaposta pixpraias, para evitar riscos trazidos pelas bebidas — como os afogamentos

Para prevenir afogamentos, a OMS recomenda que os países aprimorem a regulamentação sobre a navegação e a segurança aquática.

Pelo mundo, autoridades adotam desde placasaposta pixbalneários avisando para os riscos trazidos pelas bebidas alcóolicas (como as placas "Alcohol impairs judgement", algo como "O álcool prejudica a capacidadeaposta pixjulgamento") a seu banimentoaposta pixpraias - como é feito por autoridades locais na África do Sul e Nova Zelândia, por exemplo, onde a proibição não é necessariamente justificada apenas pela relação entre álcool e afogamentos, mas pelos riscos representados pelo álcool às pessoas e ao bem estar públicoaposta pixgeral.

A BBC News Brasil pediu ao Ministério da Saúde dados sobre afogamentos e medidas da pasta relativas ao assunto, mas não teve resposta até a publicação desta reportagem.

O Brasil já teve alguns projetos tramitando no Congresso sobre o tema, como um apresentadoaposta pix2017 que tentou firmar novembro como o Mês Nacional da Segurança Aquática eaposta pixPrevenção ao Afogamento - ele foi arquivado - e outro que tenta incluir no ensino básico treinamento para lidar com afogamentos.

De acordo com o advogado Bernardo Camara, mestreaposta pixprocesso civil e professor universitárioaposta pixMinas Gerais, não há uma lei nacional que defina estritamente as obrigaçõesaposta pixentes públicos pela prevenção a afogamentosaposta pixpraias ou rios, por exemplo.

Muitas praias públicas movimentadas têm guarda-vidas trabalhando como uma prestaçãoaposta pixserviçoaposta pixsegurança à população, como ocorre também com policiais, ele explica. A responsabilidade das autoridadesaposta pixum eventual afogamento deve ser avaliada na Justiça.

"Já para um ente particular, como um condomínio, o deveraposta pixfiscalizar é mais evidente. A premissa maior da responsabilidade civil, determinada pelo Código Civil, exige uma comprovaçãoaposta pixcausalidade entre um dano e um ato ilícito, que pode vir da negligência, imperícia ou imprudência."

"Mas a Constituição também prevê que o município ordene questõesaposta pixinteresse local, então pode haver leis municipais que exijam condutas específicas como ter guarda-vidasaposta pixdeterminados lugares."

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