'A circuncisão levou meu filho ao suicídio':codigo betano

Legenda do áudio, Em áudio: 'A circuncisão levou meu filho ao suicídio'

Alex era um jovemcodigo betano23 anos, inteligente e popular, sem históricocodigo betanodoenças mentais. E Lesley não conseguia entender por que ele decidiu tirar a própria vida.

O e-mail explicava que ele tinha feito uma circuncisão - remoção cirúrgica do prepúcio (camadacodigo betanopele que cobre a cabeça do pênis) - dois anos antes. E classificava o procedimento como uma "mutilação genital masculina".

Ele nunca mencionou isso para a família ou os amigos enquanto estava vivo. Lesley não sabia sequer que o filho havia sido circuncidado.

Nos meses seguintes, ela tentou obter mais informações sobre o procedimento na tentativacodigo betanoentender por que isso mexeu tanto com Alex e por que ele achava que se matar eracodigo betanoúnica opção.

Crédito, Lesley Roberts

Legenda da foto, Lesley diz que seus 'sonhos se tornaram realidade' quando ela virou mãecodigo betanojulhocodigo betano1994

Amorcodigo betanocasa

Alex era o mais velho dos três filhoscodigo betanoLesley - e foi muito esperado, sendo concebido após um tratamentocodigo betanofertilidade.

Lesley costuma dizer que seus "sonhos se tornaram realidade" quando virou mãe,codigo betanojulhocodigo betano1994.

Segundo ela, ele se dava muito bem com os irmãos mais novos - Thomas e James. A parede da casa delacodigo betanoCheshire, na Inglaterra, é repletacodigo betanofotos do trio.

Alex era bom aluno e se destacava nas aulascodigo betanoinglês, tanto quecodigo betanoantiga escola criou o prêmio Alex Hardy Creative Writing emcodigo betanomemória.

Crédito, Lesley Roberts

Legenda da foto, Alex era bom aluno na escola e se destacava particularmente nas aulascodigo betanoinglês

Foi durante um passeio da escola para esquiar no Canadá, aos 14 anos, que Alex se encantou pelo país. Ele gostavacodigo betanoesquiar quando era criança, e a viagem reacendeu essa paixão.

Ao completar 18 anos, ele decidiu adiar a entrada na universidade e ir morar no Canadá.

Quando faleceu, Alex estava morando havia cinco anos no país.

Crédito, Lesley Roberts

Legenda da foto, Alex esquiava e praticava snowboarding, mas a atividade física passou a ser uma prática dolorosa após a circuncisão

Início do tormento

Lesley visitou o filho várias vezes, tanto sozinha quanto acompanhada dos irmãos dele e do padrasto. Eles eram uma família unida, mas Alex jamais contou a nenhum deles que estava sofrendocodigo betanosilêncio.

"Eu tinha um problemacodigo betanoestreitamento do prepúcio", escreveu elecodigo betanoseu último e-mail, "mas desde o fim da adolescência, isso gerava problemas na cama, pois significava que meu prepúcio não se retraía por sobre a glande como deveria, o que causou alguns momentos constrangedores."

Em 2015, aindacodigo betanosilêncio, Alex consultou um médico no Canadá, que receitou uma pomada com esteroides para alongar o prepúcio. Mas, algumas semanas depois, ele voltou ao médico porque achava que o tratamento não estava funcionando.

O que Alex tinha era fimose - dificuldade ou impossibilidadecodigo betanoretrair o prepúcio, impedindo a exposição da glande. Essa aderência é perfeitamente normal nos primeiros anoscodigo betanovida. Mas, à medida que os meninos crescem, o prepúcio começa geralmente a se soltar da cabeça do pênis.

Legenda da foto, Lesley diz que Alex era 'empático, gentil, espirituoso e carinhoso'

A fimose nem sempre causa problemas, mas pode provocar dificuldade para urinar e dor durante o ato sexual.

Na Inglaterra, o sistema públicocodigo betanosaúde (NHS, na siglacodigo betanoinglês) recomenda aplicaçãocodigo betanoesteroides tópicos e técnicascodigo betanoalongamento - a circuncisão é o último recurso.

No Canadá, onde o procedimento é mais comum, Alex foi encaminhado a um urologista.

"Ele imediatamente sugeriu a circuncisão", escreveu Alex. "Eu perguntei sobre o alongamento e ele mentiu descaradamente, dizendo que não funcionaria no meu caso."

"Eu estava confiando principalmente no fatocodigo betanoque ele era o especialista e que sabia mais sobre o assunto, então, mesmo com o pé atrás, aceitei."

Investigação sobre o procedimento

Lesley encontrou algumas avaliações na internet sobre o urologistacodigo betanoAlex, que a fizeram questionarcodigo betanocompetência. Uma paciente contou que tinha sido incapazcodigo betanotrabalhar desde que foi operada por elecodigo betanodecorrênciacodigo betanoproblemas renais, e que ele "destruiu"codigo betanoqualidadecodigo betanovida.

"Sou mãecodigo betanotrês crianças pequenas que estão todos os dias com medo, achando que eu vou morrer, porque me veem sentindo muita dor", escreveu a paciente.

"Dá para ver que ele diagnosticou mal as pessoas, fez cirurgias malsucedidas e arruinou algumas vidas", afirmava outro comentário. "Ele é perigosamente incompetente."

Outro alertava: "Deixaram um instrumento cirúrgico na minha bexiga, mas só fui notificado três meses depois. Fuja antes que você se machuque!"

Crédito, Lesley Roberts

Legenda da foto, Lesley diz que sente falta dos 'olhos brilhantescodigo betanoAlex, do seu sorriso, sensocodigo betanohumor e abraçoscodigo betanourso'

Lesley ficou "horrorizada" com as críticas e solicitou a aberturacodigo betanouma investigação contra o urologista. Mas foi informada que já havia uma investigaçãocodigo betanoandamento.

O Conselhocodigo betanoMédicos e Cirurgiõescodigo betanoBritish Columbia afirmou à BBC que "não pode revelar a existênciacodigo betanouma reclamação contra um médico, e só poderá fazer isso se a queixa resultarcodigo betanouma punição formal".

Infelizmente, Alex não foi capazcodigo betanopesquisar sobre o urologista - ou a circuncisão -codigo betanoforma adequada na época porque seu laptop estava quebrado.

Ele tentou pesquisar sobre o assuntocodigo betanoum computador público, mas se sentiu desconfortável, e também achou que era um assunto "muito tabu" para discutir com os amigos.

Alex agendou, então, o que ele acreditava ser um procedimento simples e fez a cirurgiacodigo betano2015, aos 21 anos.

Crédito, Lesley Roberts

Legenda da foto, Alex adorava o irmão mais novo

"Ficou claro que o que acabaracodigo betanoacontecer tinha sido uma catástrofe", escreveu Alex para a mãe.

Ele anexou ao e-mail uma declaração públicacodigo betanoque explicou,codigo betanoriquezacodigo betanodetalhes, os problemas físicos que teve após ser circuncidado.

Na mensagem, descreveu sentir uma estimulação constante da cabeça do pênis, que não estava mais protegida pelo prepúcio.

"Essas sensações sempre presentes estimuladas pela fricçãocodigo betanoroupas são uma tortura por si só; elas não diminuíram/normalizaram após anoscodigo betanoexposição (da glande)", escreveu.

"Imagine o que aconteceria com o globo ocular se a pálpebra fosse amputada?"

"Ele sentia muita dor porque as atividades físicas normais machucavam", diz Lesley. "Ele era um grande esquiador e snowboarder, então você pode imaginar a dor que ele estava sentindo."

Queimação e coceira

O cirurgião Trevor Dorkin, que é membro da Associação Britânicacodigo betanoCirurgiões Especializadoscodigo betanoUrologia, explica que a cabeça do pênis costuma ficar mais sensível após a circuncisão - mas,codigo betanogeral, essa sensibilidade tende a diminuir com o passar do tempo.

"Eu sempre digo para os rapazes que 'vai ficar mais sensível no começo', porquecodigo betanorepente você não tem mais essa proteção sobre a cabeça do pênis e a sensação vai ser diferente", diz Dorkin, que já realizou maiscodigo betanomil circuncisões.

"Mas, na grande maioria dos casos, o paciente se ajusta a isso, o cérebro se ajusta a isso."

Alex também contou ter tido disfunção erétil e sensaçõescodigo betanoqueimação e coceira, particularmente na cicatriz do freio (pregacodigo betanotecido que liga o prepúcio à parte inferior do pênis), que foi removido.

"É uma das zonas mais erógenas, por isso é considerada importante para a função sexual", explica Dorkin.

"O prepúcio, a cabeça do pênis e o freio são áreas muito sensíveis."

"Quando você faz a circuncisão, muitas vezes, o freio não é preservado, mas isso não tem necessariamente um efeito sobre o desempenho e o prazer sexual", diz o cirurgião.

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Um movimento que ganha cada vez mais adeptos considera a circuncisão como mutilação genital masculina

Mas Alex sentia que seu freio era importante.

"Diante da ausência (do freio), posso atestar claramente que é a área mais erógena sensível do pênis e do corpo masculinocodigo betanogeral", escreveu.

"Se alguém amputar o seu clitóris, pode ser que você consiga entender como me sinto."

Ele contou ainda que sentia câimbras e contrações musculares, alémcodigo betanosensações "desconfortáveis" que se estendiam até seu abdômen.

Lesley não sabe dizer se Alex chegou a fazer sexo após a circuncisão.

"Onde havia um órgão sexual, agora eu tenho um órgão adormecido e fracassado", escreveu. "Minha sexualidade foi deixadacodigo betanofrangalhos."

"A natureza é mais sábia - como cortar partecodigo betanoum tecido saudável pode melhorar o design que a natureza desenvolveu?", questionou.

Legenda da foto, Lesley não sabia que seu filho havia sido circuncidado até ele morrer

Pouca informação

Como grande parte das pessoas, Lesley, que foi professora, admite que sabia muito pouco a respeito da circuncisão antes da morte do filho.

"Eu não sabia nada, só achava que se tratavacodigo betanouma cirurgiacodigo betanorotina", diz ela.

O prepúcio às vezes é menosprezado, sendo classificado como um "excesso inútilcodigo betanopele", mas Dorkin explica que ele tem uma função.

"Ele oferece um poucocodigo betanoproteção para a cabeça do pênis. Acredita-se que talvez tenha algum tipocodigo betanofunção imunológica."

As taxascodigo betanocircuncisão variam muito dependendo do país - e da cultura.

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), 95% dos homens são circuncidados na Nigéria, mas apenas 8,5% se submeteram ao procedimento no Reino Unido.

A maioria dos homens circuncidados no Reino Unido écodigo betanoorigem muçulmana ou judia, já que a circuncisão é considerada uma parte importante destas religiões.

Por isso, as pessoas que questionam a circuncisão às vezes são acusadascodigo betanoserem antissemitas ou islamofóbicas, mas Lesley enfatiza que seu filho não era nenhum dos dois.

No Canadá, para onde Alex havia se mudado, estima-se que 32% dos homens sejam circuncidados.

Alex acreditava que a circuncisão masculina foi normalizada a pontocodigo betanoa maioria das pessoas não questionar a prática, enquanto a mutilação genital feminina agora é considerada ilegalcodigo betanomuitos países.

Legenda da foto, Alex era o mais velho dos três filhoscodigo betanoLesley

Ele também achava que a circuncisão masculina deveria ser chamadacodigo betano"mutilação genital" - visão compartilhada por um movimento anticircuncisão cada vez maior.

"Se eu fosse uma mulher (nas nações ocidentais) isso seria ilegal, o cirurgião seria um criminoso e isso nunca teria sido considerado uma opção pelos médicos", escreveu Alex.

Os defensores da "autonomia genital" acreditam que é errado circuncidar um bebê ou uma criança - seja do sexo masculino ou feminino - porque o paciente não é capazcodigo betanodar consentimento.

Esses ativistas veem a circuncisão como uma questãocodigo betanodireitos humanos.

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Ativistas a favor da 'autonomia genital' são contra circuncidar bebês

Após ter vivido 21 anos sem ser circuncidado, Alex acreditava que os homens circuncidados na infância "tragicamente nunca seriam capazescodigo betanocompreender totalmente o que perderam".

Ele estimava ter sido privadocodigo betano75% da sensibilidade do pênis.

No entanto, as experiênciascodigo betanopacientes circuncidados na vida adulta diferem dramaticamente.

Alguns acham o sexo melhor, uma vez que não sentem mais a dor do prepúcio apertado ou inflamado.

Já outros relatam uma perda significativacodigo betanosensibilidade e redução do prazer sexual.

Há também quem diga que, apesar da sensibilidade menor, o prazer sexual continua o mesmo.

Ou seja, enquanto algumas pessoas ficam felizes com a circuncisão, outras, como Alex, se arrependem profundamente.

Crédito, Lesley Roberts

Legenda da foto, Alex foi observar baleias com a mãe no seu aniversáriocodigo betano21 anos

Sofrendocodigo betanosilêncio

Alex procurou ajuda médica após o procedimento, assim como assistência psicológica, mas nunca compartilhou seus problemas com a família ou amigos.

"Eu estive com ele durante esses dois anos e estaria mentindo se dissesse que não achei que havia algo errado", desabafa Lesley.

"Eu perguntava: 'Tem alguma coisa te incomodando? Você está bem?' E ele sempre me tranquilizava dizendo que estava."

Lesley, que foi professora, agora quer ir às escolas para conversar com rapazes sobre a importânciacodigo betanocompartilhar seus problemas, mesmo que sejam muito pessoais.

"Todo mundo sabe que os homens não costumam falar sobre os problemas da mesma forma que as mulheres, mas acho que a circuncisão é um tema muito tabu", diz ela.

"Alex era reservado. Ele certamente não teria dito 'tenho um prepúcio apertado e dói muito'. Ele não disse. E eu não sabia."

Legenda da foto, O cirurgião Trevor Dorkin alerta seus pacientes sobre os riscos da circuncisão antes do procedimento

O cirurgião Trevor Dorkin esclarece que a ocorrênciacodigo betanoproblemas sérios após a circuncisão é rara, mas não impossível.

"Você ouve históriascodigo betanohorrorcodigo betanoque a circuncisão foi mal feita e há danos causados ​​à própria cabeça do pênis", afirma.

"Os cirurgiões, no fim das contas, são humanos e há potencial para erro humano e técnico durante qualquer cirurgia."

Há registros, inclusive,codigo betanomortescodigo betanoadultos e crianças após o procedimento.

Crédito, Lesley Roberts

Legenda da foto, Na infância, Alex era 'lindo, tranquilo e adorado pelo irmão mais novo Thomas'

"Não sou qualificada para dizer que a circuncisão é sempre ruim, porque não é", diz Lesley.

"Foi certamente no caso do meu filho, e acho que precisamoscodigo betanomais pesquisas. É preciso analisar os riscos, o que realmente pode dar errado, precisamos estar mais conscientes deles."

Se a circuncisão for necessária, Dorkin adverte que é importante informar os pacientes sobre possíveis complicações.

"Especialmente quando você vai operar alguém que está no fim da adolescência ou início da idade adulta, é uma área muito sensível e importante para a função sexual, então você temcodigo betanoexplicar os riscos para eles."

Crédito, Lesley Roberts

Legenda da foto, Alex pediu à mãe para compartilharcodigo betanohistória depois que ele morreu

"Alex disse que não estava cientecodigo betanotodos os riscos", afirma Lesley. "Se ele estivesse, tenho certezacodigo betanoque não teria feito a cirurgia."

A organização britânica 15 Square, que tenta educar as pessoas sobre a circuncisão, destaca que Alex não é o primeiro homem a cometer suicídio após ser circuncidado.

"Isso acontece com mais frequência do que as pessoas pensam", diz David Smith, presidente da instituição.

Não há, no entanto, estatísticas disponíveis sobre pacientes que se mataram após o procedimento.

Alex, por exemplo, morreu há maiscodigo betanoum ano, mascodigo betanohistória não havia sido contada até agora.

Lesley, que costuma ser reservada como o filho, só concordoucodigo betanocompartilhar o casocodigo betanoAlex porque este foi o último desejo dele antescodigo betanomorrer.

"Se as informações a seguir puderem beneficiar alguém, isso serviu para um propósito", escreveu ele.

"Não me senti à vontade para levantar a questão quando tive oportunidade, então, se a minha história puder aumentar a conscientização e quebrar esse tabu dentro da sociedadecodigo betanorelação à saúde dos homens, fico felizcodigo betanodivulgar minhas palavras."

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