Leandro Karnal: 'Ninguém pode ser maduro e equilibrado se não administraráo real bwinsolidão':áo real bwin

Crédito, R. Trumpauskas

Legenda da foto, Historiador e professor da Unicamp, Karnal acabaáo real bwinlançar livro sobre a solidão

Em entrevista à BBC News Brasil, o doutoráo real bwinHistória Cultural pela USP comenta sobre a necessidadeáo real bwinpolíticas públicas voltadas para o tema, os laços constituídos pelo ódio e o paradoxo da época que mais vive a solidão, mesmo tendo horror dela.

Leia abaixo:

áo real bwin BBC News Brasil - Os brasileiros com maisáo real bwin60 anos passamáo real bwin30 milhões,áo real bwinacordo com o IBGE, e a tendência é que,áo real bwin2031, o númeroáo real bwinidosos supere oáo real bwincrianças e adolescentes. Nesse cenário, a solidão passa a ser um problema relevante nacionalmente?

áo real bwin Leandro Karnal - O envelhecimento da população é um fato demográfico insuperável. Sabemos que existe uma possibilidadeáo real bwinaumento da solidão na terceira idade por motivos variados, inclusive pela dificuldadeáo real bwinestabelecer novos laços significativos e até por questões neuroquímicas. Porém, não é um destino: a sociabilidade pode ser explorada, e jovens também podem sentir solidão aguda.

Aprender a envelhecer com interesses novos é um exercício desafiador.

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Legenda da foto, Karnal defende mais iniciativas para combater a solidão, mas não a criaçãoáo real bwinmais uma estrutura burocrática para tratar do tema

Cursos gratuitos, novos desafios, retomar projetos da juventude e procurar pessoas com interesses próximos são soluções baratas e possíveis. No primeiro mundo há muitos idosos viajandoáo real bwincruzeiros e outras atividades mais caras. Aqui, devemos ser mais criativos.

áo real bwin BBC News Brasil - Quais políticas públicas precisam ser pensadas a partir desse cenário? Será necessária a criaçãoáo real bwinum Ministério da Solidão, a exemplo do que foi feito ela premiê Theresa May no Reino Unido?

áo real bwin Karnal - Um ministério a mais significa mais funcionários e nenhuma solução concreta para o problema. Precisamosáo real bwinpolíticasáo real bwinEstado para o temaáo real bwinsolidão e envelhecimento; não precisamosáo real bwinmais mecanismos burocráticos.

Sistemas privados, mistos e públicos já fazem muitas coisas, como iniciativas do Serviço Social do Comércio (Sesc), do Serviço Social da Indústria (Sesi) etc. As universidade públicas já oferecem cursos e devem ampliar a oferta.

Políticasáo real bwinEstado, e não mais um prédio na Esplanada dos Ministérios.

áo real bwin BBC News Brasil - Como os países latinos tratam a solidão?

áo real bwin Karnal - Somos mais publicamente gregários do que povos do norte da Europa, por exemplo. Há menos gente no mundo latino saindo para viajar ou comer sem formaçãoáo real bwingrupo. Brasileiros médios usam menos a leitura como lazer do que franceses e ingleses médios.

A leitura é um caminho poderoso para embalar uma solidão saudável.

Os museusáo real bwinLondres são quase todos gratuitos, mas no Brasil são poucos assim. O espaço da rua da América Latina é mais agressivo e arriscado do que uma cidade britânica; logo, é mais difícil ser um idoso nas calçadas do Rioáo real bwinJaneiro ou São Paulo.

Por outro lado, as famílias latinas buscam mais contato, as amizades fora da família são um pouco menos submetidas a regras e nossa sociabilidade é muito rápida, ainda que acusadaáo real bwinser muito superficial.

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Legenda da foto, 'O século 21 é o momento com maior horror à solidão e, paradoxalmente, o mais solitário da história', diz Karnal

áo real bwin BBC News Brasil - Como a solidão foi vista ao longo da história? Há rejeição ao tema atualmente?

áo real bwin Karnal - A solidão é um fenômeno histórico.

Na verdade, o que muda é como cada momento se relaciona com ela. Já foi vista, no cristianismo primitivo e no medieval, como uma chanceáo real bwinsalvação longe do mundo que era o mal.

Já foi defendida como parte da elaboraçãoáo real bwinfilósofos ouáo real bwinbudistas, por exemplo. A partir do século 19, com a ascensão da família e outros valores, a solidão passa a ser vista como fonteáo real bwinisolamento, demência e desequilíbrio.

O século 21 é o momento com maior horror à solidão e, paradoxalmente, o mais solitário da história.

áo real bwin BBC News Brasil - As redes sociais intensificam a solidão?

áo real bwin Karnal - Ela criam um opiáceo, um analgésico importante, pois oferecem alguma ideiaáo real bwincompanhia sem dar,áo real bwinfato, o gosto orgânicoáo real bwinuma amizade ouáo real bwinum afeto sólido. Assim, elas atenuam uma luta genuína contra a solidão e permitem que o solitário vivaáo real bwinum mundo paralelo e falso.

áo real bwin BBC News Brasil - A solidão se torna pior nas grandes cidades?

áo real bwin Karnal - Sempre. Multiplicam-se o número e o afastamento entre as pessoas.

As grandes cidades eliminam laçosáo real bwinpertencimento e são os panoramas mais solitários do que aldeias. As pessoas se importam menos com os outros nas grandes cidades.

áo real bwin BBC News Brasil - A briga política travada nas últimas eleições nos tornou ainda mais solitários?

áo real bwin Karnal - Ela fez alguns encontrarem seus nichos onde supuseram encontrar amigos e correligionários. Na verdade, a maioria apenas encontrou seu espelho. A briga política era infantil, burra, adjetivada, não raciocinava e nem ouvia. Difícil imaginar que alguém tenha saído melhor ou mais feliz.

(Quem brigou) achou uma válvulaáo real bwinescape para seu sentimentoáo real bwininsegurança e paraáo real bwinvida sexual deficitária. Brigar mostrou nosso medo e não fez ninguém menos ou mais social.

áo real bwin BBC News Brasil - Processosáo real bwinfomento à intolerância podem impulsionar a solidão?

áo real bwin Karnal - Ou o contrário: gruposáo real bwinódio comuns podem dar a sensaçãoáo real bwincompanhia eáo real bwindissoluçãoáo real bwinum todo maior.

Será que odiamos muito e temos grupos que pensam como nós por medoáo real bwinficarmos sem ninguém?

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Legenda da foto, Redes sociais dão 'ideiaáo real bwincompanhia' sem representar convívio real, diz o historiador

áo real bwin BBC News Brasil - Qual a importância da vivência das diferenças e do confrontamentoáo real bwinideias para lidar com a solidão?

áo real bwin Karnal - Se você consegue escutar a outra pessoa sem se perder na conversa ou se desequilibrar, você manifesta uma capacidade para estabelecer limites e consciência dos seus valores.

Debate é bom, confronto com olhos vermelhos e boca espumando é desvioáo real bwinfunção apenas. Nunca estamos debatendo aquilo que parecemos estar debatendo. Estamos gritando por política, porém, na verdade, a raiz é bem mais funda.

Pode ser que a raiva e a paixão no enfrentamento, além do óbvio conteúdoáo real bwindenegação erótica, seja também o gemido profundoáo real bwingente que se desespera pela insegurança e pela solidão.

áo real bwin BBC News Brasil - Quais relações podemos pensar entre o tema, a depressão e o suicídio?

áo real bwin Karnal - Solidão é uma percepçãoáo real bwinsi no mundo. Depressão é doença. São coisas distintas, como é diferente estar triste ou deprimido.

Depressão precisaáo real bwinum profissional e é grave. Tristeza precisaáo real bwinreflexão, amigos e novos camposáo real bwininteresse. O suicídio é o risco maior da doença chamada depressão grave.

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Legenda da foto, Sociedade deveria se preocuparáo real bwincriar atividades para as pessoas idosas, diz Karnal

áo real bwin BBC News Brasil - Que tiposáo real bwinaprendizado podemos extrair da experiênciaáo real bwinsolidão?

áo real bwin Karnal - Todos. Quem somos, quais nossas percepções longe dos holofotes, quais nossos medos e os espelhos da nossa vida interior.

Estar sozinhoáo real bwinalguns momentos é fundamental. Ninguém pode ficar maduro e equilibrado se não administraráo real bwinsolidão, ou seja, se não administrar a capacidadeáo real bwinsaber quem é.

áo real bwin BBC News Brasil - Em que medida as narrativas e os espaçosáo real bwincompartilhamento podem auxiliar uma pessoa a lidar com a solidão?

áo real bwin Karnal - Primeiro, o outro mostra que há mais solidões no mundo e a minha não é tão extraordinária. Discutindo e convivendo eu percebo diferenças importantes, surgem perspectivas.

Negociando meu narciso na convivência social eu paroáo real bwinme achar o centro do mundo e percebo que parte da minha tristeza solitária é vaidade ou narciso ferido.

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