7atlético goianiense e coritiba palpitesetembro: Bolsonaro reproduz mito do homem branco militar que constrói a nação, diz historiadora:atlético goianiense e coritiba palpite

Crédito, Ricardo Borges/Divulgação

Legenda da foto, A historiadora Ynaê Lopes dos Santos

Em trechoatlético goianiense e coritiba palpiteseu recente livro Racismo Brasileiro: Uma História da Formação do País (Todavia, 2022), Santos propõe para o racismo uma metáfora diferente da "doença que precisa ser expurgada".

"Seria muito mais fácil se essa metáfora condissesse com a realidade: bastaria buscar uma cura para o racismo e pronto. Mas não há pílula mágica, porque não estamos tratandoatlético goianiense e coritiba palpiteuma doença. Uma alegoria mais eficiente para compreender a real dimensão do racismo seria compará-lo ao sistema nervoso central do corpo humano. Não bastam remédios. É preciso reprogramar todo o nosso cérebro."

Ela também é autoraatlético goianiense e coritiba palpiteHistória da África e do Brasil Afrodescendente (Pallas, 2017) e Além da Senzala: Arranjos Escravosatlético goianiense e coritiba palpiteMoradia no Rioatlético goianiense e coritiba palpiteJaneiro (Hucitec, 2010).

Veja abaixo os principais trechos da entrevista:

atlético goianiense e coritiba palpite BBC News Brasil - O 7atlético goianiense e coritiba palpitesetembro aparece no imaginário brasileiro muito pelo que retrata o quadro atlético goianiense e coritiba palpite Independência ou Morte atlético goianiense e coritiba palpite atlético goianiense e coritiba palpitePedro Américo, feito 66 anos depois da proclamação e que mitifica os eventos daquele dia. Quais outros elementos do processoatlético goianiense e coritiba palpiteindependência não tiveram espaço no imaginário brasileiro?

atlético goianiense e coritiba palpite Ynaê Lopes do Santos - Acho importante a gente pontuar com duas dimensões essa história. A primeira dimensão, que nunca é contada, diz respeito às figuras que fizeram parte da construção desse mito: D. Pedro I e as elites que estavam com ele e a aposta que fizeram numa nação que nasceu alicerçada na escravidão.

É muito importante colocar a opção política que foi feitaatlético goianiense e coritiba palpitegrande medida como herançaatlético goianiense e coritiba palpiteum passado colonial, mas também como projetoatlético goianiense e coritiba palpitefuturo, tendoatlético goianiense e coritiba palpitevista que a escravidão já era uma instituição abertamente combatida pelaatlético goianiense e coritiba palpiteimoralidade. Essa imagem do Pedro Américo que,atlético goianiense e coritiba palpitecerta maneira, materializa esse mitoatlético goianiense e coritiba palpiteformação no Brasil retira essa escolha política feita por esses representantes da nação.

Isso foi uma escolha. Podia ter sido feito diferente. O patrono da independência do Brasil, José Bonifácio, propõe o fim gradual da escravidão, uma reforma agrária e a incorporação da mãoatlético goianiense e coritiba palpiteobra indígena. Nada disso é levadoatlético goianiense e coritiba palpiteconsideração. Porque você tem um projetoatlético goianiense e coritiba palpitepaís organizado por homens que se identificam com o proprietárioatlético goianiense e coritiba palpiteescravos.

Uma outra dimensão são as experiências dos sujeitos que não faziam parte das oligarquias brasileiras, mas que participaram ativamente desse processoatlético goianiense e coritiba palpiteindependênciaatlético goianiense e coritiba palpiteformação nacional. Os africanos escravizados, homens e mulheres negros, a participação indígenaatlético goianiense e coritiba palpitediferentes momentos desse processoatlético goianiense e coritiba palpiteindependência.

Esse é um outro problema do quadro: ele fecha a ideia da independência do Brasil nesse 7atlético goianiense e coritiba palpiteSetembro, quando, na verdade, é impossível compreender o processoatlético goianiense e coritiba palpiteindependência sem tomá-lo como um processo.

Crédito, Domínio público

Legenda da foto, Quadro 'Independência ou Morte' (1888),atlético goianiense e coritiba palpitePedro Américo

atlético goianiense e coritiba palpite BBC News Brasil - E como a escravidão se insere no novo país que se estrutura após a independência?

atlético goianiense e coritiba palpite Santos - Quando as oligarquias e D. Pedro I escrevem a nossa Constituiçãoatlético goianiense e coritiba palpite1824, que é um dos primeiros produtos desse processoatlético goianiense e coritiba palpiteindependência do Brasil, e organizam esse estado nascente é definido justamente quem pode votar e por que pode votar. E esse exercício tem um recorte censitário, ele éatlético goianiense e coritiba palpitegrande medida definido por quem é ou não proprietárioatlético goianiense e coritiba palpiteescravos.

A palavra escravidão não apareceatlético goianiense e coritiba palpitenenhum momento na Constituição. Como a gente pode entender que a escravidão está sendo organizada dentro da Carta Constitucional? Quando a gente lê o artigo 179, que garante para o cidadão brasileiro o direito à propriedade privada. E a escravidão é propriedade privada.

As oligarquias sabem que a escravidão é formaatlético goianiense e coritiba palpitepropriedade mais disseminada no Brasil. O fatoatlético goianiense e coritiba palpitea gente ter um tráfico muito volumoso para o Brasil facilitava isso. Havia pessoas pobres que compravam escravos a prazo. Elas davam uma entrada e depois pagavam as outras parcelas com o dinheiro vindo do trabalho realizado pelo escravo ou escrava.

A escravidão é isso. É uma instituição que alicerça o Brasil. Alicerça a mãoatlético goianiense e coritiba palpiteobra principal, a mãoatlético goianiense e coritiba palpiteobra para a economiaatlético goianiense e coritiba palpiteexportação, alicerça o sentimento que organiza o exercício da cidadania e também define os estratos sociais do país.

Crédito, Hulton Archive

Legenda da foto, Traficantes brasileirosatlético goianiense e coritiba palpiteescravosatlético goianiense e coritiba palpite1800

atlético goianiense e coritiba palpite BBC News Brasil - É subestimada a dimensão da escravidão como o elementoatlético goianiense e coritiba palpitegrande força da economia brasileira no século 19?

atlético goianiense e coritiba palpite Santos - Quando a gente olha para esse período do Brasil próximo à proclamação da independência, as décadasatlético goianiense e coritiba palpite1810, 1820 e 1830, o país não tem nenhum grande produto, nenhuma grande commodityatlético goianiense e coritiba palpiteexportação.

O nosso açúcar não compete com o açúcar do Caribe. O café tinha pouquíssimas experiências, não muito bem sucedidas. O algodão tem um pequeno momento, mas nada muito significativo. O que sustenta sobretudo o Sudeste brasileiro nesse período é o tráfico transatlântico: comprar e vender gente negra da África.

Muitosatlético goianiense e coritiba palpitenós aprendemos da história do Brasil a partir da perspectiva econômicaatlético goianiense e coritiba palpiteciclos: o ciclo do açúcar, do ouro, do café... Se a gente fizesse um exame com mais cuidado, veria que sem o tráfico transatlântico não haveria nenhum desses ciclos, ao menos na forma como foram experimentados. Isso não é contado.

atlético goianiense e coritiba palpite BBC News Brasil - Quais figuras que participaram dos diversos processosatlético goianiense e coritiba palpiteindependência que poderiam ser mais bem conhecidas?

atlético goianiense e coritiba palpite Santos - Nesse período da independência tem uma figura fantástica, que é o Emiliano Mundrucu, um militar que compunha uma das milíciasatlético goianiense e coritiba palpitehomens negros e pardosatlético goianiense e coritiba palpitePernambuco, que luta pela independência [na Confederação do Equador,atlético goianiense e coritiba palpite1824]. É partidário da república e um homem negro. Na ocasião da independência propriamente dita, ele é obrigado a fugir do Brasil e vai para o Haiti. De lá vai para os Estados Unidos, se casa com uma mulher negra e é um dos primeiros homens a mover uma ação pública contra a segregação racialatlético goianiense e coritiba palpitetransportes públicos. Um brasileiro. Como conhecemos tão pouco sobre isso?

Crédito, Reuters

Legenda da foto, Jair Bolsonaro com criançasatlético goianiense e coritiba palpitecarro durante manifestaçãoatlético goianiense e coritiba palpiteBrasília no 7atlético goianiense e coritiba palpitesetembroatlético goianiense e coritiba palpite2021

atlético goianiense e coritiba palpite BBC News Brasil - O presidente Jair Bolsonaro está dando grande ênfase aos eventos deste 7atlético goianiense e coritiba palpitesetembroatlético goianiense e coritiba palpite2022 dentroatlético goianiense e coritiba palpitesua campanhaatlético goianiense e coritiba palpitereeleição. O que ele tenta evocar da história da independência e associar comatlético goianiense e coritiba palpitefigura?

atlético goianiense e coritiba palpite Santos - Bolsonaro é a reprodução das elites brasileiras que criaram o mito do 7atlético goianiense e coritiba palpitesetembro e que compactuaram com a manutenção da escravidão naquele momento e depois compactuaram com a manutençãoatlético goianiense e coritiba palpiteum racismo sistêmico no Brasil. Ele já deixou bem evidente que vai apostar numa perspectiva ufanista a partir do quadroatlético goianiense e coritiba palpitePedro Américo.

Ele aposta na manutenção dessa perspectiva bem conservadora da história do Brasil, desse mitoatlético goianiense e coritiba palpiteum país que nasce a partiratlético goianiense e coritiba palpiteum militar que desembainhaatlético goianiense e coritiba palpiteespada à beiraatlético goianiense e coritiba palpiteum rio. Do homem branco, militar, que constrói uma nação.

atlético goianiense e coritiba palpite BBC News Brasil - Você vê paralelos entre a figuraatlético goianiense e coritiba palpiteD. Pedro I eatlético goianiense e coritiba palpiteBolsonaro?

atlético goianiense e coritiba palpite Santos - Não muito. Acho que existe essa identificação com o homem branco militar meio toscão, mas D. Pedro era mais sofisticado. Talvez com o poder moderador [instrumento com que o imperador podia interviratlético goianiense e coritiba palpitecasoatlético goianiense e coritiba palpiteconflito entre poderes e que se sobrepunha aos demais] que D. Pedro se outorgou.

atlético goianiense e coritiba palpite BBC News Brasil - Durante a corrida presidencial, atlético goianiense e coritiba palpite Ciro Gomes foi criticado por falar "imagine explicar isso na favela" ao elogiar uma plateiaatlético goianiense e coritiba palpiteempresários no Rio. Lula,atlético goianiense e coritiba palpiteentrevista ao podcastatlético goianiense e coritiba palpiteMano Brown, disse que "há uma evolução política dos negros" com a consciênciaatlético goianiense e coritiba palpiteque "não bastam ficar achando que é vítima". Há relação dessas frases com a história do racismo no Brasil?

atlético goianiense e coritiba palpite Santos - São homens brancos falando. O Ciro Gomes é um senhoratlético goianiense e coritiba palpiteengenho, talvez até competente, bem preparado, mas a perspectiva éatlético goianiense e coritiba palpiteum senhoratlético goianiense e coritiba palpiteengenho que, quando muito, reconhece a sabedoria popular, mas nunca a colocaatlético goianiense e coritiba palpitepéatlético goianiense e coritiba palpiteigualdade. Ele não tem um olhar horizontal para a população brasileira e a acho que ele não tem nenhum problemaatlético goianiense e coritiba palpitedizer isso.

O Lula é um homem branco que ainda precisa... talvez um dos mais sensíveis a essa questão racial, mas ainda falta uma percepção. Tanto é que foi no governo dele que grandes conquistas foram feitas porque ele abriu o diálogoatlético goianiense e coritiba palpiteuma maneira mais direta com o movimento negro, mas falta uma consciência mais adensada.

atlético goianiense e coritiba palpite BBC News Brasil - Qual é o significado da efemérideatlético goianiense e coritiba palpite200 anosatlético goianiense e coritiba palpiteindependência brasileira pelaatlético goianiense e coritiba palpiteperspectiva?

atlético goianiense e coritiba palpite Santos - É uma espécieatlético goianiense e coritiba palpiteconvite para revisitar a história do Brasil. Eu sou contrária à perspectivaatlético goianiense e coritiba palpiteque a nossa independência foi menor ou que foi uma não-independência ou uma independência entre aspas. Quando a gente faz isso, esvazia as escolhas políticas que foram feitas e a gente naturaliza as coisas como "ah, escravidão existiu porque sempre teve". Não, teve porque quiseram que tivesse. Naquele momento já existiam críticas sobre a escravidão bem contundentes.

Eu vejo essa efeméride como um momento para a gente olharatlético goianiense e coritiba palpitemaneira crítica para a forma como a história brasileira vem sendo contada, para as escolhasatlético goianiense e coritiba palpiteprotagonistas e para a criação do repertório. O Brasil é fruto das escolhas feitas por suas elites. A gente naturaliza essas escolhas como se houvesse só um caminho. A história é um campoatlético goianiense e coritiba palpitedisputa. Sempre. A gente está vendo isso hoje.

Essa disputa que a gente experimenta hoje foram experimentadas no passado. Acontece que tem quem ganhe e tem quem perde. A gente tem que aprender também com quem perdeu a disputa pelo projeto político, porque outros Brasis estavam sendo pensados. Eu quero saber que Brasis eram esses.

- Este texto foi publicadoatlético goianiense e coritiba palpitehttp://vesser.net/brasil-62815411

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