'410 mil vidas me separam do presidente': as críticasMandetta a Bolsonaro na CPI da Covid:
Na quarta-feira (05/05), falará à CPI seu sucessor no comando do ministério, Nelson Teich. Ele substituirá o depoimento do ex-ministro Eduardo Pazuello, que foi transferido para o dia 19maio, após o general afirmar que não poderia comparecer por ter tido contato recente com duas pessoas diagnosticadas com covid-19.
Confira a seguir as principais falasMandetta no depoimento desta terça-feira (04/05).
'Negações, negações, negações'
Mandetta, que deixou o governo no início da pandemia justamente pelas divergências com o presidente nas estratégiasenfrentamento da crise sanitária, disse que orientou Bolsonaro com base na ciência, mas foi ignorado.
O ex-ministro criticou o fatoele ter mantido essa postura mesmo com o passar do tempo e sinalizou a responsabilidade do presidente pelas mortes já registradas no Brasil devido ao coronavírus.
"Como cidadão, eu posso sim criticar. Mesmo após eu ter saído, (o presidente continuou a) negar o usomáscara, negar o usohigiene das mãos, negar a compravacina, negar a questão da (importância da) testagem, uma sérienegações, negações, negações. Hoje, 410 mil vidas me separam do presidente", disse.
"Todas as recomendações, as fiz. Em público, nos boletins, nos conselhosministros, diretamente ao presidente, a todos os secretáriosSaúde", afirmou,outro momento do depoimento.
Ainda segundo Mandetta, o Brasil poderia ter se saído "muito melhor" se seguisse a ciência.
"Cabe a mim relatar quais eram as orientações dos órgãos científicos, técnicos. Nós sabíamos das dificuldades que teríamos. Nunca fomos iludidosachar que isso aqui seria uma solução igual da Nova Zelândia. Mas posso lhe dizer: o Brasil podia ter feito muito melhor", respondeu a um dos senadores.
'Nunca houve lockdown'
Mandetta disse também que era fundamental no início da pandemia ter estimulado medidasisolamento social, para conter o contágio do coronavírus. No entanto, lembrou o ex-ministro, Bolsonaro optou por defender o "isolamento vertical",que apenas idosos e pessoas com comorbidades (doenças prévias) ficariam isoladas, embora essa estratégia não tivesse respaldo científico.
Diante da resistência do presidente, Mandetta ressaltou que o Brasil não chegou a adotar medidas extremasproibiçãocirculaçãopessoas, os chamados lockdowns. Segundo ele, algumas ações foram adotadas tardiamente, após o sistemasaúde colapsar e faltar leitos e oxigênio.
"O Brasil não fez nenhum lockdown. O Brasil fez medidas (de restriçãocirculação) depois do leite derramado. A gente foi sempre um passo atrás desse vírusrelação a essa questãolockdown", disse.
'Assessoramento paralelo' sobre cloroquina
O ex-ministro disse que Bolsonaro tinha um "assessoramento paralelo",fora do governo, que defendia o uso da cloroquina, um remédio sem eficácia comprovada contra covid-19.
Segundo Mandetta, certa vez ele foi chamado para uma reunião no Palácio do Planalto,que foi discutido um possível decreto presidencial para alterar a bula do medicamento. No encontro, contou, estava presente o então ministro da SecretariaGoverno, Luiz Ramos, hoje chefe da Casa Civil.
Mandetta, porém, não explicouquem sugeriu a proposta e disse que a ideia logo foi rechaçada pelo presidente da Agência NacionalVigilância Sanitária (Anvisa), Antônio Barra Torres Foto, e pelo próprio Ramos.
"Eu estive dentro do Palácio do Planalto quando fui informado, após uma reunião, que era para eu subir para o terceiro andar porque tinha lá uma reunião com vários ministros e médicos que iam propor esse negóciocloroquina, que eu nunca tinha conhecido. Quer dizer, ele tinha esse assessoramento paralelo", contou à CPI.
"Nesse dia, havia sobre a mesa, por exemplo, um papel não timbradoum decreto presidencial para que fosse sugerido daquela reunião que se mudasse a bula da cloroquina na Anvisa, colocando na bula a indicação da cloroquina para coronavírus. E foi inclusive o próprio presidente da Anvisa, Barra Torres, que disse não", acrescentou.
'Não havia o normal, uma campanha institucional'
Mandetta criticou também a faltauma campanha nacional do governo para esclarecer a população sobre como se prevenir da doença. E disse que procurava fazer isso nas entrevistas coletivas que concedia diariamente — costume que lhe deu grande visibilidade, irritando Bolsonaro.
"Aquelas entrevistas (que eu concedia) só existiam porque não havia o normal quando se tem uma doença infecciosa: você ter uma campanha institucional, como foi, por exemplo, com a Aids. Havia uma campanhaque se falava como pega e orientava as pessoas a usarem preservativos", disse Mandetta,depoimento na CPI da Pandemia.
'Um homem pequeno para estar onde está', disse sobre Guedes
Segundo Mandetta, outro que ignorou seus alertas sobre a gravidade da pandemia foi o ministro da Economia, Paulo Guedes.
"O distanciamento da equipe econômica era geral. Não posso negar. Eu dialogava um pouco com o segundo escalão (do Ministério da Economia)algumas questões. Mas entre ministros, telefonemas, recados (que deixei) para conversar com o ministro, não eram respondidos", disse Mandetta.
"Um desonesto intelectualmente, uma coisa pequena, um homem pequeno para estar onde está", falou ainda sobre Guedes.
Mandetta ressaltou que, mesmo diante da avaliação do Ministério da Saúde sobre a gravidade da pandemia, Guedes ainda projetava crescimento da economia2% para 2020. Na prática, o PIB (Produto Interno Bruto) brasileiro encolheu 4,1% no ano passado, segundo o IBGE (Instituto BrasileiroGeografia e Estatística).
"Havia uma visão muito menor da gravidade. (Guedes) Não estava compreendendo o tamanho da confusão", reforçou.
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