'O olhar aflito do paciente procura os nossos': o desabafoice cassinopsicóloga sobre casosice cassinocovid-19 que repercutiu nas redes:ice cassino

Crédito, Arquivo pessoal

Legenda da foto, Psicóloga Larissa Gomes acompanha pacientes com covid-19ice cassinoCTIice cassinoBelo Horizonte

Enquanto os númerosice cassinocasos da covid-19 aumentaram nas últimas semanas, Larissa afirma que notou que cada vez mais as pessoas ignoram o isolamento social.

"Tem sido um períodoice cassinocansaço não só profissional, como pessoal. Quem trabalha na área da saúde está cansado. O fimice cassinoano, que normalmente era o momentoice cassinodesacelerar e fazer planos, agora não pode mais ser planejado. Não sabemos como serão as coisas nas próximas semanas", lamenta.

Neste mês, ela soubeice cassinodiversos conhecidos infectados pela covid-19. "Mais até do que durante o picoice cassinocasos,ice cassinomeados deste ano", diz a psicóloga.

A tendênciaice cassinoaumentoice cassinocasos segueice cassinotodo o país. Até este domingo (20),ice cassinoacordo com o Ministério da Saúde, o Brasil já registrou maisice cassino186,7 mil mortes causadas pelo coronavírus e 7,2 milhõesice cassinocasosice cassinoinfecções.

Diante da atual situação da pandemia, ela decidiu desabafarice cassinoseu perfil no Instagram. O relato, publicado no último dia 12, gerou repercussão nas redes. A publicação original teve 5,5 mil curtidas — as postagens anteriores da psicóloga costumavam ter menosice cassino100 curtidas. Logo, o texto passou a ser compartilhado por centenasice cassinopessoas.

Crédito, Arquivo pessoal

Legenda da foto, Larissa desabafou sobre a rotina que enfrenta no atendimento a pacientes infectados pelo coronavírus

O relato

"Acordo cedo, vou para o hospital. Fulano está saturando mal (com dificuldades para respirar espontaneamente), avisa o fisioterapeuta. Médico avalia e lamenta: vamos ter que intubar. Enfermagem começa uma operaçãoice cassinoguerra para preparar o procedimento", descreve a psicóloga, na introduçãoice cassinoseu relato.

No texto, Larissa detalha a rotinaice cassinoquando precisa auxiliar na comunicação entre o paciente e a família dele.

"Tablet na mão. Entro no box acompanhando o médico que, calmamente e com muita segurança, explica ao paciente que as medidas ventilatórias não invasivas foram insuficientes. Por mais otimista que a equipe seja (e, cá entre nós, a minha é linda!), o paciente já sabe com o que está lidando", detalha o relato publicado pela psicóloga.

Altamente invasivo, o procedimentoice cassinointubação costuma ser temido pelos pacientes. Nele, os médicos inserem um tubo pela boca da pessoa, que está sedada, até a traqueia para manter uma via até o pulmão e garantir a respiração.

Larissa lamenta,ice cassinoconversa com a BBC News Brasil, que muitos pacientes consideram que a intubação é sinônimoice cassinoque não irão irá resistir à covid-19. "Há muitos casosice cassinopessoas que são intubadas e sobrevivem. Acompanhei várias situações assim", diz.

"A gente explica ao familiar que a intubação faz parte do tratamento. Ela é uma formaice cassinocolocar o pulmão para descansar e deixar a máquina ser a responsável pela respiração, para que o paciente tenha tempoice cassinose recuperar. Mas é claro que a gente perde pessoas. Não é suficiente para todos", acrescenta a psicóloga,ice cassinoentrevista por telefone.

No relato compartilhado no Instagram, Larissa descreve casosice cassinopacientes que pedem para falar com os familiares por videochamada antesice cassinoserem intubados. Ela detalhou alguns diálogos que já ouviu durante essas possíveis despedidas.

"Anota aí a senha do banco. Avisa à nossa filha que a amo demais. O carnê do plano funerário tá na segunda gaveta da minha mesa. Ainda não paguei a rematrícula da escola. Rezem por mim, serei intubado", relata a psicóloga no texto que repercutiu nas redes.

A videochamada com os familiares antes da intubação depende, principalmente, do estadoice cassinosaúde da pessoa. Há casosice cassinoque a fraqueza extrema do paciente impede o contato, explica Larissa.

Crédito, Divulgação/Prefeituraice cassinoBalneário Camboriú

Legenda da foto, Psicóloga lamenta que cada vez mais brasileiros ignorem que a pandemia continua

A intubação

"Chegamosice cassinoum dos momentos mais difíceis", descreve a psicóloga,ice cassinoseu relato no Instagram, ao mencionar o início da intubação.

"O olhar aflito do paciente procura os nossos. Sinto uma mão tocar a minha, a outra segura o médico: "não me deixem morrer". Prometemos fazer o nosso melhor. Médico, fisioterapeuta e enfermagem iniciam o procedimento."

"Saio para ligar para a família. Mais medo, muito choro, súplicas por notícias e por um mínimo contato com o paciente. Os próximos dias serão eternos para essa família e decisivos para o paciente", detalha Larissa, na publicação na rede social.

Com o paciente intubado, os profissionaisice cassinosaúde fazem diversos procedimentos para que ele apresente melhora.

"Pulmão inflamado, piora ventilatória. Prona (viraice cassinobruço). Rim começa a parar. Dialisa. Coração está fraco. Liga drogas. Ufa, melhora ventilatória, vem a luta para despertar. Foram muitos diasice cassinosedação. Confusão, agitação, piora ventilatória, sedaice cassinonovo. Tentamos mais uma vez, talvez algumas outras", narra a psicólogaice cassinoseu texto.

"Não deu para extubar. Comunica a família. Traqueostomia (procedimento cirúrgico que consisteice cassinofazer uma abertura na traqueia para permitir a passagemice cassinoar). Desmame da ventilação. Paciente acorda sem saber onde está. Família acompanha tudo a distância", escreve Larissa na publicação no Instagram.

"Participoice cassinorezas. Testemunho promessas. Tento ser a ponte entre o lá fora e o aqui dentro. Paciente melhora, sai da ventilação. Enfim, depoisice cassinoum mês teremos dias melhores para esse paciente. Enquanto isso tudo acontecia, chegavam outros, iniciávamos todo o processo. Uns evoluem com menos complicação. Alguns morrem. Outros tantos enfrentam saga parecida. É assim. Todo santo dia", desabafa a psicóloga no texto compartilhado na rede social.

Crédito, Reprodução/Instagram

Legenda da foto, 'Tem dias que sinto que vivoice cassinoum universo paralelo', desabafou Larissa sobre diferença entre rotina intensaice cassinohospital e as imagensice cassinobares lotados e festas

'Exaustos e decepcionados'

No relato, Larissa comenta também sobre a situação dos profissionaisice cassinosaúde durante o enfrentamento à covid-19. "Nos bastidores, compartilhamos cansaço, vibramos com melhoras, lamentamos, e muito, vidas que perdemos", narra.

"Sabem os heróis láice cassinomarço? Morreramice cassinooverdose. Overdoseice cassinotrabalho,ice cassinonegacionismo, pela irresponsabilidade alheia. Alguns morreram, literalmente, com covid. Hoje na linhaice cassinofrente só temos humanos. Exaustos. E também muito decepcionados com o que a ausênciaice cassinocoletividade tem nos causado", acrescenta Larissa.

Ainda no relato, ela escreve sobre a realidade do aumento das aglomerações nos últimos meses.

"Horaice cassinoir para casa. Bares lotados, confraternizações nos stories, abraços coletivos, microfones compartilhados, shoppings lotados! Sextou! É Natal!", lamenta no texto.

Foi justamente por conta do cansaço e do negacionismo que Larissa fez a publicação no Instagram. "Por ver tantas pessoas que eu amo sem se cuidar, mesmo com os avisos sobre a necessidade desses cuidados, decidi fazer o texto. Foi um apelo para tentar sensibilizar os mais próximos e também outras pessoas", diz à BBC News Brasil.

Um dos temores dela é ter que passar por uma despedida por videochamada com alguma pessoa próxima, como as que tem feito com frequência nos últimos meses.

"Antes, as despedidas eram pessoalmente, e eu não acompanhavaice cassinoperto. Mas agora, com as videochamadas, eu tenho visto essas despedidas e escutado as histórias das famílias e as expectativasice cassinomelhora para o paciente", diz à reportagem.

Após o desabafo, Larissa recebeu diversos elogios nas redes. Muitas pessoas agradeceram a psicóloga por compartilhar o alerta.

Ela acredita que ainda há tempoice cassinoconscientizar aqueles que não têm seguido as medidas adequadas, como o usoice cassinomáscaras e evitar locais como festas e bares lotados.

"O meu alerta não foi uma formaice cassinofazer drama ou sensacionalismo. A situação está aí para o pessoal ver. Se eu consegui tocar um pouquinho essas pessoas (que negam o vírus ou ignoram as medidas sanitárias), acredito que elas podem refletir e ver que há algo que podem mudar nesse período (para reduzir os riscosice cassinoinfecção pelo coronavírus)", declara.

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