'Estou há 4 meses longe dos meus filhos': indígena não consegue retornar a aldeia por causabetano raspadinhacoronavírus:betano raspadinha
O acesso às terras indígenas do município passou a ser limitado, após pedidobetano raspadinhalideranças locais e especialistas na área da saúde. A entradabetano raspadinhanão indígenas nas comunidades da região do Alto Rio Negro, onde está localizada a aldeiabetano raspadinhaMargarida, foi suspensa.
Mas as medidas para conter o avanço do novo coronavírusbetano raspadinhaSão Gabriel da Cachoeira, cidade localizada na fronteira do Brasil com a Colômbia e a Venezuela, não foram suficientes para evitar a propagação do vírus na área urbana e nas aldeias da região.
No municípiobetano raspadinha45 mil habitantes, mais da metade deles vivendo fora da cidade, há maisbetano raspadinha2,5 mil casosbetano raspadinhacovid-19 e 43 mortes confirmadas até quarta-feira (24).
Em todo o Amazonas, maisbetano raspadinhamil indígenas já foram infectados pelo novo coronavírus. Entre os povos indígenasbetano raspadinhatodo o Brasil, há maisbetano raspadinha4,4 mil casos do novo coronavírus confirmados e 125 mortes, segundo a Secretaria Especialbetano raspadinhaSaúde Indígena (Sesai).
Os números nas aldeias, porém, segundo especialistas, são ainda maiores. Isso porque a escassezbetano raspadinhatestes faz com que muitos indígenas, mesmo com sintomas, não sejam diagnosticados com a covid-19.
A ida para a cidade
Margarida vive no distritobetano raspadinhaIarauetê, pertencente a São Gabriel da Cachoeira. Quando seguiubetano raspadinhadireção à cidade, ela planejava voltar para a aldeiabetano raspadinhameadosbetano raspadinhamarço, após resolver questões referentes a um projeto da Associação das Mulheres Indígenas do Distritobetano raspadinhaIarauetê (Amidi), da qual é presidente.
A Amidi é uma associação que tem o objetivobetano raspadinharepresentar e gerar renda para mulheresbetano raspadinha13 povos da região do Rio Negro. Uma das iniciativas da entidade é ajudar as indígenas na produção e comercializaçãobetano raspadinhapeças artesanais.
A associação havia ganhado recursos para um projeto para abordar questões sobre o território indígena. A iniciativa, que deve percorrer diversas comunidades da região, tem o objetivobetano raspadinhaconscientizar as mulheres sobre os processosbetano raspadinhainvasão das terras indígenas por garimpeiros. Por se tratarbetano raspadinhaum tema normalmente discutido por homens, a Amidi propôs uma iniciativa para que sejam feitas assembleias sobre o assunto somente para as mulheres. "É importante que as mulheres também participem dessas discussões", diz Margarida.
O projeto obteve recursos por meio do Fundo Socioambiental CASA, uma ONG que financia iniciativasbetano raspadinhagrupos na América do Sul.
Para regularizar a primeira parcelabetano raspadinharepasse para o projeto e resolver questões referentes a documentos da Amidi, Margarida seguiubetano raspadinhadireção à cidade. O percurso entre Iarauetê e a área urbanabetano raspadinhaSão Gabriel da Cachoeira dura cercabetano raspadinha12 horas. No trajeto, é necessário transporte terrestre e uma embarcação.
Na cidade, assinou o contrato para o projeto e recebeu metade do recurso para a iniciativa. Ela também participoubetano raspadinhaencontros com representantes locais para debater sobre as questões indígenas locais.
Quando encerrou os compromissos,betano raspadinhameadosbetano raspadinhamarço, ela iria voltar para casa. Na época, diversas regiões brasileiras começaram a orientar sobre medidasbetano raspadinhaisolamento social.
Com o aumentobetano raspadinhacasosbetano raspadinhacoronavírus no país, o projetobetano raspadinhaconscientização das indígenas sobre territorialidade foi suspenso temporariamente — desde o começo desse período, os garimpeiros aproveitaram para ampliar suas operaçõesbetano raspadinhaterras indígenas.
Um decreto municipalbetano raspadinhaSão Gabriel da Cachoeira,betano raspadinha18betano raspadinhamarço, orientou que os moradores adotassem medidasbetano raspadinhaisolamento para conter a propagação do vírus.
Os númerosbetano raspadinhaembarcaçõesbetano raspadinhaSão Gabriel da Cachoeira diminuíram drasticamente, para evitar a entrada ou saídabetano raspadinhapessoasbetano raspadinhaterras indígenas.
Na cidade, Margarida não conseguiu voltar para a aldeia. "O recurso do projeto ficou suspenso, porque só a tesoureira pode mexer nesse dinheiro e ela ficoubetano raspadinhaIarauetê, por causa da pandemia. Eu não tinha dinheiro para pagar uma embarcação para voltar para casa", diz a indígena.
"Quando pedi carona, as pessoas disseram que tinha que ajudar com a gasolina. Como eu não tinha condições para isso, fiquei por aqui mesmo. Não tinha dinheiro e não tenho até agora", conta.
A indígena relata também que ficou com receiobetano raspadinhavoltar para a aldeia e levar o vírus para seus familiares. "Muitas pessoas que estavam na cidade decidiram dar um jeito para voltar para suas aldeias, sem tomar nenhum cuidado. Acho que isso pode ter feito com que os casosbetano raspadinhacoronavírus aumentassem", diz Margarida.
Somente no distrito Iauaretê,betano raspadinhaque ela mora, há 100 casos confirmados até o momento. "Antes do primeiro diagnóstico na aldeia, já havia pessoas com sintomas que hoje acreditamos que poderia ser o coronavírus, mas não havia testes. Os números na nossa comunidade, por exemplo, são maiores do que o que temos oficialmente até o momento", diz Margarida.
Alguns hábitos dos indígenas, como compartilhamentobetano raspadinhaobjetos e as proximidades entre as casas, são considerados facilitadores para a propagação do Sars-Cov-2, nome oficial do novo coronavírus. As dificuldadesbetano raspadinhaacesso a assistência médica, mesmo antes da pandemia, colaboram para as dificuldades enfrentadas pelas comunidadesbetano raspadinhatodo o Brasil.
Profissionaisbetano raspadinhasaúdebetano raspadinhaSão Gabriel da Cachoeira relataram à BBC News Brasil,betano raspadinhareportagem do mês passado, que há comunidades da região nas quais todos os membros apresentam sintomasbetano raspadinhacovid-19. No entanto, não entram para as estatísticas oficiaisbetano raspadinharazão da faltabetano raspadinhatestes.
O único hospitalbetano raspadinhaSão Gabriel da Cachoeira, gerido pelo Exército, lotoubetano raspadinhadecorrência da explosãobetano raspadinhacasos. Pacientes intubados na unidadebetano raspadinhasaúde passaram a ser transferidosbetano raspadinhaavião para Manaus.
A Fundação Nacional do Índio (Funai) afirma que tem prestado assistência aos indígenas e dado orientações para evitar a propagação do novo coronavírus nas aldeias.
O retorno para casa
Desde fevereiro, Margarida está na casabetano raspadinhaumabetano raspadinhasuas irmãs. Ela tem aproveitado o período na cidade para resolver outras questões da associação e para buscar formasbetano raspadinhaajudar as comunidadesbetano raspadinhasua regiãobetano raspadinhameio à pandemia. "Tenho buscado regularizar algumas situações da associação e tenho escrito novos projetos. É uma formabetano raspadinhatentar aproveitar o meu tempo na cidade", diz.
Enquanto aguardava uma definição sobre o seu retorno à aldeia, Margarida tevebetano raspadinhalidar com outra doença infecciosa que até o início deste ano era uma das mais comunsbetano raspadinhaSão Gabriel da Cachoeira: a malária. "Acredito que fui picada quando fui à casabetano raspadinhauma amiga na cidade. Lá tem muitos mosquitos", afirma.
"Sempre houve muitos casosbetano raspadinhamalária e dengue aqui na cidade. Essas eram as principais preocupações. Mas agora até esqueceram um pouco, por causa do coronavírus", diz Margarida.
Ela apresentou sintomas como febre e dores no corpo. "Pensei que era a covid-19, mas fiz os exames e descobri que era malária", conta. A indígena afirma que tem se recuperado bem.
Mesmo doente, ela não paroubetano raspadinhabuscar formas para ajudar as mulheresbetano raspadinhasua comunidade. Em meio à pandemia, muitas delas que trabalham como artesãs perderam a única fontebetano raspadinharenda,betano raspadinharazão do isolamento social. "Tem muitas famílias passando dificuldades nas aldeias", lamenta.
Margarida conseguiu, no departamentobetano raspadinhamulheres da Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (Foirn), 50 cestas básicas para as mulheresbetano raspadinhasua região. "É uma ajuda muito importante neste momento", diz. Os donativos deverão ser entregues no próximo fimbetano raspadinhasemana. Na data, a indígena pretende acompanhar a embarcação e retornar para casa.
Ela tem contado as horas para voltar para perto dos filhos. Esta é a primeira vez que a indígena passa maisbetano raspadinhaum mês longe deles. "Já fiz outras viagens, mas nunca penseibetano raspadinhaficar tanto tempo longe, ainda mais durante uma pandemia. Fico preocupada se eles estão bem", conta.
Os pais dela, que têm 78 anos, estão cuidando dos netos. "Eu sei que meus filhos estãobetano raspadinhaboas mãos. Mas também fico preocupada com meus pais, porque são idosos e hipertensos. Todos os dias ligo para uma irmã que mora na aldeia para perguntar como estão as coisas."
Ao retornar para a aldeia, ela pretende procurar a equipe médica do Distrito Sanitário Especial Indígena da região. "Vou conversar com os profissionaisbetano raspadinhasaúde e vou ficarbetano raspadinhaisolamento. Se possível, farei o teste para a covid-19", comenta.
Apesar das dificuldades dos últimos meses, Margarida afirma que os mesesbetano raspadinhaque permaneceu na cidade se tornaram importantes. "Ao menos pude conquistar coisas para a associação e ajudar outras pessoas, como por meio das cestas básicas. Se estivesse na aldeia, não poderia ajudar tanto nesse período", declara.
A associação para as mulheres indígenas foi fundada há maisbetano raspadinha25 anos. Margarida conta que uma das coisas que a motiva a seguir com a iniciativa é uma frase que escutou da fundadora da entidade, anos atrás. "Ela me disse que todo o trabalho que tenho feito é para o bem das mulheres indígenas, porque elas precisam ter voz. Isso me incentiva muito", comenta.
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