Por que igrejas evangélicas ganharam tanto peso na política da América Latina? Especialista aponta 5 fatores:sporting bet mobile

Jeanine Áñez e Evo Morales

Crédito, Pedro Pardo/AFP

Legenda da foto, 'A Bíblia volta ao palácio', declarou a presidente interina da Bolívia, a senadora Jeanine Áñez, ao tomar posse na semana passada

Para o historiador americano Andrew Chesnut, autorsporting bet mobiledezenassporting bet mobilelivros e artigos sobre o crescimento das igrejas pentecostais, a forte influência dos evangélicos na ascensão e quedasporting bet mobilelíderes é uma das principais "tendências" da política atual do continente americano.

Pastor lê Bíblia durante protesto na Bolívia

Crédito, Kai Pfaffenbach/Reuters

Legenda da foto, O que explica essa influência crescente da religião na políticasporting bet mobilepaíses do continente?

"Até no México, onde a população pentecostal é pequena,sporting bet mobileapenas 8%, um partido político fundado por um pastor pentecostal ajudou a eleger o atual presidente do país, Andrés Manuel Lopez Obrador", disse Chesnut à BBC News Brasil.

"A influência política evangélica é uma das tendências políticas mais importantes das últimas quatro décadas no continente americano", completa o professor, que leciona na Virginia Commonwealth University e assina diversas publicações sobre o papel da religião na América Latina, entre elas o livro Born Again in Brazil: Pentecostal Boom and the Pathogens of Poverty.

Mas o que explica essa influência crescente da religião na políticasporting bet mobilepaíses do continente? E por que igrejas evangélicas têm conseguido cada vez mais adeptos entre os latino-americanos?

Em entrevista à BBC News Brasil, Chesnut listou 5 fatores que ajudam a responder essas perguntas: a coesão ideológica dos evangélicos, o que facilitaria articulações políticas; o fatosporting bet mobileos ritos das igrejas evangélicas serem mais "condizentes" com aspectos da cultura da América Latina; a adoçãosporting bet mobileregras menos rígidas para a formaçãosporting bet mobilesacerdotes, permitindo maior inserção nas camadas mais pobres; a criaçãosporting bet mobileredessporting bet mobileapoiosporting bet mobilecomunidades carentes; e a capacidadesporting bet mobileecoar pensamentos compartilhados por setores conservadores da classe média e alta.

Crescimento das igrejas evangélicas - e a entrada delas na política

O continente americano tem vivido uma acentuada queda no númerosporting bet mobilecatólicos, ao mesmo temposporting bet mobileque houve grande aumento na população evangélica.

Segundo o Pew Research Center, principal centrosporting bet mobilepesquisa sobre religiões,sporting bet mobile1900 a 1960, os católicos eram 94% da população da América Latina.

Mas esse percentual caiu drasticamente. Levantamentosporting bet mobile2014 do mesmo instituto mostrou que 84% dos entrevistados cresceram como católicos, mas apenas 69% continuavam a se identificar como tal.

Em contraste, só 9% dos latino-americanos foram criados como evangélicos, mas 19% dizem seguir essa religião atualmente. No Brasil, o percentualsporting bet mobileevangélicos é ainda maior:sporting bet mobileacordo com pesquisa Datafolha, eles já são 29% dos brasileiros, enquanto os católicos deixaramsporting bet mobileser maioria para representar 50% da população.

Bolsonaro fazendo oração

Crédito, Carolina Antunes/PR

Legenda da foto, No Brasil, setores evangélicos formam uma das principais basessporting bet mobileapoiosporting bet mobileJair Bolsonaro

Segundo Andrew Chesnut, que estuda o movimento pentecostal há 25 anos, uma característica importante acompanha o crescimento no númerosporting bet mobileevangélicos no continente americano: o engajamento políticosporting bet mobilelíderes e integrantes dessa religião.

O pesquisador destaca que os católicos são um grupo mais "heterogêneo", com segmentos ligados à esquerda e outros à direita. Essa pluralidade, na prática, dificultaria uma mobilização política coordenada.

"Dentro do catolicismo você tem setores conservadores, ligados ao Opus Dei, por exemplo, e mais progressistas, como os membros da teologia da libertação. Então, há mais diversidade e isso torna a tarefasporting bet mobilefazer uma aliança católica mais difícil", explica.

"Já os evangélicos são mais homogêneos politicamente. Isso facilita a união e as alianças para eleger determinados políticos."

Bolsonaro, Camacho e... Trump

Os exemplos mais recentes e evidentes da força evangélica na política são a eleiçãosporting bet mobileJair Bolsonaro e a quedasporting bet mobileEvo Morales, na Bolívia. Os dois episódios contaram com apoio crucialsporting bet mobilesetores evangélicos.

Na quedasporting bet mobileMorales, uma figura ligada à ala mais conservadora da Igreja Católica e a lideranças evangélicas ganhou protagonismo: Luis Fernando Camacho.

Ele atua como presidente do Comitê Cívico Pró-Santa Cruz, uma entidade que reúne cercasporting bet mobile200 instituições, entre associaçõessporting bet mobilemoradores, trabalhadoressporting bet mobiledireita e empresários. O comitê funciona na cidade mais populosa da Bolívia, Santa Cruzsporting bet mobilela Sierra, e é chamadosporting bet mobile"governo moral".

As constantes mençõessporting bet mobileCamacho ao "podersporting bet mobileDeus" e o costumesporting bet mobilecitar trechos da Bíblia fizeram como que chegasse a ser chamado pela imprensa internacionalsporting bet mobile"Bolsonaro boliviano".

Foi ele o principal articulador dos protestossporting bet mobilerua que culminaram na retirada do apoio da polícia e das Forças Armadas ao governo Morales. Camacho tem o costumesporting bet mobileiniciar seus discursos com uma oração e, ao entrar no antigo Palácio do Governo,sporting bet mobileLa Paz, poucas horas antes da renúncia do presidente, depositou uma Bíbliasporting bet mobilecima da bandeira boliviana.

Camacho fazendo oração antessporting bet mobilese dirigir ao público e dar entrevista

Crédito, Rodrigo Urzagasti/Reuters

Legenda da foto, Camacho é católico e contou com o apoiosporting bet mobilesetores conservadores da igreja esporting bet mobilelideranças evangélicas para derrubar Morales, diz Chestnut

Para Chesnut, Camacho e Bolsonaro têm característicassporting bet mobilecomum.

"A Bolívia, é interessante, porque é um país mais predominantemente católico que o Brasil. Na faixasporting bet mobile70% dos bolivianos ainda são católicos. Mas, na retiradasporting bet mobileMorales do poder, vimos uma forte influência evangélica", avalia.

"Camacho é mais ou menos como Bolsonaro. Ele segue sendo católico, mas tem uma grande influência pentecostal e tem os pentecostais como grandes aliados. E o discurso dele é 100% pentecostal."

A senadora Jeanine Áñez, que se autoproclamou presidente interina da Bolívia após a saídasporting bet mobileEvo Morales, segue a mesma linha. Ela entrou ao Paláciosporting bet mobileGoverno,sporting bet mobileLa Paz, erguendo uma enorme Bíblia e, atrássporting bet mobileum altar montado com velas e a imagemsporting bet mobileJesus crucificado, se empossou.

"Um aspecto importante do papel que a religião tem exercidosporting bet mobilegovernos latino-americanos é a existênciasporting bet mobileuma convergência entre os evangélicos e os católicos conservadores", diz Andrew Chesnut.

Embora os exemplos brasileiro e bolivianosporting bet mobileinfluência religiosa na política sejam contundentes, o professor americano diz que a tendênciasporting bet mobilecrescimento da força evangélica nos governos não é característica apenas da América Latina.

Segundo ele, o fenômeno teve início nos Estados Unidos, começou a ganhar força na América Latina na décadasporting bet mobile80, com a ascensãosporting bet mobileum pastor evangélico como presidente da Guatemala, e pode ser visto claramente hoje no governosporting bet mobileDonald Trump.

Trumpsporting bet mobileoração durante conferênciasporting bet mobilepastores evangélicos

Crédito, MANDEL NGAN/AFP

Legenda da foto, Presidente Donald Trump mantém relaçãosporting bet mobileproximidade com setores evangélicos dos EUA

De acordo com reportagem do jornal Washington Post, 61% dos pastores evangélicos dos Estados Unidos manifestaram, num levantamento, intençãosporting bet mobilevotarsporting bet mobileTrump na eleiçãosporting bet mobile2016. E o presidente americano mantém relaçõessporting bet mobileproximidade com lideranças evangélicas famosas no país.

"Nos EUA, os evangélicos são uma das principais bases eleitoressporting bet mobileTrump", diz Chesnut. Segundo ele, um dos reflexos da aproximação do presidente americano com setores religiosos é a decisãosporting bet mobiletransferir a embaixada dos Estados Unidossporting bet mobileIsraelsporting bet mobileTel Aviv para Jerusalém.

Bolsonaro chegou a anunciar que faria o mesmo, para atender ao pleitosporting bet mobilegrupos evangélicos que se baseiamsporting bet mobileintepretações bíblicas para defender que Jerusalém deve ser "protegida" e habitada pelos judeus. O presidente brasileiro acabou, no entanto, decidindo abrir um escritório comercial na cidade, após forte pressãosporting bet mobilepaíses árabes e do setor exportadorsporting bet mobilecommodities, que temia retaliações comerciais.

"Uma das agendas importantes atuais para os evangélicos é o apoio a Israel", afirma o professor Andrew Chesnut.

E o que tornou as igrejas evangélicas tão atrativas para o público?

Além da coesão ideológica, que facilita a articulação política dos evangélicos, Chesnut lista quatro fatores que teriam contribuído para o sucesso do movimento pentecostal entre os latino-americanos. Um deles é o fatosporting bet mobileas igrejas evangélicas adotarem ritos "mais condizentes com a cultura dos povos da região".

Nesse sentido, as músicassporting bet mobilelouvor e a maneira mais informal e diretasporting bet mobileos pastores discorrerem sobre trechos da Bíblia cumpririam papel importante.

Outro aspecto listado pelo pesquisador são as redessporting bet mobileapoio criadas pelas igrejas evangélicas para intervirsporting bet mobileproblemas das comunidades, como casossporting bet mobilealcoolismo, criminalidade e dependência química.

O terceiro fator seria o critério flexível para a formaçãosporting bet mobilesacerdotes — os bispos e pastores.

"Uma grande vantagem que as igrejas pentecostais têm é que os pastores podem se casar e não há os mesmos requisitos educacionais. Um sacerdote católico é parte da elite latino-americana quanto ao nível educacional", diz.

Bolsonaro durante comemoração dos 25 anos da Igreja Fontesporting bet mobileVida

Crédito, Alan Santos/PR

Legenda da foto, Andrew Chestnut lista três elementos que contribuíram para o sucesso das igrejas evangélicas na América Latina, nos últimos anos

"Essa facilidadesporting bet mobilenão exigir uma extensa formação acadêmica nem o celibato permitiu uma entrada maior das igrejas pentecostais nas camadas mais pobres."

Além disso, o pesquisador destaca que setores conservadores da classe média e alta dos Estados Unidos e da América Latina passaram a ver suas posições ecoadas nas novas igrejas evangélicas. Entre essas agendas estão a preocupação com o ensino sexual nas escolas, o temor do que chamamsporting bet mobile"ideologiasporting bet mobilegênero", e a posição firmemente contrária à flexibilizaçãosporting bet mobileleis relacionadas ao aborto.

"Havia uma população que compartilhava desses valores: defendia uma agenda anti-LGBT, o antifeminismo e era contrária à legalização do aborto. Essas pessoas não tinham lideranças para representar essas perspectivas da maneira desejada", diz Chesnut.

E qual o impacto dessa influência religiosa na política?

Para o professor americano, o principal temor relacionado ao aumento da ingerência evangélica na política é osporting bet mobileque líderes eleitos com o apoio desses setores acabem aprovando políticas públicas que, na prática, discriminem outros credos religiosos ou que signifiquem retrocessos na conquistasporting bet mobileminorias.

"No caso da Bolívia, já vimos comentários racistas por parte da presidente interina. Lá, alguns setores pentecostais enxergam as religiosidades indígenas como satânicas ou pagãs", diz Chesnut.

No Brasil, o pesquisador diz perceber o riscosporting bet mobilesurgimentosporting bet mobileuma atmosferasporting bet mobileintolerância contra religiõessporting bet mobilematriz africana. Chesnut fala português e viveu vários anos no Brasil, onde pesquisou o impacto da religiosidade na sociedade e na política.

Senadora que assumiu presidência interina da Bolívia

Crédito, Carlos Garcia Rawlings/Reuters

Legenda da foto, Na Bolívia, principais líderessporting bet mobileoposição a Evo Morales, Fernando Camacho e Jeanine Áñez, contaram com apoiosporting bet mobilesetores católicos e evangélicos

Ele lembra que,sporting bet mobileagosto, a polícia do Riosporting bet mobileJaneiro prendeu traficantes evangélicos integrantes do chamado "Bondesporting bet mobileJesus", grupo acusadosporting bet mobilepromover ataques a igrejassporting bet mobilematriz africana esporting bet mobileexpulsar praticantessporting bet mobilecandomblé e umbanda das favelas da Baixada Fluminense.

"Há uma preocupaçãosporting bet mobileque as religiões indígenas e afro-brasileiras possam sofrer perseguições com os pentecostais no poder. Grupos violentos podem se sentir impunes ou estimulados a agir dessa maneira", diz Chesnut.

Mas o historiador destaca que o fenômeno do crescimento das igrejas evangélicas vem acompanhadosporting bet mobileum movimento bem diferente e que também pode vir a influenciar o cenário político do continente: o aumento no númerosporting bet mobilepessoas que dizem não ter religião alguma.

"Além do crescimento das igrejas evangélicas, hásporting bet mobilevários Estados dos EUA esporting bet mobilevários países da América Latina, inclusive no Brasil, um crescimento rápido das pessoas que não têm nenhuma filiação religiosa. No Brasil, eles já formam quase 10% da população", diz.

E as características desse grupo são opostas às que costumam definir os setores evangélicos e católicos conservadores. "Eles são mais jovens, sabemos que a tendência ésporting bet mobileseremsporting bet mobileesquerda e mais liberais nos costumes. E estão crescendo quase tão rapidamente quanto os pentecostais."

Resta saber qual dos dois setores terá mais influência eleitoral nos próximos anos.

Línea

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