'Tenho que confessar. Ainda sou fértil': quando mentirbest online casino parelação consensual pode ser considerado estupro:best online casino pa

Casal se beijando na contraluz

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, No Brasil a palavra 'consentimento' não está inserida na legislação sobre estupro

Lawrance foi condenado por estuprar Sally duas vezes – porque eles fizeram sexo duas vezes –best online casino paum caso sem precedentes no Reino Unido.

"A seção 74 da leibest online casino pacrimes sexuaisbest online casino pa2003 diz que uma pessoa consente se ele ou ela concorda por escolha própria e tem a liberdade e a capacidadebest online casino pafazer aquela escolha", diz Sue Matthews, a promotora do caso. "Ao mentir sobre a vasectomia, ele impediu aquela vítimabest online casino pafazer uma escolha informada."

"Se essa condenação for mantida, a preocupação é que pessoas que nunca foram consideradas criminosas estejam sob o riscobest online casino paserem processadas por graves crimes sexuais", diz Shaun Draycott, advogadobest online casino paLawrance.

E no Brasil, como um caso como esse seria legalmente tratado?

Pela legislação brasileira, uma mentira sobre a contracepção, como abest online casino paLawrance, não poderia ser considerada estupro, explica Maíra Zapater, professorabest online casino padireito penal da Fundação Getúlio Vargas.

"Em um caso como obest online casino paSally,best online casino paque mulher queria manter relação sexual sem camisinha, mas foi enganadabest online casino parelação a um elemento importante que viciou o consentimento dela, dentro da lei brasileira ficaria bem discutível dizer se isso configura algum crime", explica Zapater. "Porque não houve violência nem grave ameaça, entãobest online casino paestupro a gente não poderia enquadrar."

Isso porque o Código Penal brasileiro define estupro, no artigo 213, como "constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso". "Ou seja, o crimebest online casino paestupro só existe quando houver violência física ou ameaça, quando a pessoa pratica o ato sexualbest online casino paforma forçada", diz Zapater.

Jason Lawrance

Crédito, Derbyshire Police

Legenda da foto, Jason Lawrance está recorrendobest online casino pasua condenação por estuprar Sally

Existe na legislação um outro crime que tratabest online casino paviolação sexual mediante fraude, definido no artigo 215 do Código Penal como ter "conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com alguém, mediante fraude ou outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestaçãobest online casino pavontade da vítima".

Mas, explica Zapater, o entendimento atual da Justiça ébest online casino paque essa lei se aplica para casosbest online casino paque a pessoa é enganadabest online casino parelação ao próprio abuso sexual – ela acredita que o que está sendo feito com ela não é um ato libidinoso, mas um procedimento médico ou religioso, por exemplo.

Ou seja, também não se encaixariabest online casino paum casobest online casino paconsentimentobest online casino paque a pessoa foi enganada e concordoubest online casino pafazer sexo.

"A gente poderia ficar com a importunação sexual, porque ela não anuiubest online casino papraticar o ato sexual com alguém fértil sem o preservativo, mas ainda seria uma interpretação discutível", diz Zapater.

"Isso mostra que a nossa lei olha para algumas coisas e não olha outras. Não se fala da questão do consentimentobest online casino parelação a métodos contraceptivos", afirma a criminalista.

O crimebest online casino paimportunação sexual é o único na legislação brasileira que falabest online casino paconsentimento. A lei que o criou foi aprovadabest online casino pa2018, após casosbest online casino paassédio no metrô cuja punição era díficil justamente pela dificuldadebest online casino paenquadrarbest online casino paqualquer definiçãobest online casino pacrime sexual existente na época.

Importunação sexual é "praticar contra alguém e sem abest online casino paanuência ato libidinoso com o objetivobest online casino pasatisfazer a própria lascívia ou abest online casino paterceiro", e pode dar penabest online casino pa1 a 5 anosbest online casino paprisão.

Um aborto seria permitido?

Como no Brasil o aborto só é permitidobest online casino pacasosbest online casino paestupro (ou seja, casosbest online casino paque a lei define como estupro), uma mulher na mesma situação que Sally – que não teria consentido com a relação se soubesse que poderia engravidar – não teria direito a fazer o procedimento legalmente caso engravidasse.

"A lei brasileira é muito dissonante com o resto do mundobest online casino parelação a direitos sexuais e reprodutivos", diz a criminalista.

"Isso mostra que a lei penal tem uma questãobest online casino paaberto a tratar,best online casino pauma mulher que acaba engravidandobest online casino pauma relação sexual consentida, mas ela não consentiubest online casino panão usar método contraceptivo."

Remover a camisinha pode contar como estupro ou outro crime sexual?

Imagembest online casino paarquivobest online casino pacamisinhas coloridas

Crédito, Getty Images

A professora Kelly Davis, da Universidade Estadual do Arizona, nos EUA, fez uma pesquisa com homens e mulheres entre 21 e 30 anos sobre resistência ao usobest online casino pacamisinha no país. Dos 313 homens participando, 23,4% admitiram usar "subterfúgios" pelo menos uma vez para não usar o preservativo desde os 14 anos.

Davis também fez outras pesquisas qualitativas com gruposbest online casino pahomens jovens para estudar o assunto. "Eles estabelecem um limite no uso da força, mas tirando isso estão dispostos a fazer qualquer coisa (para não usar o preservativo)."

Das 530 mulheres entrevistadas, 6,6% admitiram ter enganado o parceiro, sendo a tática mais usada mentir sobre o usobest online casino papílula anticoncepcional.

Davis também pesquisou uma prática conhecida como "stealthing", quando o homem concordabest online casino pausar o preservativo e o remove, sem que a mulher perceba, durante o sexo. Dos 626 homens entre 21 e 30 anos entrevistados, 10% admitiram fazer isso pelo menos uma vez desde os 14 anos.

A advogada Sandra Paul, especialistabest online casino pacrimes sexuais, afirma que,best online casino paacordo com a lei britânica, o ato é um estupro.

A questão inclusive fez parte do casobest online casino paextradiçãobest online casino paJulian Assange, o fundador do Wikileaks. Embest online casino paacusação, juízes consideraram que sexo sem preservativo é um crime sexual no Reino Unido se o parceiro só concordou com o ato com a condiçãobest online casino paque o preservativo fosse usado.

No Brasil, a remoção da camisinha só poderia ser considerada estupro,best online casino patermos legais, se "durante o ato o homem quer retirar a camisinha, a mulher fala que não e aí ele mudabest online casino paconduta e pratica a violência ou grave ameaça", explica Zapater, da FGV. "Sem esse elementobest online casino paviolência ou grave ameação, não dá para encaixarbest online casino paestupro como ele é descrito pela legislação brasileira."

Se durante o ato a mulher não percebeu, e descobre depois que a relação foi sem o preservativo, no entendimento da professora, no máximo a atitude poderia se enquadrarbest online casino paimportunação sexual. "Que é um crime residualbest online casino parelação ao estupro, ele tem os elementos do estupro mas não tem a violência", diz ela.

E se o homem não praticar o coito interrompido?

Katie Russell, porta-voz da ONG britânica Rape Crisis, afirma que mentir sobre a intençãobest online casino paretirar o pênis antes da ejaculação pode se enquadrar dentro da definição legalbest online casino paestupro no país. "É um exemplobest online casino paalguém que concordou com o sexo sob certas condições, e o parceiro não se ateve àquelas condições", diz ela.

Sandra Paul conta que um caso do tipo já chegou a ser consideradobest online casino pauma corte britânica, envolvendo um casal casado. "A mulher não queria mais filhos e concordou com o sexo desde que ele interrompesse o coito antes da ejaculação. Ele fingiu concordar, mas havia bastante provasbest online casino paque ele não tinha intençãobest online casino pafazê-lo."

A promotoria não quis abrir um processo criminal contra o marido, então a mulher pediu uma revisão judicial da decisão. A BBC questionou a promotoria sobre o caso, mas não obteve resposta.

No Brasil, um caso como esse cairia na mesma categoria da camisinha – seria difícil ser considerado crime se a mulher consentiu e só depois percebeu que ele não interrompeu o coito antes da ejaculação.

Um caso assim só poderia ser considerado crimebest online casino paestupro se, durante a relação sexual, houvesse violência ou grave ameaça para que a relação continuasse. Seria preciso que,best online casino paalguma forma, a relação fosse forçada – se a mulher manifestasse seu desejobest online casino painterromper o coito e ele continuasse.

Mentir sobre infecções sexualmente transmissíveis é crime?

Homem segurando uma gaze no braço após um examebest online casino pasangue

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Segundo uma pesquisa nos EUA, 9,6% dos homens admitiram ter mentido sobre ter feito testesbest online casino paDSTs

No Brasil, expor alguém a doença venérea é crime, mas que tem uma pena baixa (de três meses a um ano, ou multa), então normalmente é convertidabest online casino papena alternativa.

No caso da AIDS (que não é considerada doença venérea porque tem meiosbest online casino patransmissão não apenas via relação sexual), o STJ (Superior Tribunalbest online casino paJustiça) já decidiu que quem passa a doença com a intençãobest online casino painfectar o parceiro pode responder por tentativabest online casino pahomicídio.

Se a pessoa apenas mentir sobre ela, no entanto, fazendo sexo sem proteção, mas sem a intenção comprovadabest online casino patransmiti-la, não há crime contra a vida, segundo a jurisprudência do STF (Supremo Tribunal Federal). Mas, dependendo do caso, pode cometer o crimebest online casino paperigobest online casino pacontágiobest online casino pamoléstia grave oubest online casino palesão corporal.

"Não são crimes contra a dignidade sexual, mas simbest online casino papericlitação da vida e da saúde", explica a criminalista Zapater.

No Reino Unido, mentir sobre Infeções Sexualmente Transmissíveis também é uma "zona cinzenta", diz Sandra Paul. Por lá, houve diversos casosbest online casino papessoas condenadas por infectar parceiras com HIV: Daryll Rowe, Antonio Reyes-Minana e Aaron Sutcliffe são três exemplos recentes. No entanto, eles foram condenados por lesão corporal grave, não por crimes sexuais.

E se uma mulher mentir sobre usar pílula?

O advogadobest online casino padefesabest online casino paJason Lawrence, David Emanuel comparou a mentirabest online casino paseu cliente sobre a vasectomia com abest online casino pauma mulher sobre o usobest online casino papílula. Ele argumentou que, se Lawrence podia ser condenado por estupro por mentir sobre ser infértil, então uma mulher poderia ser condenada também por um ato similar.

No entanto, nas leis atuais do Reino Unido, mulheres não podem ser condenadas por estuprar homens porque o estupro é definido como um ato cometido com um pênis.

Russell, da Rape Crisis, critica a comparação da vasectomia com a pílula. "Com questões envolvendo contracepção e gravidez, é o corpo e a saúde da mulher que são afetados por esse tipobest online casino pamentira", disse ela.

"Não é possível comparar uma coisa com outra, porque é a mulher que tem que lidar com as consequências da gravidez e do aborto, e os impactos para o homem não são comparáveis."

Mas Sandra Paul não concorda. "A questão central é até que ponto a mentira vicia (ou seja, nega a possibilidade) do consentimento", diz ela.

No Brasil, assim como é difícil encaixar a mentira sobre vasectomiabest online casino paalguma crime sexual, a mentirabest online casino pauma mulher sobre a pílula também não pode ser encaixada nessa categoriabest online casino pacrime.

E se alguém mente sobre seu gênero?

Gayle Newland,best online casino pa2015

Crédito, PA Media

Legenda da foto, Gayle Newland fingiu ser um homem, convenceu a parceira a usar uma venda e a penetrou com um pênis falso

No Reino Unido, diversos casos foram parar na Justiça após mulheres fingirem ser homens para conseguir encontros com outras mulheres, oubest online casino pacasobest online casino pahomens transexuais que não revelaram seu gênero designado no nascimento a parceiras. Casos notáveis incluem Gayle Newland, Justine McNally e Kyran Lee.

Muitos desses casos envolvem o usobest online casino paum pênis falso e, como no país o estupro é definido como um ato cometido com um pênis, a acusação ébest online casino paassédio sexual, nãobest online casino paestupro. No casobest online casino paMcNally, que se apresentou como um garoto adolescente ao longobest online casino paum relacionamento com uma garota, a Justiça decidiu que "enganar quanto ao gênero pode viciar o consentimento."

No entanto, casos como esses – às vezes chamadosbest online casino pa"fraudebest online casino pagênero" – levantam a questão dos direitos das pessoas com disforiabest online casino pagênero (desconforto da pessoa com o gênero atribuído ao nascer) e sobre se pessoas transexuais deveriam ter que revelar o gênero com o qual foram designadas ao nascer aos parceiros.

A professorabest online casino padireito Alex Sharpe, especialista na questão e ativista pelos últimos 20 anos, diz que a maioria das pessoas processadas por fraude sexual parecem ter variânciabest online casino pagênero. "Então existe a questãobest online casino paescolher certos tiposbest online casino papessoas para processar", diz ela.

Sharpe acredita que um homem trans não está enganando uma parceira ao se apresentar como homem porque ele é um homem.

E outras mentiras?

Pessoas contam todo tipobest online casino pamentiras para conseguir sexo – mentem a idade, fingem ser solteiras quando na verdade são casadas, alegam ter mais dinheiro do que têm. No entanto casos como esses não foram parar na Justiça, então jurados não tiveram que avaliar se esse tipobest online casino pamentira impede ou vicia o consentimento.

Diversas mulheres tiveram relações sexuais com policiais infiltradosbest online casino pagrupos ativistas. Uma delas argumentou que isso equivale a um timebest online casino papoliciais conspirando para cometer estupro, porque os oficiais sabiam que não havia consentimento informado.

A polícia do Reino Unido indenizou algumas dessas mulheres, no entanto, a promotoria se negou a entrar com ações criminais contra os policiais, dizendo que "quaisquer mentiras nas circunstâncias do caso não foram tais que viciassem o consentimento".

Sandra Paul acredita que é precisobest online casino pamais detalhes sobre até que ponto as mentiras impedem o consentimento – e que isso deve vir com o julgamentobest online casino pasegunda instância da condenaçãobest online casino paJason Lawrance.

"Em última instância pode ser que mais legislação seja necessária", diz ela. "Não usar um preservativo quando você disse que usaria é claramente problemático, mas um adulto mentir sobre a idade, na maioria das circunstâncias, não é."

"Na faltabest online casino palegislação específica, quem faz as regras sobre o que há entre os extremos, e como os júris navegam entre essas decisões?"

No Brasil, também há uma grande "zona cinzenta", segundo Maíra Zapater, da FGV.

"Quando a gente falabest online casino palei penal, ela tem que ser muito exata para ser aplicada a um caso concreto e a uma pessoa. Por mais que a conduta seja moralmente condenável, moralmente repugnante, a gente precisa ter um controle da legalidade", diz . Ou seja, é preciso que a conduta que se pretende punir esteja descrita exatamente na lei.

A forma como o estupro é definido faz com que ele seja aplicado para casos muito espefícios, e ainda não está muito definido o que se encaixa no crimebest online casino paimportunação sexual.

"A importunação sexual é um crime que existe só há um ano, e as interpretações (por juízes e autores do Direito Penal) ainda são sendo construídas", diz Zapater.

E há muitas questões das quais a lei simplesmente não trata. "No meu entender, a lei brasileira não é clara na questão do consentimento sobre método contraceptivo", afirma a criminalista.

*Com reportagembest online casino paLetícia Mori, da BBC News Brasilbest online casino paSão Paulo

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*O nome foi alterado para proteger a identidade da vítima

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