Brexit: Como uma eventual saída sem acordo do Reino Unido da UE poderia custar até 10 mil empregos ao Brasil:
"Mais5 mil dos 10 mil empregos estariamrisco na agricultura brasileira. Outras atividades sentiriam menos", dizentrevista à BBC News Brasil Oliver Holtemöller, chefe do departamentomacroeconomia e vice-presidente do instituto, um think tank membro da Associação Leibniz, que reúne institutospesquisa alemãesdiversos ramosestudo.
No entanto, especialistas ressalvam que também poderiam haver oportunidades para o Brasilpossíveis negociações individuais com o Reino Unido.
O Halle foi fundado1992 por um acordo entre o governo da Alemanha e o Estado federal da Saxônia-Anhalt para a realizaçãopesquisas econômicas empíricas, institucionais e para terceiros, nas áreasdinâmica e estabilidade macroeconômica, instituições e normas sociais, produtividade, inovação, estabilidade financeira e regulação.
Holtemöller, um dos autores do estudo sobre os potenciais efeitosum hard Brexit no mercadotrabalho internacional, explica que o cenário turbulento é previsto diante da perspectivao Brexit reduzir exportaçõespaíses da União Europeia para o Reino Unidoum percentual que estima25%. A queda ocorreria caso a saída seja efetivada sem o chamado "acordoretirada" - que o governo britânico negociou com os líderes da União Europeia, mas que já foi rejeitado três vezes pelo Parlamento.
Para estimar os impactos, por país e indústria, o instituto construiu coeficientes que indicam quantas pessoas empregadas são necessárias para produzir nas unidadesprodução, baseando seus cálculosinformações extraídas do BancoDados MundialInsumo-Produto (WIOD, da siglainglês).
Mas o que é Brexit eque pé ele está?
Brexit é uma abreviação para "British exit" ("saída britânica", na tradução literal para o português) e é o termo mais comumente usado quando se fala sobre a decisão do Reino Unidodeixar a União Europeia.
Ele foi aprovadoum referendo23junho2016, quando os britânicos foram perguntados se o Reino Unido deveria permanecer ou deixar a União Europeia. A maioria - 52% contra 48% - decidiu que o país deveria deixar o bloco. Mas a saída não aconteceuimediato e acabou virando um processo cheioincertezas.
Dianteimpasses envolvendo o acordo que prevê como seria essa retirada, a probabilidadeum não-acordo, ou hard Brexit, segundo analistas, só cresce. A data do Brexitsi também é incerta. Originalmente, estava marcado para 29março. O prazo acabou adiado para 12abril com possibilidadenovas mudanças.
Nesta sexta-feira, a primeira-ministra britânica, Theresa May, pediu oficialmente uma nova prorrogação, desta vez para 30junho. No entanto, a editora da BBC na Europa, Katya Adler, foi informada por uma fonte na UEque o presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, vai propor uma extensão "flexível"12 meses, com a opçãoabreviar este prazo.
O pedidoMay foi feitomeio a tentativaschegar a um entendimento com a oposição para destravar o caminhosaída do bloco e precisa ser aprovado por unanimidade pelos líderes da União Europeia, na próxima quarta-feira, 10abril.
Ela propôs que, se os parlamentares britânicos aprovarem um acordo a tempo, o Reino Unido saia do bloco antes das eleições para o Parlamento Europeu, que terão início23maio. Mas afirmou que o país se preparará para participar dessas eleições caso nenhum acordo seja aprovado até lá.
Efeitos indiretosum não-acordo
Em um horizonteque o Brexit ocorra sem esse acordo, o Instituto Halle analisa que os produtos da União Europeia passariam a ser tarifados nas negociações com o Reino Unido, o que os deixaria mais caros e reduziria o apetite britânico para consumi-los.
Os efeitos disso, afirma, se alastrariam pela cadeia produtiva que abastece esse mercado e acabariam chegandoforma "indireta" a vários países, inclusive ao Brasil.
"Os efeitos não estão relacionados às exportações brasileiras para o Reino Unido (que não foram objeto do estudo), mas a insumos intermediários que as empresas brasileiras entregam a exportadorasprodutos da UE para o Reino Unido", disse Holtemöller.
"O setor alemãofabricaçãoprodutos alimentícios, por exemplo, exportaria menos para o Reino Unido e, portanto, também importaria menos insumos intermediários do setor agrícola do Brasil". O impacto é visto num horizontecurto prazo.
A longo prazo a expectativa é que "as empresas possam se ajustar à nova situação".
Retração
Enquanto essa acomodação não chegasse, porém, uma vez reduzidas as exportações para o bloco, as empresas atingidas reduziriam suas áreasprodução, demitiriam pessoal ou diminuiriam seus horáriostrabalho, segundo projeçõesHoltemöller.
"Existem também outras possibilidades. As empresas podem reduzir os preços, o que pode levar a lucros menores ou a aumentos salariais mais baixos."
O DepartamentoInteligência e Competitividade da Associação Brasileira da IndústriaAlimentos (ABIA) confirmounota à BBC News Brasil - sem estimar possíveis impactos no mercadotrabalho - que "uma saída não negociada do Reino Unido da União Europeia implicaria, no curto prazo,maior custoaquisição destas mercadorias pelas empresas do Reino Unido, com impactos financeiros negativos para as vendasalimentos do Brasil".
"Essa dificuldade", segundo a associação, poderia ser superada por um futuro acordo comercial entre o Brasil e o Reino Unido. "Todavia este processo demanda tempo, e também está sujeito a imprevistos".
Qual é a importância da UE e do Reino Unido para o comércio do Brasil ?
De acordo com dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), a União Europeia e a Europa (bloco que considera a UE, a Rússia e outros países) detêm juntas o postosegundo principal destino das exportações brasileiras hoje.
A fatia que abocanham das exportações éaproximadamente 28% e segueperto a da Ásia - para quem perderam a liderança a partir2017.
Excluindo o Oriente Médio, o chamado bloco Ásia compra atualmente 30% do que o Brasil vende lá fora.
Mas a força do comércio Brasil-UE resiste e é ressaltada pela própria União Europeia, que mantém uma página dizendo que o Brasil é o seu 10º maior parceiro comercial e também seu maior fornecedorprodutos agrícolas.
A lista do que compra inclui, por exemplo, carnes, soja, café, milho, algodão, frutas, sucos e outros subprodutos.
Isoladamente, o Reino Unido também é um parceiro importante para diversos setores brasileiros, incluindo ramos do setor agrícola e da indústriaalimentos.
Dados do MDIC levantados pela BBC News Brasil mostram que a região - que engloba Inglaterra, PaísGales, Irlanda do Norte e Escócia - é a 17º principal compradora internacional dos produtos brasileiros,meio a 253 parceiros.
Dentro da União Europeia, é a sexta mais importante, atrásHolanda, Alemanha, Espanha, Itália e Bélgica.
Só no ano passado, as exportações totais do Brasil para o mercado britânico alcançaram US$ 3 bilhões.
A força dos bens intermediários
Um levantamento do DepartamentoInteligência e Competitividade da ABIA, realizado a pedido da BBC News Brasil, mostra que, só no ano passado, as exportaçõesalimentos in natura ealimentos industrializados do Brasil para os britânicos alcançaram US$ 859,7 milhões - ou seja, 28,65% do totalUS$ 3 bi negociados com esse mercado no período.
"Deste montante, maisdois terços podem ser classificados como bens intermediários, bens manufaturados ou matérias-primas empregados na produçãooutros bens intermediários ouprodutos finais", diz a associação, acrescentando que "as cadeias produtivasvalor britânicas, inclusive as indústriasalimentos e bebidas, dependem fortementematérias-primas importadas, sendo o Brasil umseus principais fornecedores."
Do pontovista global, o Instituto Halle destaca que "tanto para bens intermediários quanto para uso final, a UE é o parceiro comercial quantitativamente mais importante do Reino Unido".
E o acordo do Brexit?
O acordoretirada do Reino Unido do bloco foi negociado entre a primeira-ministra, Theresa May, e os países remanescentes25novembro2018.
O documento estabelece que a relação comercialprodutos entre as duas partes deve ser o mais próxima possível da atual, viabilizando a facilidadenegociação.
"Isto significa uma árealivre comérciomercadorias", explica o Instituto Halle no materialdivulgação do estudo.
Em entrevista à BBC News Brasil, o professor do InstitutoRelações Internacionais da UniversidadeSão Paulo (IRI-USP), Kai Enno Lehmann, complementa que "com um possível acordo começaria um períodotransição e durante esse período as regras da União Europeia continuariam se aplicando ao Reino Unido".
Já no casonão acordo, "no minutoque o Reino Unido sair da União Europeia vai perder qualquer acordo que a União Europeia tenha com outro país. Todos os acordos que regemum lado a relação entre Reino Unido e União Europeia e,outro, a da União Europeia com o resto do mundo não teriam mais validade".
A situação do Reino Unido nesse caso, segundo o professor, seria "dramática" economicamente.
"Potencial caos", mas também "oportunidades"
"O problema com uma saída abrupta seria o potencial caos que se criaria. O Reino Unido simplesmente perderia do dia para a noite a base do seu comércio mundial, teria que renegociar seus acordos individualmente", explica Lehmann. "O impacto seria global simplesmente porque o Reino Unido é uma das maiores economias da União Europeia e do mundo".
Com relação ao Brasil, como não existe um acordolivre comércio vigente - mas simnegociação - entre o Mercosul e a União Europeia, a repercussão da saída do Reino Unido seria menos intensa do queoutros mercados, na avaliação dele, e também poderia haver um lado positivo.
"Sem esse acordo vai ter impacto? Não há dúvida. Vai ser uma coisa negativa? Com certeza também. Uma ruptura brusca seria ruim para todos os estados membros da UE, embora o impacto seja muito pior para o Reino Unido. A economia britânica sofreria bastante e isso teria impactotodos os seus parceiros comerciais, inclusive o Brasil", diz o professor, observando, porém, que como o Reino Unido "ficaria muito frágil e com menor poderbarganha", poderia haver vantagens para o Brasilpossíveis negociações individuais, mas não no curto prazo.
"Para o Brasil e vários setores as oportunidades são grandes, caso o país assuma um pensamento estratégico e estabeleça o que quer do Reino Unido eum acordolivre comércio. Se eu fosse representanteum setor estratégico faria muita pressão no governo (para assumir essa postura) e tentar se aproveitar dessa situação."
O presidente da Associação Brasileira dos Produtores ExportadoresFrutas e Derivados (Abrafrutas), Luiz Roberto Barcelos, faz coro. Segundo ele, os produtores do setor esperam,vezqueda com o Brexit, impulsionar as vendas para o Reino Unido, para onde seguem atualmente, por exemplo, 26%todo o melão que o Brasil exporta.
A fruta é a que os britânicos mais importam dos produtores brasileiros, mas uvas, mangas, melancias e limões também estão na lista.
"A expectativa é buscar um acordo nos moldes do que estamos negociando com a comunidade europeia e tentar reduzir o impostoimportação, que hoje é8,8%, para zero", diz Barcelos. "O percentual vai caindo ao longo10 anos até zerar".
"Acordo crucial"
Lehmann, da USP, diz que apesar das possíveis oportunidades que um hard Brexit pode trazer, um acordo seria crucial, uma vez que "o processosaída do país do bloco seria ordenado".
Holtemöller também afirmou que "no casoum acordo que implique o livre comércio entre UE e o Reino Unido, os efeitos sobre o emprego seriam muito menores".
"No entanto, sem um acordo formal, se aplicariam tarifas nas transações entre o Reino Unido e a UE. Carros e peçasautomóveis, por exemplo, seriam tributados10%. As tarifas agrícolas são ainda maiores", prevê o institutonota para apresentação do estudo.
Em um texto publicado no site,que também analisa os dados, o economista ressalta que "um Brexit sem acordo desestabilizaria as cadeias globaisvalor (ou seja, o conjuntoatividades necessárias para produzir e entregar o produto ao consumidor final" e que "é por isso que a retirada desordenada da Grã-Bretanha da UE tem o potencialcausar uma perda significativariqueza".
Do pontovista econômico, defende, "é crucial que um acordo ainda possa ser alcançado".
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