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A épocablaze aviaoque o Brasil barrou milharesblaze aviaojudeus que fugiam do nazismo:blaze aviao
Os documentos - que estão sendo incorporados ao Arquivo Virtual Sobre Holocausto e Antissemitismo (Arqshoah) - jogam luz sobre um lado pouco conhecido da história da imigração no Brasil.
Formação étnica do Brasil
Segundo Tucci, as recusasblaze aviaovisto a judeus seguiam ordens do alto escalão do governo. A partirblaze aviao1937, o Ministério das Relações Exteriores emitiu ao menos 26 circulares secretas impondo barreiras à entrada do grupo, considerado indesejável para a formação étnica do povo brasileiro numa épocablaze aviaoque o Brasil estimulava a migraçãoblaze aviaoeuropeus brancos e cristãos. Restrições semelhantes foram impostas a estrangeiros negros e asiáticos.
No caso dos judeus, porém, as barreiras afetavam um grupo que se via cada vez mais acuado por medidas discriminatóriasblaze aviaoboa parte da Europa. Calcula-se que cercablaze aviao6 milhõesblaze aviaojudeus tenham sido mortos pela máquinablaze aviaoguerra nazista, o maior genocídio do século 20.
As regras que barravam judeus vigoraram mesmo após o Brasil declarar guerra à Alemanha e enviar soldados para a Itália, só perdendo validade no fim do governoblaze aviaoEurico Gaspar Dutra,blaze aviao1950, quando os horrores do Holocausto já haviam sido amplamente difundidos.
"Os documentos derrubam o mitoblaze aviaoque o Brasil sempre recebeu imigrantesblaze aviaoportas abertas e reforçam a postura colaboracionista do governo Vargas com a política antissemita da Alemanha", afirma Tucci à BBC News Brasil.
Segundo ela, o governo impunha restrições a judeus e outras minorias por meioblaze aviaodocumentos secretos enquanto, no exterior, buscava apresentar o Brasil como um país "com projetos humanitários e salvacionistas". Uma circular que tratava do tema ordenava que a recusablaze aviaovistos a judeus deveria "ser justificada sem qualquer referência à questão étnica".
Autorablaze aviaovários livros sobre o antissemitismo no Brasil, Tucci estuda os documentos desde 1995, quando o Itamaraty abriu seu acervo sobre o tema. Ela diz acreditar que os númerosblaze aviaovistos recusados a judeus tenham sido muito superiores aos que já contabilizou.
Judeus 'subversivos'
A primeira das circulares secretas listava uma sérieblaze aviaoregras para barrar "numerosas levasblaze aviaosemitas, que os governosblaze aviaooutras nações estão empenhadosblaze aviaoafastar dos respectivos territórios".
A justificativa, segundo o ministério, era impedir a entradablaze aviaomigrantes que buscavam, "numa inadmissível concorrência ao comércio local e ao trabalhador nacional, absorverem, parasitariamente, (...) uma parte apreciávelblaze aviaonossa riqueza, quando, além disso, não se entregam, também, à propagandablaze aviaoideias dissolventes e subversivas".
A circular determinava, entre outros pontos, que não fossem dados vistos a judeus, exceto nos casosblaze aviaoque tivessem cônjuges brasileiros, possuíssem bens no país, pretendessem viajar a turismo ou tivessem "notória expressão cultural, política e social". As mesmas restrições não se aplicavam a europeus cristãos.
Caso o consulado suspeitasse que um judeu tentava se passar por cristão para obter o visto, poderia pedirblaze aviaocertidãoblaze aviaobatismo e suspender o processo até que, "por meioblaze aviaoinvestigação, se consiga esclarecer a dúvida". Segundo a circular, as regras haviam sido elaboradas pelos ministérios das Relações Exteriores e do Trabalho e aprovadas pelo presidente Getúlio Vargas.
Na época, outros órgãos do Estado também adotavam políticas racistas. No artigo Discriminação e Intolerância: os indesejáveis na seleção do Exército brasileiro, o pesquisador do Arquivo Histórico do Exército (AHEx) Fernando da Silva Rodrigues cita normas que impediam o acessoblaze aviaojudeus, negros e muçulmanos às escolas que formavam os oficiais da corporação. As regras foram definidasblaze aviao1937 pelo então ministro da Guerra, Eurico Gaspar Dutra, e valeram até 1946.
Deportaçãoblaze aviaoOlga Benário
Muitos historiadores já analisaram os laços entre o governo Vargas e o regime nazista na Alemanha, quando os dois países mantinham acordos secretos para a trocablaze aviaoinformações sobre militantes comunistas. A cooperação mais célebre envolveu a deportação pelo Brasil da judia alemã Olga Benário, cônjuge do líder comunista brasileiro Luís Carlos Prestes. Devolvida à Alemanha, ela foi presa e executada numa câmarablaze aviaogás no campoblaze aviaoBernburg,blaze aviao1942.
Foi só após sucessivos ataquesblaze aviaosubmarinos alemães e italianos à Marinha Mercante brasileira e sob forte pressão dos EUA que o país rompeu os laços diplomáticos com as potências do Eixo (Alemanha, Itália e Japão),blaze aviao1942, unindo-se dois anos depois aos Aliados nos camposblaze aviaobatalha.
Os documentos do governo brasileiro indicam que a afinidade entre o governo Vargas e a Alemanha nazista ia além da oposição ao comunismo - e que muitos altos diplomatas brasileiros tinham visões antissemitas.
Tucci diz que o próprio chanceler Oswaldo Aranha, homenageadoblaze aviaoIsrael por seu papel na Assembleia Geral da ONU que resultou na criação do país,blaze aviao1947, expôs ideias antissemitas e concebeu parte das ordens secretas que barravam a entradablaze aviaojudeus no Brasil.
Em carta enviadablaze aviao1938 ao então interventor federalblaze aviaoSão Paulo, Adhemarblaze aviaoBarros, Aranha alertava sobre os riscos da imigraçãoblaze aviaojudeus para o Estado.
"O israelita, por tendência milenar, é radicalmente avesso à agricultura e não se identifica com outras raças e outros credos. Isolado, há ainda a possibilidadeblaze aviaovir a ser assimilado pelo meio que o recebe (...). Em massa, constituiria, porém, iniludível perigo para a homogeneidade futura do Brasil", escreveu o chanceler.
Aranha disse que poucos dias antes havia sido procurado por um judeu austríaco radicado no Brasil, Frederico Zausmer, que pedia a regularização migratóriablaze aviaooutros 300 judeus residentesblaze aviaoSão Paulo - fato que, para o chanceler, despertava "justas suspeitas da existênciablaze aviaoum 'Getto' jáblaze aviaoformação nessa capital".
Naquele anos, guetos eram os bairros nos países sob jugo nazista onde judeus eram obrigados a morar, eblaze aviaoonde foram recolhidos e enviados aos camposblaze aviaoextermínio.
Velhos e crianças órfãs
Após a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), muitos dos formuladores das restrições à migraçãoblaze aviaojudeus permaneciam no governo brasileiro. Em 1948, o Conselho Nacionalblaze aviaoImigração e Colonização instruiu o Ministério das Relações Exteriores a reforçar as barreiras contra o grupo.
Uma circular orientava os consulados brasileiros a "não visar passaportesblaze aviaojudeus" - o que, segundo Tucci, fechou as portas para muitos velhos e crianças órfãs que haviam sobrevivido ao Holocausto e buscavam uma nova pátria.
Apesar das restrições, milharesblaze aviaojudeus conseguiram se mudar no Brasil antes e depois do Holocausto, dando origem a uma comunidade que conta hoje com 120 mil membros, segundo a Confederação Israelita do Brasil (Conib). Tucci diz que boa parte do grupo entrou no país com documentos falsos, com vistosblaze aviaoturistas ou passando-se por cristãos.
Foi o caso da família formada por Avraham, Frymet, Markus, Salomea, Josef e Sara Gottlieb, judeus poloneses que conseguiram vistos na embaixada brasileirablaze aviaoRoma com certidões falsasblaze aviaobatismo.
Outros contaram com a ajudablaze aviaojudeus brasileiros proeminentes, como o advogado José Mindlin (1914-2010), que negociou pessoalmente a concessãoblaze aviaovistos com autoridades. Mindlin teve papel central na reunificaçãoblaze aviaovárias famílias, como os Adler, judeus alemães.
Tucci conta que,blaze aviao1938, o comerciante Moritz Adler foi preso pelos nazistas e levado a um campoblaze aviaoconcentração pertoblaze aviaoFrankfurt. Mindlin foi acionado por parentes do alemão que já estavam no Brasil e conseguiu um visto para que ele deixasse o país rumo ao Brasil com a esposa, Frieda. O consulado do Brasilblaze aviaoFrankfurt, porém, negou os vistos para as duas filhas do casal, Tilly e Elsberg.
A mãe resolveu ficar com as crianças, e Moritz viajou sozinho. A família só voltou a ficar completa no fimblaze aviao1941, quando Mindlin obteve os vistos para as meninas. No Brasil, os Adler criaram a Estrela, até hoje uma das principais marcas nacionaisblaze aviaobrinquedos.
Houve ainda judeus que chegaram ao país graças a diplomatas que se recusaram a cumprir as ordens restritivas. Um deles foi Luiz Martinsblaze aviaoSouza Dantas, embaixador do Brasil na França entre 1922 e 1943, que concedeu centenasblaze aviaovistos a judeus sem informar ao governo a origem étnica dos requerentes.
Uma das famílias salvas por Dantas foi a da pintora tcheca Lise Forell, queblaze aviao1940 embarcou no navio Alsina rumo ao Brasil com os pais, avós maternos e um tio. Forell teve uma carreirablaze aviaosucesso no Brasil, expondo obras no Museublaze aviaoArteblaze aviaoSão Paulo (Masp) eblaze aviaovárias galerias.
Por causa da insubordinaçãoblaze aviaoDantas, Vargas instaurou um processo administrativo contra o embaixador, que passou 14 meses detido na Alemanha após tropas nazistas invadirem a embaixada brasileira,blaze aviao1942. Em 2003, ele foi reconhecido como um Justo entre as Nações pelo Yad Vashem (Museu do Holocausto),blaze aviaoJerusalém.
Questionado pela BBC, o Itamaraty afirmou por meioblaze aviaosua assessoriablaze aviaoimprensa que as políticas migratórias da época eram elaboradas pelo Ministério da Justiça e que os diplomatas apenas as executavam.
Neto e autorblaze aviaouma biografia sobre Oswaldo Aranha, Pedro Corrêa do Lago foi procurado por intermédioblaze aviaosua editora, mas não respondeu.
Ressurgimento do antissemitismo
Tucci diz que conhecer a postura do Brasilblaze aviaorelação a judeus que fugiam do nazismo tem grande valia num momentoblaze aviaoque o mundo volta a debater formasblaze aviaolidar com grandes levasblaze aviaomigrantes e refugiados.
"Temos aqui um espelho muito interessante para repensar uma sérieblaze aviaopolíticas e ações restritivas que estão sendo adotadas por vários países", afirma a professora.
Tucci afirma ainda que a discriminação dos judeus nos temposblaze aviaoVargas e Dutra serveblaze aviaoalerta para o "revigoramento do antissemitismo" no Brasil e no mundo. "O antissemitismo sempre reaparece nos momentosblaze aviaocrise, nas erosões do pensamento democrático, quando os mitos sobre a existênciablaze aviaouma grande conspiração judaica para dominar o mundo ressurgem com outras roupagens", diz a historiadora.
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