BBC resgata vozes e sambas esquecidos dos soldados brasileiros na 2ª Guerra:slot machine gratis
Essas gravações, feitas pelo correspondenteslot machine gratisguerra da Seção Brasileira da BBC, o anglo-gaúcho Francis Hallawell, com ajuda do técnicoslot machine gratissom britânico Douglas Farley, foram resgatadas pela BBC Brasil como parte das celebrações dos seus 80 anos e estão sendo disponibilizadas ao público para marcar essas oito décadasslot machine gratisproduçãoslot machine gratisconteúdo para o Brasil.
Historiadores e especialistas que tiveram acesso ao material ouvido pela BBC Brasil foram enfáticos ao situarslot machine gratisimportância.
"Foi emocionante ouvir as gravações", diz Francisco César Ferraz, professor do Departamentoslot machine gratisHistória da Universidade Estadualslot machine gratisLondrina (UEL), com anos dedicados à pesquisa da participação brasileira na Segunda Guerra e autorslot machine gratisdois livros sobre o assunto - O Brasil e a Segunda Guerra Mundial e A Guerra Que Não Acabou.
"Uma coisa é passar anos estudando ou lendo sobre o assunto, outra é realmente ouvir esses registros. A variedadeslot machine gratistópicos,slot machine gratissituações... têmslot machine gratistudo... desde reportagens relidas por correspondentesslot machine gratisguerra, seleções musicais, eventos, missas, humor, personagens, serviço médico... um material fantástico. É um estímulo a outros pesquisadores."
Para Vinicius Marianoslot machine gratisCarvalho, professor e pesquisador do Brazil Institute do King's College,slot machine gratisLondres, que ajudou a BBC a recuperar esse material e está publicando um trabalho focado nas músicas compostas pelos pracinhas, as gravaçõesslot machine gratisHallawell "nos aproximam demais do que viveram esses soldados na guerra".
"O som do acampamento, da panela ao fundo, pessoas falando... é a única imagem que a gente tem do universo sonoro desses pracinhas. Esse material é extremamente importante, possivelmente o único documento sonoro que dá voz ao soldado brasileiro na Itália."
As gravações resgatadas totalizam pouco maisslot machine gratisquatro horasslot machine gratisáudio. São 12 programasslot machine gratisduração e temas variados com material gravado durante os oito mesesslot machine gratiscampanha militar dos 25 mil integrantes da Força Expedicionária Brasileira (FEB) na Itália.
'Cartas, pessoal!'
Parte desse material foi transmitido ao Brasil por rádio durante a guerra, como por exemplo as reportagens que mostram uma distribuiçãoslot machine gratiscartas e a "hora do rancho"slot machine gratisum acampamento, a visita a um hospital - transmitida para o Brasil na noiteslot machine gratisNatalslot machine gratis1944 - e o registroslot machine gratisuma missa na Catedralslot machine gratisPisa,slot machine gratisque maisslot machine gratismil soldados e oficiais, com a presença do comandante da FEB, general Mascarenhasslot machine gratisMorais, cantaram o Hino Nacional.
Um dos mais curiosos é o programa com um showslot machine gratisvariedades celebrando a vitória, realizado no clube da FEBslot machine gratisAlessandria, no norte da Itália, quando os soldados aguardavam o retorno ao Brasil. O programa segue a linhaslot machine gratisshowsslot machine gratisrádio ao vivo populares na época, com concursoslot machine gratiscalouros, música e muito humor, e foi gravado especialmente "para as famílias (dos expedicionários) no Brasil, enquanto espera-se o grande dia do embarque".
Mas boa parte dos programas foi montada mais tarde, quando os soldados já tinham sido desmobilizados e retornado a suas cidades, como as homenagens aos três regimentosslot machine gratisinfantaria da FEB - o 1º, também conhecido como Regimento Sampaio, baseado na então capital, Rioslot machine gratisJaneiro, o 6º, baseadoslot machine gratisCaçapava (SP) e o 11º,slot machine gratisSão João del-Rei (MG), recontando suas campanhas com depoimentos e dramatizações feitas no estúdio da BBC.
O material do "Chico da BBC" deu impacto às transmissões da Seção Brasileira da BBCslot machine gratisondas curtas. Eram três horas diáriasslot machine gratistransmissão, sempre à noite, no horário nobre dos anosslot machine gratisouro do rádio no Brasil. Havia notícias, programasslot machine gratisvariedades, música, radioteatro e "cercaslot machine gratis15 minutos dedicados ao noticiário sobre a guerra", segundo o livro Vozesslot machine gratisLondres,slot machine gratisLaurindo Lalo Leal Filho, que conta a história da Seção Brasileira da BBC desdeslot machine gratiscriação,slot machine gratismarçoslot machine gratis1938.
As notícias que os brasileiros ouviam sobre a guerra eram traduzidas do inglês, o que, segundo Rose Esquenazi, professora da PUC-Rio e autoraslot machine gratisO Rádio na Segunda Guerra: no ar, Francis Hallawell, o Chico da BBC, longeslot machine gratisser um problema, ajudou a dar crédito ao conteúdo.
"A BBC trouxe maior equilíbrio. Falava quando um navio inglês era afundado", diz ela à BBC Brasil. "As pessoas sabiam que havia a censura do Estado Novo. Se você ouviaslot machine gratisoutra rádio, a notícia seria mais parcial. Os brasileiros sentiam que o noticiário da BBC era mais isento."
As vozes dos combatentes brasileiros e as crônicas enviadas por Hallawell "traziam humanidade" nessas transmissões. "As pessoas queriam que a guerra acabasse, e o Chico trazia as informações lá do front, onde estavam os filhos, os maridos e os noivos", afirma Esquenazi.
'Ô Félix, tá caindo muita coisa no front?'
Hallawell, nascidoslot machine gratisPorto Alegre e educado parcialmente na Inglaterra, falava português com um leve sotaque britânico, masslot machine gratisvoz, diz Esquenazi, "tinha certa intimidade com o ouvido do brasileiro".
Apesarslot machine gratismuitos soldados estarem "lendo" suas falas -slot machine gratisparticular nos programas feitosslot machine gratishomenagem aos regimentosslot machine gratisinfantaria -, a impressão que fica no ouvinte éslot machine gratisque eles se comunicam com "Chico"slot machine gratisforma aberta e direta.
Para Francisco Ferraz, as gravações ajudam a traçar um perfil mais nítido dos pracinhas.
"Esse perfil é um dos pontos sobre o qual menos temos informações, a documentação da FEB não é muito pródiga nisso. Em vários momentos (nas gravações), há o cuidadoslot machine gratisse perguntar o nome e a origem do soldado, a cidadeslot machine gratisonde vem, o que ele fazia..."
"Nos anos 1940, o Brasil era muito diferente, tínhamos uma população pouco alfabetizada. Dados estatísticos indicam que, apesarslot machine gratisrestrições do Exército, 6% dos soldados eram analfabetos. Quando você vê essa gente simples, que enfrentou temperaturas que nunca tinha enfrentado, nunca havia treinado para combaterslot machine gratismontanhas - bem diferente a combateslot machine gratisterra plana -, vê que esses jovens pertencem ao coração do povo brasileiro, no sentidoslot machine gratissua extração."
Vinicius Marianoslot machine gratisCarvalho aponta para a riqueza "fabulosa" das gravações do expedicionários fazendo música. "Nos dá a dimensão da expressão humana musical que esses soldados estão encontrando e fazendo no meio do camposlot machine gratisbatalha".
Hallawell e Farley gravaram 16 músicasslot machine gratispelo menos quatro locais diferentes na Itália. Treze dessas canções, emslot machine gratismaioria sambas e marchinhas, foram compostas por pracinhas.
"Música e guerra andam a par e passo", diz Carvalho. "Ela exerce uma função catártica incrível."
"A FEB tinha uma bandaslot machine gratismúsica, formada por cerca 60 músicos. Essa banda se desmembravaslot machine gratispequenos grupos para tocarslot machine gratisacampamentos e circular com mais facilidade. Uma delas era a orquestraslot machine gratisjazz, formada pelo pessoal do regimentoslot machine gratisSão João del-Rei (o 11º), quase imitando uma big band americana."
As orquestras militares eram comuns na Segunda Guerra. O conhecido músico americano Glenn Miller dirigiu a banda da Força Aérea americana na Europa - e morreuslot machine gratisum suposto acidente quando seu avião desapareceuslot machine gratisum vooslot machine gratisLondres a Parisslot machine gratisdezembroslot machine gratis1944.
Um dos programas diz, entretanto, "ser interessante notar que os brasileiros são os únicosslot machine gratistodos os combatentes na Itália que escrevem suas próprias canções". Carvalho diz ser "difícil saber" se a afirmação procede, mas que os pracinhas fizeram na Itália "o que se fazia no Brasil, com incorporaçãoslot machine gratistermosslot machine gratisitaliano, com narração do cotidiano que eles estão vivendo".
"É uma rica transposiçãoslot machine gratisuma vivência musical do Brasil para lá", diz o pesquisador, salientando "a grande relaçãoslot machine gratismútua troca" entre brasileiros e italianos.
Não se ouve a palavra "alemão" nos sambas. Ouve-se "tedesco" - como nos sambas Tedeschi Portare Via ou Tedesco Levante o Braço. "Ou 'paúra',slot machine gratisvezslot machine gratis'medo'."
"Há um fator que não podemos negligenciar dessa união, que é o catolicismo", pondera Carvalho. "A Itália é extremamente católica, o Brasil é eminentemente católico. É comum a narrativaslot machine gratisfamílias italianas que abrigavam os brasileiros, compartilhando o que tinham na mesa, rezando o terço juntos."
"Outra coisa é a facilidade da língua. De todo o contexto do 5º Exército (americano, ao qual a FEB se juntou) e seus aliados, um grupo extremamente multicultural - com indianos, poloneses, neozelandeses, americanos, ingleses, canadenses - a única língua neolatina é o português. O entendimento foi facilitado por essa raiz comum na língua."
As composições próprias, segundo Marianoslot machine gratisCarvalho, emslot machine gratismaioria "são músicas humorísticas, ironizando os alemães ou louvando as batalhas que fizeram". Dessas, ele destaca Onde Vi Muito Tedesco, uma embolada que descreve passo a passo a tomadaslot machine gratisMonte Castello. "É uma música fantástica. Narra detalhadamente as linhasslot machine gratisdefesa, o avanço da tropa, a aviação 'que criou muita confusão', o major Syzeno Sarmento, comandanteslot machine gratisum os batalhões... e assim vai."
As exceções são O Morto Vivo, uma surreal conversa entre um soldado e um cadáver, o emocionante samba Lembrei ('Se algum dia eu voltar/ jamais eu heislot machine gratispensar/ nas crises que eu passei/ pela vitória da pátria que tanto amei/ E será nobre dizer/ quando meu filho crescer/ a históriaslot machine gratisseu pai/ que com muito sacrifício/ buscouslot machine gratisseu benefício/ a vitória e a paz...), composto por um soldado mortoslot machine gratisMonte Castello, Alcebíades Sodré, e apresentado pelo gruposlot machine gratisjazz da FEB no showslot machine gratisvariedadesslot machine gratisAlessandria.
"É um samba bem dramático, dolente, como se (o autor) estivesse prevendo que fosse morrer", diz Marianoslot machine gratisCarvalho.
Menosprezo
Os especialistas ouvidos pela BBC Brasil acreditam que essas gravações podem ajudar a reverter o que Marianoslot machine gratisCarvalho chamaslot machine gratis"tendência a menosprezar a participação brasileira na Guerra".
Francisco César Ferraz diz que essa reversão já estáslot machine gratiscurso há alguns anos, e que as gravações "vêmslot machine gratishora oportuníssima".
"Durante muito tempo, a historiografia universitária, que é a que dita os tópicos que serão valorizados (no ensino escolarslot machine gratisHistória do Brasil, por exemplo), desprezou a participação brasileira na Segunda Guerra."
Uma explicação para esse "desprezo" seria o fato "de parte da cúpula do golpeslot machine gratis1964 ter pertencido à FEB". "Há essa associação, a meu ver errada, entre militares da FEB e militares que patrocinaram o regime militar. Na FEB haviaslot machine gratistudo. Havia células comunistas dentro da FEB. Dois dos dirigentes nacionais do PCB pertenceram à FEB, Salomão Malina e Jacob Gorender."
"No últimos dez anos houve um volume crescenteslot machine gratisinteresse pela participação na FEB e na FAB (Força Aérea Brasileira, que também esteve na Itália). E isso começou a repercutir no material didático. O númeroslot machine gratisdocumentários sobre a FEB e a participação do Brasil na Segunda Guerra aumentou bastante."
"Provavelmente é uma questão geracional. A geração mais jovem não tem o ranço, aquele rancor contra as Forças Armadas, da geração anterior."
Um exemplo da retomada das produções sobre o assunto são os livros (1942: O Brasil eslot machine gratisGuerra quase Desconhecida e Minha Segunda Guerra) e documentários (1942: O Brasil eslot machine gratisGuerra quase Desconhecida, Um Brasileiro no Dia D e O Caminho dos Heróis)slot machine gratisJoão Barone, baterista dos Paralamas do Sucesso, que se interessou pela Segunda Guerra Mundialslot machine gratisparte por seu pai ter sido pracinha.
"Todo mundo que toma conhecimento desse assunto fica surpreso, impressionado com o que aconteceu, com os fatos que levaram o Brasil a entrar na guerra, se comove e se emociona", conta.
Quando conversou com a BBC Brasil, Barone ainda não tinha ouvido as gravaçõesslot machine gratisHallawell - das quais conhecia apenas "algumas coisas que circulavam pela internet, aquela gravação do Hino Nacional sendo cantadoslot machine gratisPisa, algumas músicas".
Mas disse que "está todo mundo curioso para ouvir isso, é um material preciosíssimo".
A participação na Segunda Guerra e o contextoslot machine gratisque ela se deu "foi uma experiência tão valiosa do nosso povo", ressalta.
"É muita coisa interessante que ajuda a explicar o Brasilslot machine gratishoje."
Experiência e espíritoslot machine gratiscorpo
De fato, é difícil não se surpreender com a jornada dos pracinhas e como ela se encaixa na história recente do país. A aproximação com os EUA se consolida durante a guerra, com os acordos entre Getúlio Vargas e o então presidente americano, Franklin D. Roosevelt.
O Brasil permite a instalaçãoslot machine gratisbases militares (notadamenteslot machine gratisNatal - RN), promete fornecer munição e borracha e envia soldados para lutar contra os alemães. Em troca, os EUA bancam a criação da Companhia Siderúrgica Nacional com a construção da usinaslot machine gratisVolta Redonda, o "marco zero da nossa industrialização", como diz Barone.
Além disso, os EUA treinaram e armaram os soldados brasileiros na Europa - ajudando, talvez involuntariamente, a criar o que muitos viram como um "monstro" indesejado no Brasil.
Ao final da guerra, os maisslot machine gratis24 mil expedicionários compunham uma força militar sem rival no país. Tinham experiênciaslot machine gratiscombate, armas e um invejável espíritoslot machine gratiscorpo.
Não à toa, foram desmobilizados ainda na Europa. Após os desfiles no Rioslot machine gratisJaneiro, onde foram saudados como heróis, tiveramslot machine gratisretornar imediatamente às vidas que tinham antes. Francisco Ferraz explica que havia um grande receio, tanto no governo como na oposição e nos quartéis, com o possível engajamento dos pracinhas nos eventos políticos do país.
"Eles queriam despolitizar os pracinhas o quanto antes. A história já havia dado os exemplos dos soldados russos que voltaram da Primeira Guerra e acabaram apoiando os bolcheviques, e dos militares alemães que retornaram da mesma guerra e moldaram as bases do Partido Nazista."
"A FEB teve células comunistas", lembra Ferraz. "Vargas tinha promovido uma abertura no fimslot machine gratisseu governo. Ele não apenas libertou líderes comunistas como (Luis Carlos) Prestes, como também permitiu a legalização do Partido Comunista."
"Era um clima político bastante conturbado. E nos quartéis, os oficiais que haviam ficado no país receberam com hostilidade os que voltaram condecorados da Itália. Eles temiam ser preteridos por oficiais da FEB. A cúpula militar também não ajudou. Muitos ex-combatentes foram transferidos para bases distantes."
Outra história pouco conhecida é a dos problemasslot machine gratisadaptação que muitos ex-combatentes sofreram. Muitos voltaram com traumas e neuroses e tiveram grande dificuldade para retomar suas vidas. O governo prestou pouca ajuda - ao contrário do que ocorreu nos EUA, onde houve um planoslot machine gratisreintegração com vários tiposslot machine gratisapoio aos soldados que regressaram da guerra.
Logo esquecidos - e, aos poucos, perdendo cada vez mais espaço nos livrosslot machine gratisHistória do Brasil -, os pracinhas mantiveram acesa a chama do espíritoslot machine gratiscorpo com associaçõesslot machine gratisveteranos. Essas foram fundamentais na luta por benefícios como uma pensão, aprovada apenasslot machine gratis1988 - 43 anos depois do retorno -, chegando tarde demais para muitos ex-combatentes.
Com agradecimento especial à Embaixada do Brasilslot machine gratisLondres, que guardou parte dos arquivos usados no documentário.