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'Intervenção não pode se resumir a envioesporte jogo da sortecapitão do mato à senzala do século 21', diz ex-chefe da Polícia Civil:esporte jogo da sorte
"Por que cercar a favela, se o crime não está ali? O cerne da questão da insegurança não está ali. Aquilo ali é o resultado", afirma, considerando que os "meninos que estão no tráfico" são produto da desigualdade social.
Luz considera que a intervenção federal pode trazer benefícios se deixaresporte jogo da sortelado ações ostensivas nas favelas - que equivalem a "enxugar gelo" e estigmatizam os moradores - e trabalhar para recuperar as estruturas policiais, neutralizando a açãoesporte jogo da sorteagentes corruptos e fazendo com que os "mocinhos" - integrantes do sistemaesporte jogo da sortesegurança - façam jus à designação popular.
"O problema do Rio não são os bandidos. O problema do Rio são os mocinhos. Se ele recuperar o quadroesporte jogo da sortemocinhos, ele pode dar uma atenção real ao quadroesporte jogo da sortebandidos", afirma.
Leia abaixo os principais trechos da entrevista.
esporte jogo da sorte BBC Brasil - Como o senhor se posicionaesporte jogo da sorterelação à intervenção federal?
esporte jogo da sorte Hélio Luz - Eu entendo que a intervenção é constitucional. É inédita, mas é constitucional. A discussão está sendo muito reduzida ao oportunismo políticoesporte jogo da sortequem detém o poder. Foi uma medida oportunista? Foi, e nisso está longeesporte jogo da sorteser a primeira.
Mas acho que temos que ter uma discussão mais consequente. Estamos falando do problemaesporte jogo da sortesegurança da população do Rio. Há uma questão real e podemos ter uma conversa séria sobre isso.
Não vou falar no interventor, que é um cargo político, e sim no general Braga Netto, que manda no Comando Militar do Leste. O CML é o mais antigo e o mais completo arquivoesporte jogo da sorteinformações sobre os integrantes das polícias Civil, Militar e dos bombeiros do Estado do Rio. A trocaesporte jogo da sorteinformação do Exército com as polícias é constante. A segunda seção das Forças Armadas sabeesporte jogo da sortetudo.
Outros comandantes do CML tiveram acesso a essas informações, mas não podiam fazer muita coisa. Agora o general tem acesso a essa inteligência e pode agir com base nela. Pode mudar o comando e mexer nas polícias. Isso é inédito.
esporte jogo da sorte BBC Brasil - Mas a intervenção tem data para acabar, dia 31esporte jogo da sortedezembro. É possível resolver problemas estruturais na áreaesporte jogo da sortesegurança?
esporte jogo da sorte Hélio Luz - Não, para isso, ele precisariaesporte jogo da sortemais tempo eesporte jogo da sorteuma discussão mais ampla sobre um projetoesporte jogo da sortesegurança. Mas ele pode recuperar a estrutura existente.
O grande problema que temos é quem executa a segurança pública. Os integrantes das polícias Militares e Civil. Se o general recuperar as estruturas internas, os agentes que provocam a insegurança ficarão limitados ao ambiente externo.
O problema do Rio não são os bandidos. O problema do Rio são os mocinhos. Se ele recuperar o quadroesporte jogo da sortemocinhos, ele pode dar uma atenção real ao quadroesporte jogo da sortebandidos.
esporte jogo da sorte BBC Brasil - O mocinho é o policial?
esporte jogo da sorte Hélio Luz - Não só o policial. São os integrantes do sistemaesporte jogo da sortesegurança que operam no Estado do Rio. Pode ser bombeiro, agente penitenciário, policial rodoviário. É preciso transformar o mocinhoesporte jogo da sortemocinho.
Crime organizado pressupõe atuação a nível nacional, formaçãoesporte jogo da sorteum cartel e inserção nos poderes da República. O que denominam "bandidos" no Rio, e tenho ojeriza a isso, não é crime organizado. O tráfico no Rio não é cartelizado e disputa permanentemente a área geográfica. Não tem um exército ou integrantes constantes. Tem muitos problemas internos.
O pessoal não percebe que isso é um produto da sociedade. Esses meninos que estão no tráfico são um produto direto nosso, da classe média, dos detentores do poder desse país.
esporte jogo da sorte BBC Brasil - São um produto da desigualdade social?
esporte jogo da sorte Hélio Luz - São um produto da concentraçãoesporte jogo da sorterenda. E não venha me dizer que a Índia ou outros países com desigualdade não têm esse problema. Aqui é diferente, pô. O nosso nívelesporte jogo da sorteconcentraçãoesporte jogo da sorterenda é muito alto e resulta nisso.
A favela é produto nosso. Como é que não é produto dos que detêm o poder? Como é que não é produto da classe média? É produto meu. Como é que eu tenho aposentadoria integral e não tenho responsabilidade sobre a favela? Para eu ter meus privilégios, tem que existir favela. Isso é óbvio. O dinheiro público é um só. Se eu abocanho uma maior parte, falta do outro lado. Não há saída para isso.
Ele (o general) tem condiçãoesporte jogo da sorterecuperar as estruturas policiais e beneficiar o segmento que mais sofre com essa parafernália toda, o favelado, que é estigmatizado.
Lógico que para isso ele vai precisaresporte jogo da sorteum grupoesporte jogo da sortepoliciais civis e militares que não usem o tal do guardanapo da cabeça. Não pode. Polícia que gostaesporte jogo da sortebotar guardanapo na cabeça não serve para recuperar.
esporte jogo da sorte BBC Brasil - O senhor está falando do ex-governador Sérgio Cabral e do famoso jantaresporte jogo da sorteParis, com a farra dos guardanapos na cabeça.
esporte jogo da sorte Hélio Luz - É isso. Você pode ter um guardanapo para limpar aesporte jogo da sorteboca, com dinheiro privado. Na hora que você bota o guardanapo na cabeça, é dinheiro público.
Retirar a turma do guardanapo na cabeça é difícil, mas o general pode isolá-los, neutralizá-los. Não precisam ser todos. Na hora que neutraliza uma parte considerável, o restante se enquadra.
A partir disso, ele tem condiçõesesporte jogo da sortereduzir as açõesesporte jogo da sortevigilância ostensiva que essas GLOs (operações militares para Garantiaesporte jogo da sorteLei e da Ordem) fazem, com tropas nas favelas estigmatizando essas áreas. Como se o problema estivesse dentro das favelas. Não está.
Como ele tem um comando inédito do sistema, ele pode priorizar investigações integradas e coordenadas para prender os agentes externos da insegurança.
Eu tenho muita dificuldadeesporte jogo da sortechamaresporte jogo da sortebandido. Aqui no Brasil, chamar o pessoal que mora na favelaesporte jogo da sortebandido éesporte jogo da sorteuma incoerência tremenda. O bandido brasileiro usa terno e gravata.
Se ele (o general Braga Netto) quiser aprofundar as investigações, ele vai parar nas mesasesporte jogo da sortecâmbio que operam na avenida Rio Branco (no centro do Rio).
Ninguém pode imaginar que o menino da favela tenha capital o suficiente para bancar os entorpecentes que circulam ali. Quem detém o capital que financia as drogas tem uma mesa que opera câmbio na Rio Branco e um filho que frequenta bons colégios. Se o general chegar lá, aí realmente vai estar combatendo o crime e melhorando as condiçõesesporte jogo da sortesegurança do Rio.
esporte jogo da sorte BBC Brasil - O senhor diz que o general pode reduzir a ação ostensivas nas favelas, mas a expectativa é que essas ações possam aumentar, e semana passada vimos operações militares inclusive com fichamentoesporte jogo da sortemoradores.
esporte jogo da sorte Hélio Luz - O problema é que até agora foram operaçõesesporte jogo da sorteGLO, e elas repetem o trabalhoesporte jogo da sortevigilância que a polícia já fazia.
Se ficar operando nessa linha, só vai enxugar gelo. Vai ocorrer o mesmoesporte jogo da sortesempre. O pessoal (os traficantes) se afasta porque não quer confronto, mas depois retorna.
Por que fazer uma operação para cercar uma favela, se o crime não está ali? O cerne da questãoesporte jogo da sorteinsegurança não está ali. Aquilo ali é resultado.
esporte jogo da sorte BBC Brasil - Em esporte jogo da sorte Notíciasesporte jogo da sorteUma Guerra Particular esporte jogo da sorte , o senhor diz que a sociedade brasileira tem a polícia que quer, que garante uma elite com privilégios e uma lei que não vale para todos. O senhor acha que isso mudou?
esporte jogo da sorte Hélio Luz - Essa pergunta é difícil. Acho que o Brasil que vivemos na décadaesporte jogo da sorte60 mudou. Tivemos avanços. Naquela época não podia se falar nada sobre um senador (sobre ações ilícitas). Hojeesporte jogo da sortedia, um senador está vulnerável.
Mas um dos grandes problemas que temos nesse país é a tolerância com a ação à margem da lei. Vivemosesporte jogo da sorteum tempoesporte jogo da sorteque é admitido você ficar na franja. Os atos inconstitucionais estão se normalizando. A violação à lei está sendo admitida com muita tranquilidade.
Qual é a referência que se dá ao infrator que está lá na ponta? Quando a infração é praticada pelo excluído, você chama o Exército. Quando é praticada pela classe média e pelos detentores do poder, nada.
Se a lei é para ser cumprida na favela, é para ser cumprida por todo mundo. Ou a lei vale para todos ou não vale para ninguém.
esporte jogo da sorte BBC Brasil - No documentário, o senhor disse que a repressão policial evitava uma explosão social, mantendo o excluído sob controle. Essa lógica prevalece?
esporte jogo da sorte Hélio Luz - Sim. Na África do Sul, eles colocavam cercaesporte jogo da sortearame. Aqui não precisa colocar a cerca, porque cada um sabe o seu lugar. Então para quê você vai colocar uma operação dessas cercando a favela? O crime não está ali. Entende? O cerne da questão da insegurança não está ali. Aquilo ali é resultado.
Agora, a má distribuiçãoesporte jogo da sorterenda voltou a se acirrar, a polícia não deu mais conta e teve que chamar o Exército.
esporte jogo da sorte BBC Brasil - O senhor fala na concentraçãoesporte jogo da sorterenda, mas isso explica o fortalecimento das facções criminosas e as crescentes disputas por territórios?
esporte jogo da sorte Hélio Luz - Desculpe, mas isso é uma visão que só quem tem privilégios nesse país pode ter. Porque localiza a disputa lá na ponta. "Não, não somos nós que participamos disso. São eles." Eles quem? Os excluídos do patrimônio público. A guerra está entre eles, mas é sustentada pela turmaesporte jogo da sortecima.
É preciso estabelecer uma relação entre o auxílio-moradia (benefício pago a juízes) e a parte considerável da população que não tem moradia. Essa relação causa-efeito existe nesta eesporte jogo da sorteinúmeras questões.
Em todas elas, quem paga a conta no final é o favelado. Somos o país da desigualdade. E ficamos preocupados porque tem problema, entende, na senzala. Afrouxou a senzala, então agora tem que apertaresporte jogo da sortenovo. Então chama o capitão do mato para dar uma solução na senzala do século 21.
O problema social está no centro da questão da favela, e a questãoesporte jogo da sortesegurança do Estado é uma decorrência. Quem financia a droga que está lá? É um deboche achar que o favelado tem capital suficiente para bancar a ida, vinda e perdaesporte jogo da sortequalquer quantidadeesporte jogo da sorteentorpecentes.
esporte jogo da sorte BBC Brasil - Não seria o favelado que teria esse dinheiro, mas sim as facções criminosas.
esporte jogo da sorte Hélio Luz - Será que elas têm? Qual é a herança deixada por traficantes? Qual foi a herança deixada pelo Uê (Ernaldo Pintoesporte jogo da sorteMedeiros, fundador da facção Amigos dos Amigos)? Qual é o acúmuloesporte jogo da sortetodos esses chefetes que existiram?
esporte jogo da sorte BBC Brasil - Mas não é patrimônio acumulado, e simesporte jogo da sortecapitalesporte jogo da sortegiro do tráfico.
esporte jogo da sorte Hélio Luz - Eles não têm dinheiro acumulado. Como é que você acumula dólar? Vemos muitas simplificações quando se fala sobre o tráfico. Aí mostram a mansão do chefete que foi preso na favela. É ridículo isso. A cobertura dele é num terceiro andar com piscina na laje. Perto dos prédios que existem na Vieira Souto, na Delfim Moreira (na orlaesporte jogo da sorteIpanema e Leblon). Qual é o conceitoesporte jogo da sortemansão?
Fala-se que que eles acumulam dinheiro e estão bem organizados. Onde, se estão disputando boca por boca (de fumo)? Onde há crime organizado com disputaesporte jogo da sorteterritório permanente? Não existe. Se o cara tivesse dois milhõesesporte jogo da sortedólares disponíveis, ele saía da favela e ia ser rentista (risos).
esporte jogo da sorte BBC Brasil - Vemos sucessivos exemplosesporte jogo da sortetraficantes presos que continuam a dar ordensesporte jogo da sortedentro da prisão, com o Nem da Rocinha. Como isso ainda acontece?
esporte jogo da sorte Hélio Luz - Essa condição quem dá é o sistemaesporte jogo da sortesegurança. O cara faz o controle por meioesporte jogo da sorteagentes penitenciários. Ou é só o ex-governador (Sérgio Cabral) que tem acesso a uma comida especial (no presídio)? O mesmo caminho é usado no Rio, no Paraná ouesporte jogo da sortequalquer Estado. O sistemaesporte jogo da sortesegurança é vazado.
A classe média tem uma visão distorcida disso. Acha que a ponta está se organizando. Nada disso. É a desorganização do sistema penitenciário que permite que ordens saiam dos presídios.
Nós vivemos muitoesporte jogo da sorteilusão. É muita ficção. A tomada do Alemão foi uma ilusão. O Complexo do Alemão nunca foi tomado. Mas por um momento aquilo (a operaçãoesporte jogo da sorteocupação realizada por forçasesporte jogo da sortesegurançaesporte jogo da sorte2010) gera uma sensaçãoesporte jogo da sortesegurança, e você se ilude.
Quem detém o controle? Quem recebe a corrupção ou o cara que paga? É o agente que recebe a corrupção. É quem recebe a grana. Se não pagar para a polícia,esporte jogo da sorteduas uma, ou você se muda, ou vai para a vala.
Sem pagar a polícia, não se pratica crime no Rioesporte jogo da sorteJaneiro.
esporte jogo da sorte BBC Brasil - Os problemasesporte jogo da sortesegurança no Rio hoje não parecem muito diferentes daesporte jogo da sorteépoca à frente da Polícia Civil, nos anos 1990. Que perspectiva o senhor vê para o futuro?
esporte jogo da sorte Hélio Luz - Eu sou otimista. Acho que essas crises são crisesesporte jogo da sorteavanços. Não estamosesporte jogo da sorteuma situação horrível. Quem viveu nos anos 60, 70 sabe que jamais se podia apontar o dedo para um senador.
Tudo que está acontecendo (os casosesporte jogo da sortecorrupção) acontece há muito tempo nesse país. Sempre houve, mas agora nós sabemos. Agora vem a público. O Marcelo Odebrecht passar quase dois anos numa prisão é simbólico. A exposição do Judiciário com o caso do auxílio-moradia é simbólico.
Ainda é pouco, mas estamos avançando. Os desdobramentos são feitos à brasileira. É uma revolução republicana sem sangue. Aos poucos, a república vai se instalando.
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