Empresário confessa fraude contra ex-mulher365apostadivórcio e tenta reaver participação365apostagigante brasileira do varejo:365aposta

Fachada365apostaloja Marabraz
Legenda da foto, O Grupo Marabraz tem mais365aposta100 lojas só no Estado365apostaSão Paulo

Os filhos365apostaAbdul adotaram uma estratégia agressiva para expandir o comércio: abriram muitas lojas pela periferia paulistana e região metropolitana e ofereceram crédito às classes mais baixas. Contrataram como garotos-propaganda os ídolos do sertanejo Zezé di Camargo & Luciano, que passaram a entoar melodicamente o slogan "Lojas Marabraz, preço menor, ninguém faz"365apostapropagandas televisivas repetidas à exaustão no fim dos anos 1990.

Estamparam a marca365apostauniformes esportivos365apostavôlei e futebol feminino. E ofereceram móveis com prestações a perder365apostavista365apostaum momento365apostaque o poder365apostacompra da população se expandia. Deu certo.

Os irmãos Fares
Legenda da foto, Os irmãos Fares (da esq. p/ a dir.): Jamel, Nasser, Fábio Bahjet e Adiel | Foto: Arquivo Pessoal

Se365apostaum lado o foco dos negócios eram as classes mais baixas,365apostaoutro a família não deixava365apostacultuar uma aura365apostamistério sobre seu cotidiano. Os Fares não costumavam conceder entrevistas e escolhiam cuidadosamente suas aparições na mídia: uma delas, o casamento da neta365apostaAbdul, Sumaya Fares, foi uma festa luxuosa para mais365apostamil convidados na qual a noiva ostentava uma tiara365apostadiamantes. A pouca visibilidade levou muitos clientes a supor que os donos da Marabraz eram Zezé e Luciano.

No entanto, um processo judicial iniciado por Fábio contra os irmãos no início365aposta2018 expõe uma história que nunca tinha vindo a público. No enredo, supostas fraudes milionárias, sonegação365apostaimpostos, traição e um esquema para prejudicar365apostaex-mulher.

Na ação, ele alega ter cometido uma série365apostafraudes para lesar a ex-mulher, Suhaila Fares,365apostaum conturbado processo365apostadivórcio - na verdade dois, porque após uma primeira separação o casal reatou e, pouco depois, voltou a se divorciar.

Hoje, 21 anos depois365apostacometer o que diz ter sido365apostaprimeira fraude, ele quer que a própria Justiça reconheça que os empresários simularam transações comerciais que nunca existiram para que ele possa retomar365apostaparte dos negócios, que,365apostaacordo com Fábio, tem sido bloqueada pelos irmãos.

Falando à BBC Brasil365apostanome da família, Nasser Fares, irmão365apostaFábio, negou qualquer irregularidade e disse que nunca houve fraude ou simulação. A defesa dos irmãos ainda não foi apresentada à Justiça.

O divórcio

O imbróglio começou quando Fábio e365apostamulher, Suhaila, resolveram se separar,365aposta1995. Naquela época, a Marabraz estava365apostameio365apostaseu processo365apostaexpansão, com cerca365aposta80 lojas, e inaugurara seu terceiro centro365apostadistribuição no bairro do Jaraguá,365apostaSão Paulo.

Primos365apostaprimeiro grau, Fábio e Suhaila eram casados desde 1981365apostaregime365apostacomunhão universal365apostabens e o empresário, segundo365apostaalegação, não queria correr o risco365apostadividir o patrimônio, que se avolumava, com a ex-mulher.

Para driblar a necessidade da partilha, Fábio afirma ter recorrido a um expediente ilegal: ele diz ter se retirado oficialmente da sociedade do grupo na época, mas sustenta não ter recebido nada por isso porque, na prática, continuava sócio dos negócios. Tratava-se365apostauma venda simulada, relata ele.

"A fim365apostalesar365apostamulher no processo365apostadivórcio, notadamente365apostarelação à partilha365apostabens, o autor (Fábio) foi devidamente instruído e acompanhado365apostaseus irmãos para realizar negócios jurídicos simulados para a365apostasaída das empresas que à época compunham o Grupo Marabraz", afirmam os advogados365apostaFábio, André Frossard e Yasmin Cotait e Silva, no processo judicial.

Os registros da empresa na Junta Comercial do Estado365apostaSão Paulo mostram que Fábio se retirou da sociedade das empresas que faziam parte do Grupo Marabraz.

Além disso, os imóveis da família tinham sido passados para o nome da mãe365apostaFábio, a sogra365apostaSuhaila. Assim sendo, a esposa não teria direito às propriedades com a separação. Durante o litígio, Suhaila acabou despejada da mansão na Serra da Cantareira, na zona norte365apostaSão Paulo, onde o casal e seus dois filhos moravam.

Acordo

O processo365apostadivórcio durou até o ano 2000, quando Suhaila aceitou fazer um acordo com Fábio e receber R$ 3 milhões e um imóvel como365apostaparte na partilha.

No mesmo ano, no entanto, a história teve uma reviravolta: Fábio e Suhaila reataram o relacionamento e voltaram a viver juntos. Em 2003, fizeram um pacto antenupcial365apostaseparação total365apostabens e se casaram novamente um ano depois.

A dupla sertaneja Zezé365apostaCamargo e Luciano365apostauma propaganda da Magazine Luiza
Legenda da foto, A dupla Zezé365apostaCamargo e Luciano faz propaganda para a loja desde os anos 1990 | Foto: Reprodução/Facebook

A partir daí, as mudanças na empresa feitas365aposta1997 começaram a ser revertidas, segundo a ação movida por Fábio. Ele foi reintegrado ao quadro365apostasócios365apostaduas empresas do Grupo Marabraz, ao lado dos irmãos.

Diversas filiais da loja foram transferidas para um novo CNPJ, do qual Fábio era sócio constituinte. A marca Marabraz foi vinculada a um novo registro empresarial, criado365aposta2005,365apostaque Fábio também era dono.

Fraudes fiscais

Esse rearranjo das atividades da empresa365apostadiversos CNPJs era constante na administração do grupo,365apostaacordo com as autoridades brasileiras. O objetivo seria não só recolocar Fábio entre os sócios, mas esconder receitas para diminuir o pagamento365apostaimpostos - o que os irmãos e a empresa negam.

Em relatório365apostafiscalização365aposta2015, a Receita Federal afirma que os sócios do grupo - Jamel, Adiel e Nasser, sem Fábio - usaram diversas pessoas jurídicas "com o objetivo365apostaobter recursos365apostaforma ilícita, proveniente365apostasonegação fiscal".

Por causa disso, a Fazenda passou a exigir o pagamento365apostaum total365apostaR$ 755 milhões do Grupo Marabraz - o equivalente ao que teria sido sonegado pela empresa, acrescido365apostamultas.

Porém, ainda365apostaacordo com a Receita Federal, conforme chegavam as notificações365apostacobrança às diferentes empresas do grupo, elas eram fechadas,365apostaforma irregular e sem quitar as dívidas. "Em seus lugares, novas empresas comerciais são 'formalmente' constituídas, muitas vezes no mesmo endereço da empresa anterior", diz o documento, sugerindo que os empresários estavam meramente tentando evitar a fiscalização.

O processo ainda está365apostaandamento no Conselho Administrativo365apostaRecursos Fiscais (Carf).

Documento da receita federal
Legenda da foto, Termo365apostaverificação365apostaque a Receita Federal acusa os sócios365apostairregularidades

Diretor da Marabraz e irmão365apostaFábio, Nasser Fares diz que nunca houve uma decisão judicial condenatória e afirma que todas as dívidas federais da empresa estão sendo pagas365apostamaneira parcelada por meio do Pert (Programa Especial365apostaRegularização Tributária), do governo federal.

Nova separação

Em 2006, a família Fares teve365apostaenfrentar nova desavença domiciliar. Fábio e Suhaila se separaram365apostanovo - e iniciaram outra disputa pelo patrimônio, apesar do acordo antenupcial.

Suhaila entrou na Justiça para pedir o reconhecimento da união estável entre 2000 e 2004, quando o casal viveu junto sem formalizar a união. Ela também questionava o período365apostavalidade do acordo antenupcial.

Fábio, conforme365apostaprópria confissão processual, decidiu repetir a estratégia usada no primeiro divórcio: se retirar formalmente da sociedade sem, efetivamente, deixar365apostaser dono da Marabraz.

Em 12365apostaoutubro365aposta2006, ele registrou a venda para os irmãos - por R$ 200 mil -365apostasua cota365apostaparticipação na empresa que concentrava as filiais das lojas. Fábio também assinou um documento, junto com os irmãos,365apostaque ficava estabelecido que ele receberia R$ 750 mil pela365apostasaída "dos negócios dos Irmãos Fares".

No processo, Fábio diz que todo o patrimônio imobiliário da empresa, que estava365apostanome da mãe do empresário, foi também dividido365apostaquatro partes iguais e cada uma foi doada a um filho: Fábio, Jamel, Nasser e Adiel. Ele diz ter feito uma venda simulada da365apostaparte aos irmãos por R$ 44 milhões.

No processo que move hoje, Fábio afirma que o valor estava aquém do tamanho do patrimônio, o que seria uma prova da simulação da transação.

Embora não diga qual seria o valor total do grupo365apostavarejo, dá exemplos do tamanho dos rendimentos. Segundo a ação, só o aluguel do centro365apostadistribuição da Marabraz - um dos maiores do mundo - renderia R$ 6 milhões mensais à empresa. Outro imóvel renderia R$ 22 milhões365apostaaluguel (o documento não diz por qual prazo). Uma casa residencial365apostaum condomínio365apostaluxo era avaliada365apostaR$ 50 milhões.

O processo cita também documentos contábeis que mostram que, apenas no ano365aposta2015, o grupo teve faturamento superior a R$ 700 milhões e lucro líquido365apostamais365apostaR$ 57 milhões.

Na narrativa365apostaFábio, a discrepância entre os valores seria uma das provas que o negócio foi forjado.

Segundo ele, os irmãos estavam365apostaacordo com a fraude patrimonial, cujo único objetivo era prejudicar Suhaila - o que eles negam.

Traição

Fábio afirma ainda que, aliado às transferências formais365apostapatrimônio, ele, na prática, deixou a administração365apostaseus bens nas mãos do irmão Nasser. Fábio sofria365apostauma grave doença, que o obrigava a constantes internações hospitalares. E, segundo ele, o irmão estava ciente do esquema - o que Nasser nega.

Para tentar provar365apostatese, Fábio anexou ao processo um email que diz ter sido enviado a ele pelo irmão Nasser,365aposta2015. No texto, Nasser diz que Fábio deveria cancelar seus cartões365apostacrédito e débito e não manter mais conta365apostabanco por pelo menos três anos para ficar "totalmente blindado"365apostarelação a investidas judiciais da ex-mulher.

Documentos da junta comercial
Legenda da foto, Documentos da junta comercial mostram Fábio se retirando365apostaempresas que compunham o grupo Marabraz; ele era registrado como Pajé Fares, mas mudou365apostanome posteriormente através365apostauma retificação civil

Em 2012, o Tribunal365apostaJustiça365apostaSão Paulo impôs uma derrota a Fábio e reconheceu o direito365apostaSuhaila a uma pensão alimentícia pelo tempo365apostaque viveram365apostaunião estável. Mas se conseguiu garantir rendimentos mensais, Suhaila perdeu na disputa365apostapatrimônio, já que365aposta2016, o Superior Tribunal365apostaJustiça (STJ) confirmou a validade do pacto antenupcial - ela não teria, portanto, direito aos bens acumulados a partir365aposta2003 pelo Grupo Marabraz.

Quando o STJ decidiu a disputa e Suhaila não tinha mais possibilidade365apostarecursos, Fábio diz que resolveu reaver365apostaparte nos negócios com seus irmãos. Mas não conseguiu.

Foi assim que, diz ele na ação, o que era para ser um complô com o objetivo365apostaprejudicar a ex-mulher acabou resultando na365apostaperda total do patrimônio: os irmãos se recusaram a devolver365apostaparte.

O que diz o irmão

Atual diretor do Grupo Marabraz, Nasser Fares, nega que o irmão tenha simulado365apostasaída do grupo e afirma que não deve nada a Fábio.

"Em momento algum houve isso que você está falando (simulação365apostavenda)."

Nasser diz que o irmão saiu da empresa apenas uma vez. Durante a transação, afirma, o valor a ser pago,365apostaR$ 44 milhões, foi auditado por ambas as partes.

"Ele (Fábio) inclusive apresentou um laudo médico dizendo que estava365apostaplenas condições físicas e mentais365apostaassinar documentos e tomar decisões do tipo", afirma o irmão mais novo. Segundo Nasser, os R$ 44 milhões quitariam imóveis e a participação societária365apostaFábio.

Na ação, Fábio afirma que o montante nunca foi pago. Nasser contesta a afirmação. "Ele recebeu 100%365apostatudo o que era365apostadireito dele", diz. O pagamento teria sido feito365apostaparcelas e uma fração ainda estaria sendo paga, diz ele.

Nasser nega, ainda, ter participado365apostaqualquer conluio com o irmão para prejudicar a ex-cunhada no divórcio. "Não é do meu berço", diz, referindo-se à educação dada por Abdul aos quatro filhos.

A resposta365apostaNasser à BBC Brasil, no entanto, é contradita pelas declarações dele mesmo ao Ministério Público Federal,365aposta2010.

À época, os procuradores investigavam suposta sonegação365apostaimpostos por Fábio, diante365apostaaumento365apostapatrimônio pessoal não declarado ao fisco. O Ministério Público Federal (MPF) chegou a denunciar Fábio à Justiça, mas a ação penal foi suspensa diante365apostaum acordo dele para fazer o pagamento da dívida365apostaparcelas.

Em seu depoimento ao MPF, à época, Nasser disse que ajudava financeiramente o irmão, já que Fábio tinha saído da empresa anos antes. Ele não mencionou que fazia qualquer pagamento ao irmão pela venda365apostasua parte nos negócios.

Questionado pela BBC Brasil, Nasser disse: "Fui (depor) para ajudar meu irmão. As coisas que falei foi para ajudar meu irmão".

Perguntado se os pagamentos que fazia ao irmão seriam uma doação, como declarou ao MPF, ou o pagamento pela parte na sociedade, ele diz que "havia dois cenários".

"Um365apostapagamento e outro365apostaque eu ajudava meu irmão", diz ele. Questionado sobre por que era necessário ajudar o irmão se ele tinha essa renda proveniente da venda, Nasser disse apenas que foi "porque ele pediu".

Patrimônio

Segundo o advogado criminalista Cristiano Maronna, presidente do Instituto Brasileiro365apostaCiências Criminais, simular negócios com objetivo365apostaobter vantagem pessoal pode ser enquadrado como crime365apostaestelionato.

Centro365apostaDistribuição da Marabraz365apostaCajamar, no interior365apostaSão Paulo
Legenda da foto, Centro365apostaDistribuição da Marabraz365apostaCajamar, no interior365apostaSão Paulo | Foto: Divulgação

No caso prático, no entanto, é possível que qualquer crime possivelmente cometido Fábio já tenha prescrito. "Seria preciso analisar os detalhes para ver se não houve outro crime concomitante, o que poderia subir a pena e mudar o tempo365apostaprescrição."

Se não tiver havido prescrição, o Ministério Público pode entrar com uma ação penal contra Fábio pelas infrações que ele admite, se concluir que365apostafato elas foram cometidas.

Procurado pela BBC Brasil há algumas semanas, Fabio Bahjet Fares disse, por meio365apostaseu advogado, que não pretendia se manifestar sobre o assunto. "Os fatos e argumentos encontram-se comprovados no processo", disse seu advogado, André Frossard, do escritório Siqueira Castro.

Durante a apuração da reportagem, no entanto, ele mudou365apostaideia. Segundo disse à reportagem, Nasser paga até hoje um valor mensal referente aos dividendos a que ele diz ter direito como sócio, e também empregava seu motorista, que também faz365apostasegurança. Fábio afirmou ainda que o irmão tinha demitido esse funcionário recentemente, "como forma365apostaretaliação."

Posteriormente,365apostaentrevista à BBC Brasil, Nasser admitiu ter contratado o funcionário "para ajudar o irmão por causa do seu problema365apostasaúde", mas negou tê-lo demitido.

Nasser afirma também que as transferências365apostadinheiro que fez ao irmão não são dividendos, mas se referem à quitação da compra365apostasua parte da empresa, feita365aposta2005.

Procurada pela BBC Brasil, Suhaila Fares disse que "tomou conhecimento do processo" e confirmou a veracidade da história contada pelo marido na ação, mas não quis dar entrevista. Disse apenas: "É muito difícil uma pessoa passar pelo que passei e continuar com365apostaintegridade psicológica inabalada".

A assessoria365apostaimprensa da Marabraz disse que os outros sócios, Jamel e Adiel, não iriam se pronunciar, já que Nasser responderia pela família.