'É aceitar ou ser demitida': os desafiosapostaganhaquem esconde tatuagens por medoapostaganhaperder o emprego:apostaganha
"Desde que não sejam ofensivas, as tatuagens não podem ser fatores excludentes na minha área. Mesmo assim, até hoje eu sei que não posso escolher meus pacientes e, por isso, faço apenas tatuagens menos visíveis. Não vou fazer nenhuma no antebraço, por exemplo, mas se eu tivesse outra profissão seria diferente", diz.
Em algumas situações, as empresas não chegam a barrar os candidatos, mas pedem que a equipe esconda as tatuagens, às vezes até com fita adesiva. A reportagem conversou com funcionáriosapostaganhauma locadoraapostaganhaveículos eapostaganhauma redeapostaganhafarmácias que diziam temer perder o emprego caso não seguissem as recomendações.
Mas será que as empresas podem proibir tatuagens no ambienteapostaganhatrabalho?
O advogado e professorapostaganhagestão empresarial na PUC-SP Anis Kfouri diz que nenhum gestor pode obrigar seus funcionários a cobrir os desenhos e diz que os trabalhadores que se sentirem constrangidos podem processá-los. O trabalhador ainda pode pedir uma rescisão indireta do seu contratoapostaganhatrabalho e ter todos os seus direitos e indenizações pagas, como se tivesse sido demitido, explica.
"É inconstitucional discriminar uma pessoa porque ela tem uma tatuagem. O funcionário pode pedir uma indenização por danos morais por estar sendo tolhidoapostaganhasua liberdade, e há um precedente sobre isso importante do Supremo Tribunal Federal", acrescenta Kfouri.
Em agostoapostaganha2016, o STF decidiu que nenhum candidato pode ser desclassificadoapostaganhaconcurso público por ter tatuagem. Na época, o ministro Dias Toffoli mandou reintegrar ao processoapostaganhaseleção um homem que concorria a uma vaga para soldado da Polícia MilitarapostaganhaSão Paulo e havia sido eliminado por conta do desenho.
O candidato tinha passado na prova escrita do concurso, mas foi reprovado no exameapostaganhasaúde por ter uma tatuagem na parte internaapostaganhaseu bíceps direito. A justificativa era aapostaganhaque o desenho ficava visível quando ele usava o uniformeapostaganhatreinamento. Após a decisão da Justiça, ele concluiu o cursoapostaganhaformaçãoapostaganhanovembroapostaganha2016, mesmo mêsapostaganhaque começou a trabalhar nas ruas.
O advogado recomenda, porém, que o funcionário tente negociar com a empresa antesapostaganhaprocessá-la. "O ideal é ele dizer que não concorda com isso, avisar o setorapostaganhaRecursos Humanos e mostrarapostaganhainsatisfação. Dificilmente uma empresaapostaganhagrande porte vai permitir que isso continue", afirmou Kfouri.
A exceção, segundo Kfouri, são algumas situações que ocorremapostaganhaempresasapostaganhaalimentação, mas não ligadas às tatuagens. Elas podem pedir a seus funcionários que usem fitas ou esparadrapos para cobrir acessórios, como brincos e piercings, para evitar que eles caiam na comida.
Fitas para esconder as tatuagens
Esse não é o caso da locadoraapostaganhaveículos Localiza Hertz,apostaganhaSão Paulo. Em suas lojas, a orientação aos funcionários é que eles cubram todas suas tatuagens com esparadrapos bege. Em dias mais quentes, quando eles usam camisetaapostaganhamanga curta e saia, são visíveis os "remendos" colados às pernas, braços e dedos para esconder os desenhos.
Em pelo menos duas unidades da Localiza na capital paulista, a reportagem presenciou o momentoapostaganhaque funcionárias no balcão apertavam os braços para fixar pontas e pedaçosapostaganhafitas que se descolavam do corpo durante o trabalho. Apesar do esforço, as tatuagens não estavam escondidas; uma acabava por exibir uma asaapostaganhaborboleta e, a outra, o trechoapostaganhauma fraseapostaganhahomenagem à mãe.
Em uma loja na zona lesteapostaganhaSão Paulo, uma funcionária com três tatuagens escondidas causou estranhezaapostaganhaclientes, que comentavam entre si sobre o efeito estético provocado pelo excessoapostaganhafitasapostaganhaseu braço. "É assim desde quando eu entrei. É aceitar ou ser demitida", afirmou uma das atendentes,apostaganhaforma reservada, à BBC News Brasil.
A BBC News Brasil apurou que a empresa exige que seus funcionáriosapostaganhatodas as unidades do país escondam qualquer desenho que tenham na pele durante o horárioapostaganhatrabalho. O esparadrapo usado para cobrir os desenhos foi distribuído pela própria empresa, mas não esconde as tatuagens completamente e desgruda com facilidade. Isso leva o funcionário a reforçar a cobertura ou ficar com as fitas penduradas durante o expediente, o que eles mesmos chamamapostaganha"efeito múmia".
Funcionários da empresaapostaganhaquatro Estados disseram à reportagem que a ordemapostaganhacobrir as tatuagens é feita pela matriz da maior locadoraapostaganhaveículos da América do Sul, que ficaapostaganhaBelo Horizonte. De acordo com os relatos deles, a empresa demonstra preferência por contratar pessoas sem desenhos no corpo.
Procurada, a Localiza Hertz, fundadaapostaganha1973 e que tem quase 8 mil funcionáriosapostaganhasete países, diz que não discrimina candidatos com tatuagens, mas confirma que pede para que seus funcionários cubram os desenhos.
"A orientação é que não deixem tatuagem aparente, sempre que possível", diz,apostaganhanota divulgada porapostaganhaassessoriaapostaganhaimprensa. O texto diz, por outro lado, que "é comum encontrar,apostaganhaalguns casos, tatuagens aparentes, sem nenhuma retaliação".
No relato dos funcionários, as restrições não param nas tatuagens. O atendenteapostaganhauma unidade da LocalizaapostaganhaFlorianópolis, por exemplo, diz que as mulheres não podem ter maisapostaganhadois furos na orelha e devem usar apenas batom vermelho. "Eu tenho uma tatuagem no braço e, quando uma representante da matriz da empresa nos visitou, ela falou para eu usar uma meia-calça corapostaganhapele no braço para esconder o desenho", contou à reportagem.
A empresa também diz que distribui um "GuiaapostaganhaEstilo e Inspirações" para todos os funcionários, com "orientações claras sobre o uso do uniforme eapostaganhatodos os demais itens que compõem o padrão visual do nosso atendimento: penteados, maquiagem, usoapostaganhaacessórios, tatuagem, barba e piercing. Nosso intuito é manter a consistência desse padrão visual, reconhecido pelos nossos clientes, sem constrangimento ao colaborador", afirmou a Localizaapostaganhanota.
Despesas na farmácia
A reportagem também presenciou funcionários da redeapostaganhafarmácias Droga Raia usando fitas nos braços para cobrir suas tatuagens. Em uma loja da avenida Paulista, um funcionário diz que se sente incomodado com as fitas, mas aceita a ordemapostaganhaseus chefes para manter o emprego.
"O pior é que eles (Droga Raia) não pagam nem micropore (tipoapostaganhaesparadrapo). A gente tem que tirar o dinheiro do nosso próprio bolso para comprar. As fitas chamam a atenção e muitos clientes perguntam por que colamos isso no nosso braço. Eu sempre fico sem graça, é constrangedor. O mais triste é que a gente acaba se acostumando com essa situação", afirmou.
Procurada, a Droga Raia informou que "preza pela diversidade e o respeito aos indivíduos" e que não orienta "os funcionários a cobrir tatuagens". A empresa disse ainda que vai apurar se isso ocorreuapostaganhaalguma unidade da rede e "tomar as providências necessárias para que o fato não se repita".
"Reiteramos que os nossos valores são pautados na ética, nas relaçõesapostaganhaconfiança e na valorização do ser humano dentro e fora da empresa", informou a Droga Raia por meioapostaganhanota.
O que diz a lei sobre tatuagens no trabalho?
Segundo o advogado e professor universitário Anis Kfouri, as empresas não podem exigir que seus funcionários cubram suas tatuagens ou deixemapostaganhaexercer uma função por terem um desenhoapostaganhaseu corpo.
"O que o patrão pode fazer é estabelecer um traje, pode ser atéapostaganhamanga comprida, ou um penteado padrão para aeromoças e cozinheiras, por exemplo, mas não pedir para que escondam uma parte do corpo", explica.
Restrições ilegais, mas frequentes
Mas, apesarapostaganhaser ilegal, algumas empresas ainda tentam exigir que seus funcionários não tenham tatuagem.
Gestoraapostaganhatalentos no Núcleo BrasileiroapostaganhaEstágios (Nube), Luara Passareli Toniolo diz que alguns empresários ainda estabelecem restrições a candidatos com desenhos no corpo, mas ela não segue a orientação.
"Esses pedidos vêm diminuindo bastante. Mas, quando recebo, digo a eles que pensamos no lado profissional, não nas características físicas do candidato. Um desenho no corpo ou um corteapostaganhacabelo não vai influenciar seu desempenho", diz Toniolo.
Na visão da recrutadora, alguns gestores querem funcionários sem tatuagem por medo do que alguns clientes possam pensar.
Ela mesma tem uma tatuagem aparente no seu braço e diz que alguns candidatos ficam olhando para o desenho durante a entrevista.
"Eu percebo o olhinho curioso me observando. Já recebi elogios e, após se identificar com o desenho, uma menina me perguntou se ela também poderia usar um cabelo rosa caso fosse contratada pela empresa", conta Toniolo. Ela respondeu que sim, pois trata-seapostaganhauma opção pessoalapostaganhaestética da candidata.
Para a psicóloga da áreaapostaganharecrutamento Eva Buscoff, os empresários têm ficado muito mais abertos ao longo dos anos.
"Aquele gestor que antes achava um absurdo contratar uma pessoa com tatuagem teve filhos, que fizeram tatuagens e foram para o mercadoapostaganhatrabalho. Aquilo que trazia o sentidoapostaganhamarginal, pejorativo,apostaganhapessoa com atitudes erradas e despreocupadas caiu", afirma a psicóloga.
Hoje, para alguns profissionaisapostaganharecursos humanos, tatuagens significam uma pessoa com personalidade e atitude. Ela cita como exemplo o premiado chef brasileiro Alex Atala, que tem inúmeros desenhos nos braços e abdome.
Personal trainer perdeu o emprego por causa da tatuagem
Acácio Moreira, cuja história abre esta reportagem, conta que teve dificuldade para conseguir um emprego desde os 18 anos, quando tatuou o desenhoapostaganhauma caveira envoltaapostaganhachamas no braço.
E, quando conseguiu, teveapostaganhapedir as contas por não suportar a pressão do seu chefe, donoapostaganhauma academia no Jabaquara, na zona sul paulistana.
"Ele era evangélico. Depoisapostaganhacerto tempo, passou a criticar as minhas tatuagens e dizer que estava vendo o demônio falando no meu ouvido dizendo para eu fazer mais. Depois, pediu para eu ir trabalhar sempreapostaganhamanga comprida. Eu não aguentei e pedi as contas", conta Moreira.
Hoje, ele é pesquisador do laboratórioapostaganhamonitoramentoapostaganhaforça da UniversidadeapostaganhaSão Paulo (USP). Conta que no novo emprego nunca sofreu preconceito por suas tatuagens e que teve uma grata surpresa ao finalapostaganhaum estudo que fez com pessoas com doençaapostaganhaParkinson.
"No fim da pesquisa, um senhor veio me dizer que achava que todo cara que tinha tatuagem era bandido. Mas, que no pior momento da vida dele, quem o ajudou foi um cara com tatuagem. Ele me agradeceu e chorou. Foi emocionante."
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