O que é colorismo, o conceito que está na bocaaposta politica betanoyoutubers contra o racismo:aposta politica betano
"No final todo mundo é preto e todo mundo é discriminado, mas é fundamental que a gente compreenda como essa discriminação acontece", resume Tia Má, que, embora tenha sido registrada como parda quando nasceu, hoje se autodeclara negra.
O colorismo não é um termo novo no movimento negro, mas ainda não caiu, digamos assim, na boca do povo. Agora, com a ajuda das redes sociais, começa a alcançar um público maior. Além da Tia Má, outros youtubers já trataram do assunto nas suas redes sociais, como Nátaly Neri (do canal Afros e Afins), Gabi Oliveira (De Pretas), Sá Ollebar (Preta Pariu), Rayza Nicácio e Spartakus Santiago.
A advogada e militante Alessandra Devulsky, atualmente pesquisadora na Universidadeaposta politica betanoMontreal (no Canadá), prepara o livro O que é colorismo?, previsto para ser lançadoaposta politica betanomarçoaposta politica betano2018. A publicação fará parte da coleção Feminismos Plurais, coordenada pela filósofa Djamila Ribeiro.
Um dos objetivos da discussão é questionar a ideiaaposta politica betanoque a forte miscigenação no país seria um indicativoaposta politica betano"democracia racial".
Intelectuais e militantes negros usam o conceitoaposta politica betanocolorismo para denunciar que a mistura entre grupos étnico-raciais (no passado, frequentemente fruto da violência sexualaposta politica betanocolonos brancos contra escravas negras) não criou uma convivência harmoniosa entre os diferentes, mas uma hierarquização social.
Eles acreditam que entender a complexidade do racismo é fundamental para superá-lo. Além disso, defendem que os afrodescendentesaposta politica betanopele mais clara se conscientizem tanto do preconceito que sofrem, quanto dos privilégios que têmaposta politica betanorelação aosaposta politica betanopele mais escura.
"Os chamados negros na verdade vêmaposta politica betanomúltiplos povosaposta politica betanovárias regiões do território africano, assim como os brancos também têm as suas várias diferenças étnicas e culturais vindas da Europa. A miscigenação não elimina essas diferenças, ela multiplica", nota o sociólogo Ronaldo Sales, especialistaaposta politica betanoquestões étnico-raciais e professor da Universidade Federalaposta politica betanoCampina Grande (na Paraíba).
"O colorismoaposta politica betanoalguma forma expressa essas diferentes dinâmicas. É a ideiaaposta politica betanoque não estamos falandoaposta politica betanouma oposição entre os sem cor e osaposta politica betanocor, mas na verdadeaposta politica betanoum processoaposta politica betanocontraste e diferenciação que utiliza esses critérios como formaaposta politica betanohierarquização social, e que não é linear", acrescenta.
Alessandra Devulsky explica que o colorismo está baseado na ideiaaposta politica betanoque existe um fenótipo (isto é, um conjuntoaposta politica betanocaracterísticas físicas) normalizado: o europeu. O ideal, segundo essa lógica, é ser alto, ter a pele clara e os traços que remetem à "raça ariana".
"Quanto mais próximo se chega disso, maior a percepçãoaposta politica betanocompetência e beleza dessa pessoa", observa.
Ela ressalta que não se trataaposta politica betanouma "disputa" sobre quais são as opressões mais profundas, masaposta politica betano"entenderaposta politica betanoque modo o racismo penetra nas nossas vidas, nas relações interpessoais, e como isso se constrói historicamente".
Essa lógica não está presente apenas no Brasil, acrescenta ela. Emaposta politica betanopesquisa, Devulsky identificou o primeiro uso moderno do conceito na década da 60 na França,aposta politica betanoreferência a hierarquização social entre diferentes tiposaposta politica betanoimigrantes africanos, já que os mais claros, vindos por exemplo da Argélia, tinham mais facilidadeaposta politica betanose empregar que os mais escuros.
Segundo a advogada, essa hierarquia tem uma função econômica dentro da sociedade capitalista, pois cria uma distinção entre "quem pode colaborar e gozaraposta politica betanodeterminados benefícios sociais e quem não pode". Dessa forma, cria uma classe vulnerabilizada, mais suscetível à exploração.
"Eu ofereço então os menores salários e as piores condições, e essas pessoas vão aceitar, não porque não entendem que existe uma superexploração, mas porque não há alternativa para elas. Ou é aquilo ou a fome", critica.
A busca do embranquecimento
Um dos reflexos perversos dessa hierarquização social é o esforço dos não brancosaposta politica betanotentar se embranquecer, observa Devulsky, exemplificando seu ponto com o avanço do consumoaposta politica betanocremes clareadores na Índia.
"É um nicho cosmético (que permite) você conseguir vender um cremeaposta politica betanoclarear a pele com maisaposta politica betano50 substâncias cancerígenas. Isso acontece porque o sujeito percebe que, se tiver a pele alguns tons mais claro, vai conseguir alimentaraposta politica betanofamíliaaposta politica betanoforma menos violenta, com menos horasaposta politica betanotrabalho, num emprego menos indigno. Então, é óbvio que as pessoas vão procurar formasaposta politica betanoaliviar esse sofrimento."
Um fenômeno mais presente no Brasil é a busca pelo cabelo liso. Djamila Ribeiro é uma mulher negraaposta politica betanopela escura e, por isso, como ela mesma diz,aposta politica betanonegritude "é indisfarçável". Apenas adulta, porém, ela reconheceu seu cabelo crespo, que hoje usaaposta politica betanoum penteado trançado.
"A infância e a adolescência inteiras eu alisei muito meu cabelo. Não por questãoaposta politica betanoescolha, alisava porque queria ser aceita", conta.
"Minha mãe aquecia o penteaposta politica betanoferro no fogão e passava no meu cabelo. Depois passei para química, ambos processos extremamente agressivos. Eu só fui sentir a textura do meu cabelo na fase adulta. A maioria das mulheres negras da minha geração passaram por isso", acrescenta.
Pardo ou negro?
Militantes procuram usar o debate do colorismo também para questionar essa tentativaaposta politica betano"embranquecimento". Com o título "Pardo não tem raça? Entenda mais sobre colorismo e o lugar do pardo no debate racial brasileiro", o vídeo do ciberativista Spartakus Santiago, publicadoaposta politica betanosetembro deste ano, teve 1,4 milhãoaposta politica betanovisualizações no Facebook.
Ele usa o conceito para argumentar que afrodescendentes mestiços também são negros e os convida a se reconhecerem como tais,aposta politica betanovezaposta politica betanose declararem como "pardos", "moreninhos" ou "queimadinhosaposta politica betanosol".
"Quando a pessoa entende que esses termos só camuflam o que a gente é, são só uma máscara para a nossa condiçãoaposta politica betanonegro, ela se inclui no debate racial!", defende na gravação.
Santiago, que tem ascendência africana e italiana, conta que dentro daaposta politica betanoprópria família sofreu resistência quando passou a se afirmar como negro.
"Eles me diziam 'calma, você é moreno', como se fosse uma ofensa ser negro. Esse é um dos meus vídeos que acho que tem mais papel social, pois muitas pessoas me procuram dizendo que entenderamaposta politica betanoidentidade racial a partir dele", contou à BBC Brasil.
O debate, porém, não se dá sem tensões. Santiago, assim como a youtuber Rayza Nicácio, já sofreu críticasaposta politica betanoafrodescendentesaposta politica betanopele mais escura que dizem que eles não são negrosaposta politica betanoverdade. Na visãoaposta politica betanoDjamila Ribeiro, essa resistência é reflexo do racismo mais duro que essas pessoas enfrentam.
"Muitas vezes a sociedade racista vai privilegiar esses negrosaposta politica betanopele mais clara, até no sentidoaposta politica betanoserem convidados para falaremaposta politica betanocertos temas, a ocuparem certos postos que são importantes para a população negra. Isso gera tensões. Mas é importante elas (as mais escuras) entenderem que isso não é responsabilidade dessas pessoas (mais claras), isso é um mecanismo criado por um sistema racista para nos dividir", ressalta.
Santiago foi também acusadoaposta politica betanoestar "apagando" a ascendência indígena ao defender que pardos se assumam como negros. Ele reconhece que as críticas lhe despertaram novas reflexões e diz que pretende gravar um novo vídeo sobre o assunto. Depois dessas mensagens, ele também acrescentou na descrição do vídeo a ressalvaaposta politica betanoque estava se referindo aos pardos com afroascendência.
Um ponto central no debate do colorismo é que ser negro está relacionado com a forma como a pessoa é "lida" pela sociedade. Para Devulsky e Sales, não se trata apenasaposta politica betanoum processo individualaposta politica betanoautodeclaração, mas algo que se constrói coletivamente, na relação com os outros.
Nesse sentido, Sales considera, inclusive, que há a identidade do "pardo-branco". "São pessoas que, embora mestiças, passam como brancas (por suas características físicas) e não são descriminadas poraposta politica betanocor. Jamais seriam negras. Nesse caso, não devem se beneficiaraposta politica betanocotasaposta politica betanoconcurso", argumenta.
Já os afrodescendentes que sofrem preconceito racial são negros, considera o sociólogo, independentementeaposta politica betanosua pele ser mais ou menos escura.
Para argumentar, ele usa uma metáfora: "Eu costumo perguntar aos meus alunos: qual das cores é menos escura, o azul-marinho ou o azul-celeste? O azul-celeste, eles respondem. Então, eu pergunto: qual dos dois é mais azul? E aí você não diz qual é mais azul, porque na verdade ambos são".